terça-feira , 3 dezembro 2024
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TRF da 4ª Região mantém condenação de município paranaense que obriga a retirada de moradores de área de preservação permanente

“Os moradores da área de manguezal na Vila Guarani, no município de Paranaguá (PR) terão que deixar o local por ser área de preservação permanente. Na última semana, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) confirmou sentença que responsabilizou a prefeitura do município por ter permitido a urbanização do local, que é área de manguezal e deve ser preservada. A decisão também determinou que os ocupantes sejam realocados, as construções existentes desmanchadas e a área recuperada.

A 4ª Turma negou o recurso da prefeitura, que alegava ser o local de responsabilidade da União. O município também sustentava não tem verbas para cumprir a sentença.

De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), que moveu a ação em 2011, junto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), as ocupações na região datam da década de 1990 e prejudicam de maneira severa a área de mangue. Conforme o MPF, município não teria feito nada para impedir a moradia, possibilitando a urbanização do local ao permitir o fornecimento de água e luz.

Segundo a relatora do caso, desembargadora federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, a prefeitura adotou postura inerte e não exerceu seu poder de polícia administrativa, permitindo a instalação de serviços públicos em local ocupado ilegalmente. ‘Aferida a responsabilidade do município de Paranaguá pela ocupação irregular de área onde houve dano ambiental, deve o ente promover a realocação das pessoas que residem na área, sob pena de multa, além de providenciar a demolição da casa e a remoção do aterro‘”.

Fonte: TRF4, 17/03/2017.

Direito Ambiental

Confira a íntegra do julgado:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002156-63.2011.4.04.7008/PR
RELATORA
:
Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE
:
MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ
APELADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
:
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA
:
UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
INTERESSADO
:
JOSIAS PEDRO DA SILVA
ADVOGADO
:
MARCEL EIJI DE OLIVEIRA TAKIGUCHI

RELATÓRIO

Trata-se de ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal em face de Josias Pedro da Silva e Município de Paranaguá/PR, objetivando assegurar a integridade e a recuperação de área degradada, situada na Vila Guarani, naquela localidade.
Após regular processamento do feito, sobreveio sentença de parcial procedência, nos seguintes termos:
 
Ante o exposto, mantenho a liminar concedida e julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo Ministério Público Federal na inicial, resolvendo o mérito nos termos do art. 269, I do CPC, para condenar:
a) o Município de Paranaguá a realocar o réu e sua família em outro local, no prazo de 1 ano;
b) o réu Josias Pedro da Silva a se retirar do imóvel sob litígio, juntamente com sua família e seus bens, no prazo de 15 dias, contados da disponibilização de área pelo Município de Paranaguá para fixar moradia;
c) o Município de Paranaguá a desfazer as construções erigidas no local, colocando cercas e/ou outros obstáculos que impeçam o acesso e ocupação de outras pessoas, sob pena de fixação de multa diária em caso de descumprimento. Para tanto, concedo o prazo de 3 meses contados da retirada do réu Josias do local;
d) o Município de Paranaguá a apresentar no feito laudo ambiental após seis meses do início do cumprimento da recuperação do ambiente degradado, elaborado por técnico habilitado, o qual deverá ser submetido à aprovação do IBAMA, a quem incumbirá o acompanhamento a partir deste ponto.
Determino ainda a manutenção no local da placa de interdição já providenciada pelo Município de Paranaguá, até que a área seja ambientalmente recomposta.
Condeno os réus ao pagamento das custas processuais, pro rata. Contudo, suspendo a exigibilidade da verba com relação ao réu Josias Pedro da Silva em razão do benefício da justiça gratuita, que ora defiro.
Tendo em vista que o autor da demanda é o Ministério Público Federal, deixo de fixar honorários de sucumbência (STJ – AgRg no REsp 1386342/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/03/2014, DJe 02/04/2014).
Havendo apelação, presentes os pressupostos subjetivos e objetivos, notadamente a tempestividade e o preparo, os quais deverão ser verificados pela Secretaria, recebo, desde logo o recurso tão somente no efeito devolutivo, em razão da antecipação de tutela. Em seguida, deverá a parte recorrida ser intimada para manejo de contrarrazões, com a posterior subida dos autos ao e. TRF da 4ª Região.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Irresignado, o Município de Paranaguá/PR apelou. Sustentou que não foi o responsável pela instalação das famílias no local, tendo a União, em verdade, se omitido em seu dever de fiscalização. Afirmou que, como a área integra o patrimônio publico federal, não pode proceder à retirada dos moradores, cabendo àquela ingressar com a demanda reintegratória. Argumentou que não incorreu em qualquer ação/omissão que gerasse lesão ao meio ambiente. Ponderou que o deslocamento de residências e seus ocupantes reclama recursos, em observância à Lei de Responsabilidade Fiscal, e o seu plano orçamentário não contempla verba específica para esse fim. Ressaltou que eventual determinação judicial nesse sentido demandaria o remanejo de numerário de outras dotações. Requereu, assim, a reforma da sentença e a integração da União no polo passivo da lide, para fins de responsabilização pelos danos causados. Mantida sua condenação, defendeu a redução dos valores fixados a título de multa diária.
Apresentadas contrarrazões recursais, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.

VOTO

Uma vez que concordo totalmente com o entendimento adotado pelo Juízo a quo quando da prolação da sentença combatida, peço vênia e integro, nas razões de decidir do apelo, a fundamentação constante no referido decisum, assim vertida:
FUNDAMENTAÇÃO
Pretende o Ministério Público Federal a retomada e recuperação de área ambiental especialmente protegida (APP – Área de Preservação Permanente), a qual, segundo relata, foi invadida pelo autor, que erigiu construções no local e fixou moradia, juntamente com sua família. Atribui a responsabilidade pelos danos ambientais diretamente ao réu Josias Pedro da Silva, por ter erigido construção e ocupado a área, e ao Município de Paranaguá, por sua inércia em impedir a invasão.
Primeiramente, há que se destacar que as áreas de manguezais são áreas de preservação permanente nos termos do art. 2º, ‘f’ do Código Florestal – Lei 4771/65, c/c arts. 1º, e 3º da Resolução CONAMA nº 303/2002, somente podendo ser utilizada em casos excepcionais de utilidade pública e interesse social.
Tratam-se de áreas de relevantíssimo papel ambiental, na medida em que, consoante bem pontuado na informação nº 0299/2008 do SETEC/PR a partir do levantamento realizado em 30/10/2007 na Rua Antonio José Santana Lobo (evento 1, INQ2, pág.11 e ss):
‘…os manguezais estão entre os ecossistemas mais importantes, principalmente devido ao fato de serem berçários naturais, criadouros e abrigos de muitas espécies, tanto daquelas características desses ambientes, como para peixes e outros animais, inclusive de alto mar. Várias das espécies que ali vivem e outras, que utilizam a área como berçário, são utilizadas na alimentação humana, representando significativa fonte de alimentos, constituindo significativa fonte de proteínas de alta qualidade. Os mangues produzem a maior parte do alimento que o homem captura no mar.
A vegetação de mangue desempenha também importante papel na fixação das margens de baías, enseadas, rios, lagoas, reentrâncias costeiras ou diretamente em áreas expostas diretamente à linha da costa, impedindo assim a erosão.’ (grifou-se)
Portanto, áreas de mangue como a apresentada no presente feito deve ser objeto de proteção por todas as esferas de poder, e não só pela detentora do domínio sobre a área, conforme bem exposto na decisão que antecipou parcialmente os efeitos da tutela (evento 18).
Contudo, restou comprovado no feito que, infelizmente, o dano ambiental apontado pelo Ministério Público Federal é inequívoco e de razoáveis proporções, tendo sido devidamente documentado no inquérito policial apresentado no início da lide, como se observa na informação do SETEC/PR acima mencionada:
‘… o dano provocado é maior do que aquele provocado apenas pelas duas construções; que, na realidade, em torno das mesmas havia uma série de outras, todas elas em Área de Preservação Permanente de Manguezal (Resolução CONAMA 303/2002). Na verdade, verifica-se que os fatos objetos dos laudos citados não são fatos isolados, mas o avanço urbano sobre o manguezal. Extensões dessa categoria de área protegida haviam sido aterradas e sobre estes aterramentos foram feitos arruamentos e edificações…
(…)
No final da Rua Antonio José Lobo (Vila Guarani) pode ser vista uma parcela de manguezal em início de ocupação (figura 3). Já, na Rua São Paulo, a situação é diversa, tendo o aterro ido até as margens do rio Emboguaçu. A figura 4 mostra o aterramento feito até a margem deste rio e manguezal do lado.
(…)
Além dos danos por supressão da vegetação do mangue, com consequente diminuição do habitat para várias espécies e posterior aterro, foi observado também o despejo de esgoto doméstico diretamente no mangue (exemplificado nas figuras 5 e 6), estando estes dois fatores entre aqueles que causam importantes alterações nas propriedades do manguezal.
Esclarece-se que o dano não se limita às duas ruas citadas nos laudos e nas ilustrações aqui apresentadas, mas estendem-se a ruas próximas às duas mencionadas, constituindo avanço urbano sobre o manguezal.
(…)
Neste caso específico, a recuperação da área não deve se ater ás edificações examinadas isoladamente. Por esta razão a mensuração econômica do dano perpetrado deveria se estender ao dano ambiental provocado em toda a extensão de manguezal que foi aterrada para construção de edificações.'(evento 1, INQ2, pág. 11; INQ4, pág.02 e ss – grifou-se)
Note-se que os dados levantados no âmbito do IPL nº 026/2009 (2009.70.08.000451-3) não foram questionados por qualquer dos réus quanto ao seu valor probante, nem foi produzida qualquer contraprova que os invalidasse, sendo, portanto, suficiente à comprovação dos danos relatados na inicial.
Diante desse quadro, é imperativo que se avie providências no sentido de recompor o meio ambiente, trazendo-o o mais próximo possível ao status quo ante. Tal responsabilidade, por certo, incumbe aos causadores da lesão ao meio ambiente, nos termos do art. 3º, II e IV da Lei nº 6.938/81, os quais definem como poluidor ‘a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental’, sendo esta definida como ‘a alteração adversa das características do meio ambiente’.
Contudo, não se pode desconsiderar uma relevante questão que subjaz à presente discussão: o direito constitucional à moradia, corolário do princípio da dignidade humana, o qual, assim como a proteção ao meio ambiente, também tem assento constitucional.
Neste sentido, como bem se observou por ocasião da decisão que antecipou os efeitos da tutela, embora a presente ação tenha sido dirigida apenas ao réu Josias Pedro da Silva e sua família, trata-se apenas da ponta do iceberg de uma realidade bem mais complexa, na medida em que, conforme consta do IPL que instruiu a inicial, à época foram identificadas pelo menos 19 famílias na região, de maneira que a solução definitiva para a questão ultrapassaria a esfera individual.
Tal fato é observável inclusive logo no início IPL anexo à peça vestibular, o qual foi instaurado para apurar o ‘avanço desenfreado de comunidades inteiras sobre áreas de preservação permanente (mangues) nas regiões de Vila Guarani e Vila do Povo, ambas em Paranaguá/PR’ (evento 1, INQ2, pág. 3), fato confirmado posteriormente na já citada informação do SETEC/PR, segundo a qual não são fatos isolados; antes, decorrem do avanço urbano sobre o manguezal, o que já vem acontecendo pelo menos desde 1994.
Ainda, tratando especificamente do caso em tela, há que se registrar que o réu Josias, quando ouvido no IPL, relatou que mora na localidade há aproximadamente 20 anos, juntamente com duas crianças, auferindo renda de R$ 150,00 mensais com sua atividade de catador (evento 1, INQ9, pág.04 e 05). Em sua manifestação preliminar afirmou que ‘reside no imóvel há mais de 06 (seis) anos, quando da sua aquisição a custo relativamente baixo, por não haverem condições econômicas suficientes para sua moradia e instalação em área diversa’. Anexadas a sua petição constam faturas de água e luz, o que, aliado a certidão da oficiala de justiça que narra que o imóvel está localizado onde chega o asfalto, demonstra que a área já está completamente urbanizada. (evento 8, CERT1)
Como se observa, o réu, assim como os demais ocupantes, ostenta situação econômica bastante precária, cabendo-lhe ainda sustentar sua família com seus parcos recursos, e que, pela mais absoluta falta de opção, acabou por optar pela alternativa que lhe pareceu mais viável à época, qual seja, invadir o local protegido, a fim de ter um teto para abrigar-se juntamente com seus filhos.
A carência das pessoas que ali se instalaram foi verificada inclusive pelos agentes da Polícia Federal que inspecionaram a área, conforme constou do despacho proferido pelo Delegado que presidiu o inquérito, nos seguintes termos: ‘…haja vista a extrema carência verificada no local pelos agentes de polícia federal os quais relataram que as pessoas ocupantes daquela área não têm condições econômicas de se deslocarem até esta descentralizada para prestarem esclarecimentos, expeça-se memorando ao SO solicitando aos servidores que providenciem a entrevista aos moradores…’ (evento 1, INQ6, pág.10 – grifou-se)
Neste ponto, surge inquestionável a responsabilidade do Município de Paranaguá que, em detrimento de sua obrigação de organizar a ocupação urbana, e à revelia da proteção conferida por lei às Áreas de Proteção Permanente – APP, omitiu-se quando foram iniciadas as ocupações, chegando mesmo a incentivá-las, na medida em que viabilizou – ainda que por omissão – o acesso aos serviços fornecimento de água e luz. Tal incentivo, inclusive, foi confirmado pela própria Secretaria Municipal de Urbanismo (evento 1, INQ12, pág. 5), que exarou o seguinte parecer administrativo:
‘Nas décadas de 80 e 90, o Brasil sofreu um grande número de ações de invasão, muitas delas incentivadas pelo poder legislativo municipal. Essas invasões ‘em massa’ já não acontecem com frequência, mas é IRREAL supor que qualquer órgão possa impedi-las, quando muito, segurá-las por um período. Aqui afirmamos que Prefeituras, Órgãos Ambientais Estaduais e federais e o próprio Patrimônio da União, proprietário das áreas citadas neste processo, não possuem efetivo capaz de patrulhar o município em toda a sua extensão. Por outro lado, por muitos anos não houve no país uma política de planejamento e a urbanização foi acontecendo de forma excludente, relegando a população de baixa renda aos ‘imóveis’ sem valor legal.
Ora, onde locar essa população? Diante da fragilidade ambiental de nosso município, essas ocupações irregulares vem causando danos sistemáticos ao meio ambiente.
Para reduzir o déficit habitacional e criar áreas propícias para a habitação de interesse social, na gestão do prefeito José Baka Filho, desde 2005 e em ordem cronológica, algumas medidas foram tomadas:
1. Criação da estrutura de Regularização Fundiária;
2. Capacitação constante de técnicos na busca de verbas federais através do Ministério das Cidades, que tem aprovado e repassado verbas para inúmeros projetos de habitação e recuperação ambiental
3. Elaboração do PDDI – Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado e Zoneamento Ecológico/Econômico que trouxe instrumentos urbanísticos que auxiliam na redução do déficit de moradias e áreas, de acordo com o Estatuto das Cidades;
4. Elaboração de PLHIS – Plano Local de Habitação de Interesse Social, que utiliza os instrumentos citados na busca de garantir o direito constitucional de ‘moradia’. (evento 1, INQ12, pág. 9)
Respondendo de forma objetiva os questionamentos do Sr. Delegado da Polícia Federal:
1. NÃO PERMITIMOS A OCUPAÇÃO das áreas citadas, apenas não conseguimos contê-las;
2. O responsável pelas ocupações desordenadas é o Governo Federal, pelos motivos já expostos acima, que permitiu a política fundiária de grandes glebas nas mãos de uns poucos durante séculos de colonização e história urbana.’
(evento 1, INQ12, pág. 9 – grifou-se)
Neste ponto, é oportuno reproduzir parcialmente o relatório do ilustre Delegado da Polícia Federal Michael de Assis Fagundes, assentado no IPL que instruiu o presente feito:
‘…a resposta exarada não é das mais felizes, primeiro porque a Constituição Federal impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender o meio ambiente ecologicamente equilibrado, este considerado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, assim sendo, diante do caso concreto, devidamente comunicado à autoridade competente, não cabe a ela ‘lavar as mãos’ e simplesmente declarar em ‘caixa alta’ que NÃO PERMITIMOS A OCUPAÇÃO!!!
E ainda transferir a responsabilidade para o Governo Federal da ocupação ocorrida na área de preservação permanente do Município de Paranaguá, também não se coaduna com a responsabilidade solidária e objetiva imposta a todos diante de uma afronta ao meio ambiente, que merece ser preservado para as presentes e futuras gerações, por isso, em razão do valor fundamental que representa, o legislador permitiu uma tríplice reação no ordenamento jurídico, nos âmbitos cível, administrativo e criminal, para que não assistamos passíveis a essas e outras formas de abusos ocorridos em pleno século XXI, conforme bem revelou a informação nº 299/08 do SETEC/SR/DPF/PR.’ (evento 1, INQ12, pág. 13 e INQ13, pág. 1 e 2)
Portanto, é inquestionável a responsabilidade do Município de Paranaguá pelos danos ambientais causados em razão da ocupação irregular na Vila Guarani, na medida em que se manteve historicamente inerte diante do avanço urbano sobre áreas ecologicamente sensíveis. Permitiu a invasão e a ocupação durante anos a fio, nos quais houve sucessão de moradores, que iam transferindo seus ‘direitos’, na maior parte das vezes de forma onerosa, a outras pessoas que, por sua simplicidade e pouca instrução, além da falta de opção, acabavam por aceitar tais negócios – alguns até mesmo registrados em cartório, conforme constou do IPL, chancelando a aparência de legalidade. Sendo assim, é inaceitável qualquer jogo de empurra entre as esferas de poder, quando à toda evidência o município tinha responsabilidade direta de conservar e fiscalizar área.
Neste sentido, há que se reproduzir os fundamentos da decisão que antecipou parcialmente os efeitos da tutela, na qual asseverou-se que ‘…sendo claras as disposições constitucionais que imputam ao município a responsabilidade por zelar pelo conservação adequada do meio ambiente, bem como pela ocupação ordenada do solo em sua extensão territorial, concluo pela legitimidade passiva do município de Paranaguá na presente demanda. (…)
Ainda:
‘Por fim, mesmo acolhendo o argumento de que os princípios da precaução/prevenção que regem o direito ambiental impõem a urgência nas decisões sob pena de inviabilizar a efetiva reparação dos danos causados, ao mesmo tempo entendo que a urgência no deferimento das medidas pleiteadas pelo Ministério Publico deve ser analisada em conjunto com as questões sociais já relacionadas nas petições dos réus da presente ação, bem como com o conflito de interesses constitucionalmente assegurados – direito à moradia x proteção ao meio ambiente.’ (evento 18)
Diante disto, ante a longa inércia dos diversos entes públicos que deveriam ter evitado os danos causados à região de mangue, considerando ainda as questões sociais envolvidas, as dificuldades econômicas dos moradores da região, bem como os trâmites burocráticos que o município tem que seguir para efetuar a remoção efetiva dos moradores das áreas afetadas, não vejo como determinar, em sede liminar, que a situação seja resolvida em apenas dois meses, como quer o MPF.’
Note-se que a retirada do réu ou dos demais ocupantes da área em que estão, sem que tenham um rumo certo para onde ir com seus bens, acabará por criar uma situação de perigo social inaceitável, pois o resultado prático de tal diligência seria colocá-los literalmente na rua, à própria sorte. Fazê-lo seria uma verdadeira afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, o qual, em última análise, é protegido pela própria legislação invocada pelo Ministério Público Federal.
Por outro lado, também não se pode olvidar que o réu já tinha ciência da irregularidade de sua ocupação pelo menos desde 19/07/2010 (evento 1, INQ9, pág. 5), não tendo tomado qualquer providência a respeito. Diante disso, mantê-lo na área seria perpetuar a lesão ao meio ambiente, senão aumentá-la, chancelando ainda a permanência dos demais no local. Não poderá, portanto, permanecer ali ad eternum, sob pena de conferir legalidade à situação de dano ambiental.
Diante de tais considerações, o que se observa é que a decisão a ser proferida no presente feito terá, além dos efeitos jurídicos que lhe são ínsitos, efeitos práticos: se o réu for mantido na área, os demais ocupantes se sentirão no direito de fazer o mesmo; se retirado, o efeito será pedagógico, na medida em que restará demonstrado que o Poder Público não está omisso em face às ocupações irregulares que tem acontecido historicamente na região de Paranaguá.
Por todo o exposto, deverá ser imposta ao réu a obrigação de deixar o local, levando consigo sua família e seus pertences. Antes, porém, deverá o Município de Paranaguá providenciar outra área para alocá-lo juntamente com sua família. Até lá, o réu poderá permanecer na área, nos mesmos termos e condições em que foi autorizado por ocasião da decisão que antecipou a tutela.
Ao Município de Paranaguá incumbirá, portanto, a obrigação de, no prazo de um ano, encontrar um local para assentar o réu juntamente com sua família. Em seguida, deverá desfazer as construções e recompor ambientalmente a área em questão.
Efetivamente, a responsabilidade civil por danos ao meio ambiente é de natureza objetiva e encontra respaldo no art. 225, § 3º da Constituição Federal, no art. 14, § 1º, da Lei n.º 6.938/81, no art. 7º da Lei n.º 7.661/88, no art. 2º, § 1º, do Novo Código Florestal, e nos princípios do poluidor-pagador, da prevenção e precaução (STJ, 2ª Seção, REsp 1114398/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, julgado em 08/02/2012, DJe 16/02/2012):
RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DANOS DECORRENTES DO ROMPIMENTO DE BARRAGEM. ACIDENTE AMBIENTAL OCORRIDO, EM JANEIRO DE 2007, NOS MUNICÍPIOS DE MIRAÍ E MURIAÉ, ESTADO DE MINAS GERAIS. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. NEXO DE CAUSALIDADE.
1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados e c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado.
2. No caso concreto, recurso especial a que se nega provimento.
(STJ, 2ª Seção, REsp 1374284/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014 – grifei)
A região em que edificada a residência do réu é qualificada como terreno de marinha, por sofrer a influência da maré, e está situada em faixa litorânea, o que propicia a formação de vegetação conhecida como manguezal, objeto de especial proteção ambiental.
Nesse contexto, em se tratando de área de preservação permanente, conforme as conclusões do exame realizado in loco pelos agentes públicos (informação n.º 0299/08- SETEC/SR/DPF/PR) e fotografias juntadas aos autos, é indubitável que a edificação irregular causou degradação ambiental, porque, afora a supressão e aterramento dos manguezais, houve (e, supõe-se, ainda persiste) o indevido despejo direto de esgoto doméstico.
Ressalte-se que a informação que consta no laudo produzido pelo Setor Técnico-Científico da Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado do Paraná aponta para a ocorrência de dano ambiental na área de manguezal entre 1994 e 2007, o que induz a crer, em razão da urbanização desordenada, que tal impacto negativo no meio ambiente é progressivo.
Além disso, a obrigação de recompor o meio degradado é propter rem, inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes (ou possuidores) posteriores, ainda que não tenham sido os agentes da lesão ecológica.
Nesse sentido:
AMBIENTAL. DANO AO MEIO AMBIENTE. ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVA LEGAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELO DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. SÚMULA 83/STJ. FUNDAMENTO AUTÔNOMO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/SF.
1. A Caixa Econômica Federal sustenta que ‘as construções questionadas pelo Ministério Público como causadoras de danos ambientais não foram realizadas pela Caixa Econômica Federal, mas sim por terceiros que ocuparam a área muito antes da área ser transformada em uma APA- Área de Proteção Ambiental’. O STJ possui entendimento pacífico de que a responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade, como obrigação propter rem, sendo possível cobrar também do atual proprietário condutas derivadas de danos provocados pelos proprietários antigos. Incidência Súmula 83/STJ.
2. Já quanto à responsabilização do IBAMA/ICM-BIO, a Corte de origem entendeu que ‘o art. 1° da Lei 11.516/2007, que dispõe sobre a criação do referido Instituto, expressamente prevê sua atribuição no dever de adotar providências no sentido de coibir a pratica de danos ambientais, bem como de executar ações de conservação e proteção da área, in verbis: (…) Ainda, a Lei 6.938/1981 consagra em seu art. 2°, ser a recuperação das áreas degradadas um dos princípios da Política Nacional do Meio Ambiente’ (fl. 449, e-STJ).
3. Dessa maneira, como a fundamentação supra é apta, por si só, para manter o decisum combatido e não houve contraposição recursal sobre a aplicação do art. 2º da Lei 6.938/1981, aplica-se na espécie, por analogia, o óbice da Súmula 283/STF: ‘É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.’ 4. Recursos Especiais não conhecidos.
(STJ, 2ª Turma, REsp 1622512/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado em 22/09/2016, DJe 11/10/2016) 
Quanto à responsabilidade do Município de Paranaguá pelos danos ambientais gerados por seus munícipes, é razoável o argumento de que a União é o ente estatal legitimado para figurar no polo passivo da ação, nos termos do art. 23, incisos VI e VII, da Constituição Federal, e em especial pelo fato de ser área de domínio federal -, não bastando sua participação como mero assistente do órgão ministerial demandante.
Não obstante, considerando que o dever de proteger o meio ambiente é do Poder Público, em todas as esferas governamentais (art. 225 da CF), e eventual omissão do titular do bem público degradado não exime os demais entes estatais de sua responsabilidade (solidária), é de se admitir a possibilidade de ser demandado unicamente o Município pela ocupação irregular da área, uma vez que o litisconsórcio é facultativo, e não necessário:
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AMBIENTAIS E URBANÍSTICOS. OFENSA AO ARTIGO 535 DO CPC/73. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO OPOSTOS CONTRA O ACÓRDÃO LOCAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. TESES JURÍDICAS QUE NÃO FORAM SUBMETIDAS À DISCUSSÃO PERANTE O TRIBUNAL A QUO. SÚMULA 282/STF. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO INATACADOS. SÚMULA 283/STF. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
(…)
4. Reconhecida pelo Tribunal de origem a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário decorrente da análise da relação jurídica entre os interessados, a alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ.
5. ‘Em ações judiciais que visam ao ressarcimento de danos ambientais ou urbanísticos a regra é a fixação do litisconsórcio passivo facultativo, abrindo-se ao autor a possibilidade de demandar de qualquer um deles, isoladamente ou em conjunto, pelo todo.’ (AgRg no AREsp 548.908/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, SEGUNDA TURMA, DJe 30/06/2015) 6. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ, 1ª Turma, AgRg no AREsp 13.188/ES, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/06/2016, DJe 24/06/2016 – grifei)
PROCESSUAL CIVIL. REPARAÇÃO E PREVENÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS E URBANÍSTICOS. DESLIZAMENTOS EM ENCOSTAS HABITADAS. FORMAÇÃO DO POLO PASSIVO. INTEGRAÇÃO DE TODOS OS RESPONSÁVEIS PELA DEGRADAÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DESNECESSIDADE.
1. Hipótese em que a pretensão recursal apresentada pelo Município de Niterói se refere à inclusão do Estado do Rio de Janeiro no polo passivo da Ação Civil Pública que visa a reparação e prevenção de danos ambientais causados por deslizamentos de terras em encostas habitadas.
2. No dano ambiental e urbanístico, a regra geral é a do litisconsórcio facultativo. Segundo a jurisprudência do STJ, nesse campo a ‘responsabilidade (objetiva) é solidária’ (REsp 604.725/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 22.8.2005, p. 202); logo, mesmo havendo ‘múltiplos agentes poluidores, não existe obrigatoriedade na formação do litisconsórcio’, abrindo-se ao autor a possibilidade de ‘demandar de qualquer um deles, isoladamente ou em conjunto, pelo todo’ (REsp 880.160/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 27.5.2010). No mesmo sentido: EDcl no REsp 843.978/SP, Rel. Ministro Heman Benjamin, Segunda Turma, DJe 26.6.2013. REsp 843.978/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 9.3.2012; REsp 1.358.112/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28.6.2013.
3. Agravo Regimental não provido.
(STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp 432.409/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado em 25/02/2014, DJe 19/03/2014 – grifei)
Acresce-se que, afora sua omissão diante das edificações irregulares no local, o Município (1) tem o dever de proteger as áreas que se encontrem em seus limites geográficos, combatendo a destruição do meio ambiente, por meio de políticas públicas e controles eficazes, (2) é responsável por assegurar a ocupação ordenada do espaço urbano e, consequentemente, a alocação das famílias que serão desalojadas (art. 182 da CF), e (3) permitiu a instalação de serviços públicos, que viabilizaram a permanência dos ocupantes no local (como por exemplo, a ligação de água e luz etc.).
Com relação à ausência de previsão orçamentária para as medidas necessárias à realocação das famílias a serem retiradas do local, transcrevo trecho da manifestação do Ministério Público Federal em contrarrazões à AC nº 5002162-70.2011.4.04.7008, por pertinente: Os mesmos argumentos, ipsis litteris, já foram utilizados há mais de um ano atrás, durante a contestação, e provavelmente será usado também para outros eventuais recursos, mas, passado todo esse tempo, por que então o recorrente já não solicitou ao Poder Legislativo local a inclusão de dotação orçamentária para relocação das famílias?.
A par disso, tal alegação não restou comprovada.
Por fim, não merece provimento o pedido de redução do valor da multa diária, porquanto o montante definido mostra-se adequado e razoável para o caso.
Demonstrada a ilegalidade da construção, seja por atingir a vegetação de manguezal, seja pela falta de aforamento – já que tem a natureza de terreno de marinha -, impõe-se a confirmação da sentença pelos seus próprios fundamentos.
No mesmo sentido, os seguintes julgados deste Tribunal, proferidos em demandas similares relativas à mesma área geográfica:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TERRENO DE MARINHA E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. VEGETAÇÃO DE MANGUE. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS AO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÃO DE RECOMPOR O MEIO AMBIENTE DEGRADADO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO ENTRE MUNICÍPIO E A UNIÃO. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ. REALOCAÇÃO DAS PESSOAS QUE VIVEM NA ÁREA. 1. Plenamente possível o indeferimento da prova pericial, nos termos do art. 464, II, do CPC/2015, sem que isso represente ofensa à ampla defesa, eis que já houve constatação técnica que demonstra ser o local área de preservação permanente. 2. O Município restou inerte ante ocupação e construção irregular realizada no terreno integrante de Área de Preservação Permanente; não exerceu, portanto, seu Poder de Polícia Administrativa e permitiu a instalação de serviços públicos, como por exemplo, a ligação de luz no local ocupado ilegalmente. 3. A responsabilidade civil por danos ao meio ambiente encontra respaldo no art. 225, § 3º da Constituição Federal, que recepcionou o regime da responsabilidade objetiva, independentemente de culpa, prevista pela Lei nº 6.938/81. 4. A região em que edificada a residência do réu é qualificada como terreno de marinha, eis que sofre a influência da maré. Além disso, por situar-se na região litorânea, propicia a formação da vegetação conhecida como manguezal, configurando-se como Área de Preservação Permanente e demonstrando a necessidade de sua preservação, vulnerada pelo impacto que a construção da moradia vem causando aos manguezais. 5. A obrigação de recompor o meio degradado é propter rem, inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes posteriores, ainda que não tenham sido autores da lesão ecológica. 6. A obrigatoriedade de se formar litisconsórcio é determinada pela lei ou pela natureza da relação jurídica. Assim, não se identificam os requisitos para formação do pretendido litisconsórcio necessário, pois a ação civil pública foi proposta com o único objetivo de impor ao Município uma série de providências pelas quais é responsável em razão de suas atribuições constitucionais, sendo indiferente a discussão acerca da propriedade da área em que supostamente ocorreu o dano ambiental e, portanto, descabida a pretensão de que a sentença atinja a esfera jurídica da União. 7. Aferida a responsabilidade do Município de Paranaguá pela ocupação irregular de área onde houve dano ambiental, deve o ente promover a realocação das pessoas que residem na área, sob pena de multa, além de providenciar a demolição da casa e remoção do aterro, medidas últimas estas a serem realizadas juntamente com o outro réu.   (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002153-11.2011.404.7008, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 30/11/2016) 
ADMINISTRATIVO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DANO. MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ. RÉU PARTICULAR. RESPONSABILIDADE. RECUPERAÇÃO AMBIENTAL. MANGUEZAIS. Mantém-se sentença que condenou o Município de Paranaguá à retirada de construções erigidas em APP, com a realocação das pessoas que residem na área, sob pena de fixação de multa diária em caso de descumprimento, bem como a apresentar laudo ambiental elaborado por técnico habilitado, a ser submetido à aprovação do IBAMA, condenando o réu particular a se retirar do imóvel sob litígio, juntamente com sua família e seus bens, em razão aos danos causados ao meio ambiente (manguezais). (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002161-85.2011.404.7008, 3ª TURMA, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 28/09/2016)
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
É o voto.

EMENTA

ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TERRENO DE MARINHA E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. VEGETAÇÃO DE MANGUE. MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ. VILA DO POVO E VILA GUARANI. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS AO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÃO DE RECOMPOR O MEIO AMBIENTE DEGRADADO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO ENTRE MUNICÍPIO E A UNIÃO. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO DE PARANAGUÁ. REALOCAÇÃO DAS PESSOAS QUE VIVEM NA ÁREA.
1. O Município restou inerte ante ocupação e construção irregular realizada no terreno integrante de Área de Preservação Permanente; não exerceu, portanto, seu Poder de Polícia Administrativa e permitiu a instalação de serviços públicos, como por exemplo, a ligação de luz no local ocupado ilegalmente.
2. A responsabilidade civil por danos ao meio ambiente encontra respaldo no art. 225, § 3º da Constituição Federal, que recepcionou o regime da responsabilidade objetiva, independentemente de culpa, prevista pela Lei nº 6.938/81.
3. A região em que edificada a residência do réu é qualificada como terreno de marinha, eis que sofre a influência da maré. Além disso, por situar-se na região litorânea, propicia a formação da vegetação conhecida como manguezal, configurando-se como Área de Preservação Permanente e demonstrando a necessidade de sua preservação, vulnerada pelo impacto que a construção da moradia vem causando aos manguezais.
4. A obrigação de recompor o meio degradado é propter rem, inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes posteriores, ainda que não tenham sido autores da lesão ecológica.
5. A obrigatoriedade de se formar litisconsórcio é determinada pela lei ou pela natureza da relação jurídica. Assim, não se identificam os requisitos para formação do pretendido litisconsórcio necessário, pois a ação civil pública foi proposta com o único objetivo de impor ao Município uma série de providências pelas quais é responsável em razão de suas atribuições constitucionais, sendo indiferente a discussão acerca da propriedade da área em que supostamente ocorreu o dano ambiental e, portanto, descabida a pretensão de que a sentença atinja a esfera jurídica da União.
6. Aferida a responsabilidade do Município de Paranaguá pela ocupação irregular de área onde houve dano ambiental, deve o ente promover a realocação das pessoas que residem na área, sob pena de multa, além de providenciar a demolição da casa e remoção do aterro, medidas últimas estas a serem realizadas juntamente com o outro réu.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 08 de março de 2017.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora

Direito Ambiental

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