Indenização atualizada chega a R$1,5 milhão.
A JBS foi condenada em pagar indenização por danos morais coletivos em razão do lançamento de restos da produção de um frigorífico no Rio das Pitas, em Mato Grosso.
A decisão é do TJMT e o STJ negou o recurso sob o fundamento de que, a pretensão da empresa demandaria reanalise provas, ferindo a súmula 7 da corte.
Segunda a relatora, Min. Regina Helena Costa: “É relevante notar que o fato de a presença dos poluentes não ter sido verificada pela empresa nos meses seguintes, em outras análises, ainda que tivessem sido colhidas amostras no mesmo local, não afasta o dano produzido, nem o torna menos prejudicial, cabendo salientar que o dano ocorreu em um curso d’água, o que faz com que os dejetos sejam levados pela correnteza a outras áreas.”
Processo: REsp 1734459 (Com informações do STJ).
Acórdão do TJMT que condenou a empresa:
APELANTE(S): JBS S. A.
APELADO(S): MINISTÉRIO PÚBLICO
Número do Protocolo: 159161/2015
Data de Julgamento: 19-09-2016
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – CONDENAÇÃO A INDENIZAR DANO MORAL COLETIVO – NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA E AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – REJEITADA – COMPROVAÇÃO DO DESPEJO DE EFLUENTES SEM O DEVIDO TRATAMENTO – VISTORIA REALIZADA – DANO MORAL COLETIVO – VALOR FIXADO – CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE RESPEITADOS – RECURSO DESPROVIDO.
O julgamento antecipado da lide não implica automaticamente em cerceamento de defesa.
A sentença que expõe sucintamente os motivos para a fixação do valor do dano não é carente de fundamentação.
Os laudos técnicos juntados atestam que nada data da vistoria havia despejo de efluentes no Córrego sem o tratamento devido.
O dano moral advindo de degradação ambiental é expressamente previsto na Lei da Ação Civil Pública.
O valor fixado atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
R E L A T Ó R I O
EXMA. SRA. DRA. VANDYMARA G. R. P. ZANOLO
Egrégia Câmara:
Trata-se de Recurso de Apelação contra a sentença prolatada pelo juízo da Vara Única da Comarca de Araputanga nos autos da Ação Civil Pública Ambiental código nº 26647, a qual julgou procedente o pedido da inicial, condenando o apelante ao pagamento de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) a título de danos morais coletivos, a ser revertido ao Fundo de Compensação a que alude a Lei 7.357/85, bem como confirmou a antecipação de tutela.
Condenou ainda a apelante ao pagamento das custas processuais.
A Apelante suscita, preliminarmente, a nulidade da sentença pelo julgamento antecipado da lide. Fundamenta a arguição de nulidade na alegação de que a ação foi ajuizada com o objetivo de obrigar-lhe a cessar a prática de supostos danos ambientais causados pelo despejo de efluentes acima dos níveis permitidos pela Resolução CONAMA 357 no Rio das Pitas, na cidade de Araputanga, bem como a pagar indenização por danos causados ao meio ambiente e à população local.
Todavia, ao oferecer contestação, demonstrou a inexistência de nexo de causalidade entre sua atividade industrial e a poluição constatada, juntando laudos específicos, os quais demonstram que a poluição decorre de outras fábricas que despejam efluentes ali, do lixo doméstico, requerendo especificamente a produção de perícia técnica, prova documental e oral.
Não obstante a documentação juntada, sem lhe ser facultada a possibilidade de prova pericial, foi proferida a sentença condenatória, em julgamento antecipado.
Afirma que as provas periciais e a realização de diligência são indispensáveis para a sua defesa e comprovação da origem da poluição, pois há divergência entre os laudos técnicos relativos a período idêntico, tendo ocorrido o cerceamento de defesa.
Suscita a nulidade da sentença por ausência de fundamentação em relação aos parâmetros utilizados para a fixação do valor da indenização, aduzindo que o valor consta do dispositivo, todavia em toda a motivação não há nenhuma menção à ponderação do valor.
No mérito, alega que o relatório de vistoria juntado com a inicial pelo Ministério Público, não comprova que a poluição no Rio das Pitas é decorrente de sua atividade industrial, inexistindo o nexo de causalidade; que existem documentos nos autos que comprovam que os efluentes lançados pela apelante estavam em conformidade com os parâmetros do CONAMA e que a indústria manteve sua regularidade ambiental, tratando-se de sentença contrária à prova dos autos. Alega a inadmissibilidade de danos morais coletivos pois não existe prova efetiva de que um grupo ou coletividade específica tenha sido atingida, devendo ser afastada tal condenação. Subsidiariamente, pugna pela redução do valor.
Contrarrazões do apelado às fls.. 450/463, pugnando pelo desprovimento do recurso.
A douta Procuradoria de Justiça se manifestou pelo desprovimento do recurso às fls. 527/531.
É o relatório.
P A R E C E R (ORAL) EXMO. SR. DR. LUIZ EDUARDO MARTINS JACOB
Ratifico o parecer escrito.
V O T O
EXMA. SRA. DRA. VANDYMARA G. R. P. ZANOLO (RELATORA)
Egrégia Câmara:
VOTO PRELIMINAR
NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA
O julgamento antecipado da lide, por si só, não implica em cerceamento de defesa. No caso em tela, a inicial, ao alegar que a apelante causou degradação ambiental no Rio das Pitas, em decorrência de lançamento de efluentes do seu frigorífico, afirma que o Relatório da Vigilância Sanitária observou que o tratamento de efluente da apelada estava em desacordo com a distância mínima de 300 m estabelecida na Lei Complementar 232/05, que alterou o Código Estadual do Meio Ambiente, bem como que o frigorífico emite poluentes no ar que se dissipam pela chaminé.
A inicial afirmou que na perícia realizada, foi constatado que o apelado possui o segundo maior índice de concentração de nitrogênio amoniacal de descarga de efluentes no rio, causando poluição acima do limite máximo estabelecido na Resolução do CONAMA nº 357/2005.
Narra a constatação de geração de resíduos sólidos, líquidos e gasosos bastante tóxicos e restritivos à vida dos peixes. Juntou laudo assinado por engenheira sanitarista e boletim de análise emitido pela Secretaria de Estado de Meio ambiente- SEMA, cuja coleta foi realizada no dia 09/06/2010.
A apelante, em sua defesa, alegou o respeito à legislação no tratamento dos efluentes lançados no rio das Pitas, e impugnou a análise realizada a pedido do Ministério Público, no mês de junho de 2010, afirmando que, no mesmo mês, o laudo da mesma empresa apresentou resultado diferente, juntando laudos.
Com a contestação, juntou Auto de Inspeção realizado pela SEMA/MT em data de 04/05/2011, o qual demonstra que não foi constatada nenhuma anormalidade em nível de poluição do ar, solo e água e que os sistemas e tratamento de efluente industrial primário e secundário funcionam adequadamente, em conformidade com a legislação ambiental.
A Prefeitura Municipal de Arapuntaga, atendendo à solicitação do juízo nos autos, realizou inspeções sanitárias, por meio de sua vigilância sanitária, juntando os termos de vistoria nos autos.
A apelante juntou relatórios periódicos de análise do sistema de tratamento de efluentes.
Logo, o julgador, pelos laudos e farta documentação juntada, firmou seu convencimento, julgando antecipadamente a lide.
A apelante juntou inúmeros laudos nos autos, sendo-lhe oportunizada a farta comprovação quanto à eficiência de seu sistema de tratamento de efluentes, antes de serem lançados no Rio das Pitas.
Assim, não há que se falar em cerceamento de defesa pelo julgamento da lide no estado em que se encontra o processo, pois o convencimento do julgador foi firmado mediante os laudos e relatórios juntados nos autos, tendo constado na sentença que:
“…26.o caso concreto, a vistoria técnica que subsidiou a propositura da demanda fora firmada por analista ambiental – Químico Industrial e profissional de análise laboratorial do SEMA/MT (fls. 37/46), secundada por estudo técnico de amostras firmada por Engenheira Sanitarista Ambiental (fls. 29/36).
27. Tal estudo por equipe interprofissional não pode simplesmente ser descartado como pretende a requerida, uma porque feito in locu por especialistas, sem aviso prévio, justamente para se constatar a realidade da degradação que os rejeitos efluentes emanados da atividade empreendedora da Ré lançam no meio-ambiente, duas porque, tal medida visa justamente evitar a manipulação de resultados e/ou impedimento ou simulação de coletas e amostras, preservando, por outro lado, por isso mesmo, a credibilidade do exame.
28. Assim, fora constatada concentração no resultado das amostras do efluente tratado da Requerida no valor de 146 mg/l, com descarga de efluentes, contendo alta concentração de amônia, sendo que, tanto a montante como a jusante da empresa Ré, fora constatado cromo total acima do permitida pela Resolução Conama n. 357/2005, referida substancia além de altamente tóxica é biocumulativa, ocasionando danos aos corpos d’agua.
29. Além disso, como se não bastasse, tais estudos apontaram despejo de grande quantidade de material putrescível, e compostos tóxicos como sulfeto de sódio, cal livre e compostos arsenicais.
30. Tais circunstanciais ensejaram justamente a concessão da tutela antecipada requestada para o fim de adequação da atividade empreendedora aos limites máximos fixados pelas normas ambientais, o que sequer fora contrariado pela empresa Ré, que, pelo contrário, informou estar cumprindo a decisão judicial liminar nos termos determinados.
31. Portanto, pode-se concluir que os documentos apresentados pela empresa Ré (estudos ambientais, pareceres e outros) embora apontem para uma atual regularidade ambiental não comprovam que os efluentes lançados no córrego Ribeirão das Pitas até a data da vistoria técnica estivessem dentro dos limites fixados pela Resolução CONAMA n. 357/2005 e demais normas ambientais pertinentes à matéria.”
Rejeito a preliminar, portanto.
PRELIMINAR
NULIDADE DA SENTENÇA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO QUANTO AOS PARÂMETROS PARA A FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO
A apelante alega que a sentença é nula porque não fez o juízo de ponderações quanto aos parâmetros que utilizou para fixar o valor indenizatório em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
Na sentença, quanto ao dano moral coletivo, o juízo assim constou:
“…Na avaliação do dano moral coletivo não podem ser considerados elementos da subjetividade individual, do psiquismo das pessoas enquanto seres biológicos. Na apreciação do chamado dano moral coletivo não se indaga sobre o “sofrimento”, a “dor”, o “padecimento”, o transtorno mental, o abatimento dos sentimentos. Não se procede a esses tipos de questionamentos porque a coletividade, a sociedade não são entes biológicos.
40. Sociedade, agrupamento social, coletividade são conceitos da Antropologia e da Sociologia. São, antes de tudo, realidades históricas e sociais. Mas as coletividades os grupos sociais para se desenvolverem, para subsistirem no tempo e no espaço, precisam adotar certas regras de conduta e valores. Os agrupamentos humanos, que o Direito denomina de “coletividade” desenvolvem valores, concepção de decência e patrimônio ideal que devem ser protegidos. Por isso, a consideração jurídica transindividual da tutela dos interesses difusos e coletivos, inclusive quanto ao dano moral, não tem como parâmetro sofrimento psíquico do indivíduo, mas uma violação a valores e direitos objetivamente considerados.
41. Examina-se o dano moral coletivo no seu aspecto objetivo relativamente a ofensa a valores e/ou interesses coletivos, a gravidade da lesão objetivamente considerada para o grupo social. O dano esta in re ipsa. Após, examina-se a existência do dano e suas consequências sob o aspecto subjetivo do ofensor: a responsabilidade de sua conduta; a intenção de causar dano; o conhecimento das consequências nefastas de sua conduta lesiva.
42. Em síntese, o fundamento do dano moral coletivo é também resultante de uma regra moral não é justo auferir-se benefício em detrimento do direito de outrem.
43. O Ministro Luiz Fux, quando integrante do Superior Tribunal de Justiça decidiu que sob o enfoque infraconstitucional a Lei n. 8.884/94 introduziu alteração na LACP, segundo a qual passou restou expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei.
44. A prova da existência de atividade lesiva ao meio ambiente pode significar também responsabilidade pelo dever de indenizar dano moral coletivo e difuso (art. 1º, IV, da Lei 7.347/85, pois todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (CF/88, art. 225, caput e § 3º). …”
A seguir, condenou a apelante no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
Embora não tenha constado como chegou ao valor de R$ 500.000,00, expôs o douto juízo monocrático que considerou a gravidade da lesão, as consequências do dano.
Assim, expôs os motivos pelos quais entendeu por bem em fixar o valor em R$ 500.000,00, ressaltando-se que não existe uma fórmula ou tabela para a fixação de danos morais, a qual é feita pelo prudente arbítrio do julgador.
Rejeito, portanto, a preliminar.
VOTO MÉRITO
O douto juízo, na sentença, assinalou que o laudo que deu suporte à inicial foi firmado “… por analista ambiental – Químico Industrial e profissional de análise laboratorial do SEMA/MT (fls. 37/46), secundada por estudo técnico de amostras firmada por Engenheira Sanitarista Ambiental (fls. 29/36).”
Referidos laudos espelharam a realidade encontrada quando da realização da vistoria, em junho de 2010.
Conforme já constei quando da análise das preliminares, onde transcrevi trecho da sentença, especialmente no que se refere aos motivos que firmaram o convencimento do juízo de primeiro grau, o estudo que instruiu a inicial efetivamente constatou, por meio de exame de amostras coletadas dos efluentes lançados pela apelante, a concentração de 146mg/l de nitrogênio amoniacal, acima do permitida pela Resolução Conama n. 357/2005, que é de valor menor ou igual a 20 mg/l.
Além disso, a análise das amostras 305 e 306, colhidas no ponto de lançamento do frigorífico, bem como da jusante do ponto de lançamento da apelante, fls. 39, indicam índices maiores que o permitido pela Res. CONAMA 357/2005 em fósforo e, na amostra 305, demanda bioquímica de oxigênio acima do permitido.
Este aumento da demanda de bioquímica é provocado, segundo a análise da amostra, por despejos de origem predominantemente orgânica no rio das Pitas, o que causa “a depleção de oxigênio dissolvido (OD), até níveis que inibem a vida aquática.” (fls. 41).
Para melhor compreensão, esclarece-se que a depleção de oxigênio é a queda de oxigênio dissolvido presente na água. Segundo a Wikipédia:
“ Demanda bioquímica de oxigênio ou demanda biológica de oxigênio (DBO) corresponde à quantidade de oxigênio consumido na degradação da matéria orgânica no meio aquático por processos biológicos, sendo expresso em miligramas por litro (mg/L). É o parâmetro mais empregue para medir poluição. (…) Sua alta concentração pode ocasionar em problemas ambientais graves. Como o DBO corresponde a alta quantidade de matéria orgânica no meio, para sua total decomposição há o uso do oxigênio dissolvido na água, caso a matéria orgânica seja muito abundante, a decomposição pode ser anaeróbia, tendo como resultados substâncias que podem degradar a qualidade da água. Os produtos mais comuns envolvidos na degradação anaeróbia são gás carbônico, metano, amônia, ácidos graxos, mercaptanas, fenóis e aminoácidos. A total depleção do oxigênio dissolvido ocasiona na morte da biota aquática dependente do oxigênio e eutrofização do corpo d’água. …”
Dessa forma, não há como se deixar de concluir, pela prova produzida nos autos, que quando da vistoria e exame da coleta realizada no dia 09/06/2010, os efluentes lançados pela Apelante estavam fora dos padrões exigidos para que os dejetos possam ser lançados em rios. Assim, realmente havia, quando do ajuizamento da ação, poluição por dejetos lançados pela apelante, causadores de degradação ambiental e poluidores de curso d’água natural.
Nesse ponto, a conclusão a que chegou o julgador de primeiro grau, na sentença, é exatamente esta. Confira-se:
“ …31. Portanto, pode-se concluir que os documentos apresentados pela empresa Ré (estudos ambientais, pareceres e outros) embora apontem para uma atual regularidade ambiental não comprovam que os efluentes lançados no córrego Ribeirão das Pitas até a data da vistoria técnica estivessem dentro dos limites fixados pela Resolução CONAMA n. 357/2005 e demais normas ambientais pertinentes à matéria. …”
Com efeito, verifica-se que os documentos e vistorias, estudos técnicos juntados pela apelante em sua defesa, não se tratam de coleta feita no mesmo dia que a amostra analisada pela SEMA/MT.
Além disso, o boletim de análise das amostras que instrui a inicial é assinado por Adari Rogério de Almeida – Analista de Meio Ambiente – Químico Industrial e Sérgio Batista de Figueiredo – Gerente de Laboratório e Ensaios – SEMA/MT. A apelante, em sua defesa, juntou laudos da empresa ANALÍTICA – Análises Químicas e Controle de Qualidade, assinados por Jadir Inácio Ferreira da Silva – Químico Responsável e as datas das coletas das amostras analisadas são: 25/05/2010, 27/01/2010, 25/02/2010, 30/03/2010, 28/04/2010 e 23/06/2010 (fls. 87/92, respectivamente).
Além disso, não comprovam, referidos laudos, que os pontos de coleta das amostras são exatamente os mesmos das amostras coletadas pela SEMA/MT. Dessa forma, não há que se falar que os laudos juntados pela apelante desconstituem o laudo e as análises realizadas a pedido do Ministério Público.
Assinalo, também que o Auto de Inspeção da SEMA juntado pela apelante às fls. 100, referente à vistoria realizada em 24/03/2011, além de ser posterior à coletas das amostras que embasam a inicial, apenas relata que foram apresentados aos técnicos da Sema os seguintes documentos: – cópia da licença de operação; – boletins de análise de auto monitoramento do STE e do manancial, referente aos meses de janeiro e fevereiro de 2011; – cópia de parecer técnico, – cópia de gráficos de medição e vazão do Córrego das Putas dos meses de julho, agosto e setembro de 2010.
Conforme consta deste auto de inspeção, a empresa apelante entregou boletins de auto monitoramento, ou seja, análises da empresa contratada por ela para tanto, apenas isso.
Tendo ficado comprovada a atividade poluidora, o dano moral coletivo a que foi condenada decorre do próprio texto da Lei da Ação Civil Pública ( Lei nº 7347/85), que em seu art. 1º dispõe:
“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
l – ao meio-ambiente (…)”
O dano moral advindo da degradação ao meio ambiente, portanto, é expressamente previsto na lei da ACP, e, no caso em tela, o bem que estava sendo degradado pela atividade da apelante é o mais precioso para a vida neste planeta: a água.
Segundo Carlos Alberto Bitar Filho:
“O dano moral coletivo é uma injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial. Tal como se dá na seara do dano moral individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo simples fato da violação (damnun in re ipsa). (BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro. In: Revista de Direito do Consumidor, nº 12, out\dez\1994, p. 12).”
Também segundo posicionamento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, a reparação de danos por degradação ambiental deve ser a mais completa possível, e o dano moral coletivo, nesse caso, é in re ipsa:
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELA EMISSÃO DE FLÚOR NA ATMOSFERA. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. POSSIBILIDADE DE OCORRER DANOS INDIVIDUAIS E À COLETIVIDADE. NEXO DE CAUSALIDADE. SÚMULA N. 7/STJ.DANO MORAL IN RE IPSA. (…). 4. É jurisprudência pacífica desta Corte o entendimento de que um mesmo dano ambiental pode atingir tanto a esfera moral individual como a esfera coletiva, acarretando a responsabilização do poluidor em ambas, até porque a reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível. (…) 7. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1175907/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 25/09/2014) .
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC.OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. CONDENAÇÃO A DANO EXTRAPATRIMONIAL OU DANO MORAL COLETIVO. POSSIBILIDADE.PRINCÍPIO IN DUBIO PRO NATURA. (…) 2. A Segunda Turma recentemente pronunciou-se no sentido de que, ainda que de forma reflexa, a degradação ao meio ambiente dá ensejo ao dano moral coletivo. 3. Haveria contra sensu jurídico na admissão de ressarcimento por lesão a dano moral individual sem que se pudesse dar à coletividade o mesmo tratamento, afinal, se a honra de cada um dos indivíduos deste mesmo grupo é afetada, os danos são passíveis de indenização. 4. As normas ambientais devem atender aos fins sociais a que se destinam, ou seja, necessária a interpretação e a integração de acordo com o princípio hermenêutico in dubio pro natura. Recurso especial improvido. (REsp 1367923/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/09/2013)
“ (…) 4. O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado. […]. (STJ, Segunda Turma, REsp 1269494/MG, relatora Ministra Eliana Calmon, DJe 1/10/2013.”
No caso em tela, ao ser fixado o valor da condenação pelo dano moral coletivo, respeitou-se os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Como já afirmado, o bem que estava sendo degradado é aquele mais precioso para a vida, que é a água e, portanto, a degradação pode atingir toda a vida no planeta. Assim, em relação à proporcionalidade, o valor fixado na sentença corresponde ao dano causado a bem essencial à vida.
Com relação à razoabilidade, a apelante é indústria de grande porte, com capacidade de pagamento, a degradação ocorreu em razão de sua atividade industrial, tendo, portando, obtido proveito econômico dela, e a reparação ambiental, segundo posicionamento pacífico da jurisprudência, deve ser a mais completa possível.
Atentando para estes parâmetros, o valor fixado na sentença deve ser mantido.
Diante disso, NEGO PROVIMENTO ao recurso.
É como voto.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. MÁRCIO VIDAL, por meio da Câmara Julgadora, composta pela DRA. VANDYMARA G. R. P. ZANOLO (Relatora), DES. MÁRCIO VIDAL (1º Vogal) e DESA. MARIA APARECIDA RIBEIRO (2ª Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, REJEITOU AS PRELIMINARES E, NO MÉRITO, DESPROVEU O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA.
Cuiabá, 19 de setembro de 2016.
DOUTORA VANDYMARA G. R. P. ZANOLO – RELATORA
(N.U 0000106-79.2011.8.11.0038, , VANDYMARA G. R. P. ZANOLO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 19/09/2016, Publicado no DJE 22/09/2016)