O parecer técnico divulgado pelo Ibama é a análise do 2° Relatório Semestral de Andamento do Projeto Básico Ambiental (PBA) e das Condicionantes da Licença de Instalação 795/2011, da Usina Hidrelétrica Belo Monte, que está sendo construída no Rio Xingu, no Pará. As 128 páginas analisam detalhadamente o relatório entregue ao órgão licenciador pela Norte Energia S.A. há seis meses.
As recomendações do Ibama mostraram-se lenientes com os atrasos da Norte Energia, responsável pela obra, na implantação do Projeto Básico Ambiental (PBA) e demais condicionantes ambientais para a construção da usina, ao apontar irregularidades graves em seu cumprimento e não punir a empresa.
Dentre os principais problemas listados pelo órgão ao analisar o relatório da empresa estão: significativos atrasos no cronograma das obras de saneamento básico e de infraestrutura urbana das cidades de Altamira, Vitória do Xingu e dos sítios Belo Monte e Belo Monte do Pontal; atraso na conclusão do Cadastro Socioeconômico, que garante os direitos da população diretamente atingida e o total descumprimento quanto à obrigação de informar o destino da madeira extraída durante a obra. Em vistoria realizada em novembro de 2012, o Ibama encontrou um acúmulo imenso de madeira sem a realização da medição das toras no momento correto (romaneio), indevidamente armazenada e apodrecendo nos canteiros e pontos de estocagem.
Atrasos e ramal irregular
O parecer do Ibama, apesar de reconhecer a gravidade dos danos ambientais derivadas do descumprimento do Plano de Supressão e das Autorizações de Supressão de Vegetação emitidas pelo órgão, não determina a autuação do empreendedor para imposição de multa ou suspensão total (ou de trechos) da obra com o objetivo de corrigir as irregularidades identificadas durante a fiscalização.
Além dos atrasos dos cronogramas de obras socioambientais, o parecer relata que o Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM) construiu um Ramal de Derivação (RD) irregular, levando eletricidade da região ao canteiro de obras. O novo RD representa o descumprimento da exigência expressa da condicionante 2.4 da Licença de Instalação (LI), que mantinha bloqueada a construção do ramal até a autorização explicita do órgão licenciador. A Norte Energia omitiu essa informação ao Ibama nos relatórios já entregues, incluindo este último, de 31 de janeiro de 2013 (veja relatório publicado no site do Ibama).
A condescendência do Ibama com a Norte Energia neste segundo parecer contrasta com a imposição da multa de R$ 7 milhões que infligiu à empresa um ano antes, em fevereiro de 2012, quando divulgou o primeiro parecer sobre as condicionantes ambientais para a instalação da usina. Agora, o Ibama apenas notificou a empresa (veja os detalhes abaixo).
As irregularidades identificadas pelo órgão ambiental no último relatório eram semelhantes às constatadas no primeiro parecer, que em sua conclusão determina a imposição de multa ao empreendedor.
Condicionantes indígenas
Em dezembro de 2012, a Funai manifestou publicamente, em resposta a um requerimento de informação feito pelo ISA, a existência de atrasos significativos no atendimento de condicionantes e na implantação do PBA, que ainda não tinha sido contratado em dezembro de 2012 (leia mais). Mas não encaminhou parecer oficial ao Ibama sobre atendimento de condicionantes e implantação do PBA indígena.
“A eficiência que se verifica na execução do cronograma da obra não se reflete na execução das condicionantes sociais, ambientais e econômicas assumidas pela Norte Energia, quando arrematou Belo Monte no leilão promovido pelo governo em março de 2010. O descompasso aumenta de forma extremamente preocupante, degradando de forma crescente as condições de vida na região. Aliado a este descompasso, o poder público parece não ter pulso para enfrentar a questão”, avalia o secretario executivo do ISA, André Villas-Bôas.
O Instituto Socioambiental preparou um quadro comparativo dos pareceres de acompanhamento de condicionantes da Licença de Instalação (LI). A tabela apresenta três colunas: a primeira contém as principais observações do Ibama quanto ao 1° Relatório Semestral de Andamento do Projeto Básico Ambiental e das Condicionantes da Licença de Instalação avaliado em novembro de 2011; na sequência, as mesmas observações quanto ao 2° Relatório emitido em dezembro de 2012. A última coluna trata de observações pertinentes feitas por advogados e especialistas do ISA. (Veja a tabela aqui)
Notificação pode virar recomendação
Em 29 de janeiro de 2013, mais de um mês após a emissão do Parecer Técnico 168/2012, o órgão licenciador notificou a Norte Energia exigindo a conclusão e readequação de algumas das atividades consideradas pendentes no parecer e as necessidades de ajustes, relativas ao reassentamento dos atingidos e à infraestrutura de saneamento da região.
O Ibama exigiu o início da implantação da vila dos trabalhadores (em 60 dias); a compra dos imóveis destinados ao Reassentamento Urbano (em 150 dias), com ampla discussão coletiva; a tomada de medidas provisórias para destinação dos resíduos sólidos em Vitória do Xingu, dado o atraso do cronograma de implantação do aterro sanitário; a apresentação de solução para a comunidade rural que teve suas casas demolidas, dada a proximidade com as obras, sem ter havido reassentamento dos atingidos; e a conclusão, em 60 dias, do esgotamento sanitário de duas comunidades rurais diretamente atingidas – obra que deveria ter sido finalizada há quase um ano.
Entretanto, o órgão ambiental não se pronunciou quanto às demais inadequações, descumprimentos de condicionantes e atrasos de cronogramas – mesmo os mais graves e claros, como a construção irregular dos Ramais de Derivação ou o desrespeito ao Plano de Supressão de Vegetação.
De qualquer maneira, a notificação não traz expressamente a possibilidade de que seja imposta alguma sanção à Norte Energia, no caso de descumprimento dos prazos. Há, portanto, a chance de que essa notificação acabe se tornando mera recomendação.
Fonte: ISA