domingo , 28 abril 2024
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Reservatórios das hidrelétricas podem recarregar reservas subterrâneas de água

Por Ivo Pugnaloni

Pesquisa da Universidade da Califórnia estudou mais de 170 mil poços em 40 países encontrando dados alarmantes sobre o nível das reservas subterrâneas de água.

reservas subterrâneasreservas subterrâneas

 

Parece que alguém lá “em cima” quer que o mundo inteiro entenda melhor coisas que não estão sendo divulgadas sobre as mudanças climáticas.

Como por exemplo, – o papel que as hidrelétricas -, que hoje são tão “demonizadas” no Brasil, podem ter cumprido silenciosamente, durante todos esses mais de 70 anos, quando armazenaram, por mais tempo, a água doce que caiu em forma de chuva e foi descansar no fundo dos lagos dos seus reservatórios.

Água doce que, se não fossem elas, as hidrelétricas, estaria correndo direto para o Oceano Atlântico, deixando de percolar no fundo dos reservatórios e não evaporando nas amplas superfícies de seus lagos. E assim, deixando de recarregar os lençóis freáticos e aquíferos antes de chegar ao seu destino final.

Nessa interessante reportagem da CNN Brasil, um estudo realizado pela Universidade da California, em mais de 40 países, com um universo de 140 mil poços, entre 2000 e 2022, provou que o nível das reservas subterrâneas diminuiu pelo menos 10 cm ao ano em 36% dos poços pesquisados ou 50.400 poços.

O estudo aponta como principais causas da espantosa redução de nível e de volume reservado, o exagerado aumento dos processos de irrigação que usam água subterrânea e além de provável alteração no regime de chuvas. reservas subterrâneas

A foto de cima é a original da matéria de anteontem da CNN, que pode ser acessada nesse link. É pena que, aqueles que apenas olharem a foto e só lerem a manchete, poderão pensar que culpa da queda do nível dos aquíferos é dos pequenos agricultores, que usam sistemas quase artesanais como o da imagem. E não os grandes projetos como os da foto da direita, com centenas de pivôs centrais. reservas subterrâneas

O uso da foto de cima, me lembra os locutores dos telejornais, que durante o apagão elétrico de 2001, insinuavam que a culpa da redução forçada de 25% do consumo de energia das indústrias não era da falta de planejamento, mas sim culpa do povo brasileiro, “que gasta muita água sem necessidade”.

Enquanto esse julgamento era emitido, as cenas eram de uma dona de casa, lavando um carro com mangueira, na porta da garagem, vestida com um roupão, chinela havaianas e com “bobs” de enrolar o cabelo.

É notória, atualmente, a mesma maneira de passar uma impressão errada pela imagem, tirar proveito da falta de informação verdadeira, comprovada, assinada. Nunca vi os locutores da TV corrigirem seu erro e reconhecerem que o apagão aconteceu porque os governos Sarney, Collor, Itamar e FHC simplesmente proibiram a construção de novas hidrelétricas no Brasil. E ainda por cima, botaram a culpa no povo e nos órgãos de licenciamento ambiental.

Fernando Henrique, para resolver o problema de falta de novas hidrelétricas, que ele mesmo ajudou a criar, lançou o Programa Prioritário de Termoelétricas (PPT), no qual seriam empresas privadas a abastecer esse enorme mercado, criado pela falta da construção das primeiras pelas empresas do grupo estatal ELETROBRÁS.

E isso, apesar de ter sido alertado por professores e especialistas eméritos como Luiz Pinguelli Rosa, Ildo Sauer, Roberto D’Araujo e outros.

Ocorreu que as empresas privadas não compraram a ideia do PPT. E assim. quem teve que investir nas termoelétricas foram a Petrobrás, os familiares do ex-presidente Sarney e o grupo do chamado “rei do Gás”, Carlos Suarez, um dos donos da Construtora OAS, que terminaram livrando o Brasil do risco de passar por um novo apagão.

Com o PPT, Fernando Henrique e Lula, que herdou o programa em já em andamento, instalaram 14 GW dessas usinas termoelétricas fósseis, potência igual à de uma Itaipu, só que, produzindo energia dezenas de vezes mais cara do que nossa gigantesca binacional, com combustíveis importados e altamente poluentes.

reservas subterrâneas

O gráfico acima mostra as duas formas como ocorreu a aquisição de energia termoelétrica, entre 1976 e 2020, em percentuais do total adquirido.

Nele destaca-se que em 2004 e 2005, em barras vermelhas, devido ao racionamento e ao PPT, a expansão da capacidade total do sistema ocorreu em mais de 70% por meio de termelétricas fósseis e, em 2010, depois do leilão de 2008, essa expansão por térmicas, em barras laranja, chegou a 48%. Um aumento para lá de suspeito, quando se considera que ter existido um proposital bloqueio à construção de novas hidrelétricas.

reservas subterrâneas

Esse outro gráfico mostra o impressionante crescimento de 400% na potência total instalada de térmicas fósseis no Brasil entre 1996 e 2017. E claro, a mesma evolução ocorrendo nas emissões de gases de efeito estufa e particulados, sujando nossa matriz que era 85% limpa.

Já a foto da direita mostra o rio Itaguari, no Oeste da Bahia, onde as outorgas de água concedidas pela ANA foram tantas e de tal montante que o rio perdeu 90% de sua vazão.

Isso prova que as outorgas de água subterrânea para grandes projetos estão simplesmente consumindo quase toda a água dos aquíferos e lençóis freáticos. Não os pequenos agricultores.

Para piorar a situação, a água que cai do céu, sem hidrelétricas para reservá-la, vai direto para o mar e não alimenta as reservas subterrâneas. E assim, deixa de produzir infiltração suficiente que possa compensar o volume que a irrigação retira dos lençóis e dos aquíferos.

É evidente que, se essa água toda, que hoje é perdida indo direta para o mar, fosse armazenada nos lagos de alguns reservatórios, os fenômenos da percolação e da evaporação da maior superfície dos lagos formados iriam realimentar as nossas reservas subterrâneas.

Elas, as aguas, estariam fazendo aquilo que Guilherme Arantes diz, “voltando, humildes, para o fundo da terra”, como diz a linda sua canção de 1981, mas extremamente atual, “Planeta Água”.

As hidrelétricas tão combatidas ainda iriam nos permitir gerar energia elétrica à noite para complementar a energia solar e eólica que não funcionam nesse longo período de 16 horas, hoje produzida por termelétricas fósseis poluentes e muito mais caras.

As hidrelétricas pequenas, micro, mini, médias e grandes, nos permitem abastecer cidades, criar muito pescado, irrigar a agricultura com métodos muito mais eficientes e baratos do que o custoso pivô central, grande consumidor de energia.

Ao contrário do que afirmam os que criticam as hidrelétricas para estimular o investimento em outras fontes, a construção de novos reservatórios é extremamente benéfica a todas as fontes renováveis pois serve de bateria natural para elas além de fazer muito bem ao ambiente e às pessoas, por várias razões, mostradas aqui.

Para ter uma ideia da quantidade de água que é retirada para irrigação, a EMBRAPA mostra em seu site que, em 2017, por exemplo, esse valor representou 52% do total; já em 2016, foi igual a 46,2%. Esse valor varia muito entre as regiões hidrográficas. Por exemplo, em 2006, as outorgas para irrigação representaram em média 46,7% do total. Na região do São Francisco, elas representaram 68,2%. Já na Bacia do Rio Paraná, região que possui a maior capacidade instalada de geração de energia, existem 176 usinas hidrelétricas, inclusive Itaipu, Furnas, Porto Primavera e Marimbondo. Nessa bacia as outorgas para irrigação representaram apenas 21,9% do total.

Ao contrário do que diz o título da matéria, a água não está “acabando”, mas sim indo mais rápido para o mar do que poderia ir se não desmatássemos o solo para pastoreio e agricultura, ou usássemos as hidrelétricas para reservá-la, mitigando os efeitos da irrigação com água subterrânea, um recurso que nos possibilita alimentos mais baratos, menos gente passando fome, vivendo mal e ficando doente.

Alguém que pense um pouco não querer armazenar água doce, – que é algo que já falta no mundo todo -, é um completo absurdo. E provavelmente é isso que nos fará secar o planeta, pois deixar a chuva cair e não guardar a água, deixando-a correr para o mar, como se não tivesse valor algum é simplesmente patético. Ainda mais constatando que população brasileira dobrou entre 1980 e 2022!

Teimar o governo em não criar formas de armazenar água doce, ou em promover propositalmente o não aproveitamento do potencial hídrico e hidráulico da União, negando-se a usar água, seja para gerar energia, abastecer às cidades e às reservas subterrâneas do país, enquanto a população e o consumo de água e de energia crescem, só podem ser resultados de uma ingenuidade pueril. Ou de uma omissão que, um dia, poderia até mesmo, vir a ser considerada criminosa.

Ainda mais quando tal “proibição” de construção de hidrelétricas não existe em lei, mas nos é imposta por organizações ditas “não-governamentais” em sua maioria estrangeiras, subvencionadas por empresas do ramo de extração, produção e importação de combustíveis queimados por termelétricas fósseis.

A Terra é o nosso Planeta Água, e deve ser defendida por todos, desde que tudo seja pensado e planejado com ampla participação popular e não feito de qualquer jeito, cada um por si, como se o mundo não fosse de todos. E segundo a vontade de quem tenha mais dinheiro para comprar mais espaço publicitário e desacreditar às demais fontes de energia.

Nesse sentido, a promoção pelo governo federal de conferências nacionais de energia e recursos minerais a cada dois anos, preparadas nos estados e municípios, tal como existem as conferências nacionais de saúde, educação, meio ambiente, economia solidária, comunicação e assistência e mais sessenta outras, seria o caminho certo.

Precisamos que o planejamento do nosso crescimento econômico, social e energético, seja feito de forma estratégica, com uma prática cooperativa e não competitiva-agressiva, visando apenas o máximo lucro hoje, sem qualquer preocupação com o futuro dos nossos filhos e netos.

Fica para vocês, mais uma vez, o convite para ouvir “Planeta Água”. de Guilherme Arantes, música de 1981. Preste atenção à profética e magnifica letra. Saboreie a melodia emocionante. E pense bem no que está acontecendo à nossa volta.

Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni é engenheiro eletricista e de telecomunicações. Foi presidente da COPEL DISTRIBUIÇÃO, diretor de planejamento da COPEL SA, diretor do Instituto ILUMINA, membro da equipe do Instituto CIDADANIA que formulou as “Diretrizes do Setor Elétrico” da campanha presidencial de 2002 de Luiz Inácio Lula da Silva, fundador e primeiro presidente da ABRAPCH, associação brasileira de pequenas hidrelétricas, professor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, Secretário Adjunto de Transportes de Curitiba e membro do Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia.. Há 23 anos é diretor presidente da ENERCONS Consultoria em Energias Renováveis, responsável técnico por mais de 100 estudos e projetos de geração de energia hidrelétrica e eólica perante a ANEEL bem como 309 projetos de eficiência energética perante a mesma agência. Agraciado com a Medalha do Mérito da Engenharia do CREA PR e Láurea de Menção Honrosa do CONFEA por serviços prestados à Engenharia Nacional. Coautor dos livros “História de Eletrificação Rural no Brasil” (2015) e “Eletrificação Rural Comunitária” (1985), tendo na assessoria da presidência do conselho de administração da COPEL sido responsável pela redução dos custos do programa de eletrificação CLIC RURAL que entre 1985 e 1998 levou energia elétrica a mais de 200 mil agricultores familiares do Paraná.

Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni é engenheiro eletricista e de telecomunicações. Foi presidente da COPEL DISTRIBUIÇÃO, diretor de planejamento da COPEL SA, diretor do Instituto ILUMINA, membro da equipe do Instituto CIDADANIA que formulou as “Diretrizes do Setor Elétrico” da campanha presidencial de 2002 de Luiz Inácio Lula da Silva, fundador e primeiro presidente da ABRAPCH, associação brasileira de pequenas hidrelétricas, professor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, Secretário Adjunto de Transportes de Curitiba e membro do Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia.. Há 23 anos é diretor presidente da ENERCONS Consultoria em Energias Renováveis, responsável técnico por mais de 100 estudos e projetos de geração de energia hidrelétrica e eólica perante a ANEEL bem como 309 projetos de eficiência energética perante a mesma agência. Agraciado com a Medalha do Mérito da Engenharia do CREA PR e Láurea de Menção Honrosa do CONFEA por serviços prestados à Engenharia Nacional. Coautor dos livros “História de Eletrificação Rural no Brasil” (2015) e “Eletrificação Rural Comunitária” (1985), tendo na assessoria da presidência do conselho de administração da COPEL sido responsável pela redução dos custos do programa de eletrificação CLIC RURAL que entre 1985 e 1998 levou energia elétrica a mais de 200 mil agricultores familiares do Paraná.

 

 

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