Fernando Luiz Zancan e Enio Fonseca
Segundo o Dicionário infopédia da Língua Portuguesa a palavra Conceito (do latim conceptus, do verbo concipere, que significa “conter completamente”, “formar dentro de si”), é aquilo que a mente concebe ou entende: uma ideia ou noção, representação geral e abstrata de uma realidade.
Vemos muitos conceitos sendo colocados na mídia de forma a “vender” certas ideias que tendem a levar a entendimentos equivocados, ou levam a direcionamentos que interessam a jogos econômicos ou políticos, o que pode levar a pré-conceitos.
Por exemplo, o conceito exposto na mídia por instituições financeiras, públicas e movimentos ambientais de descarbonizar todas as atividades econômicas, leva a entender que é para acabar com a indústria dos combustíveis fósseis. Os combustíveis fósseis não geram apenas energia, e sim milhares de produtos utilizados na agricultura, na indústria química, alimentícia, farmacêutica e tantos outros usos. Ora não se acaba com as notícias ruins matando o mensageiro. Como o objetivo é reduzir as emissões de gases de efeito estufa então devemos desenvolver tecnologia para reduzir as emissões que os combustíveis fósseis produzem. Portanto, o conceito correto para a palavra descarbonizar é reduzir as emissões das fontes fósseis sem acabar com elas. Até porque elas são muito importantes nas cadeias produtivas de todos os países. Tecnologias de captura, uso e armazenamento de carbono – CCUS – existem desde 1932. Hoje, nos USA existem mais de 6 mil km de gasodutos (duas vezes o gasoduto Brasil-Bolívia) transportando CO2 para uso e recuperação terciária de petróleo. As tecnologias de CCUS ainda são caras, mas se fosse priorizado o investimento em seu desenvolvimento teríamos a mesma curva de aprendizagem que algumas fontes renováveis tiveram com os subsídios disponibilizados ao longo de décadas, especialmente pela Europa e aqui no Brasil via a Conta de Desenvolvimento Energético-CDE.
Outro conceito frequente na mídia é que para descarbonizar deve-se usar exclusivamente as fontes renováveis. A geração por fontes renováveis eólica e solar não emitem gases de efeito estufa, mas ao analisar o ciclo de vida das emissões desde a fabricação dos equipamentos até seu descarte, vemos que também ocorrem emissões. Por exemplo, para que um megawatt de geração eólica possa ocorrer é necessário cerca de 10 vezes mais aço que um megawatt de uma usina a carvão. O aço é feito de minério de ferro e carvão e sua produção emite CO2. Não podemos renunciar a análises comparativas de todo o processo de produção, de todas as fontes, quando tratamos de Transição Energética Justa.
Quando se fala neste conceito, vem uma ideia de que a solução é mudar radicalmente da produção de energia de fontes fósseis para renováveis. Transição é um processo que vem associado ao desenvolvimento de tecnologia. Mudar processos produtivos, para descarbonizar uma economia, demanda a utilização de novos equipamentos mais eficientes, novos métodos produtivos, recursos financeiros para modernização de parques industriais, buscando a eficiência e a segurança energética
Esse processo deve considerar ainda, junto com o incremento das fontes de geração renováveis, o uso dos fósseis com captura de carbono e a energia nuclear que não emite CO2. O que desejamos é um mundo de baixo carbono, com emissões líquidas zero, ou seja, pode-se emitir gases de efeito estufa, mas deve considerar os processos de captura, inclusive os naturais, com destaque para o plantio de florestas. O mundo que consome cerca de 85% da sua energia de fósseis precisa reduzir as emissões, mas isso deve ter uma transição gradual, que mantenha os empregos e a renda, ou seja, a Transição Justa.
Portanto, outro conceito que deve ficar claro o de que a Transição Justa representa a mudança de modelo econômico de um mundo de alto carbono para um mundo de baixo carbono sem destruir valor econômico e social, respeitando ainda os valores da sustentabilidade , do ESG e das ODS da ONU, em especial a de nº 7, que preconiza: “Assegurar até 2030, em caráter universal, energia barata, confiável e sustentável”.
Hoje, no Brasil, pela Lei Federal 14.299/22, foi criado o Programa de Transição Energética Justa para o estado de Santa Catarina, onde há o objetivo de criar, em conjunto com a Lei Estadual 18.330/22, um novo modelo de produção de baixo carbono na região carbonífera do sul catarinense.
Se fizermos uma boa aplicação deste marco legal, poderemos dar um exemplo ao mundo em relação ao planejamento que deve ser feito para viabilizar uma transição energética, além de justa, também responsável. Isso porque iremos evitar situações como observamos hoje em todo o mundo, de aumento de custo dos combustíveis pela persistência em desinvestir em fósseis sem ter um plano estruturado para isso.
A busca do equilíbrio na tomada de decisões que impactam a sociedade deve ser feita com o necessário conhecimento técnico, a partir das melhores práticas produtivas, das tecnologias de ponta, dos custos responsáveis e com o devido respeito às especificidades de cada País.
O Brasil tem uma base de geração de energia elétrica sustentável e diversificada, com espaço para todas as fontes. É o que nos dá uma grande vantagem competitiva, econômica e ambiental em relação a outros países. Cerca de 80% de nossa matriz de geração elétrica é feita por fontes renováveis. Entender os conceitos que tratam da descarbonização é fundamental para saber o que devemos fazer. Infelizmente, a falta dessa compreensão pode acabar por fazer com que todos paguem o preço desta mistura de conceitos ou pré-conceitos.
Fernando Luiz Zancan , Engenheiro de Minas pela UFRGS, Especialista em Gerência de Produção pela UFSC , há 42 anos atuando na atividade carbonífera de Santa Catarina e 33 anos como Secretário Executivo do Sindicato da Indústria da Extração de Carvão desse Estado – SIECESC. Diretor da Associação Beneficente da Indústria Carbonífera de Santa Catarina – SATC desde 1990. Presidente da Associação Brasileira do Carvão Mineral.. Membro do Conselho Consultivo da Indústria do Carvão da Agência Internacional de Energia – CIAB/IEA.Presidente da ABCM- Associação Brasileira de Carvão Mineral.
Enio Fonseca- Engenheiro Florestal, Conselheiro e Ex Presidente e VP do FMASE. Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, Especialização em Engenharia ambiental pelo IETEC-MG, em Proteção Florestal pelo NARTC e CONAF-Chile, em Liderança em Gestão pela FDC, em Educação Ambiental pela UNB, MBA em Gestão de Florestas pelo IBAPE, em Gestão Empresarial pela FGV, Senior Advisor em questões socioambientais, foi Superintendente do IBAMA em MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Conselheiro no Conselho de Política Ambiental do Estado de MG, founder da Pack of Wolves Assessoria Estratégica Ambiental.
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