quinta-feira , 28 março 2024
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Responsabilidade civil ambiental: TJGO aplica teoria do risco integral ao condenar empresa por queimada em Área de Preservação Permanente

“A Goiasa Goiatuba Álcool Ltda. foi condenada a restabelecer, em até seis meses, áreas de preservação permanente e de reserva local afetadas por incêndio, que teve início em sua propriedade. A decisão é do desembargador Carlos Escher, que manteve a sentença da juíza Sabrina Rampazzo de Oliveira, da 1ª Vara de Goiatuba.

A Goiasa interpôs apelação cível alegando que não há responsabilidade ambiental objetiva, por inexistir nexo causal ou omissão da empresa. Disse que incêndio só se alastrou para as áreas vizinhas devido à baixa umidade relativa do ar na data do incidente, e que empreendeu todas as medidas possíveis para combater o alastramento do fogo. A empresa aduziu que o incêndio foi acidental e imprevisível, o que afasta a responsabilidade objetiva em razão do caso fortuito ou de força maior.

O desembargador citou o parecer do procurador de Justiça Osvaldo Nascente Borges, o qual disse que restou demonstrado o dano ambiental, ‘evidenciado pela degradação ambiental ocorrida, comprometendo vegetação que compreende áreas de reserva legal e de proteção permanente, restando comprovada, consoante apontado pela douta sentença objurgada, a ineficiência no ato de conter o alastramento do incêndio’, configurando situação de responsabilidade objetiva, pela teoria do risco integral.

Dessa forma, Carlos Escher afirmou que o entendimento do Procurador de Justiça encontra guarida no posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, ‘no sentido da aplicabilidade da teoria da responsabilidade objetiva pelo risco integral em matéria ambiental’, consistindo na obrigação de reparar o dano causado”.

Fonte: Centro de Comunicação Social do TJGO (texto: Gustavo Paiva)/Imagem: IBAMA.

Leia a íntegra da decisão:

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 300845-09.2012.8.09.0067 (201293008451) DE GOIATUBA

APELANTE GOIASA GOIATUBA ÁLCOOL LTDA

APELADO MINISTÉRIO PÚBLICO

RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS ESCHER CÂMARA 4ª CÍVEL

 

EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. DELIMITAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. 1 – Em se tratando de dano ambiental, adota o ordenamento jurídico brasileiro a teoria do risco integral, tratando-se, portanto, de responsabilidade objetiva, não comportando discussão referente à culpa ou dolo do ofensor (art. 225, §§ 2º e 3º, da CF/88 c/c art 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81). 2. Consoante o STJ, a delimitação da área ambiental degradada pode ser levada a efeito quando do cumprimento da sentença, sendo permitida a condenação genérica (arts. 95 e 97 do CDC c/c art. 21 da Lei nº 7.347/1985). APELO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.

 

DECISÃO

 

Trata-se de recurso de apelação, interposto pela empresa GOIASA GOIATUBA ÁLCOOL LTDA, qualificada e representada, contra a sentença proferida nos autos da ação civil pública movida em desfavor da empresa recorrente pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, também qualificado e representado.

Busca a empresa recorrente a reforma da sentença de fls. 1801/1806, proferida pela MMª Juíza de Direito da 1ª Vara da comarca de Goiatuba, Drª Sabrina Rampazzo de Oliveira, pela qual julgou procedentes os pedidos formulados na exordial, para condenar a empresa insurgente à obrigação de fazer consistente no restabelecimento das áreas de preservação permanente e de reserva legal descritas na petição inicial ao seu estado anterior, correspondente ao momento antecedente à ocorrência do incêndio descrito nos autos, no prazo de 06 (seis) meses.

Defende a empresa apelante, em suma (fls. 1843/1879), ser necessária a reforma da sentença fustigada, porquanto a responsabilidade ambiental objetiva não deve ser reconhecida no caso em exame, uma vez inexistente o nexo causal entre qualquer conduta ou omissão da empresa insurgente e o incêndio noticiado nos autos, o qual só se alastrou para as áreas vizinhas ao seu imóvel em razão da baixa umidade relativa do ar na data do sinistro, tendo empreendido, outrossim, todas as medidas que se encontravam ao seu acesso para combater o alastramento do fogo com a maior rapidez possível.

Destaca, ainda, tratar-se de incêndio acidental e imprevisível, afastando a responsabilidade objetiva em razão do caso fortuito ou de força maior, e o fato de não se tratar de uma atividade de risco o plantio de cana-de-açúcar.

Sustenta, por derradeiro, ter restado comprovada nos autos a recuperação das áreas ambientais degradadas, e a iliquidez da sentença fustigada, uma vez não haver nos autos a medida da área e as árvores que eventualmente ainda não tenham se recuperado.

Elaborou, ao final, o seguinte pedido:

“Diante do exposto, requer a Apelante seja a presente conhecida e provida para que seja a ação julgada totalmente improcedente, uma vez que não se deve aplicar a responsabilidade objetiva.

Alternativamente, se se considerar a Apelante responsável, requer seja convertido o julgamento em diligência, a fim de se apurar a área a ser recuperada, ouvido, também, o órgão ambiental competente”.

O preparo devido é visto à fl. 1880.

Em sede de contraminuta à apelação, pugnou a parte recorrida, em suma, pelo improvimento do recurso interposto pela parte adversa (fls. 1902/1916).

Encaminhados os autos à douta Procuradoria de Justiça, seu ilustre representante, Dr. Osvaldo Nascente Borges, opinou pelo improvimento da apelação (fls. 1923/1928).

É, em síntese, o relatório.

Passo à decisão.

Entendo, de início, que deve ser negado seguimento à apelação em exame, nos termos do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, pelos fundamentos a seguir expostos.

Cinge-se a irresignação da empresa recorrente à sentença pela qual a ilustre magistrada de primeiro grau julgou procedentes os pedidos formulados na exordial, para condenar a empresa insurgente à obrigação de fazer consistente no restabelecimento das áreas de preservação permanente e de reserva legal descritas na petição inicial ao seu estado anterior, correspondente ao momento antecedente à ocorrência do incêndio descrito nos autos, no prazo de 06 (seis) meses.

Defende a empresa apelante, em suma (fls. 1843/1879), ser necessária a reforma da sentença fustigada, porquanto a responsabilidade ambiental objetiva não deve ser reconhecida no caso em exame, uma vez inexistente o nexo causal entre qualquer conduta ou omissão da empresa recorrente e o incêndio noticiado nos autos, o qual só se alastrou para as áreas vizinhas ao seu imóvel em razão da baixa umidade relativa do ar na data do sinistro, tendo empreendido, outrossim, todas as medidas que se encontravam ao seu acesso para combater o alastramento do fogo com a maior rapidez possível.

Destaca, ainda, tratar-se de incêndio acidental e imprevisível, afastando a responsabilidade objetiva em razão do caso fortuito ou de força maior, e o fato de não se tratar de uma atividade de risco o plantio de cana-de-açúcar. Sustenta, por derradeiro, ter restado comprovada nos autos a recuperação das áreas ambientais degradadas, e a iliquidez da sentença fustigada, uma vez não haver nos autos a medida da área e as árvores que eventualmente ainda não tenham se recuperado.

Tenho, desta feita, que a controvérsia versada nesta seara restou satisfatoriamente elucidada no parecer declinado pelo eminente Procurador de Justiça, Dr. Osvaldo Nascente Borges, o qual, em percuciente manifestação, bem assinalou o caminho a ser perfilhado para a resolução da contenda em apreço.

Destarte, com arrimo no art. 210, parágrafo único, do Regimento Interno desta Corte, acato o referido parecer ministerial como razões de decidir, transcrevendo abaixo alguns de seus trechos:

“(…)

Verifica-se, pelo lastro probatório coligido aos autos, demonstrado o dano ambiental, evidenciado pela degradação ambiental ocorrida, comprometendo vegetação que compreende áreas de reserva legal e de proteção permanente, restando comprovada, consoante apontado pela douta sentença objurgada, a ineficiência no ato de conter o alastramento do incêndio, configurando-se, pois, independentemente da comprovação da autoria, situação de responsabilidade objetiva, pela teoria do risco integral, nas balizas da Lei nº 6.938/81 e do art. 225, §§ 2º e 3º, da Carta Magna.

Desta forma, concretizados os elementos material e subjetivo, não há negar-se a prática de ato lesivo ambiental ensejador de reparação civil, como se vê dos seguintes julgados, in verbis:

(…) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE. 1. Havendo o magistrado considerado suficiente à formação de sua convicção o arcabouço probatório já constante dos autos, não há que se ter por cerceamento de defesa a decisão quanto ao imediato julgamento do feito, nos termos do artigo 330, I, do CPC. 2. A jurisprudência do STJ orienta no sentido de que, em se tratando de dano ambiental, a responsabilidade é objetiva. Dispensa-se portanto a comprovação de culpa, entretanto há de se constatar o nexo causal entre a ação ou omissão e o dano causado, para configurar a responsabilidade. Assim, independentemente da existência de culpa, o poluidor, ainda que indireto é obrigado a indenizar e reparar o dano causado ao meio ambiente. 3. A obrigação de reparação dos danos ambientais possui caráter propter rem, por isso que a Lei 8.171/91 vigora para todos os proprietários rurais, ainda que não sejam eles os responsáveis por eventuais desmatamentos anteriores. APELO IMPROVIDO. (TJGO, APELACAO CIVEL 288291-55.2007.8.09.0087, Rel. DES. CARLOS ESCHER, 4A CAMARA CIVEL, julgado em 04/12/2014, DJe 1689 de 12/12/2014) APELAÇÃO CÍVEL. AGRAVO RETIDO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. PROTEÇÃO MEIO AMBIENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RISCO INTEGRAL. NEXO CAUSAL. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE. MULTA COMINATÓRIA. REDUÇÃO QUANTUM. POSSIBILIDADE. CUMPRIMENTO OBRIGAÇÃO. EXIGUIDADE PRAZO. NÃO OCORRÊNCIA. 1 – Em se tratando de dano ambiental, adota o ordenamento jurídico brasileiro, nos termos do artigo 225, §§ 2º e 3º, da Carta Magna, bem como artigo 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, a teoria do risco integral, tratando-se, portanto, de responsabilidade objetiva, não comportando discussão referente à culpa ou dolo do ofensor. 2 – Não cabe denunciação da lide em ação civil pública quando ausentes os requisitos do artigo 70, do Código de Processo Civil, sendo inclusive, vedada quando cabível ação de regresso contra o responsável subjetivo, nas hipóteses em que se trata de responsabilidade objetiva. 3 – As atividades consideradas potencialmente causadoras de degradação ao meio ambiente dependerão de prévio licenciamento ambiental municipal e, somente poderá ser concedida, no caso do solicitante preencher os requisitos exigidos pela legislação de regência. 4 – Arbitrada a sanção administrativa pecuniária em montante considerado excessivo deve a mesma ser reduzida para se adequar aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 5 – Não se mostra exíguo o prazo fixado de 60 (sessenta) dias, para o cumprimento da obrigação, se a ação foi ajuizada há quase 3 (três) anos. RECURSOS CONHECIDOS, SENDO O AGRAVO RETIDO DESPROVIDO E APELAÇÃO CÍVEL PARCIALMENTE PROVIDA. (TJGO, APELACAO CIVEL 228952-39.2012.8.09.0137, Rel. DES. ALAN S. DE SENA CONCEICAO, 5A CAMARA CIVEL, julgado em 09/07/2015, DJe 1828 de 17/07/2015) (…)”.

O entendimento anteriormente expendido encontra guarida, outrossim, no posicionamento perfilhado pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no sentido da aplicabilidade da teoria da responsabilidade objetiva pelo risco integral em matéria ambiental, mesmo em se tratando de incêndios alastrados para áreas ambientais situadas em imóveis vizinhos, e da obrigação de fazer consistente na reparação ambiental, independente da especificação da área degradada na sentença, senão vejamos:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 594.629 – SP (2014/0262806-0) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO AGRAVANTE : NEUZA MARIA TOMAZ RIBEIRO AGRAVANTE : CARLOS ALBERTO RIBEIRO ADVOGADOS : MARCUS VINICIUS DA COSTA FERNANDES E OUTRO (S) BRUNA ARAUJO OZANAN AGRAVADO : USINA AÇUCAREIRA SÃO MANOEL S/A AGRAVADO : DIRETA – AVIAÇÃO AGRÍCOLA LTDA AGRAVADO : EGUALDADE PARTICIPAÇÕES S/A ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS DECISÃO (…). RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CONDENATÓRIA POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS E PATRIMONIAIS – INCÊNDIO INICIADO NA ÁREA DE PROPRIEDADE DO RÉU QUE ATINGIU O IMÓVEL RURAL DO AUTOR – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA – CORTE LOCAL QUE, AO RECONHECER A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL DO RÉU (ART. 3º, INC. IV E ART. 14, § 1º, DA LEI 6.938/81), CONDENA-O AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS, A SEREM QUANTIFICADOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE RÉ. DANOS AMBIENTAIS INDIVIDUAIS OU REFLEXOS (POR RICOCHETE) – RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA – APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 14, § 1º, DA LEI Nº 9.938/81, E, OUTROSSIM, EM VIRTUDE DA VIOLAÇÃO A DIREITOS DE VIZINHANÇA – RECONHECIMENTO DO DEVER DE INDENIZAR IMPUTÁVEL AO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. Pretensão ressarcitória deduzida com escopo de serem indenizados os danos decorrentes de incêndio iniciado em propriedade vizinha, ocasionado pela prática de queimada. Pedidos julgados improcedentes pelo magistrado singular. Sentença reformada pela Corte de origem, ao reconhecer a responsabilidade objetiva e solidária do proprietário do imóvel lindeiro pelos danos decorrentes do incêndio, ainda que praticado por terceiro (arrendatário ou gestor de negócios), tendo em vista a aplicação dos ditames da responsabilidade civil ambiental (…). (REsp 1145358/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/04/2012, DJe 09/05/2012) 4. Ante o exposto, nego provimento ao agravo. Publiquese. Intimem-se. Brasília (DF), 13 de outubro de 2014. Ministro Luis Felipe Salomão Relator (STJ – AREsp: 594629 SP 2014/0262806-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 16/10/2014) (destaquei).

ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO MUNICÍPIO DE ARACAJU, DA EMURB E DA UNIÃO AFASTADAS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. NÃO CONFIGURADO. DANO AMBIENTAL. COMPROVADO. DELIMITAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SENTENÇA MANTIDA. 1 a 4 Omissis (…). 5. O Superior Tribunal de Justiça assentou que a delimitação da área degradada pode ser levada a efeito quando do cumprimento da sentença, sendo permitida a condenação genérica, ex vi arts. 95 e 97 do Código de Defesa do Consumidor c/c art. 21 da Lei nº 7.347/1985. 6. Apelações desprovidas. (TRF-5 – AC: 720220124058500 , Relator: Desembargador Federal Frederico Koehler, Data de Julgamento: 30/01/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: 03/02/2014) (negritei).

Ante ao exposto, acolhendo o parecer do órgão ministerial atuante em segunda instância, nego seguimento à apelação ofertada, o que faço com fulcro no artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, mantendo inalterada, por estes e seus próprios fundamentos, a sentença fustigada, porquanto proferida em consonância com a jurisprudência dominante desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça.

Goiânia, 03 de dezembro de 2015.

Desembargador CARLOS ESCHER

RELATOR

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