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Meio ambiente em risco. O que muda com as propostas de alteração no Licenciamento Ambiental?

mauro1(1)Análise sobre as propostas de alterações no Licenciamento Ambiental, por Mauro G. Moura, Ex-Secretário do Meio Ambiente de Porto Alegre/RS e Ex-Diretor Técnico da FEPAM/RS.

 

Hoje (11/04/16) participo da “Audiência Pública que discutirá a proposta de resolução que altera o procedimento do licenciamento ambiental no âmbito do CONAMA“, no Auditório do Palácio do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, Praça Marechal Deodoro, 110, 3º andar, Centro – Porto Alegre/RS. Em avaliação o PL 3729/04, em tramitação na Câmara Federal, o PLS 654/15, em tramitação no Senado Federal e Revisão das Resoluções CONAMA 001/86 e 237/97.

Esta Audiência visa colher a opinião dos atores sociais do RS quanto aos projetos de lei ou resolução acima enumerados, que tratam exclusivamente do licenciamento ambiental do Brasil.

O licenciamento ambiental não é o único instrumento de gestão ambiental elencado na Lei nº 6938/81 (da Política Nacional do Meio Ambiente). São doze os instrumentos listados no art. 9º da Lei e, na ordem, o Licenciamento é o quarto. Por quê? Porque não é o mais importante instrumento de gestão ambiental e, na realidade, autoriza a degradação “controlada” do meio ambiente, que, se não acompanhado dos demais instrumentos, não promove o chamado “desenvolvimento sustentável”.

Sem me estender aqui, o licenciamento ambiental que não tem previamente o conhecimento sobre uma região (pelo menos a hidrográfica), através de instrumentos como zoneamento ecológico-econômico, Avaliação Ambiental Estratégica, Planos de Bacia Hidrográfica, Avaliação Ambiental Integrada, entre outros, será um instrumento de intensa degradação ambiental, subvertendo princípios ambientais importantes como a da prevenção e da precaução.

Para um exemplo deste tipo de estudo (neste caso, quantas hidrelétricas uma bacia hidrográfica suporta com menor dano ambiental), acessem o site:

http://www.fepam.rs.gov.br/biblioteca/hidreletrico_uruguai.asp

(Estudo científico realizado pela FEPAM/UFRGS e ANEEL). Na tabela 49, há a relação entre área alagada e energia gerada para os Aproveitamentos Hidrelétricos (AHE´s) avaliados.

mauro

Resumindo, deste estudo dos 34 Aproveitamentos Hidrelétricos (AHE) avaliados, 14 foram considerados viáveis, mas vejam: (1) apesar de “somente” 14 das AHE’s serem consideradas viáveis, estas representam 59% da Energia Firme das 34 e (2) “somente” 22% de área a ser alagada. Por que “somente”? Porque, mesmo assim, teremos que “destruir” 22% de florestas nativas para a instalação das hidrelétricas (por isto o licenciamento ambiental é sempre um instrumento de degradação ambiental). Com este estudo estamos aproveitando substancialmente o potencial elétrico da região, com a menor degradação possível. É isto que você chama “sustentabilidade”?

Voltando ao tema da Audiência Pública a ser realizada no Ministério Público.

As autoridades federais demonstram um enorme interesse pelo licenciamento ambiental, mas praticamente nenhum interesse de dotar os órgãos ambientais de reais instrumentos de gestão que permitam fazer um licenciamento ambiental rápido, mas com as devidas proteções aos processos ecológicos, tão necessários a sobrevivência da humanidade.

Logo, ressalta aos olhos o interesse meramente econômico sobre a área ambiental, o que importa é licenciar rápido, independentemente da proteção ao patrimônio ambiental e a futura qualidade de vida de nossos filhos ou netos.

Como o licenciamento ambiental será uma garantia que nossos recursos naturais serão racionalmente utilizados e que desastres ambientais, como o de Mariana não ocorrerão, se os projetos de lei visam somente acelerar o licenciamento ambiental, sob o ponto de vista meramente burocrático?

O PL 3729 de 2004 deveria ser retirado pois tem pontos de conflito sérios com a Lei Complementar Federal nº 140/2011 (friso, “Lei Complementar”). Em especial quanto as competências da União, estados e municípios. Por que a tramitação agora “urgente” para um projeto de 2004, que nem leva em consideração a Lei nº 140/11?

O PLS 654 de 2015, tenta facilitar o licenciamento de grandes obras públicas, principalmente federais (sistemas viário, hidroviário, ferroviário e aeroviário; portos e instalações portuárias; energia; telecomunicações e exploração de recursos naturais), que são as com grande impacto ambiental.

As mudanças nas resoluções CONAMA nº 01/86 e 237/97 ainda estão em discussões no Conselho Nacional do Meio Ambiente, mas algumas proposições ali postas, com o intuito de simplificação do processo de licenciamento devem ser vistas com cuidado.

Quais são as principais propostas desta nova legislação (analise feita em audiência pública realizada pelo Ministério Público de São Paulo, em fevereiro/16):

  • Prazos exíguos para análises técnicas de alta complexidade;
  • Possibilidade da supressão de fases do procedimento de licenciamento, mesmo para projetos que envolvam atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente;
  • Possibilidade de dispensa de documentos técnicos essenciais (EIA/RIMA, inclusive, mesmo para atividades potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental) e limitação na fixação de condicionantes nas licenças ambientais;
  • Tratamento insuficiente para o tema da cumulatividade e sinergia de impactos para uma dada região, o que permite que vários projetos similares sejam analisados separadamente, ignorando-se o conjunto dos impactos negativos;
  • Excessiva ampliação da discricionariedade do órgão licenciador na dispensa de etapas e exigências de estudos técnicos; e
  • Reduzida participação e interferência de demais órgãos técnicos, sociedade civil e comunidade científica no procedimento de licenciamento, tudo em comparação à disciplina atual da matéria, hoje determinada pelas Resoluções CONAMA 01/86 e 237/1997.

Estas mudanças legislativas têm que ser amplamente discutidas com todos os segmentos sociais interessados no tema ambiental, principalmente porque as manifestações das entidades pertencentes ao Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) não estão tendo a adequada colhida junto ao Congresso Nacional.

 

Sem me alongar, pois deveria aprofundar o tema, o licenciamento ambiental é demorado porque:

  • Falta apoio humano, técnico e financeiro aos órgãos ambientais que, regra geral, não são vistos como organizações do próprio governo;
  • A questão ambiental é vista pelos governos setorialmente (uma Secretária, um Departamento) e não um assunto transversal na execução de qualquer programa governamental;
  • Como consequência, falta de estudos ambientais que permitam dizer previamente ao empreendedor se é possível licenciar onde ele deseja, ou não. Como o órgão ambiental não conhece o meio ambiente, exige maiores estudos do licenciador para conhecer;

Que o sistema legal deve ser aprimorado, não resta a menor dúvida, mas aprimorar o quê, se desde 1981, não cumprimos a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente e negligenciamos o atendimento aos doze instrumentos de gestão ali elencados?

O cumprimento da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente deveria ser a busca e exigência dos parlamentares (já que fizeram a Lei e tem, por obrigação primária, zelar pelo cumprimento das leis), e não a facilitação do licenciamento ambiental sem base cientifica de conhecimento sobre meio ambiente.

Como esta legislação proposta somente nos fragiliza na proteção ambiental e mesmo atenta contra algumas intenções/acordos/princípios internacionais assumidos pelo Brasil, espero que não seja aprovada sem um amplo debate com a sociedade brasileira interessada em sustentabilidade (ambiental, econômica e social).

 

Leia também:  http://direitoambiental.com/conama-quer-mudar-normas-sobre-licenciamento-ambiental-mas-realiza-consulta-publica-no-carnaval-editorial-de-direitoambiental-com/

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