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Sustentabilidade: tornar uma cidade mais caminhável traz benefícios coletivos e individuais

Cidade com pedestres e bicicletas (Foto: Thinkstock)

Foto: Thinkstock

Dia Mundial Sem Carro, celebrado em 22 de setembro, é sempre uma boa oportunidade para promover outras formas de transporte. Belo Horizonte, por exemplo, aproveitou a data para colocar um ônibus gratuito em circulação –iniciativa do movimento Tarifa Zero. Outras cidades, como Florianópolis e Brasília, receberam ações voltadas ao uso da bicicleta. Mas, para muita gente, ainda falta uma peça importante nesse debate sobre mobilidade urbana. Um movimento crescente, no Brasil e no mundo, quer chamar a atenção para uma opção antiga, simples e efetiva: andar a pé.

Um dos principais defensores dessa ideia é o urbanista Jeff Speck, cujo livro “Cidade Caminhável” foi lançado esse ano no Brasil, pela editora Perspectiva. O trabalho reúne experiências de cidades norte-americanas para mostrar como a presença do pedestre está relacionada à vitalidade dos centros urbanos, estimulando o comércio e dando força a equipamentos culturais.

Ao abordar o tema em uma palestra no TED, Speck se apoiou no exemplo de Portland, em Oregon, que, na década de 1970, foi na contramão do modelo de desenvolvimento urbano que predominava país.

“Enquanto a maioria das cidades norte-americanas estava incentivando uma expansão sem planejamento, Porland instituiu um perímetro de crescimento urbano”, lembra Speck. “Enquanto a maioria ampliava suas estradas, removendo as árvores e os estacionamentos paralelos às calçadas, para facilitar o fluxo de veículos, Portland instituiu um programa de ruas estreitas. E, enquanto a maioria estava investindo em mais estradas e rodovias, eles investiam em bicicletas e caminhadas.”

O resultado? De acordo com Speck, desde 1996 vem sendo observada uma queda na quilometragem diária percorrida por cada cidadão de Portland. Lá, o tempo perdido no trânsito e os gastos com transporte estão abaixo da média no país. Ao mesmo tempo, segundo o urbanista, a cidade está acima da média quando se trata de gastos com lazer. O estilo de vida oferecido em Portland fez com que a cidade se tornasse especialmente atraente para jovens com alto nível educacional. Os censos indicaram um aumento significativo no número de universitários, superior à média nacional. São os representantes da chamada geração Y, que Speck define como “motores de empreendedorismo”.

As medidas em prol da “caminhabilidade” também repercutem nos índices de saúde, defende Speck. Uma cidade projetada para estimular a atividade física de seus habitantes ajuda a combater a obesidade – e os problemas associados a ela, como diabetes. Além disso, a qualidade do ar melhora, já que os carros são grandes responsáveis pela emissão de CO2 na atmosfera. A poluição, como se sabe, está ligada à ocorrência de problemas respiratórios, como asma. Além disso, ao adotar um sistema que privilegie o pedestre, é possível reduzir o número de acidentes de trânsito e das mortes causadas por eles.

Nova Iorque, Washington, Boston, Chicago, San Francisco, Seattle e Portland são, nesta ordem, as cidades mais caminháveis nos EUA, segundo uma pesquisa realizada nesse ano pela organização Smart Growth America. O trabalho constatou que as áreas mais caminháveis são, também, as que reúnem mão de obra mais qualificada e concentram uma renda per capita mais alta.

De olho na demanda desse público por áreas mais caminháveis, novos serviços vêm surgindo. Um deles é o Walk Score, criado em 2007 nos EUA. A ferramenta determina a “caminhabilidade” de uma área a partir da presença de escolas, parques, comércio etc. no entorno. Assim, seus clientes podem levar essa informação em conta ao alugar ou adquirir um imóvel – o serviço está disponível nos Estados Unidos, no Canadá e na Austrália. Já o Walkability App permite que os próprios usuários avaliem uma região a partir de nove parâmetros, como a disponibilidade de faixas de segurança e infraestrutura para pessoas com deficiências físicas. O Walkonomics, por sua vez, indica as melhores rotas para chegar a um endereço a pé – a ferramenta leva em conta até a limpeza do trajeto, a iluminação, a sinalização e a inclinação das vias. Está disponível para cidades como Londres, Washington e Nova York.

O que torna Nova York um bom exemplo de cidade caminhável? Em 2012, uma equipe da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego, de São Paulo) foi até lá para entender como a cidade estimulava o deslocamento a pé. Uma das diferenças apontadas no relatório se refere ao tempo de espera para atravessar a rua: enquanto em Nova York as pessoas aguardam no máximo 50 segundos no sinal, em São Paulo a espera é muito maior, pode chegar a 130 segundos.
Tornar a capital paulista mais amigável para os pedestres é a meta da Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo, criada no ano passado. O grupo reivindica, entre outras coisas, a melhoria na qualidade das calçadas, a redução da velocidade de veículos motorizados e mais vias exclusivas para circulação a pé. Inspirado no Cidadeapé, surgiu neste ano o movimento Caminha Rio.

A pesquisa Como Anda, conduzida pelas ONGs Cidade Ativa e Corrida Amiga, com apoio do Instituto Clima e Sociedade, mapeou 131 organizações brasileiras voltadas à promoção da mobilidade a pé. Essas iniciativas proliferaram especialmente depois de 2013. Um dos ganhos, desde então, foi a criação, em São Paulo, de uma faixa de pedestre em x: inspirada nos modelos de Tóquio, ela permite que as pessoas atravessem um cruzamento numa etapa só, não em duas. Outra novidade foi a faixa exclusiva para pedestres. O projeto piloto, adotado no bairro da Liberdade, em São Paulo, permite que as pessoas caminhem com segurança numa faixa do asfalto quando as calçadas são muito estreitas para o fluxo de gente. Os primeiros passos dessa caminhada já estão sendo dados. Que venham os próximos.

Fonte: Revista Galileu, 22/09/2016

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