sábado , 14 dezembro 2024
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Lei municipal sobre poluição sonora é julgada inconstitucional pelo TJRS

“Os Desembargadores do Órgão Especial do TJRS julgaram arguição de inconstitucionalidade que questionava legislação do Município de Torres que estabelece níveis de decibéis acima dos permitidos pela legislação federal e estadual, em inobservância à competência que lhe é conferida pela Constituição Federal.

Caso

A 22ª Câmara Cível do TJRS suscitou arguição de inconstitucionalidade ao Órgão Especial em razão do julgamento da apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público em face do Município de Torres, declarando inconstitucional o artigo 1º da Lei Municipal nº 3.586/2001, que estabelece níveis de decibéis que extrapolam os previstos na legislação federal e estadual, além de outras obrigações impostas ao Município.

Na ação, o MP alegou que o Município estaria descumprindo sua obrigação de fiscalizar os estabelecimentos comerciais que produzem excesso de ruídos.

Decisão

No TJ, o relator do processo foi o Desembargador Francisco José Moesch, que destacou que o art. 24, inciso VI, da Constituição Federal estabelece que os Municípios não dispõem de  competência concorrente para legislar sobre proteção ao meio ambiente e controle da poluição, sendo competência restrita da União, Estados e Distrito Federal.

Na Constituição Estadual, o art. 52, inciso XIV, afirma que os Municípios podem suplementar a legislação federal e estadual, no que couber. Porém, conforme o magistrado, este entendimento não se aplica ao caso.

‘Apesar de o Município deter competência para suplementar a legislação federal e estadual no que couber, não lhe é permitido legislar de forma a desrespeitar os limites impostos pelas normas hierarquicamente superiores, como aqui, onde o Município de Torres estabeleceu pela Lei nº 3.586/2001, níveis de decibéis superiores ao permitido em norma federal e estadual, legislando em flagrante inconstitucionalidade.’

Assim, à unanimidade, foi julgada procedente a ação para declararar a inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 3º da Lei nº 3.586/2001″.

Fonte: TJRS.

Direito Ambiental

Confira a íntegra do julgado:

Arguição de Inconstitucionalidade

 

Órgão Especial
Nº 70075952325 (Nº CNJ: 0359347-85.2017.8.21.7000)

 

Comarca de Torres
COLENDA 22 CAMARA CIVEL

 

PROPONENTE
MUNICIPIO DE TORRES

 

INTERESSADO
MINISTERIO PUBLICO

 

INTERESSADO

RELATÓRIO

Des. Francisco José Moesch (RELATOR)

Trata-se de incidente de arguição de inconstitucionalidade suscitado pela Colenda 22ª Câmara Cível, nos autos da ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face do MUNICÍPIO DE TORRES, cujo objeto era a condenação do ente municipal a obrigações de fazer e não fazer concernentes à poluição sonora, com a declaração, de forma incidental, da inconstitucionalidade parcial da Lei Municipal nº 3.586/2001.

Sustenta o órgão fracionário que embora pacífico o entendimento de que possível a alegação de inconstitucionalidade de determinada lei, em sede de ação civil pública, o mesmo só pode ocorrer a título de causa de pedir e não de pedido, como no caso. Assevera que houve pedido expresso de declaração, tendo a sentença declarado a inconstitucionalidade incidenter tantum, dos artigos 1º, 2º e 3º, da Lei Municipal nº 3.586/2001, que estabelece níveis de decibéis que extrapolam aqueles previstos na legislação federal sobre o tema, violando expressamente os artigos 24, VI, 30, II e 225 da Constituição Federal, legislando além de sua competência supletiva.

Os autos foram a mim redistribuídos, sendo determinada vista ao Procurador-Geral de Justiça, nos termos do art. 210 do Regimento Interno.

Sobreveio parecer do Procurador-Geral de Justiça pela procedência da presente arguição, para que declarada em sede de controle difuso, a inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 3º, todos da Lei Municipal nº 3.586, de 01 de novembro de 2001, do Município de Torres.

É o relatório.

 

VOTOS

Des. Francisco José Moesch (RELATOR)

Eminentes colegas.

A fim de evitar desnecessária tautologia, transcrevo o acórdão da Colenda 22ª Câmara, sob minha relatoria, que à unanimidade suscitou o presente incidente (fls. 3.133 a 3.144):

“Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MUNICÍPIO DE TORRES da sentença que julgou parcialmente procedente a ação civil pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO para:

“a) DECLARAR, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da integralidade do art. 1º, da Lei Municipal nº 3.586/2001, do Município de Torres/RS;

b) CONDENAR o Município de Torres à obrigação de não-fazer consistente na abstenção de concessão de alvarás de funcionamento a estabelecimentos comerciais capazes de evitar a propagação de ruídos para o seu exterior, de acordo com a Resolução do CONAMA nº 01/90 e NBR/ABNT nº 10.151;

c) CONDENAR o Município de Torres à obrigação de fazer consistente na cassação dos alvarás de funcionamento de todos os estabelecimentos comerciais que se utilizem de música ao vivo e/ou mecânica em suas atividades e que não possuam Projeto de Contenção Acústica implantado, projeto que deverá ser eficaz de molde a evitar a propagação de ruídos além dos limites previstos na NBR/ABNT nº 10.151 ou que, de qualquer forma, estejam produzindo poluição sonora, conforme constatado por órgãos de proteção ambiental mediante aferição de decibelímetro;

d) FIXAR multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para o caso de descumprimento, com base nos arts. 537 do CPC, e art. 12, §2º, da Lei nº 7.347/85, com prazo de 90 dias para implementação, contados da data da intimação do Município de Torres da presente sentença.”

Em suas razões recursais, o Município de Torres alega, preliminarmente, inadequação da via eleita, pois indevida a declaração incidental de inconstitucionalidade, em conformidade com o art. 97 da Constituição Federal e a Súmula Vinculante nº 10. Afirma a necessidade de interposição de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, demanda para a qual a autora não detém legitimidade, de acordo com o art. 95, §2º, da Constituição Estadual. Pede a extinção do feito com base no art. 485, VI, do CPC quanto à declaração de inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 3º da Lei Municipal nº 3.586/2001, suscitando o incidente de inconstitucionalidade ao Pleno desta Corte. No mérito, assevera a possibilidade do município legislar sobre os níveis de ruído e sons para fins de poluição sonora. Aduz a inexistência de prova de eventuais danos ambientais decorrentes de poluição sonora nos níveis autorizados pela norma municipal atacada, não se prestando os documentos produzidos unilateralmente pelo Parquet como prova técnica. Argumenta a impossibilidade de ser considerada prova os levantamentos realizados pela PATRAM, nos termos do art. 13 da Lei Federal nº 5.194/96. Frisa que os estabelecimentos capazes de atender às normas técnicas tem direito líquido e certo ao licenciamento de sua atividade. Quanto à determinação de projeto de contenção, menciona ser indevido, uma vez que é desarrazoado que o profissional que executa o projeto seja condenado a observar as normas que regem sua profissão, bem como que os níveis a serem observados para fins de poluição sonora, caso mantida a declaração de inconstitucionalidade da norma municipal, são aqueles constantes da NBR 10.151, não podendo ser exigida a observação de outros níveis e, ainda, é desnecessário que a sentença determine o uso de decibelímetro, já que é imposição da legislação técnica. Por fim, insurge-se contra a aplicação de astreintes, pois tal penalidade prejudica as finanças públicas e toda a coletividade que suportará o referido ônus, postulando seu afastamento. Requer o provimento da apelação (fls. 3102-3107)

Nas contrarrazões, refere o Ministério Público inicialmente, a necessidade de correção de erro material, a fim de corrigir o item “b’ da sentença para que conste “estabelecimentos comercial não capazes de evitar”. No que diz respeito à preliminar de reserva de plenário, sustenta que possui como destinatários os órgãos fracionários de 2º grau, para evitar a supressão de competência do Pleno ou Órgão Especial, não se aplicando à decisão proferida por juiz de 1º grau, que possui competência para, em controle difuso, conhecer do pedido de inconstitucionalidade em sede Ação Civil Pública. No mérito, defende a existência de elementos suficientes nos autos, que demonstram a ocorrência de dano ambiental em decorrência de excesso de ruídos na cidade de Torres, diante do funcionamento de casas noturnas e similares. Alega que os relatórios ambientais juntados, foram confeccionados por profissionais habilitados, agentes do Estado, a favor de quem milita a presunção de legitimidade dos atos administrativos. Destaca que os limites de decibéis estabelecidos pela legislação municipal, extrapolam, em muito, os limites fixados pela legislação federal, o que acarreta o reconhecimento da inconstitucionalidade (fls. 3121-3125). 

Neste grau de jurisdição, o Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e parcial provimento do apelo.

É o relatório.

(…)

O tema da poluição sonora está na ordem do dia. Estudos científicos comprovam que o ruído em excesso, além de causar lesões auditivas, acarreta problemas de saúde mental, contribuindo inclusive para o agravamento do estresse. Os sons produzidos pelo trânsito de veículos, construção civil, aparelhos domésticos, funcionamento de bares, “baladas” e outras fontes geradoras de barulho têm levado o Poder Público a tomar providências e estabelecer restrições à prática de atividades que causam poluição sonora. A medição dos ruídos é feita em decibéis e há estudos acerca dos limites que não poderiam ser ultrapassados, por serem prejudiciais à saúde e ao sossego público.

No que tange a bares e casas noturnas, não são poucos os casos que chegam ao Judiciário envolvendo a questão da perturbação ao sossego. A Constituição Federal assegura o livre exercício da atividade econômica, mas também a proteção à saúde e ao meio ambiente. Entendo que a liberdade do exercício da profissão não é absoluta, sujeitando-se a restrições em caso de colisão com outros direitos fundamentais consagrados na Constituição. O que se deve buscar é o equilíbrio, a ponderação, a compatibilização entre tais direitos. Deve-se lançar mão do método da ponderação de interesses, de modo a preservar o máximo de cada um dos valores em conflito.

A Constituição Federal fixa, no seu art. 127, caput, a organização do Ministério Público, atribuindo-lhe o rol dos direitos e interesses que deve proteger e defender. Dentre suas funções institucionais, o inciso III do art. 129 prevê a de “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

A Lei nº 7.347/85 disciplina a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, bem como a outros interesses difusos ou coletivos (art. 1º), tendo o Ministério Público legitimidade para propô-la (art. 5º, inciso I). Cabe ressaltar que foi o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) que ampliou o âmbito de incidência da Lei da Ação Civil Pública, ao determinar sua aplicação a todos os interesses difusos e coletivos.

No caso em tela, ao propor a presente ação civil pública em razão de poluição sonora, está o Ministério Público agindo em defesa do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. DIREITO AO SILÊNCIO. POLUIÇÃO SONORA. ART. 3°, III, ALÍNEA “E”, DA LEI 6.938/1981. INTERESSE DIFUSO. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

1. Hipótese de Ação Civil Pública ajuizada com o fito de cessar poluição sonora causada por estabelecimento comercial.

2. Embora tenha reconhecido a existência de poluição sonora, o Tribunal de origem asseverou que os interesses envolvidos são individuais, porquanto afetos a apenas uma parcela da população municipal.

3. A poluição sonora, mesmo em área urbana, mostra-se tão nefasta aos seres humanos e ao meio ambiente como outras atividades que atingem a “sadia qualidade de vida”, referida no art. 225, caput, da Constituição Federal.

4. O direito ao silêncio é uma das manifestações jurídicas mais atuais da pós-modernidade e da vida em sociedade, inclusive nos grandes centros urbanos.

5. O fato de as cidades, em todo o mundo, serem associadas à ubiqüidade de ruídos de toda ordem e de vivermos no país do carnaval e de inumeráveis manifestações musicais não retira de cada brasileiro o direito de descansar e dormir, duas das expressões do direito ao silêncio, que encontram justificativa não apenas ética, mas sobretudo fisiológica.

6. Nos termos da Lei 6.938/81 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), também é poluição a atividade que lance, no meio ambiente, “energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos” (art. 3°, III, alínea “e”, grifei), exatamente a hipótese do som e ruídos. Por isso mesmo, inafastável a aplicação do art. 14, § 1°, da mesma Lei, que confere legitimação para agir ao Ministério Público.

7. Tratando-se de poluição sonora, e não de simples incômodo restrito aos lindeiros de parede, a atuação do Ministério Público não se dirige à tutela de direitos individuais de vizinhança, na acepção civilística tradicional, e, sim, à defesa do meio ambiente, da saúde e da tranqüilidade pública, bens de natureza difusa.

8. O Ministério Público possui legitimidade para propor Ação Civil Pública com o fito de prevenir ou cessar qualquer tipo de poluição, inclusive sonora, bem como buscar a reparação pelos danos dela decorrentes.

9. A indeterminação dos sujeitos, considerada ao se fixar a legitimação para agir na Ação Civil Pública, não é incompatível com a existência de vítimas individualizadas ou individualizáveis, bastando que os bens jurídicos afetados sejam, no atacado, associados a valores maiores da sociedade, compartilhados por todos, e a todos igualmente garantidos, pela norma constitucional ou legal, como é o caso do meio ambiente ecologicamente equilibrado e da saúde.

10. Recurso Especial provido.

(REsp 1051306/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/10/2008, DJe 10/09/2010)

 

O Ministério Público ajuizou a presente ação civil pública em face do Município de Torres, alegando que o ente público não vem cumprindo com sua obrigação de fiscalizar os estabelecimentos comerciais que produzem excesso de ruídos, forte no art. 225, caput, e parágrafos, da Constituição Federal, e art. 1º, I, da Lei nº 7.347/85, constando dos pedidos, item ‘g’, a declaração incidenter tantum de inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 3º,  da Lei Municipal nº 3.586/2001 (fl. 55).

A douta sentença declarou a inconstitucionalidade incidenter tantum da integralidade dos arts. 1º, 2º e 3º, da Lei Municipal nº 3.586/2001, do Município de Torres, nos seguintes termos:

2.2.1. Declaração incidenter tantum de inconstitucionalidade do artigo 1º, e seus complementos (incisos, alíneas e parágrafos) da Lei Municipal nº. 3.586/2001. Tenho que deve ser declarada inconstitucional a integridade do artigo em comento.

Embora possua conteúdo conceitual as definições ali encartadas, como o que poderia se pensar em aplicar o princípio de interpretação conforme a constituição, mantendo-se o texto, e somente declarando a inconstitucionalidade das expressões “ou transgrida as disposições fixadas nesta Lei” (art. 1º, I, parte final) e “ultrapasse os níveis máximos fixados nesta Lei” (art. 1º, IX, c, parte final”), Canotilho1 ensina que “se os órgãos aplicadores do direito, sobretudo os tribunais, chegarem à conclusão, por via interpretativa, de que uma lei contraria a constituição, a sua atitude correcta só poderá ser a de desencadear os mecanismos constitucionais tendentes à apreciação da inconstitucionalidade da lei. Daqui se conclui que a interpretação conforme a constituição só permite a escolha entre dois ou mais sentidos possíveis da lei mas nunca uma revisão do seu conteúdo.2 A interpretação conforme à Constituição tem, assim, os seus limites na <<letra e na clara vontade do legislador>>, devendo <<respeitar a economia da lei>> e não podendo traduzir-se na <<reconstrução>> de uma norma que não esteja devidamente explícita no texto>>3. (cfr. Acs TC 254/92, in Acórdãos, 22, p. 83; 162/95, DR, I-A, 8-5)” (…) Por outras palavras: a interpretação conforme a constituição deve respeitar o texto da norma interpretanda e os fins prosseguidos através do acto normativo sujeito a controlo4”.

Assim, tendo sido a intenção do legislador municipal a alteração dos limites sonoros previstos na legislação federal, contrariando a sua atividade constitucional supletória, e atingindo o fundamento republicano da dignidade da pessoa humana, não há como se realizar interpretação conforme a Constituição, pois estaria o Poder Judiciário usurpando atividade legislativa, proferindo decisão que vai além do sentido resultante do texto e da finalidade da lei municipal, “pois uma lei pode ficar sem efeito, mas o concretizador da constituição continuará a ser o legislador ao qual será sempre possível elaborar leis em substituição das consideradas inconstitucionais.5” .

Destarte, ao legislar, o Município, ultrapassando os limites constitucionais suplementares previsto no art. 30, inciso II, da Constituição Federal de 1988, e atuando contra o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º. III, da Carta Maior, abrandando em caráter suplementar o exigido pela legislação federal em termos de emissão de fluidos sonoros, impingiu com a pecha da inconstitucionalidade os termos previstos na íntegra do art. 1º, da Lei Municipal nº. 3.586/2001.

2.2.2. Declaração incidenter tantum de inconstitucionalidade dos artigos 2º e e seus complementos (incisos, alíneas e parágrafos) da Lei Municipal nº. 3.586/2001.  A Resolução CONAMA 01/90 estabelece, no seu item III, que “São prejudiciais à saúde e ao sossego público, para os fins do item anterior aos ruídos com níveis superiores aos considerados aceitáveis pela norma NBR 10.152 – Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas visando o conforto da comunidade, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT”.

Assim, ao legislar, o Município, exorbitando de sua atividade supletória prevista nos art. 30, inciso II, da Constituição Federal de 1988, abrandando em caráter suplementar o exigido pela legislação federal, e maculando o princípio da dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, III, da Carta da República, tornou inconstitucionais os termos previstos art. 2º, incisos I e II, e §1º, da Lei Municipal nº. 3.586/2001.

2.2.3. Declaração incidenter tantum de inconstitucionalidade do artigo 3º, e seus complementos (incisos, alíneas e parágrafos), da Lei Municipal nº. 3.586/2001. É de ser declarado inconstitucional o inciso I do art. 3º por superar os limites constitucionais impostos pela atividade supletiva que deve exercer a municipalidade, pois lhe é vedado lançar normas que venham a transpor os limites dados pela regulamentação federal, liberalizando-os, e o inciso II do artigo 3º, por não prever qualquer tipo de limitação sonora protetiva estabelecida, cuja absoluta ausência significa verdadeira desproteção e, igualmente, inobservância do caráter suplementar a ser dado pelo Município de Torres/RS à legislação federal.

Assim, ao legislar, o Município, exorbitando de sua atividade supletória prevista nos art. 30, inciso II, da Constituição Federal de 1988, abrandando em caráter suplementar o exigido pela legislação federal, e ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, III, da Carta da República, maculou de inconstitucionalidade os termos previstos art. 3º, incisos I e II, da Lei Municipal nº. 3.586/2001.

 

É pacífico o entendimento de que é possível a alegação de inconstitucionalidade de determinada lei, através da ação civil pública, desde que a título da causa de pedir e não de pedido, caso em que o controle se dará de forma incidental (AgRg no Recurso Especial nº 1.367.971/RJ, Relator Ministro Humberto Martins. Segunda Turma do STJ. Data do Julgamento 12/05/2015).

Portanto, no presente caso, entendo que a questão deva ser submetida ao Órgão Especial desta Corte.

Com efeito, conforme se verifica no disposto no artigo 24, VI, da Constituição Federal, os Municípios não dispõem de competência concorrente para legislar sobre proteção ao meio ambiente e controle da poluição, competência restrita da União, Estados e Distrito Federal, o que, no âmbito estadual foi disciplinado pelo artigo 52, XIV, da Constituição Estadual, podendo os Municípios suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, por aplicação do artigo 30, II, da Constituição Federal.

 Nesse sentido, o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CIVIL E PROCESSO CIVIL. DIREITO DE VIZINHANÇA. POLUIÇÃO SONORA. LEI MUNICIPAL. LIMITES. RESOLUÇÃO DO CONAMA. PROVA. REDUÇÃO DE RUÍDO. AR-CONDICIONADO. AUSÊNCIA DO NECESSÁRIO PREQUESTIONAMENTO. OFENSA REFLEXA AO TEXTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO JÁ CARREADO AOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279/STF. 1. (…) 6. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE VIZINHANÇA. POLUIÇÃO SONORA. LEI MUNICIPAL. LIMITES. RESOLUÇÃO DO CONAMA. PROVA. REDUÇÃO DE RUÍDO. AR-CONDICIONADO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. MULTA DIÁRIA ASTREINTES. TÍTULO JUDICIAL. LUCROS CESSANTES INDEVIDOS. 1. A norma municipal fixa limites máximos que, na realidade, são superiores aos limites máximos fixados na resolução pelo órgão ambiental federal competente (Resolução nº 01/90 do Conama e NBR 10.152), devendo a última se sobrepor à norma local. 2. A perícia judicial comprovou que, no período da noite, a emissão de ruído decorrente do acionamento do aparelho de ar-condicionado do réu, ultrapassa o nível permitido para o período noturno. Assim, devem ser tomadas medidas para evitar tal efeito, por dizer respeito ao princípio da precaução, vigente no direito ambiental. 3. Havendo decisão interlocutória que, em antecipação de tutela, impôs obrigação de fazer mediante astreintes, essa pena pecuniária deverá ser determinada no título judicial, em relação à unidade temporal dessa multa (dia, semana ou mês) e a data a partir de quando devida, devendo ser fixada na decisão que julga definitivamente a demanda, caso haja elementos para assim o fazer. 4. Conforme o §6º, do art. 461 do CPC, o juiz pode revisar a periodicidade das astreintes de ofício, quando se mostrar desproporcional. 5. Não há lucros cessantes quando não há comprovação cabal de que o faturamento do autor restou consideravelmente diminuído por causa do ruído causado pelo ar-condicionado do réu. Deram parcial provimento ao primeiro apelo e, quanto ao segundo, desacolheram a preliminar e negaram provimento. Unânime.” 7. Agravo regimental desprovido. (AI 781547 AgR/RS, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Julgamento: 13/03/2012, Órgão Julgador:  Primeira Turma Publicação ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-064 DIVULG 28-03-2012 PUBLIC 29-03-2012.)

 

Assim, tem-se que a norma municipal, não pode transpor as normas hierarquicamente superiores, sob pena de inconstitucionalidade.

No caso dos autos, o Município, editou a Lei no 3.586/2001, que estabelece, no que importa:

 

“LEI Nº 3586/01, DE 01/11/2001.

(Regulamentada pelo Decreto nº 2/2007)

 

JOSÉ BATISTA DA SILVA MILANEZ, Prefeito Municipal de Torres, Estado do Rio Grande do Sul, em conformidade com o art. 93, inciso III, da Lei Orgânica do Município, faço saber que a Câmara Municipal de Torres APROVOU e eu sanciono e promulgo a seguinte Lei:

Capítulo I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art.1 o. Para efeitos da presente Lei, consideram-se aplicáveis as seguintes definições:

I – Poluição Sonora: toda emissão de som que, direta ou indiretamente, seja ofensiva ou nociva à saúde, à segurança e ao bem-estar da coletividade ou transgrida as disposições fixadas nesta Lei;

II – Meio Ambiente: conjunto formado pelo espaço físico e os elementos naturais nele contidos, até o limite do território do Município, passível de ser alterado pela atividade humana;

III – Som: fenômeno físico provocado pela propagação de vibrações mecânicas em um meio elástico dentro da faixa de freqüência de 16 Hz a 20 kHz e passível de excitar o aparelho auditivo humano;

IV – Ruído: qualquer som que cause ou tenda a causar perturbações ao sossego público ou produzir efeitos psicológicos e/ou fisiológicos negativos em seres humanos;

V – Pressão Sonora: diferença instantânea entre a pressão real e a pressão barométrica média medida em um determinado ponto do espaço e produzida por energia sonora;

VI – Nível de Pressão Sonora (NPS): avaliação quantitativa do som de um determinado meio, significando 20 (vinte) vezes o logaritmo de base 10 (dez) da proporção entre a pressão sonora medida e a pressão de referência 20 X 10-6 N/m2;

VII – Som Impulsivo: som de curta duração, com início abrupto e parada rápida, caracterizado por um pico de pressão de duração menor que u7m segundo;

VIII – Ruído de Fundo: todo e qualquer som que esteja sendo emitido durante o período de medições, que não aquele objeto das medições;

IX – Distúrbio por Ruído ou Distúrbio Sonoro significa qualquer som que:

a) ponha em perigo ou prejudique a saúde de seres humanos ou animais;

b) cause danos de qualquer natureza à propriedade pública ou privada;

c) possa ser considerado incômodo ou que ultrapasse os níveis máximos fixados nesta Lei.

X – Som Incômodo: toda e qualquer emissão de som medido dentro dos limites reais da propriedade da parte supostamente incomodada que ultrapasse em mais de 08 dB-A o valor do ruído de fundo;

XI – Nível Equivalente (Leq): o nível médio de energia do ruído, encontrado integrando-se os níveis individuais de energia ao longo de determinado período de tempo e dividindo-se pelo período, medida em dB-A;

XII – Decibel (dB): analiticamente, dez vezes o logarítimo decimal de razão entre duas quantidades de potência, sendo, portanto, uma medida adimensional de ganho;

XIII – Decibel dB-A: decibéis medidos na curva de ponderação A;

XIV – Som intermitente: é aquele que possui um tempo de duração menor que 15 minutos e superior a 0,25 segundos de variações maiores ou iguais a três dB;

XV – Zona sensível de ruído ou zona de silêncio: é aquela que, para atingir seus propósitos, necessita que lhe seja assegurado um silêncio excepcional;

XVI – Limite real da propriedade: um plano imaginário que separa a propriedade real de uma pessoa física, ou jurídica, de outra;

XVII – Vibração: movimento oscilatório transmitido pelo solo ou por uma estrutura qualquer, perceptível por uma pessoa;

XVIII – Estado de emergência: qualquer exceção de excepcionalidade, que possa ocasionar danos irreversíveis ao meio ambiente, à integridade física ou psíquica da população, ou a bens materiais;

XIX – Medidas de emergência: aquelas que visam evitar a ocorrência ou impedir a continuidade de um estado de emergência;

XX – Horários:

a) Diurno é aquele compreendido entre as 07(sete) horas e 19 (dezenove) horas dos dias úteis;

b) Vespertino, o compreendido entre as 19(dezenove) horas e as 22 (vinte e duas) horas;

c) Noturno é aquele das 22 (vinte e duas) horas às 07 (sete) horas.

Capítulo II
DOS NÍVEIS DE PRESSÃO SONORA

Art.2 o. Os níveis de intensidade de sons ou ruídos fixados por esta Lei, bem como o nível equivalente e o método utilizado para avaliação e medição, obedecerão as seguintes normas:

I – em zonas predominantemente residências 65 decibéis (65db), no horário compreendido entre 07:00 horas e 19:00 horas e de 60 decibéis (60 db) no horário compreendido entre 19:00 horas e 07:00 horas medidos na curva “A”;

II – em zonas comerciais ou aquelas em que pela Lei do Plano Diretor, nada se oponha, 85 decibéis (85 db) no horário compreendido entre 07:00 horas e 19:00 horas e de 80 decibéis (80 db) no horário compreendido entre 19:00 horas e 07:00 horas;

§1º – Independentemente do ruído de fundo, a medição dos níveis de som e ou ruídos será realizada dentro do domicílio ou estabelecimento prejudicado, com as janelas e portas fechadas, a distância de 01,50m (um metro e cinqüenta centímetros) da parede e à altura de 01,50m (um metro e cinqüenta centímetros) do solo;

§2º – A medição dos efeitos sonoros antes referidos deverá ser realizada, exclusivamente, por profissional habilitado para tal função, devendo o mesmo utilizar aparelho medidor de sons (decibelímetro), digital, com a etiqueta de aferição do INMETRO dentro do prazo de validade, devendo ser calibrado pelo profissional antes de cada medição e usado em posição estática;

§3º – Ao tempo da referida medição será obrigatório o acompanhamento da pessoa responsável pela emissão do som e ou ruído.

Art.3º Considerando que o Município de Torres está situada em zona de atividade predominantemente turística, e que os turistas buscam o lazer e o entretenimento, fica estabelecido que nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março de cada ano os horários limites para a emissão de sons e ou ruídos serão os seguintes:

I – Casas de comércio ou de diversões públicas como, bares, cafés, restaurantes, cantinas, hotéis ou assemelhados nas quais haja reproduções de números musicais por conjuntos, orquestras, instrumentos isolados ou aparelhos poderão funcionar no horário compreendido entre as 10:00 horas e 02:00 horas do dia seguinte, obedecendo aos limites de 85 decibéis (85 dB) estabelecidos nesta Lei, após este horário deverão adotar instalações adequadas e reduzir sensivelmente a intensidade de suas execuções ou reproduções, além de outras providências cabíveis, obedecendo ao limite de 80 decibéis (80 dB), estabelecidos nesta Lei, de modo a não perturbar o sossego da vizinhança;

II – Parques, praças e recreios onde haja reproduções de números musicais por conjuntos, orquestras, corais, bandas, instrumentos isolados ou aparelhos poderão funcionar no horário compreendido entre 10 horas e 02 horas do dia seguinte.

(…).”

 

Por sua vez, a Constituição Federal, no seu art. 225, caput, estabelece:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

A Lei nº 6.938/81, ao dispor sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, assim dispõe:

Art 3º – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

(…)

III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

 

E, ainda, regulamentando a matéria, a Resolução 01/90 do CONAMA e a NBR/ABNT nº 10.151/00, que dispõe expressamente sobre os limites de emissão de ruídos a serem obedecidos, apresentando os seguintes critérios de avaliação:

 

“6.1 Generalidades

O método de avaliação do ruído baseia-se em uma comparação entre o nível de pressão sonora corrigido Lc e o nível de critério de avaliação NCA, estabelecido conforme a tabela 1.

6.2 Determinação do nível de critério de avaliação – NCA

6.2.1 O nível de critério de avaliação NCA para ambientes externos está indicado na tabela 1.

6.2.2 Os limites de horário para o período diurno e noturno da tabela 1 podem ser definidos pelas autoridades de acordo com os hábitos da população. Porém, o período noturno não deve começar depois das 22 h e não deve terminar antes das 7 h do dia seguinte. Se o dia seguinte for domingo ou feriado o término do período noturno não deve ser antes das 9 h.

6.2.3 O nível de critério de avaliação NCA para ambientes internos é o nível indicado na tabela 1 com a correção de – 10 dB(A) para janela aberta e – 15 dB(A) para janela fechada.

6.2.4 Se o nível de ruído ambiente Lra, for superior ao valor da tabela 1 para a área e o horário em questão, o NCA assume o valor do Lra.

Tabela 1 – Nível de critério de avaliação NCA para ambientes externos, em dB(A)

 

Tipos de áreas Diurno Noturno
Áreas de sítios e fazendas 40 35
Área estritamente residencial urbana ou de hospitais ou de escolas 50 45
Área mista, predominantemente residencial 55 50
Área mista, com vocação comercial e administrativa 60 60 55
Área mista, com vocação recreacional 65 55
Área predominantemente industrial 70 60

 

Como visto, a lei municipal, fixou níveis de decibéis que desbordam a limitação prevista na legislação federal, ofendendo ao disposto nos arts. 24, VI, 30, II e 225, da Constituição Federal, pois legislando em flagrante desconformidade com sua competência.

 Neste sentido o seguinte precedente do Órgão Especial:

ADIN. SÃO BORJA. ART.131-F DA LC Nº 40 DE 6 DE AGOSTO DE 2007, QUE DISCIPLINA OS RUÍDOS SONOROS, PARA IGREJAS OU TEMPLOS, EM NÍVEIS SUPERIORES AOS DA ÓRBITA FEDERAL E ESTADUAL. TODA EMISSÃO DE RUÍDOS SONOROS, DE FORMA EXCESSIVA, AFETA A QUALIDADE DE VIDA E TRADUZ POLUIÇÃO AMBIENTAL. DIREITO CONSTITUCIONAL AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO E SAUDÁVEL. COMPATIBILIDADE DAS NORMAS. RESOLUÇÃO Nº 1/90 DO CONAMA, COM FORÇA DE LEI. COMPETE À UNIÃO ESTABELECER NORMAS GERAIS EM MATÉRIA DE MEIO AMBIENTE E CONTROLE DE POLUIÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 24, VI, §§1º E 4º DA CARTA FEDERAL. AUTORIZAÇÃO PARA LEGISLAÇÃO SUPLETIVA SOMENTE NO VÁCUO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL. EM MATÉRIA DE MEIO AMBIENTE E CONTROLE DE POLUIÇÃO NÃO HÁ PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE DO MUNICÍPIO. NORMATIVIDADE FEDERAL, DE CARÁTER GERAL, COMO PARÂMETRO RAZOÁVEL, À QUAL DEVEM ESTAR VINCULADAS AS NORMAS ESTADUAIS E MUNICIPAIS. BLOQUEIO DE COMPETÊNCIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS E SUA INTERPRETAÇÃO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFRONTA AOS ARTS. 24, VI, §§ 1º E 4º, 30, II E 225 ¿CAPUT¿ DA CARTA FEDERAL, ARTS. 8º E 250, “CAPUT” DA CARTA ESTADUAL E RESOLUÇÃO Nº 1/90 DO CONAMA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70024564536, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vasco Della Giustina, Julgado em 10/11/2008)

 O controle difuso de constitucionalidade permite a todos os órgãos do Poder Judiciário a confrontação de normas jurídicas em face da Carta Magna. Nos Tribunais, todavia, deve ser observado quorum qualificado, com competência privativa para tal averiguação. Trata-se da reserva de plenário, garantia insculpida no art. 97 da Constituição Federal:

Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

 Assim, evidenciada a existência de norma ou ato normativo violador da Constituição Federal ou da Constituição Estadual, seja por inconstitucionalidade formal (inobservância de procedimento e formas constitucionalmente previstos) ou material (contradição com o teor de texto constitucional), não resta alternativa ao órgão fracionário senão dar início ao incidente de inconstitucionalidade, sob pena de nulidade por error in procedendo, exceção prevista apenas no parágrafo único do art. 481 do CPC (quando a norma específica já houver sido submetida à análise do órgão especial).

O procedimento está previsto no Código de Processo Civil, arts. 948 e seguintes, e no Regimento Interno desta Corte:

Art. 209. Sempre que os órgãos fracionários do Tribunal se inclinarem pela inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo, determinarão a remessa do processo ao Órgão Especial.

Leciona o ilustre Des. Vasco Della Giustina (in “Controle de Constitucionalidade das Leis: Ação Direta de Inconstitucionalidade – Tribunal de Justiça e Município”, Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2006, p. 93/94):

 

“Cabe às partes interessadas, inclusive aos assistentes, propor o incidente ou alegar a matéria em defesa.

Também o Ministério Público, quer como parte, quer como custos legis está legitimado para propor a exceção.

Pode o magistrado tanto de primeiro quanto de segundo grau, de ofício, suscitar o incidente.

Neste sentido, preleciona o eminente processualista Humberto Theodoro Júnior que ‘qualquer processo sujeito a julgamento pelos tribunais enseja a argüição: recursos, causas de competência originária ou casos de sujeição obrigatória ao duplo grau de jurisdição’.

(…)

E continua o emérito professor:

‘A argüição é feita perante o órgão do tribunal encarregado do julgamento do processo (Turma ou Câmara). Esse órgão parcial não tem competência para declarar a inconstitucionalidade da norma impugnada e a irrelevância da argüição dos interessados. Assim, ‘se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento’ da causa (art. 481) E a decisão é irrecorrível’.

‘Mas se o órgão judicial der acolhida à argüição, o julgamento do feito será suspenso, lavrando-se acórdão e remetendo-se a questão ao Tribunal Pleno (art. 481), ou ao órgão especial que o representa.’

‘Quando o incidente tiver sido provocado pelas partes com a necessária antecedência, o Ministério Público já terá sido ouvido antes da sessão de julgamento. Mas quando suscitado no voto de algum juiz, na própria sessão, a decisão do incidente terá que ser adiada para cumprir-se o disposto no art. 480, que manda ouvir-se, previamente, o Ministério Público.” (Curso de Direito Processual Civil, vol. VII, p. 630/631)

 

O Des. Araken de Assis (in “Manual dos Recursos”, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2007) assim afirma:

 

No julgamento do recurso ou da causa, acontece de a parte alegar a inconstitucionalidade da lei, ou o órgão judiciário, ex officio, divisar vício dessa natureza na norma que lhe cumpre aplicar à espécie. O direito brasileiro consagra diversas modalidades de controle de constitucionalidade. E o mais antigo, inspirado no modelo norte-amerciano, consiste no controle difuso, segundo o qual compete ao órgão judiciário apreciar, incidenter tantum, a questão da constitucionalidade, arvorada em prejudicial em processo com outro objeto.

Tratando-se de realizá-lo no tribunal, na peculiaridade de sua atividade judicante, surge a necessidade de dotar a pronúncia da inconstitucionalidade de regulamentação especial. No segundo grau, com efeito, a declaração da inconstitucionalidade subordina-se à cláusula da reserva do plenário (full bench), prática prudencial norte-americana, introduzida no art. 179 da CF/1934 e hoje inserida no art. 97 da CF/1988. Somente pelo voto da maioria absoluta dos seus membros, ou dos membros do órgão especial (art. 93, XI, da CF/1988), o tribunal poderá pronunciar a declaração da inconstitucionalidade. Do incidente respectivo ocupam-se os arts. 480 a 482 do Capítulo II (Da declaração de inconstitucionalidade) do Título IX (Do processo nos tribunais) do Livro I.

É curioso que, subvertendo a hierarquia, aos juízes de primeiro grau seja dado proclamar a inconstitucionalidade, incidentalmente, mas nenhum componente de órgão fracionário do tribunal inferior ao órgão especial ou ao plenário, quer dizer, o sobrejuiz titular da câmara, turma, ou grupo ou seção, possa fazê-lo com idêntica liberdade, exceto quando já exista pronunciamento acerca da questão constitucional (art. 481, parágrafo único). Sucede que o entendimento oposto conduziria a consequências altamente indesejáveis, obrigando o órgão judiciário de primeiro grau a desrespeitar a Constituição e aplicar leis inconstitucionais. Por tais razões cristalizou-se a tese de que juízos monocráticos apreciam, irrestritamente, questões constitucionais, e, de outro lado, a repercussão intensa do pronunciamento dos tribunais impôs quórum qualificado. Em resumo, aos órgãos fracionários de menor estrutura dos tribunais (câmara, turma, grupo ou seção) só cabe rejeitar a argüição de inconstitucionalidade (art. 481, caput, primeira parte).

A regra do full brech exige uma técnica similar à do incidente de uniformização. Inclinando-se o órgão fracionário do tribunal a pronunciar a inconstitucionalidade, porque lhe é lícito rejeitá-la e prosseguir no julgamento, há de suspendê-lo, remetendo a causa ou o recurso ao órgão especial – vencido o incidente, retornam os autos ao órgão de origem, que completará o julgamento. A cisão da competência significa que o julgamento se realiza por etapas em órgãos distintos.

(…)

E qualquer integrante do corpo julgador da causa ou do recurso – relator, revisor ou vogal -, ex officio, pode suscitar o incidente de inconstitucionalidade. Toda questão de direito, qual a da constitucionalidade, submete-se à iniciativa oficial.

(…) Tratando-se, porém, de argüição ex officio, o relator suscitará a questão no momento em que o presidente lhe conceder a palavra para proferir o voto. É a ocasião propícia, de resto, para os sobrejuízes que se seguirem, na ordem de antiguidade, ao primeiro voto, na hipótese de o relator omitir a questão.

É admissível a alegação de inconstitucionalidade, ou sua suscitação, ex officio, nesses termos, desde o início do julgamento até a proclamação do resultado (art. 556).

(…) A deliberação do órgão fracionário funciona como simples juízo de verossimilhança da suposta inconstitucionalidade. Na verdade, põe-se em julgamento problema diverso – submeter-se, ou não, a inconstitucionalidade ao tribunal pleno (art. 481, caput, segunda parte, in fine).

(…)

Não raro acontece de o órgão fracionário ignorar o preceituado no art. 97 da CF/1988. Sem embargo de reconhecer e pronunciar a inconstitucionalidade, e, conseguintemente, não aplicar a norma controvertida, prossegue no julgamento, desprezando a cláusula da reserva do plenário. O acórdão se revela irremediavelmente nulo. Infringiu o art. 97 da CF/1988. Tal vício pode ser proclamado através de recuso extraordinário ou, transitando em julgado, de rescisória (art. 485, V). E, uma vez anulado o acórdão, retorna-se ao exame da questão de se submeter, ou não, ao plenário a inconstitucionalidade.”

 Impõe-se, pois, no presente caso, que seja suscitado incidente de inconstitucionalidade, a ser apreciado pelo Órgão Especial desta Corte.

Por fim, destaco que embora já tenha sido ajuizada Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre a Lei nº 3.586/2001, tal arguição deu-se somente em relação à Constituição Estadual, cuja ementa segue transcrita:

ACAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL QUE DISPOE SOBRE RUIDOS, SONS EXCESSIVOS OU INCOMODOS. E PERMITIDO AOS MUNICIPIOS, A TEOR DO ARTIGO 30, II, DA CONSTITUICAO FEDERAL, SUPLEMENTAR A LEGISLACAO ESTADUAL, QUANTO AOS LIMITES DE EMISSAO SONORA, DEFININDO OS PADROES ADEQUADOS AO INTERESSE LOCAL, ISTO E, ATENDIDAS AS PECULIARIDADES DE CADA MUNICIPIO. INEXISTENCIA DE VIOLACAO DO ARTIGO 8º DA CONSTITUICAO ESTADUAL. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS: ADIN 598448355 E 70000697003. ACAO JULGADA IMPROCEDENTE. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70004993143, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cacildo de Andrade Xavier, Julgado em 11/08/2003).

 Ademais, tal entendimento restou pacificado em sede de Recurso Especial nº 1.208.282, transitado em julgado (fls. 3030-3035):

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO SONORA. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. INTERESSE DE AGIR RECONHECIDO PELA CORTE DE ORIGEM.

COISA JULGADA AFASTADA. NORMAS NÃO CONTEMPLADAS NO AJUSTE. OBJETO DIVERSO. INVERSÃO DO JULGADO QUE DEMANDARIA O REEXAME DE PROVAS E DE CLÁUSULAS DO ACORDO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7/STJ.

1. A alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos e do termo de ajustamento de conduta, providências vedadas em recurso especial, conforme os óbices previstos nas Súmulas 5 e 7/STJ.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1208282/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 14/05/2015)

 Pelo exposto, suscito incidente de inconstitucionalidade, determinando a remessa dos autos ao Órgão Especial deste Tribunal.”

Pois bem.

Quanto à competência legislativa em matéria ambiental, prevê a Constituição Federal, no que pertine:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

(…)

VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

(…)

Art. 30. Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local;

II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

(grifei)

E, ainda, estabelece a Constituição Estadual:

Art. 52. Compete à Assembléia Legislativa, com a sanção do Governador, não exigida esta para o especificado no art. 53, dispor sobre todas as matérias de competência do Estado, especialmente sobre:

(…)

XIV – matéria prevista no art. 24 da Constituição Federal.

No âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, o Decreto Estadual nº 23.430, de 24 de outubro de 1974, dispõe sobre os limites de decibéis, no que importa:

Art. 131 – Ficam estabelecidos os seguintes níveis de sons e ruídos permitidos de acordo com o horário de atividade:

a) “Horário Noturno” – até 30 dB (trinta decibéis) medidos na curva “A” do medidor de intensidade de som (decibelímetro);

b) “Horário Diurno” – até 60 dB (sessenta decibéis) medidos na curva “B” do medidor de intensidade de som.

Parágrafo único – A medição dos níveis de sons incômodos e ruídos será feita dentro do domicílio ou estabelecimento prejudicado, com as janelas e portas fechadas, e à distância de 1,00 m (um metro) da parede.

Art. 132 – As exigências contidas nos artigos anteriores não dispensam os estabelecimentos de cumprirem os dispositivos legais exigidos por outras autoridades fora da área da Saúde Pública.

Como já referido, apesar de o Município deter competência para suplementar a legislação federal e estadual no que couber, não lhe é permitido legislar de forma a desrespeitar os limites impostos pelas normas hierarquicamente superiores, como aqui, onde o Município de Torres estabeleceu pela Lei nº 3.586/2001, níveis de decibéis superiores ao permitido em norma federal e estadual, legislando em flagrante  inconstitucionalidade.

Nesse alinhamento, a jurisprudência deste Órgão Especial, em situações semelhantes:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL QUE ESTABELECE LIMITE DE EMISSÃO SONORA PARA EQUIPAMENTOS DE SOM USADOS EM VEÍCULOS EM NIVEL MÁXIMO SUPERIOR AO PERMITIDO EM NORMA ESTADUAL. INSCONSTITUCIONALIDADE. Os Municípios detêm competência suplementar para legislar sobre matéria relativa ao meio ambiente e poluição, nos casos de omissões ou lacunas e para atender ao interesse local. Precedentes. Caso em que a Lei Municipal n. 4.889/2011 desborda da competência suplementar ao instituir limite de emissão sonora superior ao permitido em norma estadual, estabelecendo forma diversa de medição. Inconstitucionalidade por ofensa aos artigos 8º e 52, XIV da Constituição Estadual, conjugados com os artigos 24, VI, 30, II e 225 da Constituição da República. Precedentes. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70058961145, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 26/01/2016).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE ALEGRETE. LEI MUNICIPAL QUE DISPÕE SOBRE OS NÍVEIS DE RUÍDO PARA FINS DE CONTROLE DA POLUIÇÃO SONORA. INOBSERVÂNCIA DA RESOLUÇÃO Nº 1/90 DO CONAMA, QUE ESTABELECE OS CRITÉRIOS GERAIS. AFRONTA AO ART. 8º DA CE-89 E AO ART. 225 DA CF-89, O QUE AUTORIZA O MANEJO DA PRESENTE DEMANDA. 1. O cerne da inconstitucionalidade da Lei – Alegrete nº 4.451, de 26JAN10 está na sua afronta aos artigos 8º, caput e 52, XIV, da CE-89, combinados com os artigos 24, VI, §§ 1º a 4º; 30, II; e 225, da CF-88. 2. Os limites de emissão ruído para controle da poluição do meio ambiente estão previstos na Resolução – CONAMA nº 1/90, que é um instrumento normativo que regulamenta o tema, estribado no art. 1º da Lei nº 7.804/89 e nos arts. 23, VI e 225, da CF-88. A par disso, a legislação municipal não pode desbordar os limites conferidos pela norma regulamentadora, relativamente aos níveis de emissão de ruído por clubes e entidades sociais nos dias de Carnaval, caso dos autos. 3. O Município não pode, em nome do interesse local, desbordar dos parâmetros gerais. A União editou norma de caráter geral regulamentando a questão da emissão ruído para controle da poluição do meio ambiente (Resolução – CONAMA nº 1/90), que dispõe sobre critérios de padrões de emissão de ruídos decorrentes de quaisquer atividades industriais, comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de propaganda política. Esta resolução estabeleceu as normas gerais a serem observadas, pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, quando da regulamentação da matéria, adotando as normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT previstas na NBR 10.151 e na NBR 10.152. 4. No âmbito estadual, o art. 52, XIV, da CE-89 determina que cabe à Assembléia Legislativa, com a sanção do Governador, não exigida esta para o especificado no art. 53, dispor sobre todas as matérias de competência do Estado, especialmente sobre aquelas previstas no art. 24 da CF-88. Para regulamentar a questão dos sons e ruídos, foi editado o Decreto-RS nº 23.439, de 24OUT74. 5. Configurada afronta ao art. 225 da CF-88 e ao art. 8ª da CE-89 que autoriza o manejo da ação direta de inconstitucionalidade. 6. Inconstitucionalidade da Lei – Alegrete nº 4.451/10 declarada. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70060488624, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 22/06/2015).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO PÚBLICO NÃO-ESPECIFICADO. LEI N° 13.085/2008, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E LEI Nº 5.498/2010, DO MUNICÍPIO DE CANOAS. LIMITES PARA EMISSÃO SONORA NAS ATIVIDADES EM TEMPLOS RELIGIOSOS, NO ÂMBITO ESTADUAL E MUNICIPAL, RESPECTIVAMENTE. DISSONÂNCIA COM A LEGISLAÇÃO FEDERAL QUE DISPÕE ESPECIFICAMENTE SOBRE A MATÉRIA. POLUIÇÃO AMBIENTAL. DIREITO CONSTITUCIONAL AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO E SAUDÁVEL. COMPATIBILIDADE DAS NORMAS. RESOLUÇÃO Nº 1/90 DO CONAMA, COM FORÇA DE LEI. COMPETE À UNIÃO ESTABELECER NORMAS GERAIS EM MATÉRIA DE MEIO AMBIENTE E CONTROLE DE POLUIÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 24, VI, §§1º E 4º DA CARTA FEDERAL. AUTORIZAÇÃO PARA LEGISLAÇÃO SUPLETIVA SOMENTE NO VÁCUO DA LEGISLAÇÃO FEDERAL. EM MATÉRIA DE MEIO AMBIENTE E CONTROLE DE POLUIÇÃO NÃO HÁ PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE DO MUNICÍPIO. NORMATIVIDADE FEDERAL, DE CARÁTER GERAL, COMO PARÂMETRO RAZOÁVEL, À QUAL DEVEM ESTAR VINCULADAS AS NORMAS ESTADUAIS E MUNICIPAIS. BLOQUEIO DE COMPETÊNCIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS E SUA INTERPRETAÇÃO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRELIMINARES REJEITADAS. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE, VENCIDO O RELATOR QUANTO AO MÉRITO. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70042300442, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Arno Werlang, Julgado em 02/12/2013).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 4742/93 DE RIO GRANDE. NÍVEIS DE DECIBÉIS. HORÁRIOS NOTURO E DIURNO. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA DA MUNICIPALIDADE PARA DISPOR SOBRE NÍVEIS DE DECIBÉIS SUPERIORES AOS CONSTANTES NA LEGISLAÇÃO ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA. Nos termos do disposto no artigo 24, VI, da Constituição Federal, os Municípios não dispõem de competência concorrente para legislar sobre proteção ao meio ambiente e controle da poluição, competência restrita da União, Estados e Distrito Federal, o que, no âmbito estadual foi disciplinado pelo artigo 52, XIV, da Constituição Estadual, que editou o Decreto Estadual 23.439/74 para tanto, podendo os Municípios suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, por aplicação do artigo 30, II, da Constituição Federal. Logo, ausente competência do Município para disciplinar níveis de decibéis superiores aos constantes na legislação estadual, flagrada a inconstitucionalidade da norma municipal. Precedente do Órgão Especial do TJRGS. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE, POR MAIORIA. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70033909680, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 19/04/2010).

Nesses termos, voto por julgar procedente a presente Arguição de Inconstitucionalidade, para declarar, em controle difuso, a inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 3º, da Lei nº 3.586, de 01 de novembro de 2001, do Município de Torres, por ofensa aos artigos 24, VI, 30, II e 225 da Constituição Federal.

OS DEMAIS DESEMBARGADORES VOTARAM DE ACORDO COM O RELATOR.

DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO – Presidente – Arguição de Inconstitucionalidade nº 70075952325, Comarca de Torres: “À UNANIMIDADE, JULGARAM PROCEDENTE A ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE.”

EMENTA

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE TORRES. LEI MUNICIPAL Nº 3.586/2001 QUE DISPÕE SOBRE RUÍDOS, SONS EXCESSIVOS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. ESTABELECIMENTO DE LIMITES ACIMA DO PERMITIDO NA LEGISLAÇÃO FEDERAL E ESTADUAL.  AFRONTA AOS ARTIGOS 24, VI, 30, II E 225 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

De acordo com o disposto no artigo 24, VI, da Constituição Federal, os Municípios não dispõem de competência concorrente para legislar sobre proteção ao meio ambiente e controle da poluição, competência restrita da União, Estados e Distrito Federal, o que, no âmbito estadual foi disciplinado pelo artigo 52, XIV, da Constituição Estadual, podendo os Municípios suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, por aplicação do artigo 30, II, da Constituição Federal.

Os artigos 1º, 2º e 3º, da Lei Municipal nº 3.586/2001, do Município de Torres, estabelecem níveis de decibéis que extrapolam aqueles previstos na legislação federal e estadual sobre o tema, violando expressamente os artigos 24, VI, 30, II e 225 da Constituição Federal.

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. UNÂNIME.

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar procedente a Arguição de Inconstitucionalidade.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DesEMBARGADORES Carlos Eduardo Zietlow Duro (Presidente), Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Arminio José Abreu Lima da Rosa, Marcelo Bandeira Pereira, Jorge Luís Dall’Agnol, Nelson Antonio Monteiro Pacheco, Luiz Felipe Brasil Santos, Maria Isabel de Azevedo Souza, Irineu Mariani, Marco Aurélio Heinz, Bayard Ney de Freitas Barcellos, Carlos Roberto Lofego Caníbal, Matilde Chabar Maia, André Luiz Planella Villarinho, Alzir Felippe Schmitz, Angela Terezinha de Oliveira Brito, Marilene Bonzanini, Glênio José Wasserstein Hekman, Tasso Caubi Soares Delabary, Denise Oliveira Cezar, Almir Porto da Rocha Filho, Ney Wiedemann Neto, Eduardo Uhlein e Ricardo Torres Hermann.

Porto Alegre, 23 de abril de 2018.

 

 

DES. FRANCISCO JOSÉ MOESCH,

Relator.

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