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Fiscalização sobre as áreas particulares ainda não desapropriadas: TRF1 suspende liminar que autorizava proprietários rurais a exercerem atividade econômica na Serra da Canastra

“O presidente do TRF1, desembargador federal Hilton Queiroz, suspendeu a liminar concedida pelo Juízo da Vara Única da Subseção Judiciária de Passos/MG que proibia o Instituto Chico Mendes da Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), requerentes da suspensão da liminar, de exercerem fiscalização sobre as áreas particulares ainda não desapropriadas e que autorizava os proprietários de terras a exercerem atividades econômicas em suas propriedades rurais.

As instituições alegam que a determinação do Juízo em afastar a incidência do Plano de Manejo do Parque Nacional das terras ainda não desapropriadas e em estabelecer que fossem essas áreas regidas apenas pela legislação ambiental comum (Código Florestal) expõe aquelas terras a uma condição de fragilidade ambiental.

O desembargador Hilton Queiroz afirmou que há grave transtorno à ordem e à segurança pública diante do prejuízo efetivo ao sistema nacional de unidade de conservação, considerando que a ordem pública ambiental deve ser compreendida ‘como a ausência de perturbações ou degradações ambientais bem como que o Parque Nacional da Serra da Canastra é um ambiente de elevada importância para a conservação dos recursos hídricos’.

Esclareceu o magistrado, ainda, que ‘ao afastar o regime protetivo de unidade de conservação de proteção integral e seu plano de manejo e consentir a prática de atividades econômicas nas áreas particulares, sujeitando-as tão somente às regras do Código Florestal, a decisão questionada coloca as áreas ainda não desapropriadas do Parque Nacional da Serra da Canastra em condição de vulnerabilidade ambiental’”.

Fonte: TRF1, 02/02/2017 (Processo n°: 0003585-02.2017.4010000/MG).

Direito Ambiental

Confira a íntegra da decisão:

SUSPENSÃO DE LIMINAR OU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA N. 0003585-02.2017.4.01.0000/MG

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL PRESIDENTE

REQUERENTE : INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE – ICMBIO

PROCURADOR : DF00025372 – ADRIANA MAIA VENTURINI

REQUERENTE : INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA

PROCURADOR : DF00025372 – ADRIANA MAIA VENTURINI

REQUERENTE : UNIÃO FEDERAL

PROCURADOR : AL00005348 – JOSÉ ROBERTO MACHADO FARIAS

REQUERIDO : JUÍZO FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIARIA DE PASSOS – MG

AUTOR : DEFENSORIA PUBLICA DA UNIÃO – DPU

D E C I S Ã O

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e a União requerem a suspensão da liminar concedida pelo Juízo da Vara Única da Subseção Judiciária de Passos/MG, nos autos da ação civil pública nº 0003407-92.2014.4.01.3804, cujo teor é o seguinte:

1. Declarar a CADUCIDADE do DECRETO n° 74.447 DE 21 DE AGOSTO DE 1974, desde 22 de agosto de 1979;

2. Reconhecer a REVOGAÇÃO EXPRESSA do DECRETO N. 74.447 DE 21 DE AGOSTO DE 1974 por Decreto Federal de DECRETO DE 10 DE MAIO DE 1991;

3. Reconhecer a INEXISTÊNCIA ORIGINÁRIA DE INTERESSE SOCIAL na área não compreendida pelo DECRETO Nº 74.447 DE 21 DE AGOSTO DE 1974, conforme mapa supra;

4. Proibir o exercício, pelo ICMBio, IBAMA ou qualquer outro órgão ou autarquia executiva, de qualquer atividade tendente à consolidação fundiária, por doação, desapropriação ou qualquer outro meio, até que se edite o Decreto de interesse social exigido pela ordem jurídica;

5. Afastar a incidência do Plano de Manejo do Parque Nacional de todas as terras particulares afetadas pelo Decreto de criação do Parque, doravante regidas pela legislação ambiental comum;

6. Afastar o ICMBIO de qualquer atuação sobre as chamadas “áreas não-consolidadas” e atribuir ao INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA, em decorrência da atribuição expressa no art. 3º do Decreto nº 70.355/72, na qualidade de sucessor imediato do IBDF, e competência do art. 2º, I, da Lei nº 7.735/89, até a edição de novo decreto, o exercício do poder de polícia ambiental sobre essas áreas particulares tendo por base somente as NORMAS COMUNS AMBIENTAIS, do novo Código Florestal, aplicáveis á generalidade da população;

7. Destacar que a área inserida no DECRETO Nº 70.355, DE 3 DE ABRIL DE 1972, e ainda não adquirida pelo Poder Público, conquanto não mais regida pelo Plano de Manejo, continua sujeita à proteção ambiental como qualquer parte do território nacional, notadamente quanto às atividades de alto impacto ambiental, na forma do Código Florestal e das normas de licenciamento e fiscalização incidentes sobre cada atividade, que deverão continuar a ser cumpridas.

8. Autorizar os proprietários de terras, desde já, a exercer suas atividades econômicas em suas propriedades rurais, sujeitos às normas administrativas e legais gerais quanto a atividades de impacto ambiental relevante, tais como licenciamentos e autorizações, que deverão ser obtidas junto aos órgãos municipais, estaduais ou federais, de acordo com a legislação comum.

Descrevem as competências do ICMBio nos seguintes termos:

11. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade é uma autarquia em regime especial. Criado no dia 28 de agosto de 2007, pela Lei nº 11.516, o ICMBio é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e integra o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).

12. De acordo com a citada Lei, cabe ao Instituto executar as ações do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, podendo propor, implantar, gerir, proteger, fiscalizar e monitorar as unidades de conservação instituídas pela União.

13. Cabe a ele, ainda, fomentar e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade, bem como exercer o poder de polícia ambiental para a proteção das Unidades de Conservação federais.

14. Entre as principais competências do ICMBio estão propor a criação, a regularização fundiária e a gestão das Unidades de Conservação federais e apoiar a implementação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

15. O Instituto deve ainda contribuir para a recuperação de áreas degradadas em Unidades de Conservação. Ele fiscaliza e aplica penalidades administrativas ambientais ou compensatórias aos responsáveis pelo não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental.

16. Cabe ao Instituto Chico Mendes monitorar o uso público e a exploração econômica dos recursos naturais nas Unidades de Conservação onde isso for permitido, obedecidas as exigências legais e de sustentabilidade do meio ambiente.

17. A autarquia também cria e promove programas de educação ambiental, contribui para a implementação do Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (Sinima) e aplica, no âmbito de sua competência, dispositivos e acordos internacionais relativos à gestão ambiental, dentre outras competências.

18. A missão do Instituto Chico Mendes é proteger o patrimônio natural e promover o desenvolvimento socioambiental.

19. Isso se dá por meio da gestão de Unidades de Conservação Federais, da promoção do desenvolvimento socioambiental das comunidades tradicionais naquelas consideradas de uso sustentável, da pesquisa e gestão do conhecimento, da educação ambiental e do fomento ao manejo ecológico.

Sustentam que o Juízo de origem “decidiu afastar a incidência do Plano de Manejo do Parque Nacional de todas as terras ainda não desapropriadas, determinando sejam regidas apenas pela legislação ambiental comum (Código Florestal), bem como autorizar os proprietários de terras, desde já, a exercerem atividades econômicas em suas propriedades rurais, sujeitando-os apenas à legislação geral, e não ao regime de proteção integral de um Parque Nacional (itens 5, 7 e 8 do dispositivo da decisão).” (fl. 13).

Afirmam que “ao afastar o regime protetivo de unidade de conservação de proteção integral e seu Plano de Manejo (onde apenas o uso indireto dos recursos naturais é permitido), e permitir a prática de atividades econômicas nas áreas particulares, sujeitando-as tão somente às regras do Código Florestal, a decisão em comento coloca as áreas ainda não desapropriadas do Parque Nacional da Serra da Canastra em condição de alta vulnerabilidade ambiental.” (fl. 13)

Ressaltam que “a chancela para que os proprietários de tais áreas pratiquem atividades econômicas representa um aval para o completo desrespeito ao regime da unidade de conservação, em dissonância com os princípios de proteção ao meio ambiente, em especial os princípios da prevenção e da precaução.” (fls. 13/14).

Destacam que “o Código Florestal estabelece o dever de preservar 20% (vinte por cento) de cada imóvel rural, a título de reserva legal. Naturalmente, isso significa que 80% (oitenta por cento) da área de cada imóvel é passível de exploração, ao menos em tese.” (fl. 14)

Registram que “a decisão em apreço deu uma espécie de cheque em branco á sociedade, autorizando-a a explorar uma área de 91,6 mil hectares dentro de um parque nacional de proteção integral, o que equivale a 90 mil campos de futebol ou cerca de três vezes o tamanho da cidade de Belo Horizonte.” (fl. 14)

Consigam que “o conjunto de atividades agropecuárias e de mineração que ocorrem na unidade, cuja prática foi liberada pela decisão em apreço, já vem ocasionando uma série de impactos ambientais, tais como soterramento de vegetação, carreamento de sólidos, assoreamento de drenagens e um expressivo impacto visual. A tendência agora, caso mantida a decisão, é que tais danos só aumentem (vide item “Impactos Ambientais” – Nota Técnica ICMBio – DOC. 05).” (fl. 14).

Asseveram que a suspensão da decisão de primeira instância “não só deu carta branca para a prática de atividades econômicas em plena unidade de conservação de proteção integral, mas também impede que o ICMBio fiscalize essas áreas, deixando o meio ambiente absolutamente indefeso.” (fls. 18/19)

Pugnam pela imediata suspensão da decisão proferida nos autos da ação civil pública nº 0003407-92.2014.4.01.3804, em decorrência da clara ofensa à segurança e à ordem públicas, em seus enfoques administrativo e ambiental, com efeitos até o trânsito em julgado da decisão de mérito da ação principal.

DECIDO.

Segundo as prescrições do art. 4º da Lei 8.437/92, “compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.” (original sem destaque).

O deferimento do pedido de suspensão, portanto, está condicionado a que esteja plenamente caracterizada a ocorrência de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde ou à economia públicas, tendo em vista o caráter de excepcionalidade da medida (4º da Lei nº 8.437/1992).

A lesão ao bem jurídico tutelado deve ser grave, devendo a requerente demonstrar, de modo cabal e preciso, que a manutenção da decisão recorrida trará desastrosa consequência para a coletividade.

Na hipótese dos autos, a decisão que se objetiva suspender concedeu, em análise precária da questão, um provimento de caráter satisfativo que: i) proíbe o ICMBio, o IBAMA ou qualquer outro órgão ou autarquia executiva, de qualquer atividade tendente à regularização fundiária, por doação, desapropriação ou qualquer outro meio, até que se edite novo Decreto de declaração de interesse social; ii) afasta o ICMBio de qualquer atuação sobre as áreas ainda não desapropriadas e atribui ao IBAMA o exercício do poder de polícia ambiental sobre elas, determinando que se lhes aplique apenas o Código Florestal.

Entendo que há grave transtorno à ordem e à segurança pública, porquanto existe um prejuízo efetivo ao sistema nacional de unidade de conservação, considerando que a ordem pública ambiental deve ser compreendida como a ausência de perturbações ou degradações ambientais, bem como que o Parque Nacional da Serra da Canastra (PNSC) é um ambiente de elevada importância para a conservação dos recursos hídricos.

Assim, ao afastar o regime protetivo de unidade de conservação de proteção integral e seu Plano de Manejo e consentir a prática de atividades econômicas nas áreas particulares, sujeitando-as tão somente às regras do Código Florestal, a decisão questionada coloca as áreas ainda não desapropriadas do Parque Nacional da Serra da Canastra em condição de alta vulnerabilidade ambiental.

Pelo exposto, DEFIRO o pedido de suspensão de liminar.

Intimem-se.

Comunique-se, com urgência, ao juízo requerido, encaminhando-se-lhe cópia desta decisão.

Sem recurso, arquivem-se os autos.

Brasília, 27 de janeiro de 2017.

Desembargador Federal HILTON QUEIROZ

Presidente

Direito Ambiental

Veja também:

 

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– Dados do CAR são utilizados para militância judicial contra agricultores proprietários de terras em Parque Estadual nunca desapropriado (Portal DireitoAgrário.com, 12/12/2016)

– Justiça Federal libera criação de gado e plantio dentro do Parque Nacional da Serra da Canastra, onde fica a nascente do São Francisco (Portal DireitoAmbiental.com)

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