“O proprietário de um terreno não pode ser autuado por infração ambiental quando a obra for realizada pelo Poder Público. Sob esse entendimento, o Tribunal Regional da 4ª Região (TRF4) decidiu, na última semana, manter a anulação de uma multa imposta pelo Ibama a um morador de Brusque (SC), que teve obras públicas realizadas dentro de sua propriedade.
Em 2005, a prefeitura decidiu, em atendimento a uma reivindicação da população, abrir uma estrada dentro da propriedade privada. A construção da via exigiu a terraplanagem de uma área de 15.000 m² e ainda a canalização de um rio.
Como a área era de preservação permanente, e a construção foi feita sem licença ambiental, o Ibama multou o dono do terreno. Conforme justificativa do instituto, o costume é sempre autuar o proprietário, mesmo que os procedimentos sejam decorrentes de atuação do Poder Público.
Ele ingressou com a ação após ser incluído em cadastro de dívida ativa. Além da anulação do auto de infração, o autor também requereu indenização por dano moral.
A Justiça aceitou os pedidos e condenou o Ibama a pagar indenização no valor de R$ 10 mil ao autor. O órgão recorreu ao tribunal.
Na 3ª Turma do TRF4, o relator do caso, desembargador federal Fernando Quadros da Silva, manteve o posicionamento de primeiro grau. ‘No caso, verifica-se que o autor não deu causa ao dano ambiental, não podendo ser responsabilizado pelas obras de infraestrutura realizadas pelo município de Brusque, tendo sido erroneamente autuado, por agentes que não foram diligentes, e tido o seu nome indevidamente registrado no Cadin, levado a protesto e inscrito no Serasa. O que, como bem observado pela magistrada de origem, certamente lhe trouxe consequências que transcendem o mero dissabor cotidiano. Assim, excepcionalmente, e considerando-se as particularidades do caso concreto, tenho que deva ser mantida a condenação do Ibama’, concluiu o magistrado em seu voto”.
Fonte: TRF4, 09/03/2016.
Confira a íntegra da decisão:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002166-97.2013.4.04.7215/SC
RELATOR
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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APELANTE
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA
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APELADO
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HERMES MORSCH
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ADVOGADO
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MILENY TRUPPEL MERICO
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MPF
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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EMENTA
ADMINISTRATIVO. ABERTURA DE LOGRADOURO. OBRAS DE INFRAESTRUTURA E SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO. RESPONSABILIDADE. AUTO DE INFRAÇÃO. PROTESTO DE TÍTULO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
1. Inexistente o nexo de causalidade, ou seja, o liame entre a conduta do autuado e o dano ao meio ambiente decorrente de obras de infraestrutura de abertura de logradouro realizadas pelo ente municipal, não há que falar em responsabilidade civil ou administrativa do particular, a ensejar a lavratura de auto de infração.
2. Mantida a sentença que anulou o referido auto, declarou nula a respectiva CDA e cancelou em definitivo o registro do protesto do título, condenando o IBAMA ao pagamento de indenização a título de danos morais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de março de 2016.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
RELATÓRIO
HERMES MORSCH ajuizou ação anulatória de débito fiscal, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, requerendo a desconstituição de certidão de dívida ativa, originada a partir de auto de infração lavrado em razão da prática de terraplanagem em uma grande área, com canalização de um corpo hídrico, sem autorização do órgão ambiental competente. Alega que não seria o responsável pelo cometimento da infração ambiental que lhe fora imputada, razão pela qual pretende indenização por danos morais.
O pedido de antecipação de tutela foi deferido (evento 6 – DECLIM1).
O Juízo a quo, confirmando a antecipação de tutela, julgou procedentes os pedidos, extinguindo o processo com resolução do mérito (CPC, art. 269, inc. I), para anular o auto de infração e a CDA por este originada, cancelando em definitivo o registro do protesto de título. Fundamentou no sentido de que, pelo conjunto probatório, restou demonstrada a ausência de responsabilidade civil do autor pelo dano perpetrado, sendo que ele foi absolvido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina no âmbito da AC n. 2010.024303-4, tendo em vista a total ausência de provas pelo crime previsto no art. 38 da Lei n. 9.605/1998. Condenou o IBAMA ao pagamento de indenização ao autor, a título de danos morais, em R$10.000,00 (dez mil reais), atualizados monetariamente pelo IPCA-E, a partir da sentença (STJ, Súmula 362), acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, de 02/2005 (STJ, Súmula 54) a partir de 06/2009 e, a partir de 07/2009, dos juros aplicados à caderneta de poupança (Lei n. 9.494/97, art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/09). Condenou a autarquia, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, o que faço com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC. Sem custas (Lei n. 9.289/96, art. 4º, inc. I e II) (evento 126 – SENT1).
Apelou o IBAMA, sustentando a legalidade do ato administrativo, ante a higidez do auto de infração e da respectiva CDA, razão pela qual deve ser reativada a publicidade do protesto do título, bem como deve ser afastada a condenação da autarquia ao pagamento de indenização por danos morais (evento 138 – RAZAPELA1).
Com as contrarrazões e o parecer do representante do MPF junto a este Tribunal, Procurador Regional da República Fábio Bento Alves, opinando pelo desprovimento da apelação (evento 4 – PARECER1), vieram os autos.
É o relatório.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8119895v5e, se solicitado, do código CRC F253E7A7. |
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03/03/2016 11:50:19 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002166-97.2013.4.04.7215/SC
RELATOR
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA
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MILENY TRUPPEL MERICO
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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VOTO
A questão controvertida nos autos refere-se à intervenção em bem declarado de utilidade pública, logradouro no Município de Brusque/SC, onde foram realizadas obras de infraestrutura, como redes de água e esgoto e iluminação pública, dentre outras, a fim de transformá-la, como referido, em ‘verdadeira via pública urbana’ (E1, AUTO7, p. 7-11).
Entendeu a magistrada de origem que, pelo conjunto probatório carreado aos autos, o autor foi autuado pelo IBAMA sem ter praticado a infração ambiental, mas tão-somente por ser o proprietário da área degradada, o que leva à nulidade do auto de infração correspondente.
O IBAMA, nas razões do recurso, alega que o autor, em seu depoimento pessoal admitiu ter autorizado a entrada de máquinas pertencentes ao Município de Brusque no seu imóvel para realizar a terraplanagem, sem haver, contudo, qualquer autorização ambiental. Por essa razão, afirma ser o autor, ora apelado, responsável pelo dano ambiental causado, sustentando que a inscrição foi legítima, motivo pelo qual não há dano a ser indenizado.
Contudo, razão não lhe assiste. Isso porque, conforme bem enfatizado na sentença, o autor, no seu depoimento pessoal, apenas confirmou que não se opôs à abertura da via pública, tendo ratificado as alegações da inicial no sentido de que as obras de terraplanagem do terreno e de retirada da cobertura vegetal teriam sido realizadas pela Prefeitura de Brusque.
De fato, não merece reparos a sentença recorrida, cujo trecho transcrevo, adotando os seus fundamentos como razões de decidir:
2. Fundamentação
2.1. Da (in)exigibilidade do débito
Segundo preceitua o caput do art. 225 da Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB, o meio ambiente é ‘bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida’ e deve ser preservado ‘para as presentes e futuras gerações.’ Por se tratar de bem jurídico de natureza difusa, merece a proteção de todos, indistintamente, cabendo ao Poder Público, por seus órgãos específicos, a vigilância e a fiscalização das atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos naturais.
A seu turno, a Lei n. 6.938/81, que dispôs sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, estabeleceu que, sem prejuízo das sanções cabíveis, ‘é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade’ (art. 14, § 1º).
No exame do caso concreto, constato que o autor foi autuado, em 09.02.2005, em razão de ter efetuado ‘terraplenagem em uma área de 15.000m2 (quinze mil metros) quadrados com canalização de um corpo hídrico numa extenção de 150 (cento e cinquenta) metros, sem autorização do órgão ambiental competente’ [sic], nos termos do AI n. 350.421/D (E1, AUTO7), na forma dos arts. 38 e 70 da Lei n. 9.605/98, dos arts. 2º, inc. II e VII, e 25, ambos do Decreto n. 3.179/99, e do art. 2º, al. ‘a’, ‘1’, da Lei n. 4.771/65, cuja redação, vigente à época dos fatos, é a que segue:
Lei n. 9.605/98:
Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.
Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.
§ 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu poder de polícia.
§ 3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade.
§ 4º As infrações ambientais são apuradas em processo administrativo próprio, assegurado o direito de ampla defesa e o contraditório, observadas as disposições desta Lei.
Decreto n. 3.179/99:
Art. 2º As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções:
[…]
II – multa simples;
[…]
VII – embargo de obra ou atividade;
[…]
Art. 25. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Multa de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) a R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), por hectare ou fração.
Lei n. 4.771/65:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d’água, em faixa marginal cuja largura mínima será:
1 – de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura:
[…]
Analisando os documentos juntados aos autos, constato que, por meio da Lei Municipal n. 2.406/00, publicada em 19.04.2000, a via de circulação que passa pela propriedade do autor foi denominada ‘Rua Evelina Morsch’, cuja extensão foi definida em 1.777,30 metros, e largura fixada em 4,00 metros (E1, AUTO7, p. 6).
Posteriormente, em 28.11.2003, a população que seria beneficiada com a implantação do indigitado logradouro solicitou ao então Prefeito Municipal, por meio de abaixo-assinado, a adoção das providências necessárias à implantação das obras de infraestrutura básica no local, como redes de água e esgoto e iluminação pública, dentre outras, a fim de transformá-la em ‘verdadeira via pública urbana’ (E1, AUTO7, p. 7-11).
Em 18.04.2005, o então Presidente da Câmara Municipal de Brusque encaminhou ao Sr. Prefeito Municipal o Ofício n. 330/2005, por meio do qual postulou a realização de obras e serviços de interesse coletivo, dentre eles a continuidade das obras de abertura do logradouro denominado Rua Evelina Morsch (E1, OUT10, p. 7).
Além disso, por meio do Decreto n. 6.602/11, o Chefe do Poder Executivo Municipal declarou de utilidade pública ‘as obras necessárias à retificação e alargamento do leito da Rua Evelina Morsch, denominada por meio da Lei Ordinária Municipal nº 2.406, de 19 de abril de 2000.’ Estabeleceu, ainda, que as obras em questão ‘destinam-se à adequação da referida via pública ao sistema viário municipal, bem como, sua preparação para futura via de ligação entre os municípios de Brusque e Guabiruba.’ (E1, OUT11, p. 6).
Na sequência, em 19.09.11, o Sr. Prefeito Municipal solicitou ao Superintendente Substituto do IBAMA o levantamento do embargo da área, a fim de dar prosseguimento na realização dos serviços de melhoria da infraestrutura da referida via pública (E1, OUT11, p. 8), reiterando expediente encaminhado à mesma Autoridade administrativa em 09.02.2011 (E1, OUT11, p. 9).
Em seu depoimento pessoal, o autor ratificou as alegações tecidas na petição inicial no sentido de que as obras de terraplanagem do terreno e de retirada da cobertura vegetal teriam sido realizadas pela Prefeitura de Brusque. Referiu teria deixado de pagar a multa que lhe foi imposta pelo IBAMA para não confessar um crime que não havia cometido. Questionado pelo Procurador do réu, aduziu que, apesar de não ter sido indenizado pela ‘invasão’ da área litigiosa pelo Município de Brusque, não se opôs à abertura da via pública porque o logradouro, dotado de infraestrutura, beneficiaria a todas as pessoas que residem e/ou trafegam pelo local, visto se tratar de ligação entre os Municípios de Brusque e Guabiruba. Informou, ainda, não teria postulado – administrativa ou judicialmente – qualquer indenização junto ao Poder Público Municipal em razão de perda de parcela de seu terreno para a abertura do logradouro em questão (E70, AUDIO_MP32).
Por sua vez, a testemunha arrolada pelo IBAMA relatou que, apesar de não se recordar plenamente dos fatos, em razão do tempo transcorrido desde então, lembra que eram máquinas da Prefeitura (de Brusque) que estavam trabalhando na (re)abertura da rua, sem autorização do órgão ambiental competente. Questionado sobre as razões que o levaram a autuar o autor, e não o Poder Público Municipal, referiu que ‘o costume nosso sempre é autuar o proprietário do imóvel’. Disse, também, não se recordar se foi ‘o autor ou os operadores das máquinas’ que teriam afirmado que as obras estariam sendo realizadas pelo Município. Informou que o relatório de vistoria, de praxe, era encaminhado ao Ministério Público e que o Termo de Embargo era lavrado quando se tratava de área de preservação permanente (E118, VIDEO1).
Registro, ainda, que o autor foi absolvido pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina no âmbito da AC n. 2010.024303-4, ‘tendo em vista a total ausência de provas de que foi o apelante o autor do crime previsto no art. 38 da Lei n. 9.605/98’, na forma do art. 386, inc. V, do Código de Processo Penal – CPP, a qual não faz coisa julgada na esfera cível, consoante prescreve o art. 935 do Código Civil, a contrario sensu: ‘A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.’
Todavia, o exame detalhado do conteúdo probatório carreado aos autos leva à conclusão de que o autor foi autuado pelo IBAMA não por ter praticado a infração ambiental, mas tão-somente por ser o proprietário da área degradada, o que leva à nulidade do auto correspondente.
A propósito, registro que ‘embora o ordenamento jurídico brasileiro tenha adotado a responsabilização objetiva do proprietário do imóvel por danos ambientais – sendo desnecessária a análise de existência de culpa ou dolo -, não pode ser afastada a necessidade de comprovação da existência de nexo causal entre sua conduta (ação ou omissão) e o dano’ (TRF4, AC 5002181-03.2012.404.7215, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 21/08/2013). No mesmo sentido, consigno que é ‘imprescindível a comprovação da responsabilidade do autor em provocar incêndio, com fundadas prova da autoria da conduta ilícita. Ausentes os fundamentos da responsabilização, não remanesce a possibilidade de figurar o autor como responsável pela prática de infração administrativa’ (TRF4, AC 5001528-68.2011.404.7204, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 12/07/2013).
Nesse contexto, o pedido de anulação do auto de infração n. 350.421/D, lavrado em 07.02.2005, é procedente. Em consequência, também procede o pedido no que tange à nulidade da CDA n. 26777, inscrita no âmbito do PAF n. 02026.006220/2005-05, e do protesto correspondente.
2.2. Do pedido de indenização
Em regras gerais, ‘aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito’ (CC, art. 186). Além disso, ‘também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes’ (CC, art. 187).
A obrigação de indenizar, a seu turno, decorre da prática do ato ilícito: ‘Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.’ (CC, art. 927, caput). Esses, pois, são os fundamentos da teoria clássica da responsabilidade civil, que tem a culpa como pressuposto do dever de indenizar. Ausente a prova da culpa, a indenização é indevida. Assim, compete à vítima provar a existência dodano, o nexo de causalidade e a culpa do agente.
Por outro lado, em se tratando de certas pessoas e determinadas situações, o dever legal de reparar os prejuízos subsiste independentemente de culpa, bastando, para tanto, que a vítima comprove o dano e o nexo de causalidade. É a chamada responsabilidade objetiva, que tem como fundamento o preceito contido no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: ‘Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.’
A CRFB, por sua vez, estabeleceu que ‘as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa’ (art. 37, § 6º).
Segundo Yussef Said Cahali (Responsabilidade Civil do Estado. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 485.), uma vez que a CF/88 teria ‘adotado a teoria da responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas indicadas em seu art. 37, § 6º, a que bastaria o nexo de causalidade entre o dano e a ação ou omissão do ente público ou privado prestador de serviço público, mostra-se, em princípio, despicienda qualquer averiguação do dolo ou da culpa por parte de seus agentes, por desnecessária a sua prova.’
Por sua vez, dano moral é o que atinge bens incorpóreos, tais como a imagem, a honra, a privacidade ou a autoestima. Caracteriza-se pelo sentimento de desconforto, pela dor, pelo constrangimento, pela humilhação ou demais sentimentos correlatos. Segundo Antonio Jeová Santos (Dano moral indenizável. 4. ed. São Paulo: RT, 2003, p. 94-95), ‘o que configura o dano moral é aquela alteração no bem-estar psicofísico do indivíduo. Se do ato de outra pessoa resultar alteração desfavorável, aquela dor profunda que causa modificações no estado anímico, aí está o início da busca do dano moral.’ Por conta de tais características, a jurisprudência pátria assentou-se no sentido de que a ocorrência do dano moral é presumida, o que dispensa a prova efetiva de sua existência, consoante, aliás, estabelece a Súmula n. 388 do STJ (‘A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano moral.’).
A seu turno, a respectiva indenização deve ser fixada segundo o princípio da razoabilidade, levando-se em conta o grau de intensidade do sofrimento da vítima, a posição social do ofendido, a condição econômica do ofensor, a intensidade do ânimo em ofender e a repercussão da ofensa. Em suma, o valor da indenização não pode ser reduzido a ponto de se tornar insignificante – o que esvaziaria sua natureza reparatória – nem pode consistir em valor expressivo, de modo a se tornar fonte de enriquecimento injustificado da vítima.
No caso concreto, o autor teve seu nome indevidamente registrado no CADIN, levado a protesto e inscrito no SERASA, o que lhe trouxe conseqüências que transcendem o mero dissabor cotidiano, razão pela qual arbitro a indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), sobre os quais devem incidir, até 06/2009, juros moratórios, à razão de 1% (um por cento) ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil, a contar de 02/2005, por força do disposto na Súmula n. 54 do STJ (‘Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.’); a partir de 07/2009, são devidos os juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/09.
A correção monetária, por sua vez, deve incidir pelo IPCA-E, tendo em conta que ‘o STF, ao julgar a ADI 4357/DFD, declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/09, afastando a aplicação da TR como índice de correção monetária’ (TRF4, AC 5006672-77.2012.404.7110, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 11/04/2014), a partir desta data, nos termos da Súmula n. 362 do STJ (‘A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.’).
Por fim, sendo suficiente a análise dos pontos abordados para o deslinde da controvérsia, torna-se desnecessária a apreciação dos demais argumentos trazidos pelas partes, pois, segundo o STJ, ‘o julgador, no exame das lides que lhe são submetidas, não está obrigado a responder questionários jurídicos elaborados pelas partes e nem a discorrer sobre todos os dispositivos legais por elas invocados. É de sua obrigação, ao examinar os contornos da lide controvertida, apresentar os fundamentos fáticos e jurídicos em que apoia suas convicções para decidir’ (AgRg no AREsp 180.224/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 23/10/2012). Para o STF, ‘o juiz, para atender à exigência de fundamentação do art. 93, IX, da CF, não está obrigado a responder a todas as alegações suscitadas pelas partes, mas tão-somente àquelas que julgar necessárias para fundamentar sua decisão’ (AI 417161 AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 21.03.2003).
3. Dispositivo
Ante todo o exposto, CONFIRMO a antecipação de tutela, resolvo o mérito da lide (CPC, art. 269, inc. I) e JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, nos termos da fundamentação, para:
I) ANULAR o Auto de Infração – AI n. 350.421/D, lavrado em 07.02.2005;
II) DECLARAR nula a Certidão de Dívida Ativa – CDA n. 26777, inscrita no âmbito do Processo Administrativo Fiscal – PAF n. 02026.006220/2005-05;
III) CANCELAR em definitivo o registro do protesto do título n. 2677601, espécie CDA, no valor de R$ 12.259,23 (doze mil duzentos e cinquenta e nove reais e vinte e três centavos), vencimento à vista, apontado no 1º Tabelionato de Notas e Protesto de Brusque/SC sob n. 114073/2013 e lavrado em 25.06.2013, na forma do caput e § 3º do art. 26 da Lei n. 9.492/97; e
IV) CONDENAR o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA a pagar indenização à parte autora, a título de danos morais, no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), atualizado monetariamente pelo IPCA-E, a partir desta data (STJ, Súmula 362), acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, de 02/2005 (STJ, Súmula 54) a 06/2009 e, a partir de 07/2009, dos juros aplicados à caderneta de poupança (Lei n. 9.494/97, art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/09).
Condeno o IBAMA, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, o que faço com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC.
Partes isentas do pagamento de custas (Lei n. 9.289/96, art. 4º, inc. I e II).
Sem reexame necessário (CPC, art. 475, § 2º).
Registrada eletronicamente. Publique-se e intimem-se (evento 126 – SET1).
De fato, inexistente o nexo de causalidade no caso em tela, ou seja, o liame entre a conduta do autuado e o dano ao meio ambiente decorrente das obras de infraestrutura da abertura do logradouro, não há que falar em responsabilidade civil ou administrativa, a ensejar o auto de infração lavrado, razão pela qual andou bem a sentença ao anular o referido auto, declarar nula a respectiva CDA e cancelar em definitivo o registro do protesto do título.
Por outro lado, verificado o dano moral decorrente do protesto indevido do título, há o dever de indenizar.
No caso em tela, verifica-se que o autor não deu causa ao dano ambiental, não podendo ser responsabilizado pelas obras de infraestrutura realizadas pelo Município de Brusque/SC, tendo sido erroneamente autuado por agentes que não foram diligentes, e tido o seu nome indevidamente registrado no CADIN, levado a protesto e inscrito no SERASA, o que, como bem observado pela magistrada de origem, certamente lhe trouxe consequências que transcendem o mero dissabor cotidiano.
Assim, excepcionalmente, e considerando-se as particularidades do caso concreto, tenho que deva ser mantida a condenação do IBAMA ao pagamento de indenização a título de danos morais, tal como determinado pela sentença, corretos os valores fixados, porque seguiram os critérios da proporcionalidade e razoabilidade.
Assim, deve ser mantida a sentença, por seus próprios fundamentos.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8119896v9e, se solicitado, do código CRC 5F350AF9. |
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581DE44528A71A2D |
Data e Hora: |
03/03/2016 11:50:20 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 02/03/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002166-97.2013.4.04.7215/SC
ORIGEM: SC 50021669720134047215
RELATOR
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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PRESIDENTE
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Marga Inge Barth Tessler
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PROCURADOR
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Dr(a)Juarez Mercante
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APELANTE
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA
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APELADO
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HERMES MORSCH
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ADVOGADO
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MILENY TRUPPEL MERICO
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MPF
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02/03/2016, na seqüência 68, disponibilizada no DE de 19/02/2016, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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VOTANTE(S)
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Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
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Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
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José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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José Oli Ferraz Oliveira |
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02/03/2016 18:52 |