por Maurício Fernandes*.
O Projeto de Lei n. 5067/2016, de autoria do Senador Mineiro Antônio Anastasia, busca alterar a Lei n. 9.605/98 para que, no caso de desastre ambiental, o valor da sanção de multa aplicada ao responsável seja aplicada na região afetada, com a finalidade de recuperação ambiental e o ressarcimento, aos cofres públicos municipais, no caso de perda de arrecadação.
O contexto é claro no sentido de destinar recursos da multa ambiental para a Prefeitura Municipal de Mariana, que teve perdas severas de arrecadação. Além disso, ao destinar recursos da multa ambiental para recuperação, inverte-se a lógica de que cabe ao gerador do dano ambiental proceder a reparação de seus atos (princípio do poluidor pagador e princípio da responsabilização).
Vincular a receita da multa administrativa (punição) para reparação é adentrar no âmbito do direito civil ambiental, cuja reparação é condição inafastável em qualquer hipótese. Tanto é assim que o direito ambiental brasileiro reconhece a responsabilidade objetiva e solidária na responsabilidade civil ambiental, bem como a teoria do risco integral. Na esfera administrativa, ao contrário, a responsabilidade é subjetiva e não prescinde da conduta lesiva, bem assim as multas podem levar anos para serem executadas através de morosos processos de execução fiscal. Aliás, sobre o tema cabe lembrar Pedro de Menezes Niebuhr (Processo Administrativo Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 268 e 305), para quem o processo administrativo fiscalizatório não tem como finalidade aplicar uma sanção ao administrado, mas sim apurar a efetiva ocorrência de uma conduta em tese capaz de caracterizar ilícito administrativo. Além disso, ao adotar-se a sanção pecuniária como regra, o poder público pode estar induzindo a uma mercantilização das infrações administrativas ambientais, onde estaria se precificando as infrações.
O Direito Ambiental e o Processual já proporcionam condições para exigir a reparação imediata, através de tutela de urgência, bem como já permite que o Fundo Nacional do Meio Ambiente invista na reparação, caso necessário, como, por exemplo, em áreas órfãs.
Tem-se que a iniciativa, que na primeira leitura parece razoável, levará os órgãos ambientais a adotarem medidas ainda mais arrecadatórias, com o afastamento do mais importante instrumento já existente para resolver essas situações, que é o Termo de Compromisso de Ajustamento, e, também transferirá para o Poder Público e para sociedade a responsabilidade pela reparação dos danos causados.
*Maurício Fernandes é Professor de Direito Ambiental, Consultor Jurídico em matéria ambiental, Advogado do Escritório Maurício Fernandes Advocacia Ambiental (www.mauriciofernandes.adv.br).
Sobre o Projeto de Lei
“A Câmara dos Deputados analisa projeto do Senado (PL 5067/16) que altera a Lei de Crimes Ambientais [e Sanções Administrativas Ambientais](Lei 9.605/98) para determinar que, em situação de desastre, a multa por infração ambiental seja revertida para recuperar a região afetada.
O texto também altera a Lei do Fundo Nacional do Meio Ambiente (Lei 7.797/89) para incluir entre as aplicações prioritárias do fundo a recuperação de áreas degradadas por desastres ambientais.
Autor da proposta, o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) sustenta que a ideia do projeto surgiu após a tragédia de Mariana (MG), em 2015, quando o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco despejou milhões de metros cúbicos de lama no curso do Rio Doce, causando a morte de 19 pessoas. A primeira condenação obriga a Samarco a pagar R$ 1,2 bilhão para medidas reparatórias.
Pelo projeto, os recursos da multa aplicada por infração ambiental devem ser destinados a ações de resposta e de reconstrução da área afetada, independentemente da obrigação do infrator de reparar os danos causados.
Caso a multa seja aplicada por órgão ou entidade federal, a destinação dos recursos dependerá do reconhecimento de situação de emergência ou de estado de calamidade pública pelo executivo federal.
O texto prevê ainda a criação de um plano de trabalho que deve ser elaborado com a participação de estados, municípios e de representantes da sociedade civil das áreas atingidas.
Por fim, caso o desastre ambiental cause queda na arrecadação do município, parte do dinheiro deverá ser direcionado para garantir, além da recuperação do meio ambiente, a manutenção dos serviços públicos nas localidades danificadas.
Tramitação
O projeto será analisado pelas comissões de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Depois, seguirá para o Plenário”.
Fonte: Agência Câmara Notícias, 10/02/2017 (Reportagem – Murilo Souza/Edição – Marcia Becker).
Conheça a íntegra do projeto:
Projeto de Lei nº 5067/2016