terça-feira , 19 março 2024
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Regularização Ambiental Pós-CAR: recomendações após as novas alterações do Código Florestal

por Pedro Puttini Mendes.

 

Em outra oportunidade comentamos a respeito dos prazos vencidos para regularização ambiental[1] e as medidas provisórias recém editadas com relação ao Código Florestal, especialmente no que diz respeito ao Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA).

Para solucionar este impasse, pois o nome “provisórias” determina que tais normativas sejam convertidas em leis federais, a Presidência da República sancionou, com publicação no Diário Oficial da União de 18/10/2019, a Lei Federal nº 13887/2019, convertendo a comentada Medida Provisória 884 de 14/06/2019.

Estas questões estão diretamente ligadas à regularização ambiental de todas as propriedades e posses rurais brasileiras, como também de sua segurança jurídica por afetar as duas principais ferramentas jurídicas ambientais já comentadas, CAR e PRA.

Apenas para recordar a falta de clareza que antes prevalecia na legislação entre o Código Florestal (Lei Federal nº 12.651/2012) e a MP 884, determinava o Código Florestal, no artigo 59 que “A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA, devendo essa adesão ser requerida no prazo estipulado no § 3º do art. 29 desta Lei”.

Desta maneira, este comentado “prazo estipulado no §3º do artigo 29” (Código Florestal), leia-se “o prazo do CAR”, foi alterado pela Medida Provisória 884, a qual publicou novo texto determinando que “A inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais”, ou seja, extinguiu o prazo.

Agora, com a conversão da medida provisória em lei federal, já citados seus números logo acima, esta omissão foi suprida com o seguinte texto: “A inscrição no CAR é obrigatória e por prazo indeterminado para todas as propriedades e posses rurais”. Portanto, não existe mais prazo para o CAR, é indeterminado.

E o Programa de Regularização Ambiental (PRA)?

Já o PRA – Programa de Regularização Ambiental, também teve seu prazo reeditado pelo texto da nova lei, mas não é indeterminado, foi colocado na legislação (Código Florestal) como sendo dois anos contados da inscrição do imóvel rural no CAR. Confira o texto.

Art. 1o A Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 59. ……………………………………………………………………………………..

§ 2º  A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA, que deve ser requerida em até 2 (dois) anos, observado o disposto no § 4º do art. 29 desta Lei.

 

Mas atenção. A inscrição no CAR, para fins de adesão ao PRA somente poderá ser realizada até 31 de dezembro de 2020, veja-se o texto da nova lei:

 

Art. 1o A Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 29. ……………………………………………………………………………………..

§ 4º Os proprietários e possuidores dos imóveis rurais que os inscreverem no CAR até o dia 31 de dezembro de 2020 terão direito à adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), de que trata o art. 59 desta Lei.” (NR)

 

Resumindo.

Aquele que ainda não se inscreveu no CAR e possui passivos ambientais – leia-se, déficit de reserva legal, áreas de preservação permanente ou áreas de uso restrito – deverá, até 31 de dezembro de 2020 inscrever-se no CAR para garantir apenas seu direito de adesão ao PRA, para que então, no prazo de até dois anos, formalize a adesão ao programa.

Mas na prática, o que é esta adesão ao PRA? Como funciona esta etapa seguinte à inscrição no CAR e adesão ao PRA? De maneira bem resumida, podemos iniciar uma explicação a partir da seguinte imagem.

 

Portanto, a adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) é mera declaração de vontade, vinculada a uma série de outros instrumentos jurídicos do Código Florestal, ou seja, não basta o proprietário ou possuidor de imóvel rural dizer que existe um passivo em sua área, que pretende recuperar e não se comunicar mais com o órgão ambiental.

O Decreto Federal que regulamenta o Código Florestal, Decreto nº 7.830/2012, sem novas alterações, responde a essas dúvidas em seu artigo 9º, parágrafo 2º, definindo o PRA como “conjunto de ações ou iniciativas a serem desenvolvidas por proprietários e posseiros rurais com o objetivo de adequar e promover a regularização ambiental e nível federal e estadual, composto por alguns instrumentos”.

 

I – o Cadastro Ambiental Rural – CAR, conforme disposto no caput do art. 5o;

II – o termo de compromisso; (art. 59, §3º, Lei 12651 e art. 5º, Dec 8235/2014)

III – o Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas; e,

IV – as Cotas de Reserva Ambiental – CRA, quando couber. 

 

E mais um decreto federal, que também trata do PRA, o Decreto nº 8.235/2014, também inalterado pelas novas leis, determina que, além da adesão ao PRA, seja assinado um termo de compromisso junto ao órgão ambiental do Estado correspondente à inscrição no CAR:

 

Art. 4º Nos termos do § 1º do art. 59 da Lei nº 12.651, de 2012, os programas de regularização ambiental serão implantados pelos Estados e pelo Distrito Federal, observados os seguintes requisitos:

I – termo de compromisso, com eficácia de título executivo extrajudicial;

 

Percebe-se então que não basta adesão ao PRA, mas em ato subsequente, assinar os respectivos compromissos junto ao órgão ambiental, o que tem sofrido variações dependendo de cada estado, onde alguns já tem emitido automaticamente um termo provisório no ato da adesão ao PRA para depois convocar os proprietários para entregar seus projetos e outros estados já estão optando por convocar para assinar definitivamente os compromissos de recuperação das áreas danificadas (reserva legal, área de preservação permanente, área de uso restrito).

Há outra novidade com a nova Lei Federal nº 13.887, pois alguns estados, como São Paulo, dentre outros, não permitiam ao proprietário ou possuidor de imóveis rurais com passivos ambientais aderir ao PRA, encurralado neste entrave burocrático, agora solucionado pelo seguinte texto incluído pela lei:

 

§ 7º  Caso os Estados e o Distrito Federal não implantem o PRA até 31 de dezembro de 2020, o proprietário ou possuidor de imóvel rural poderá aderir ao PRA implantado pela União, observado o disposto no § 2º deste artigo.” (NR)

 

Explicado o trâmite entre a adesão ao PRA e assinatura dos termos de compromisso, caberá ao proprietário ou possuidor de imóvel rural com passivo ambiental, procurar os técnicos devidamente habilitados a realizar os projetos de recuperação das áreas de reserva legal, preservação permanente ou uso restrito que não estão em conformidade com a legislação, sabendo o seguinte.

Para reserva legal, caso necessite recuperação e não se trate de áreas consolidadas (vale leitura ao artigo sobre o tema[2]), as opções são aquelas disponibilizadas pelo artigo 66 do Código Florestal:

 

Art. 66.  […]

I – recompor a Reserva Legal; 

II – permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal; 

III – compensar a Reserva Legal. 

[…]

§ 2o A recomposição de que trata o inciso I do caputdeverá atender os critérios estipulados pelo órgão competente do Sisnama e ser concluída em até 20 (vinte) anos, abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo 1/10 (um décimo) da área total necessária à sua complementação. 

§ 3o A recomposição de que trata o inciso I do caput poderá ser realizada mediante o plantio intercalado de espécies nativas com exóticas ou frutíferas, em sistema agroflorestal, observados os seguintes parâmetros:

I – o plantio de espécies exóticas deverá ser combinado com as espécies nativas de ocorrência regional; 

II – a área recomposta com espécies exóticas não poderá exceder a 50% (cinquenta por cento) da área total a ser recuperada. 

§ 4o Os proprietários ou possuidores do imóvel que optarem por recompor a Reserva Legal na forma dos §§ 2oe 3o terão direito à sua exploração econômica, nos termos desta Lei. 

 

Já as áreas de preservação permanente, para que sejam recuperadas, também não se tratando de áreas consolidadas, devem obedecer todas aquelas metragens já definidas pelo artigo 4º do Código Florestal, valendo também observar o que diz o artigo 19 do Decreto Federal nº 7830/2012[3]

Por fim, também é importante analisar alguns outros reflexos desta nova lei, comentados no texto de antes, já que nada foi comentado acerca do crédito rural, como determina o texto do artigo 78-A onde não seria mais autorizada concessão após a data prevista pelo artigo 29, §3° do Código Florestal, aquele que agora possui a seguinte redação: “A inscrição no CAR é obrigatória e por prazo indeterminado para todas as propriedades e posses rurais”.

Logo, permanece o alerta, se não há prazo para inscrição no CAR, a qualquer tempo, podem as instituições bancárias realizar o bloqueio de crédito rural.

Notas:

[1] https://www.scotconsultoria.com.br/noticias/artigos/50844/prazos-vencidos-para-regularizacao-ambiental-e-as-medidas-%E2%80%98provisorias%E2%80%99.htm

[2] https://www.scotconsultoria.com.br/noticias/artigos/50234/areas-consolidadas-e-mal-compreendidas.htm

[3] Art. 19. A recomposição das Áreas de Preservação Permanente poderá ser feita, isolada ou conjuntamente, pelos seguintes métodos:

I – condução de regeneração natural de espécies nativas;

II – plantio de espécies nativas;

III- plantio de espécies nativas conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas; e

IV – plantio intercalado de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, exóticas com nativas de ocorrência regional, em até cinquenta por cento da área total a ser recomposta, no caso dos imóveis a que se refere o inciso V do caput do art. 3º da Lei nº 12.651, de 2012.

§ 1º Para os imóveis rurais com área de até um módulo fiscal que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em cinco metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água.

§ 2º Para os imóveis rurais com área superior a um módulo fiscal e de até dois módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em oito metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água.

§ 3º Para os imóveis rurais com área superior a dois módulos fiscais e de até quatro módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em quinze metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d’água.

§ 4º Para fins do que dispõe o inciso II do § 4º do art. 61-A da Lei nº 12.651, de 2012, a recomposição das faixas marginais ao longo dos cursos d’água naturais será de, no mínimo:

I – vinte metros, contados da borda da calha do leito regular, para imóveis com área superior a quatro e de até dez módulos fiscais, nos cursos d’água com até dez metros de largura; e

II – nos demais casos, extensão correspondente à metade da largura do curso d’água, observado o mínimo de trinta e o máximo de cem metros, contados da borda da calha do leito regular.

§ 5º Nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de nascentes e olhos d’água perenes, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição do raio mínimo de quinze metros.

§ 6º Para os imóveis rurais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de lagos e lagoas naturais, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição de faixa marginal com largura mínima de:

I – cinco metros, para imóveis rurais com área de até um módulo fiscal;

II – oito metros, para imóveis rurais com área superior a um módulo fiscal e de até dois módulos fiscais;

III – quinze metros, para imóveis rurais com área superior a dois módulos fiscais e de até quatro módulos fiscais; e

IV – trinta metros, para imóveis rurais com área superior a quatro módulos fiscais.

§ 7º Nos casos de áreas rurais consolidadas em veredas, será obrigatória a recomposição das faixas marginais, em projeção horizontal, delimitadas a partir do espaço brejoso e encharcado, de largura mínima de:

I – trinta metros, para imóveis rurais com área de até quatro módulos fiscais; e

II – cinquenta metros, para imóveis rurais com área superior a quatro módulos fiscais.

§ 8º Será considerada, para os fins do disposto neste artigo, a área detida pelo imóvel rural em 22 de julho de 2008.

 

Pedro Puttini Mendes – Advogado (OAB/MS 16.518), Consultor Jurídico e Professor nas áreas de Direito Agrário, Ambiental, Família e Sucessões. Graduado em Direito (2008) e Mestre em Desenvolvimento Local (2019) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. Professor convidado das faculdades: Unigran Capital (Especialização em Direito Civil e Processo Civil; e MBA em Agronegócio), IPOG – Instituto de Graduação e Pós-Graduação (MBA em Agronegócio e Agroindústria), Novoeste Educacional (MBA em Agronegócios) e FIA – Fundação Instituto de Administração / Pensa Agro (Direito Agrário e Ambiental). Organizador das obras “Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor” (Editora Contemplar, 2018) e “O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988” (Editora Thoth, 2018). Escreveu em coautoria as obras “Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988” (editora Thoth, 2018); “Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar” (Editora Thoth, 2018); “Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul – explicada e comentada” (Editora do Senado, 2017). Apresentador do quadro “Direito Agrário” para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria, colaborador do Portal DireitoAgrario.com. Membro e Coordenador da União Brasileira de Agraristas Universitários (UBAU), Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA). Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. E-mail: [email protected]

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