Conheça o inteiro teor de sentença da 4ª Vara Federal de Santa Maria que reconheceu de ofício nulidade da autuação do IBAMA por falta de motivação na decisão administrativa que aplicou multa por queimada ilegal na Região Amazônica, anulando processo de execução fiscal da respectiva multa.
Íntegra extraída da movimentação processual em www.jfrs.jus.br.
EMBARGANTE
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AMAURI PAULO CERVO
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ADVOGADO
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LUCIO ANDRÉ MÜLLER LORENZON
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RICARDO LUÍS SCHULTZ Y CASTRO
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EMBARGADO
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA
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SENTENÇA
Trata-se de embargos à execução opostos por Amauri Paulo Cervo incidentes à execução fiscal ajuizada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), autuada nesta Vara Federal sob o nº 2008.71.02.000668-0, a qual tem por lastro CDA originada do Auto de Infração nº 156097, Série D.
Alega o Embargante, em síntese, nulidade da execução por vícios na formação do título executivo. Refere que não foram observados os requisitos legais no preenchimento do Auto de Infração, bem como em relação às circunstâncias atenuantes da penalidade de multa imposta, decorrentes de medidas de recuperação do meio ambiente degradado. Sustenta cerceamento de defesa por não ter sido franqueada vista dos autos para formular recurso da decisão após os pareceres pela redução da multa.
Informa ter postulado junto ao IBAMA autorização para desmatar 14,84 hectares e autorização de queima de pastagens de 35,34 hectares. Afirma ter efetuado o corte da vegetação sem autorização em face da demora na expedição de autorização. Menciona não ter praticado a infração, informando que a propriedade está localizada às margens de rodovia com grande movimento de carros e caminhões, não sendo raro que motoristas joguem tocos de cigarros acesos que causam incêndios em vegetação seca, o que talvez tenha sido a causa do fogo. Refere que sequer se encontrava no município na data do fato.
Aduz, ainda, não terem sido apontadas as coordenadas geográficas exatas no Auto de Infração, inexistindo georreferenciamento e não terem sido indicadas sequer por estimativa quantas árvores e quais as espécies atingidas. Informa ter ajustado a composição dos danos civis com o Ministério Público Federal, tendo cumprido o acordo em sua integralidade. Por fim, sustenta que no caso deveria ter sido aplicada apenas advertência, devendo ser afastada a multa. Postula atribuição de efeito suspensivo aos embargos. Junta documentos.
Intimado, o IBAMA ofereceu impugnação (evento 11) refutando as alegações de vícios e nulidades na formação do título e de cerceamento de defesa, ressaltando que é a quarta vez que o Executado oferece defesa. Refutou as demais teses apresentadas pelo Embargante e postulou improcedência dos embargos.
O Embargante apresentou réplica (evento 14), destacando que não deu causa ao incêndio. Novamente questionou a falta de georreferenciamento, informação que deveria constar no auto de infração conforme previsto no § 11 do art. 2º do Decreto nº 3.179/1999. Juntou documentos, dentre eles a Autorização de Funcionamento de Atividade Rural (AFAR) emitida pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Pará.
Foi expedida (evento 24) e cumprida (evento 34) carta precatória para oitiva de testemunhas.
Indeferiu-se a produção de prova pericial (evento 40)
Vieram os autos conclusos para sentença.
Relatei.
II – FUNDAMENTAÇÃO
– Da Certidão de Dívida Ativa
A CDA, originado do Auto de Infração nº 156097, Série D, enuncia como descrição do fato o ‘USO DE FOGO EM ÁREA DE 40HA DE FLORESTA NATIVA ABATIDA A CORTE RASO SEM AUTORIZAÇÃO DO IBAMA’.
A infração teria ocorrido na Fazenda Faxinal II, de propriedade do Embargante, localizada no município de Novo Progresso, no Estado do Pará, tendo como base o seguinte enquadramento legal: art. 41 da Lei nº 9.605/1998, art. 2º do inc. II, VII, com art. 28 do Decreto nº 3.179/1999.
A multa foi fixada no processo administrativo ambiental nº 02018.003721/00-16, que tramitou perante a Superintendência Estadual do IBAMA do Pará.
No entanto, tal argumento não prospera.
O Auto de Infração foi lavrado em 23/08/2000, quando ainda não havia a determinação de constar o georreferenciamento da área, exigência que foi introduzida pelo Decreto nº 6.321, de 21 de dezembro de 2007, ao dar nova redação ao § 11 do art. 2º do Decreto nº 3.179, de 21 de setembro de 1999.
Assim, como não havia expressa determinação normativa dispondo sobre a exigência do georreferenciamento na data em que foi lavrado o Auto de Infração, não há se falar de nulidade por este motivo.
Assim, rejeito a alegação de cerceamento de defesa nos termos arguidos pelo Embargante.
– Do vício observado na decisão proferida pela Representação Estadual do IBAMA no Estado do Pará
Considerando que a legalidade dos atos administrativos são passíveis de revisão na esfera judicial, constato, de ofício, a existência de vício insanável na decisão proferida pela Representação Estadual do IBAMA do Estado do Pará, a qual não motivou a decisão que concluiu pelo indeferimento da defesa apresentada ao Auto de Infração, deixando de fundamentar as razões da manutenção do valor da multa aplicada pelo Agente Fiscal quando havia parecer técnico que opinava pela redução do valor da multa aplicada.
A imposição de multa na esfera administrativa constitui e cria restrições ao patrimônio privado do administrado, razão pela qual o processo administrativo deve obrigatoriamente observar as regras e garantias do devido processo legal.
Nesse contexto, consoante a doutrina de WELLINGTON PACHECO BARROS, existem dois momentos distintos que envolvem a aplicação da multa no processo administrativo ambiental:
(b) ‘multa punição‘, que é aquela que ‘sobrevém como momento final do processo administrativo ambiental; é uma decorrência do procedimento de fixação da multa’, a qual pode vir a ser mantida, reduzida ou majorada, desde que observado os requisitos legais estabelecidos. (BARROS, Wellington Pacheco. Direito ambiental sistematizado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, pp. 241-242)
Importante destacar que entre os referidos momentos na aplicação da multa ambiental, desenvolve-se o processo administrativo ambiental, o qual deve assegurar ao administrado que responde à infração ambiental o respeito às garantias ao devido processo legal, asseguradas pela Constituição Federal, tais como o direito ao contraditório e a ampla defesa, motivação das decisões, etc.
Ainda, cumpre observar que para apurar o valor da ‘multa punição’ durante o processo administrativo, o então vigente Decreto nº 3.179/1999 estabelecia no art. 7º que a autoridade competente deveria, de ofício ou mediante provocação, majorar, manter ou minorar o seu valor, respeitados os limites estabelecidos nos artigos infringidos, observado os critérios estabelecidos no art. 6º e, no que couber, o disposto nos arts. 14 e 15 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.
Conforme explica o referido doutrinador:
Adiante, o respectivo parecer foi remetido ao Escritório Regional de Santarém, na qual o Agente de Defesa Florestal Juberto Lima Pereira, em 07/02/2001, manifestou o seguinte:
Por sua vez, a decisão final da Representante do IBAMA/PA, Sra Selma Bara Melgaço, que fixou o valor da ‘multa punição‘, proferida em 10/05/2001, foi a seguinte (conforme consta no verso da fl. 30 do processo administrativo):
‘À DIAF,
Além de ter sido redigida ‘a mão’, a respectiva decisão ao não acolher os fundamentos jurídicos do parecer técnico da Subprocuradoria do IBAMA/PA e da manifestação do Agente de Defesa Florestal, afrontou o devido processo legal, pois não fundamentou as razões pela qual decidiu pela manutenção do valor definido no Auto de Infração e Termo (‘multa acusação‘) fixado pelo Agente Autuante.
Destaco que tal decisão administrativa final proferida pela Representante do IBAMA/PA, que constitui e cria restrições ao patrimônio privado do administrado ao fixar o valor da ‘multa punição‘, sem qualquer motivação legal para justificar o quantum fixado em desacordo com o parecer e manifestação técnica oficial é nula de pleno direito.
Assim, além dos dispositivos e garantias processuais previstas na Constituição Federal, a decisão administrativa final proferida pela Representante do IBAMA/PA contrariou frontalmente a Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que, ao dispor sobre a motivação das decisões proferidas no âmbito dos processos administrativos federais, expressamente prevê:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
Cumpre mencionar que o Decreto nº 3.179, de 21 de setembro de 1999 foi revogado pelo Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008 (o qual dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências). No entanto, o atual decreto regulamentador da Lei dos Crimes e Sanções Administrativas Ambientais trouxe disposição expressa a ser observada no âmbito do processo administrativo ambiental, reafirmando o dever de observância do devido processo legal pelos Órgãos Ambientais, ressaltando a necessidade de fundamentação da decisão que fixa a ‘multa punição‘ a ser imposta ao administrado, conforme transcrevo:
Art. 123. A decisão da autoridade julgadora não se vincula às sanções aplicadas pelo agente autuante, ou ao valor da multa, podendo, em decisão motivada, de ofício ou a requerimento do interessado, minorar, manter ou majorar o seu valor, respeitados os limites estabelecidos na legislação ambiental vigente. (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Assim, restando caracterizada a nulidade da decisão proferida pela Representação Estadual do IBAMA do Estado do Pará, nos autos do processo administrativo ambiental nº 02018.003721/00-16 e demais atos processuais subsequentes, a respectiva CDA também se encontra eivada de vício insanável, razão pela qual deve ser julgado procedente os presentes embargos para o fim de extinguir a execução fiscal nº 2008.71.02.000668-0.
Por consequência, resta prejudicada a análise dos demais pedidos formulados na inicial.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE os presentes embargos para, reconhecendo a nulidade da decisão proferida pela Representação Estadual do IBAMA do Pará nos autos do processo administrativo ambiental nº 02018.003721/00-16 e demais atos processuais subsequentes, declarar nula a respectiva CDA referente ao Auto de Infração nº 156097, Série D, e extinguir a execução fiscal nº 2008.71.02.000668-0, nos termos da fundamentação.
Incidente sem custas (art. 7º, da Lei nº 9.289/1996).
Considerando que não foram diretamente acolhidas as teses formuladas pelo Embargante para a procedência da ação, porém ressaltando a importância do trabalho do seu procurador, fixo, a título de honorários de sucumbência a serem arcados pelo IBAMA, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), fulcro no artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, atualizado desde o ajuizamento pelo IPCA-e.
Em atenção à petição do evento nº 52 e certidão do evento 53, encaminhe a Secretaria e-mail para a Vara Única de Novo Progresso informando que já houve a realização da oitiva das testemunhas por aquele Juízo nos autos da Carta Precatória Cível processo nº 00053924620138140115-PA (50000827420134047102), conforme evento 34.
Dou esta sentença por publicada pela inserção do seu arquivo de texto no sistema de processo eletrônico ‘e-proc’.
Intimem-se.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
João Batista Brito Osório
Documento eletrônico assinado por João Batista Brito Osório, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.jfrs.jus.br/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 11640287v5 e, se solicitado, do código CRC 98DBB55. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | João Batista Brito Osório |
Data e Hora: | 09/09/2014 19:08 |
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