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Loteamento irregular: TRF1 determina a demolição de condomínio localizado em área de preservação ambiental permanente

“A 5ª Turma do TRF da 1ª Região determinou a demolição, sob a supervisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), de qualquer edificação existente na faixa de 100 metros a partir do reservatório da Usina Hidrelétrica Mascarenhas de Moraes, localizada no município de Delfinópolis/MG, em virtude do loteamento irregular do Condomínio Nogueira I. A decisão foi tomada para proteger área de preservação permanente. Os réus têm 30 dias para cumprir a decisão a partir da data da intimação, sob pena de multa diária de R$ 5 mil em caso de descumprimento.

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública requerendo a desocupação e a recuperação da área de preservação permanente em referência; a demolição de qualquer edificação ali existente; apresentação, ao órgão ambiental, de projeto de adequação ambiental; abstenção da realização de novas construções no local; adoção de medidas compensatórias aos danos ambientais e pagamento de indenização pelos danos ambientais causados.

Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente ao fundamento de que, além de a implantação do loteamento descrito nos autos ter sido regularmente autorizada pelos órgãos ambientais competentes e se encontrar em área urbana consolidada, o local não se submeteria às normas da Resolução Conama 302/2002, eis que editadas em momento posterior à sua implantação. Segundo o Juízo, o empreendimento deve observar a Lei Estadual 14.309/2002, que estabelece que a faixa de preservação do entorno de reservatórios hidrelétricos corresponde a apenas 30 metros, limite este que teria sido respeitado.

O MPF recorreu ao TRF1 sustentando que a ocupação da área em questão ‘não se enquadraria em nenhuma das hipóteses legais de autorização para esse tipo de intervenção”. Argumentou que o Condomínio Nogueira I não se encontra em área urbana consolidada na medida em que não preenche os requisitos legais que definem tal tipo de área. Alegou que a extensão da área não deve corresponder a 30 metros, mas a 100 metros a partir do reservatório da usina, “não se aplicando ao caso as disposições da Lei Estadual 18.023/2009, por se tratar de usina hidrelétrica federal’.

A União apresentou recurso como interessado na questão (litisconsorte) sustentando a ilegalidade das edificações construídas em área de preservação permanente, que deve ser considerada na extensão de 100 metros contados da cota máxima de inundação do reservatório artificial. Defende a condenação dos réus pelos danos ambientais.

Decisão – O Colegiado deu razão aos recorrentes. Em seu voto, o relator, desembargador federal Souza Prudente destacou que a largura mínima da faixa marginal, independentemente de sua localização, será de 100 metros, e não de 30 metros, que deverá ser observada apenas, em relação às lagoas, lagos ou reservatórios d´água naturais ou artificiais situados em áreas urbanas.

O magistrado também ressaltou que o loteamento em questão encontra expressa vedação na Lei 6.766/1979, que assim dispõe: ‘não será permitido o parcelamento do solo (…) em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis até a sua correção’, como no caso.

‘Na hipótese dos autos, as edificações descritas nos autos foram erguidas, sem o prévio, regular e competente licenciamento ambiental, no interior de Área de Preservação Permanente, assim definida na legislação e atos normativos de regência, a caracterizar a ocorrência de dano ambiental, impondo-se, assim, além da sua demolição, a adoção de medidas restauradoras da área degradada, bem assim, a inibição da prática de ações antrópicas outras’, afirmou o relator”.

Fonte: TRF1, 11/05/2016.

 Confira a ementa do julgado:

APELAÇÃO CÍVEL 2007.38.04.000066-2/MG

Processo na Origem: 660520074013804

RELATOR(A) : DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE

APELANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADOR : LUDMILA JUNQUEIRA DUARTE OLIVEIRA

APELANTE : UNIÃO FEDERAL

PROCURADOR : JOSÉ ROBERTO MACHADO FARIAS

APELANTE : INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS – IBAMA

PROCURADOR : ADRIANA MAIA VENTURINI

APELADO : MÁRCIA APARECIDA BENEDITO NOGUEIRA E OUTROS(AS)

ADVOGADO : RENATO RATTIS PÁDUA E OUTRO(A)

LITISCONSORTE PASSIVO: JOSÉ ROBERTO SCHIAVONI

ADVOGADO : SEBASTIÃO BORGES VIANA

 

EMENTA

AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (RIO GRANDE). SUSPENSÃO DE ATIVIDADES AGRESSORAS AO MEIO AMBIENTE. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL E DO POLUIDOR-PAGADOR. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA E DEMOLIÇÃO DE EDIFICAÇÕES), DE NÃO FAZER (INIBIÇÃO DE QUALQUER AÇÃO ANTRÓPICA SEM O REGULAR LICENCIAMENTO AMBIENTAL). POSSIBILIDADE. IRRETROATIVIDADE DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL POR IMPERATIVO DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO ECOLÓGICO EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO.

I – Não se conhece de agravo retido quando não consta, nas razões ou nas contrarrazões do apelo, pedido expresso para sua apreciação (CPC, art. 523, §1º), como no caso.

II – “Na ótica vigilante da Suprema Corte, “a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral (…) O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações” (ADI-MC nº 3540/DF – Rel. Min. Celso de Mello – DJU de 03/02/2006). Nesta visão de uma sociedade sustentável e global, baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura de paz, com responsabilidades pela grande comunidade da vida, numa perspectiva intergeracional, promulgou-se a Carta Ambiental da França (02.03.2005), estabelecendo que “o futuro e a própria existência da humanidade são indissociáveis de seu meio natural e, por isso, o meio ambiente é considerado um patrimônio comum dos seres humanos, devendo sua preservação ser buscada, sob o mesmo título que os demais interesses fundamentais da nação, pois a diversidade biológica, o desenvolvimento da pessoa humana e o progresso das sociedades estão sendo afetados por certas modalidades de produção e consumo e pela exploração excessiva dos recursos naturais, a se exigir das autoridades públicas a aplicação do princípio da precaução nos limites de suas atribuições, em busca de um desenvolvimento durável. A tutela constitucional, que impõe ao Poder Público e a toda coletividade o dever de defender e preservar, para as presentes e futuras gerações, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, como direito difuso e fundamental, feito bem de uso comum do povo (CF, art. 225, caput), já instrumentaliza, em seus comandos normativos, o princípio da precaução (quando houver dúvida sobre o potencial deletério de uma determinada ação sobre o ambiente, toma-se a decisão mais conservadora, evitando-se a ação) e a conseqüente prevenção (pois uma vez que se possa prever que uma certa atividade possa ser danosa, ela deve ser evitada) , exigindo-se, assim, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade (CF, art. 225, § 1º, IV)” (AC 0002667- 39.2006.4.01.3700/MA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.172 de 12/06/2012).

III – Na inteligência jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça, o princípio da proibição do retrocesso ecológico, em defesa do meio ambiente equilibrado autoriza o entendimento de que “o novo Código Florestal não pode retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, tampouco para reduzir de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da “incumbência”; do Estado de garantir a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I)“. (AgRg no AREsp 327.687/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/08/2013, DJe 26/08/2013).

IV– Na hipótese dos autos, as edificações descritas nos autos foram erguidas, sem o prévio, regular e competente licenciamento ambiental, no interior de Área de Preservação Permanente (APP Rio Grande), assim definida na legislação e atos normativos de regência, a caracterizar a ocorrência de dano ambiental, impondo- se, assim, além da sua demolição, a adoção de medidas restauradoras da área degradada, bem assim, a inibição da prática de ações antrópicas outras, desprovidas de regular autorização do órgão ambiental competente, apurando-se o quantum indenizatório do dano material ao meio ambiente agredido através de competente prova pericial, na fase de liquidação do julgado, por arbitramento (CPC, arts. 475-C e 475-D).

V – Nas demandas ambientais, por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum, admite-se a condenação simultânea e cumulativa, em obrigação de fazer, não fazer e indenizar. Assim, na interpretação do art. 3º da Lei 7.347/1985, a conjunção ‘ou’ opera com valor aditivo, não introduz alternativa excludente. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ. “A recusa de aplicação, ou aplicação truncada, pelo juiz, dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa, daí a resposta administrativa e judicial não passar de aceitável e gerenciável “risco ou custo normal do negócio”. Saem debilitados, assim, o caráter dissuasório, a força pedagógica e o objetivo profilático da responsabilidade civil ambiental (= prevenção geral e especial), verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de fato, mesmo que não de direito, do degradador premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério” (REsp 1145083/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 04/09/2012).

VI – Ordenou-se, ainda, o cumprimento das obrigações de fazer e de não fazer, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa coercitiva, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por dia de atraso, a contar da intimação deste Acórdão mandamental, sem prejuízo das sanções penais previstas no artigo 14, inciso V, e respectivo parágrafo único, do CPC vigente.

VII – Apelações providas. Sentença reformada.

 

ACÓRDÃO

Decide a Turma, à unanimidade, preliminarmente, não conhecer do agravo retido e, no mérito, por maioria, dar provimento às apelações, nos termos do voto do Relator.

Quinta Turma do Tribunal Regional Federal – 1ª Região – Em 17/02/2016.

Desembargador Federal SOUZA PRUDENTE

Relator

 

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