sexta-feira , 22 novembro 2024
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Ar de Porto Alegre é duas vezes mais poluído do que aceitável, diz pesquisa

Estudos também revelam perigos para a saúde e custos da poluição. Autoridades dizem que não há solução para o problema a curto prazo.

Hospitais lotados, congestionamentos no trânsito e paradas de ônibus sujas. O que tudo isso tem em comum? A poluição do ar de Porto Alegre. Recentes pesquisas sobre o assunto indicam que o ar da capital gaúcha contém, em média, o dobro de poluentes.

Trata-se de um mal escapamento-carro-diabetesinvisível, que pode causar sérios danos ao organismo humano e que custa cerca de R$ 360 milhões por ano aos cofres públicos. O vilão que ameaça silenciosamente a saúde dos porto-alegrenses tem um nome quase assustador: material particulado.

“Esse poluente, essa partícula, ele vem da queima do combustível, de carros e veículos pesados principalmente, e também é oriunda do atrito do pneu no asfalto, da borracha no asfalto. Então, vem tanto da borracha quanto do pavimento”, explica a professora de Farmacologia e Toxicologia, Claudia Ramos Rhoden.

A pesquisadora faz parte de um grupo da Universidade Federal de Ciências da Saúde Porto Alegre (UFCSPA) que estuda esse tipo de poluição e constatou os perigos que ela representa à saúde.

“Nós expusemos os animais à poluição real da cidade de Porto Alegre. Quando esses animais foram testados, eles apresentavam problemas de memória e de aprendizado e tinham alterações bioquímicas, como o aumento de substâncias tóxicas para o cérebro que são geradas pelo próprio organismo como uma resposta à presença de um agente”, explica.

Segundo Claudia, a poluição do ar trata-se de um mal urbano contra o qual o nosso organismo não está preparado para se defender.

“Essas partículas pequenas não conseguem ser filtradas no nariz ou serem protegidas, o organismo não fica protegido pela via respiratória superior, e elas conseguem chegar no pulmão. Algumas partículas são tão pequenas que conseguem se dispersar ou conseguem circular por todo o organismo atingindo diferentes órgãos”, constata a pesquisadora.

Um outro estudo analisou amostras do ar em seis cidades da Região Metropolitana de Porto Alegre. Em média, o ar da capital é duas vezes mais poluído do que o recomendado pelos padrões internacionais. Mas em alguns momentos do dia esse índice é ainda pior, como nos horários de pico, no início da manhã e no fim da tarde.

Mesmo fora dos horários de maior movimento, os índices de poluição são preocupantes. A reportagem presenciou um teste com um aparelho que mede a quantidade de poeira no ar no meio da tarde e o resultado foi um índice de poluição cinco vezes acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

“Nós fizemos um estudo novo encomendado para ver os níveis de poluentes em paradas de ônibus. Então, se fez medições de material particulado nas paradas. A gente fazia o monitoramento por quase 24 horas em uma parada na Avenida João Pessoa. Teve picos, momentos em que a gente chegou a ter 500 microgramas por metro cubico”, conta Claudia.

“Os danos causados por esse tipo de poluente eles vão além do pulmão. A gente tem alterações cardíacas, alterações ligadas ao sistema nervoso central – e aí se detecta alteração no aprendizado e na memória – alterações relacionadas à fertilidade. Tem uma série de sistemas que são afetados pela exposição à poluição”, alerta a pesquisadora.

Os pesquisadores já sabem também que no inverno a situação é ainda pior porque acontece a chamada inversão térmica, que é quando uma massa de ar polar fica suspensa. Isso impede que os poluentes se dissipem.

E nessa mesma época que os hospitais lotam com pacientes, muitos deles com problemas respiratórios. Um levantamento da Universidade de São Paulo (USP) feito em seis capitais aponta que Porto Alegre gasta, por ano, R$ 360 milhões para o tratamento de doenças causadas pela poluição.

Mas há lugares onde ainda é possível respirar bem na capital gaúcha: Belém novo, na Zona Sul. Esta região, que também abriga outros bairros como Lami e Hípica, é considerada pelos pesquisadores a menos poluída. Ali os moradores vivem como se estivessem em uma cidade de interior, com tranquilidade e ar puro.

Segundo autoridades, não há soluções a curto prazo
O que o poder público tem feito para combater a poluição do ar em Porto Alegre? Segundo as autoridades, não existem políticas sérias sobre o assunto. Uma das alternativas apontadas é investir em transporte público, retirando carros particulares de circulação. Deixar o carro na garagem quando possível é uma das formas que cada um pode contribuir para tornar o ar da capital gaúcha mais respirável.

Das 13 estações de monitoramento da qualidade do ar que existem atualmente em Porto Alegre e Região Metropolitana, só quatro funcionam. O presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), Nilvo Silva, diz que duas serão consertadas, mas admite que não há uma solução a curto prazo para o problema.

“Não existe uma política voltada para a qualidade do ar no Rio Grande do Sul. Existe os limites de qualidade que precisam ser obedecidos, e a Fepam obviamente olha para isso sistematicamente quando faz o licenciamento ambiental”, diz Nilo.

A Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam) tem duas unidades de monitoramento que também não funcionam. Mas mesmo que todas estivessem em operação, o que se faria com dados tão alarmantes? Para o secretário do Meio Ambiente, Cláudio Dilda, esse é um desafio que ainda precisa ser enfrentado pelo poder público.

“O desafio é efetivamente nós cumprirmos o que a legislação já aponta: o veículo tem que sair da fábrica com tal especificação e emitindo tais poluentes, em tais quantidades, e a fiscalização. Ou seja, vai ter que fazer anualmente – ou aquilo que as autoridades competentes no setor acharem mais conveniente ser feito – uma vistoria para manutenção”, opina.

Uma forma encontrada para tentar amenizar o problema foi cobrar dos proprietários de carros poluentes. A Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) da capital já realiza a operação ar puro, que multa quem dirige carro que emite fumaça preta. Entre janeiro e abril deste ano, 272 carros foram multados. Em 2012, foram registradas mais de 1,2 mil infrações deste tipo.

Mas essa fiscalização também pode começar na iniciativa privada. É o caso de uma indústria que fabrica eixos para máquinas agrícolas. A empresa não tem frota de caminhões, mas no local não entra veículo poluidor.

“Todos os fornecedores que possuem veículos a diesel, nós solicitamos o automonitoramento da frota, ou seja, evidências de que eles fazem o controle adequado, que eles monitoram as emissões. E além disso, nós fazemos uma amostragem dos veículos que ingressam na empresa e sempre que é detectado algum tipo de irregularidade, índices acima do que recomenda a legislação, nós solicitamos um plano de ação para que aquele fornecedor faça a regularização”, explica a engenheira Sheila de Castro.

Para a pesquisadora da UFCSPA, a melhor solução é algo que parecer ainda estar longe de acontecer: um número menor de veículos nas ruas.

“A gente poderia começar a pensar na melhoria do transporte coletivo, na qualidade do combustível desses veículos, na qualidade do motor desses veículos, em função de quanto está queimando realmente de combustível, e na qualidade também não só do veículo em si, mas também da pavimentação”, opina Claudia.

Não ficar muito tempo exposto à poluição, não fazer exercícios físicos perto de grandes avenidas, deixar o carro em casa quando possível. Essas são algumas dicas de como é possível se proteger do ar poluído e evitar que ele se torne ainda pior. Se, por enquanto, ainda não há solução definitiva para o problema, ao menos todos podem contribuir para amenizá-lo.

Fonte: G1

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