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Justiça anula processo administrativo e condena órgão ambiental em dano moral

A 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul julgou improcedente recurso de apelação interposto pelo órgão ambiental estadual (Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler – FEPAM), mantendo a sentença que anulou processo administrativo ambiental e condenou-lhe ao pagamento de danos morais em favor da empresa Olle & Cia LTDA.

No presente caso, a empresa havia sido autuada pela FEPAM pela prática de atividade potencialmente poluidora (Comércio Varejista de Combustíveis e Serviços) sem licença ambiental e por descumprimentos de exigências estabelecidas em sua licença de operação, tendo apresentado impugnação à multa aplicada pelo órgão ambiental após realizadas as adequações técnicas.

No entanto, a FEPAM inscreveu a empresa em dívida ativa e protestando a multa sem ter analisado recurso tempestivamente apresentado no âmbito do processo administrativo, o que gerou o reconhecimento pelo Judiciário da nulidade do procedimento administrativo instaurado em face da empresa autuada que culminou com a aplicação da multa, a partir da apresentação do recurso administrativo apresentado.

E, por conta da ilegalidade da inscrição indevida da dívida e seu protesto, o Judiciário reconheceu que a conduta da FEPAM gerou dano moral à empresa autuada.

Atuou na defesa da empresa Olle & Cia LTDA o advogado Rodrigo Puente (OAB/RS nº 87.260).

Direito Ambiental

Confira a íntegra da decisão:

 

Apelação Cível

 

Vigésima Primeira Câmara Cível
Nº 70075258871 (Nº CNJ: 0290002-32.2017.8.21.7000)

 

Comarca de Porto Alegre
FUNDACAO ESTADUAL DE PROTECAO AMBIENTAL HENRIQUE LUIZ ROESSLER – F

 

APELANTE
OLLE & CIA LTDA

 

APELADO

RELATÓRIO

Des. Marcelo Bandeira Pereira (RELATOR)

Adoto o relatório do parecer do Ministério Público às fls. 444v-445:

“Trata-se de recurso de apelação interposto pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler, inconformado com a respeitável sentença de fls. 415-423v., a qual, nos autos da ação anulatória cumulada com indenização por danos imateriais com pedido de tutela de urgência ajuizada por Olle & Cia LTDA. contra a apelante, foi proferida nos seguintes termos: Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos deduzidos para: a) conceder tutela de urgência para determinar a suspensão da exigibilidade do débito decorrente do Auto de Infração nº2421/82014; b) declarar a nulidade do processo administrativo nº 13153-0567/14-4 a partir dos atos que se sucederam ao protocolo do recurso de fls. 139/155 e c)- condenar a demandada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). O valor deverá ser corrigidos pelo IGP-M a partir dessa data (Súmula nº 362 do STJ), acrescidos de juros moratórios de 12% ao ano a contar da citação. Condeno a requerente ao pagamento de 30% das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da demandada que fixo em 10% do valor da condenação. Condeno a FEPAM ao pagamento do restante das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da autora que fixo em 20% do valor da condenação, nos termos do art. 85, §3º, I do CPC.

A FEPAM, em razões de apelo de fls. 425-434, de início, empreende suma dos fatos. Atenta para a presunção de legitimidade e de legalidade dos atos administrativos praticados por ela praticados. Alega ser incontroverso que o autor vinha operando sem licença ambiental do órgão competente, quando da autuação, pois a renovação da licença foi posterior ao vencimento. Compreende que o autor vinha descumprindo as condicionantes e as exigências dispostas na Licença de Operação, tais como delimitadas na descrição da conduta expressa no instrumento de autuação. Diz que foram propiciados, em todas as fases procedimentais, os direitos ao contraditório e à ampla defesa. Assevera que o autor não fez uso das impugnações e recursos administrativos que lhe foram propiciados.  Refere que o autor tomou conhecimento da infração em 13/01/2015 e se manteve silente. Explica que o autor não apresentou protocolo de defesa e, tampouco, pagou a multa simples que lhe foi imposta. Manifesta, não obstante, que a empresa recorrida comprovou o atendimento das exigências constantes do anexo I do instrumento de autuação. Destaca que o autor protocolou, na FEPAM, o 4º Relatório de Operação do Sistema de remediação, nos termos exigidos pelo instrumento de autuação, com o fito de renovar a licença ambiental e a reduzir os compostos químicos de interesse (remediação da área contaminada). Alega que os procedimentos administrativos são válidos e legais, devendo ser mantidos na íntegra. Explica que a FEPAM agiu conforme os princípios da prevenção e da precaução, objetivando minimizar ou mitigar possíveis riscos de dano ao meio ambiente. Salienta, ainda, que os atos administrativos praticados pela FEPAM observaram questões técnicas e legais, atendendo à tutela ambiental. A seguir, defende ser possível reconhecer que o processo administrativo seja considerado nulo, a partir dos atos que sucederam ao protocolo do recurso, mas não concorda com a concessão de indenização por danos morais, diante da total inércia da parte autora de empreender regularização das questões ambientais. Observa que a parte autora teve, em vários momentos, oportunidades e modos de cumprir sua responsabilidade (e exemplo disso é o fato de que cumpriu as condicionantes e exigências da licença ambiental). Refere que a parte autora, ora apelada, teve ciência e conhecimento – inclusive com retirada de cópias pelo procurador habilitado – da notificação de cobrança do crédito perante o Fundo Estadual de Meio Ambiente, mas preferiu permanecer inerte. Afirma que a empresa autora teve ciência da necessidade de pagamento em data de 08/06/2015, mantendo-se inerte. Frisa que, embora tenha recorrido da decisão administrativa devidamente motivada, recebeu notificação para pagamento e, outra vez, nada fez. Grifa que, mesmo alegando prejuízo moral em razão da inscrição em dívida ativa, propôs a demanda anulatória somente após um ano da inscrição em dívida ativa. Colaciona julgados do TJRS. Refere que situação apresentada não configura dano moral. Destaca que houve inúmeras oportunidades de cancelar ou pagar o valor devido em via administrativa e mesmo judicial. Pugna pelo provimento do recurso para que seja reconhecida a improcedência do pedido no que toca ao dano moral. 

Foram apresentadas contrarrazões ao recurso, fls. 436-440. 

Vieram os autos com vista a este Órgão do Ministério Público.”

Com vista dos autos, a Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

VOTOS

Des. Marcelo Bandeira Pereira (RELATOR)

Desde logo adianto o desprovimento do apelo.

Historio que a empresa apelada (Ollé & Cia Ltda.) foi autuada pela FEPAM pela prática de atividade potencialmente poluidora (Comércio Varejista de Combustíveis e Serviços) sem licença ambiental, uma vez que sua licença de operação expirou em agosto de 2013, tendo a renovação sido solicitada apenas em setembro de 2013, portanto após decorrido o prazo da licença anterior, já que somente teria direito à prorrogação automática, caso protocolado o pedido 120 dias antes de expirado o prazo (artigo 18, §4º, da Resolução nº 237/1997 do CONAMA).

Além disso, a autuação indicou o descumprimento de exigências estabelecidas na Licença de Operação nº 6651/2012-DL, em relação à operação do sistema de remediação, já que apresentava concentrações acima dos valores orientadores, e ausência de apresentação de análise da caixa separadora referente ao segundo semestre de 2013. Em razão das infrações acima narradas houve a aplicação de multa de R$ 5.615,00, além de fixação do prazo de 30 dias para o cumprimento das obrigações fixadas, sob pena de suspensão parcial das atividades de comércio varejista de combustíveis (fl. 47).

Tais fatos são incontroversos, não havendo razão para maiores digressões, já que a própria apelada realizou as adequações técnicas necessárias, vindo a impugnar a autuação visando à anulação da multa aplicada que foi inscrita em dívida ativa e protestada, gerando-lhe prejuízo na realização de suas atividades comerciais.

E, neste ponto, questão destacada na apelação, nada há a reparar na sentença que declarou a nulidade do processo administrativo a partir dos atos que se sucederam ao protocolo do recurso administrativo (fls. 139-155), suspendendo a exigibilidade do débito decorrente do Auto de Infração nº 2421/2014.

Efetivamente, o processo administrativo, embora desde o início tenha transcorrido com lisura e respeito às regras garantidoras do contraditório e da ampla defesa, após a decisão que julgou procedente o auto de infração e confirmou a aplicação da multa, com intimação da empresa autuada e apresentação de recurso administrativo desta decisão, padece de nulidade, uma vez que, sem apreciação e julgamento da insurgência, tornou definitiva a multa e a inscreveu em dívida ativa com encaminhamento a protesto (fls. 162, 164 e 43).

O fato de a empresa não ter apresentado defesa inicialmente no processo administrativo não a impedia de apresentar recurso administrativo após a definitivação da penalidade, como efetivamente o fez, em tempo oportuno, nos termos do artigo 118, inciso II, da Lei nº 11.520/2000 – Código Estadual do Meio Ambiente e artigo 10 da Resolução nº 006/1999 do CONSEMA.

Assim, padece de nulidade o procedimento administrativo instaurado em face da apelada que culminou com a aplicação da multa, a partir da apresentação do recurso administrativo apresentado.

Saliento que tal nulidade, porque reconhecida a partir da apresentação do recurso, não invalida a aplicação da penalidade, entretanto, suspende sua exigibilidade, conforme disposto no artigo 12 da Resolução supracitada.

E justamente em razão da suspensão da exigibilidade da penalidade pecuniária é que se mostrou ilegal a inscrição do crédito, então suspenso, em dívida ativa e, mais ainda, a indicação indevida da dívida a protesto, circunstâncias que acabaram por gerar os danos morais alegados, já que se trata de empresa atuante no comércio local, cujo crédito e idoneidade (bom nome e imagem) são elementos indispensáveis à manutenção regular de suas atividades.

Neste ponto, porque bem elucidativo, transcrevo parte da sentença da Dra. Nadja Mara Zanella, no que toca à fixação da indenização pelo dano moral sofrido (fls. 422-423):

“(…) Não há dúvida de que o protesto foi indevido, já que realizado enquanto pendente o recurso administrativo interposto pela parte autora, ao qual não foi dado encaminhamento.

Dispõe a Constituição Federal em seu art. 5º inc. X que são invioláveis a intimidade, a honra, a vida privada e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Pela própria redação do dispositivo, vê-se que o legislador constituinte concedeu às pessoas naturais a possibilidade de pleitear ressarcimento de todos os danos, inclusive de ordem moral.

Numa primeira leitura poder-se-ia dizer que apenas às pessoas naturais foi resguardado o direito à indenização pelos danos morais sofridos. Ocorre que a pessoa jurídica também é passível de sofrer violação do direito à imagem e, portanto, pode ser sujeita de direitos para buscar reparação quando tiver violada a sua imagem.

Na espécie, diante do fato praticado é desnecessária qualquer prova acerca da ocorrência dos danos, pois decorre do próprio fato praticado, caracterizando a violação à imagem da parte autora, pois teve protestado um título indevidamente. Portanto, caracterizado o dano moral, que decorre do próprio abalo de crédito, sem a necessidade de prova específica de tal dano.

Já a fixação do valor da indenização deve ser feita por arbitramento do julgador atendendo-se os seguintes parâmetros: a extensão do dano, grau de culpa do ofensor, situação econômica das partes, sempre observando, ainda, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

No que se refere ao primeiro critério, verifica-se a parte ré não demonstrou que a autora possuía outro título protestado ao tempo do fato. Quanto ao segundo pressuposto, tem-se que a ré agiu de forma negligente ao negativar o nome da demandante, o que ocorreu por evidente falha administrativa.

A quantificação a ser fixada, nesse rumo, não deve gerar o enriquecimento da vítima lesada; mas, por outro lado, não deve ser um valor irrisório, não representando nenhuma prevenção e punição do ofensor. Vale dizer, o valor fixado deve reparar razoavelmente o ofendido e sinalizar uma punição para o responsável, diante do caráter punitivo-pedagógico da condenação desta espécie.

(…) contudo, não se pode olvidar da conduta da empresa autora. Embora tenha protocolado o recurso referente ao processo administrativo nº 13153-05.67/14.4 em 20/04/15 (fl.139), recebeu notificação em que consta o número do mesmo processo administrativo (canto superior direito do documento de fl. 164) em que informada a cobrança de R$ 5.615,00 (mesmo valor da multa aplicada – fl. 136), ficando ciente em 08/06/2015 do futuro encaminhamento para inscrição em dívida ativa e execução fiscal (fl. 164). O recebimento da notificação se deu em 08/06/2015, não havendo notícia de que tenha tomado qualquer providência, mesmo tendo seu advogado requerido cópia em 19/06/2015 (fl. 166), de modo que o título ser protestado em 12/08/2016 (fl. 43)

Sopesadas tais circunstâncias, inclusive, a omissão da autora em apontar o equívoco no âmbito administrativo, tenho que o valor equivalente a R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) é quantia suficiente para indenizar a parte autora pelos danos morais sofridos, além de servir, concomitantemente, como sanção à ofensora.

– Ante o exposto, nego provimento à apelação.

Des. Marco Aurélio Heinz – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa (PRESIDENTE) – De acordo com o(a) Relator(a).

DES. ARMINIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA – Presidente – Apelação Cível nº 70075258871, Comarca de Porto Alegre: “NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNANIME.”

Julgador(a) de 1º Grau: NADJA MARA ZANELLA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO AMBIENTAL. ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA. LICENÇA DE OPERAÇÃO AMBIENTAL EXPIRADA. APLICAÇÃO DA MULTA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO QUE PADECE DE NULIDADE A PARTIR DA APRESENTAÇÃO TEMPESTIVA DO RECURSO ADMINISTRATIVO (ARTIGO 118, INCISO II, DA lEI ESTADUAL Nº 11.520/200 – CÓDIGO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE) QUE NÃO FOI APRECIADO E JULGADO. PENDÊNCIA DE RECURSO ADMINISTRATIVO QUE AFASTA A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO (PENA DE MULTA) QUE NÃO PODERIA TER SIDO INSCRITO EM DÍVIDA ATIVA E PROTESTADO (ARTIGO 12 DA RESOLUÇÃO Nº 006/1999 DO CONSEMA). PROTESTO INDEVIDO QUE GEROU DANOS MORAIS, ABALANDO O BOM NOME DA EMPRESA NO COMÉRCIO EM QUE ATUA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA.

APELAÇÃO DESPROVIDA.

 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa (Presidente) e Des. Marco Aurélio Heinz.

Porto Alegre, 11 de outubro de 2017.

 

Direito Ambiental

Veja também:

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Direito Ambiental

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