O 10º Bate-papo Virtual, realizado no dia 31/03/2020, teve como tema “Impactos da Pandemia, à Luz do Direito Ambiental, na mineração”.
Expositores:
Ricardo Carneiro (Advogado)
Jônatas Trindade (Diretor de Licenciamento do IBAMA)
Pedro Campany (Gerente Jurídico na Votorantim Cimentos)
Solange Costa (Gerente Jurídica Minerária na Vale)
Guilherme Simões (Gerente Geral Jurídico na Nexa)
Thales Teixeira (Gerente Geral Jurídico Ambiental e Regulatório na Gerdau)
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Confira o vídeo:
Apontamentos referentes ao 10º Bate Papo Virtual:
Ricardo Carneiro:
A crise decorrente da pandemia de COVID-19 tem levado o federalismo brasileiro ao limite. Está-se diante de um cenário em que União, Estados e Municípios pretendem avocar para si a atribuição no estabelecimento de parâmetros para o enfrentamento da situação de calamidade, travando disputas ― muitas vezes no âmbito judicial ―, visando a definir de qual ente federativo é a competência para determinar as atividades essenciais que devem ser mantidas durante a crise de saúde pública.
Todavia, o art. 21, inciso XVIII da Constituição da República de 1988, determina a competência material e executiva da União para o planejamento e promoção de defesa permanente contra as calamidades públicas, devendo-se questionar, assim, se há espaço normativo que caiba aos Estados e Municípios.
Com base em tal atribuição de competência, foi editado o Decreto Federal nº 10.282, de 20.03.2020, o qual definiu serviços públicos e atividades essenciais que deverão ter seu exercício e funcionamento resguardados em meio ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus. Dentre as atividades foram previstas, por exemplo, a produção de petróleo e o monitoramento de construções e barragens que possam acarretar risco à segurança, não sendo mencionadas expressamente, contudo, demais atividades relacionadas à mineração.
De modo a pacificar o entendimento, foi editada pelo Ministério de Minas e Energia a Portaria nº 135/GM, de 28.03.2020, que considerou essencial a disponibilização dos insumos minerais necessários à cadeia produtiva das atividades elencadas no sobredito Decreto Federal. Apesar disso, deve-se analisar criteriosamente quais atividades estão diretamente relacionadas à aludida cadeia produtiva, vez que a Portaria apresentou apenas um rol exemplificativo, deixando espaço para interpretação de hipóteses que não seriam entendidas como serviços e atividades essenciais.
É possível observar, ainda, diversos diplomas normativos editados pelos Governos Estaduais e Municipais, os quais estabeleceram, ao contrário do que foi feito em âmbito federal, listagens negativas, que discriminaram os serviços que devem ser suspensos. Em outros casos, os atos normativos suspenderam abstratamente os Alvarás de Funcionamento das mais diversas atividades econômicas, sem qualquer critério de especificidade.
Jonatas Trindade:
O IBAMA tem mantido o foco na padronização de procedimentos, se utilizando, para tanto, das Orientações Técnicas Normativas – OTNs e dos Procedimentos Operacionais Padrão – POPs. O objetivo do órgão é conferir celeridade ao trâmite dos processos e segurança jurídica, por meio da simplificação de fluxos de trabalho e da consolidação de entendimentos e teses sobre matérias técnicas relevantes.
Ademais, no âmbito do Plano de Ação desenvolvido atualmente pelo IBAMA, inserem-se as Guias de Avaliação de Impacto Ambiental, cujos instrumentos visarão a proporcionar previsibilidade das avaliações do órgão em suas mais diversas atividades, de modo a evitar discrepância de decisões proferidas diante de situações, em certa medida, semelhantes.
Destaque-se, ainda, que o referido plano de ação se encontra em atraso por conta dos impactos causados pela pandemia da COVID-19, porém, o objetivo é que, superada essa situação excepcional, sejam oferecidos os devidos instrumentos para que o licenciamento ambiental não seja impeditivo para que as atividades econômicas retomem a normalidade. Importante ressaltar, também, que, quanto aos impactos socioeconômicos, o setor da mineração é o primeiro a ser afetado e o último a efetivar sua retomada.
Neste sentido, o IBAMA tem dispendido esforços para o desenvolvimento dos instrumentos do Marco Legal do Licenciamento Ambiental, fomentando o ato normativo que deverá promover a modernização da Instrução Normativa nº 84 ― que, em verdade, consistirá na substituição total da norma anterior. Este dispositivo normativo, ainda a ser editado, tem como objetivo propiciar um regramento moderno, próprio do licenciamento ambiental, contendo novas regras que proporcionarão segurança jurídica e técnica dos mais diversos institutos aplicáveis.
Por fim, após questionamento formulado pela Solange Costa, foi esclarecido que, a exemplo do procedimento atualmente realizado pela ANM, também se encontra em desenvolvimento a revisão do estoque regulatório do IBAMA, iniciativa que se encontra em fase inicial de execução.
Pedro Campany:
No que se refere às medidas discutidas em meio à crise de saúde pública decorrente da pandemia da COVID-19, dentre as quais encontra-se definição das atividades que devam ser classificadas como sendo essenciais, que, por consequência, podem se manter em funcionamento, vale relembrar que, as Leis de Greve (nº 7.783, de 28.06.1989) e da Mata Atlântica (nº 11.428, de 22.12.2006), por exemplo, já definiam algumas atividades que, por suas características, deveriam ser entendidas como de caráter essencial.
Especificamente em relação ao setor mineral, é de se ressaltar que várias atividades dependem da mineração, seja direta ou indiretamente, haja vista que esta constitui a base da cadeia econômica e produtiva. Logo, é inerente ao setor a caracterização como atividade essencial.
Quanto às questões atinentes às competências legislativas e administrativas dos entes federados, a atividade de mineração é desenvolvida por meio de concessões federais. Assim, caso seja objetivada a paralisação, se faz necessária a edição de ato federal competente. Desse modo, vale refletir quanto às consequências do (não) atendimento das determinações advindas de um ato normativo municipal que proíba as atividades de mineração, por exemplo, sendo necessária a ponderação dos efeitos decorrentes do risco administrativo de um eventual descumprimento da obrigação.
Para além disso, no que se refere às condicionantes relacionadas às licenças ambientais, enquanto houver operação ― ou seja, enquanto forem mantidas as atividades ―, é necessário seguir com o cumprimento das obrigações, devendo as evidências de atendimento serem apresentadas após o restabelecimento dos prazos e dos atendimentos presenciais pelos órgãos. Caso o cumprimento de determinada condicionante reste inviabilizado, fazendo-se necessária a suspensão, ou na hipótese de a operação ser paralisada por completo, deve-se efetivar a notificação do respectivo órgão licenciador.
Solange Costa:
Assim como já exposto, o Decreto Federal nº 10.282, de 20.03.2020, trouxe a definição dos serviços públicos e das atividades essenciais, os quais deverão ter seus funcionamentos mantidos em meio à emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, constituindo-se em uma lista abrangente, a qual ainda assim, segue sendo complementada, inclusive, indiretamente, como no caso da Portaria MME nº 135/2020.
Quanto à interrupção das atividade, vale destacar que a retomada das atividades não ocorre imediatamente, como se fosse necessário apenas “ligar o interruptor”, havendo toda uma dinâmica para que as atividades possam ser restabelecidas, conforme o estágio em que se encontravam antes da suspensão.
É de extrema importância, ainda, a manutenção das atividades dos órgãos públicos, a fim de conferir segurança aos administrados. De fato, para o atual momento de crise, devem ser mantidos em foco a serenidade, o diálogo e a harmonia entre todos os agentes do setor, para que as eventuais dificuldades possam ser superadas.
Guilherme Simões:
Tendo em vista a Portaria MME nº 135/2020, não restam dúvidas quanto à essencialidade da atividade de mineração, frente ao cenário da atual crise, sendo que a matéria se encontra pacificada no âmbito da União. Esta percepção também foi observada durante discussões realizadas junto aos servidores da ANM, MME e SGM.
A preocupação se mantém, contudo, em relação aos Estados e Municípios, os quais, ao que parece, nem sempre conseguem dimensionar o contexto da atividade de mineração, o que demanda das empresas o estabelecimento de diálogo com os entes públicos, a fim de que possam ser esclarecidas as características peculiares do setor mineral.
Neste sentido, vale o exemplo da tentativa de fechamento do refeitório da empresa, medida que se fundamentou em diploma normativo que determinava aos restaurantes, bares e cafés que mantivessem o funcionamento apenas por meio do serviço de delivery, providência que não deveria se aplicar ao refeitório específico da empresa. Com efeito, após os cabíveis debates com os órgãos competentes, a medida foi afastada, tendo restado demonstrado a peculiaridade da situação.
Thales Teixeira:
Em que pese as particularidades da atividade de mineração, o setor mineral também deve ser balizado pela razoabilidade e pela proporcionalidade, certo não haver dicotomia entre saúde e economia, não devendo um prevalecer sobre o outro. Tanto assim que, para as mais diversas empresas, a preservação da saúde de seus trabalhadores constitui o primeiro objetivo frente ao cenário atual.
A crise de saúde pública apresenta incontestável impacto regulatório, sendo possível observar a edição de, aproximadamente, 310 (trezentos e dez) atos normativos, seja a nível federal, estadual ou municipal, os quais atingem direta ou indiretamente o setor de mineração e siderurgia.
A retomada econômica, conforme é possível dimensionar desde já, será lenta e gradual, razão pela qual é válido analisar como serão os aspectos regulatórios pós-crise e como a regulação pode acelerar a retomada da atividade do setor de mineração.
Neste sentido, não se pode esquecer que o art. 15, da Lei nº 13.575, de 26.12.2017, que criou a ANM, determina a realização de Análise de Impacto Regulatório previamente à adoção das propostas de alterações de atos normativos, instrumento que será de grande valia no cenário pós-crise, o qual deverá ser balizado, conforme o Acórdão nº 2261/2011 do TCU.
Dentre outros aspectos de regulação, vale destacar o Projeto de Lei Complementar nº 34/2020, apresentado na Câmara dos Deputados, que institui o empréstimo compulsório de empresas com patrimônio líquido igual ou superior a R$ 1 bilhão para o governo, a fim de atender exclusivamente às despesas urgentes causadas pela situação de calamidade pública relacionada ao novo coronavírus, e a Medida Provisória 931, de 30.03.2020, que prorrogou o prazo para a realização das Assembleias Gerais Ordinárias das sociedades anônimas.
(*os apontamentos foram elaborados por Thabata Luanda e Sofia França).
10º Bate-papo Virtual – “ Impactos da Pandemia, à Luz do Direito Ambiental, na mineração”
(gravado dia 31 de março de 2020)
Expositores:
Ricardo Carneiro
Jônatas Trindade
Pedro Campany
Solange Costa
Guilherme Simões
Thales Teixeira
Coordenação:
Marcos Saes e Albenir Querubini