“Decisão considera que prática delituosa foi comprovada através de provas “robustas, seguras e incriminatórias”, impondo-se sua responsabilização penal.
O Juízo da Vara Criminal da Comarca de Bujari condenou a Fazenda Bella Aliança Agropecuária Ltda. ao pagamento de 50 dias multa, “à razão de um salário mínimo vigente”, pelo desmate ilegal de mais de três hectares de cobertura vegetal de uma Área de Preservação Permanente (APP).
A decisão, do juiz de Direito titular daquela unidade judiciária, Manoel Pedroga, publicada na edição nº 5.606 do Diário da Justiça Eletrônico (DJE, fl. 131), desta quarta-feira (23/03/2016), considera que a prática delituosa restou devidamente comprovada através de provas “robustas, seguras e incriminatórias”, impondo-se, dessa maneira, a condenação da empresa agropecuária.
Entenda o caso
De acordo com a denúncia do Ministério Público do Acre (MPAC), a Fazenda Bela Aliança teria promovido o desmate ilegal de mais de três hectares de cobertura vegetal de uma APP localizada no interior da propriedade, que está situada às margens da BR 364.
Ainda segundo o MPAC, a madeira extraída ilegalmente (cerca de 60 metros cúbicos) teria sido apreendida na própria sede da empresa agropecuária e seria utilizada “na construção de um curral”, evidenciando, assim, conduta delituosa prevista no art. 38 da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais).
A defesa, por sua vez, sustentou que a Bella Aliança “não promoveu nenhum desmatamento ao contrário do que consta no auto de infração e da denúncia”, impondo-se, assim, em tese, a sua absolvição.
Sentença
O juiz titular da Vara Criminal da Comarca de Bujari, no entanto, ao analisar o caso, rejeitou a versão apresentada pela defesa, assinalando que as provas juntadas aos autos são “robustas, seguras e incriminatórias”, sendo, “assim, impossível a absolvição”.
O magistrado também destacou não verificar a incidência de “causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade”, impondo-se, por consequência, a responsabilização penal da demandada pela conduta que lhe fora imputada
O juiz de Direito sentenciante assinalou ainda a gravidade do fato, “tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente”, ressalvando, no entanto, que a área desmatada representa apenas uma pequena fração da propriedade (que possui área total superior a 20 mil hectares), o que autorizaria, no entendimento do magistrado, a aplicação de pena menos gravosa, a teor do que dispõe o art. 21 da referida Lei de Crimes Ambientais.
Por fim, Manoel Pedroga julgou o pedido formulado pelo MPAC parcialmente procedente e condenou a Fazenda Bella Aliança Ltda. ao pagamento de 50 dias multa, “à razão de um salário mínimo”, levando-se em conta o “poderio econômico” da demandada, ressaltado ainda o caráter pedagógico da condenação.
A empresa ainda pode recorrer da sentença condenatória”.
Processo 0500136-57.2010.8.01.0010 (010.10.500136-8)
Fonte: TJAC, 28.03.2016.
Confira a íntegra da sentença:
Processo 0500136-57.2010.8.01.0010 (010.10.500136-8)
Sentença
O Ministério Público do Estado do Acre, por meio de sua Promotora de Justiça atuante nesta Comarca de Bujari ajuizou ação penal contra Bella Aliança Agropecuária Ltda, denunciando-a pelo crime previsto no artigo 38 c/c 45, ambos da Lei 9.605/98.
Descreve a denúncia de páginas 01/08 que, in verbis:
“por derradeiro, através do oficio 770 – IMAC, esta Promotoria tomou conhecimento do desmate de 3,12 hectares de Área de Preservação Permanente – APP ocorrido entre 2001 e 2007.Apura-se no caderno investigatório que a referida madeira seria usada na construção de um curral e, foi apreendida na sede da Denunciada Agropecuária Bella Aliança LTDA, ou seja, na Rodovia Governador Edmundo Pinto (BR 364), Km 64, Fazenda Bella Aliança, Bujari/AC.Ficando assim tal conduta incursa nas sanções do art. 45 da lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais): “Cortar ou transformar em carvão madeira de lei, assim classificada por ato de Poder Público, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo com as determinações.
A denúncia foi recebida, por meio da decisão de páginas 302/303 dos autos.
A Ré foi devidamente citada, conforme certidão de página 313 dos autos. Apresentada resposta à acusação de página 314/317.
Em sede de instrução foram ouvidas as testemunhas arroladas e interrogada a Ré.
Na fase de diligência, nada requereram.
O Ministério Público apresentou suas Alegações Finais, na forma de memoriais, requerendo, em síntese, a condenação da Empresa Ré como incurso na pena do delito do artigo 38 da Lei de Crimes Ambientais.
A defesa, por sua vez, da mesma forma apresentou suas alegações finais, oportunidade em que alegou a preliminar de coisa julgada, no mérito, requereu a absolvição sob argumentos de que os fatos narrados na denúncia não são verdadeiros.
Após, vieram-me os autos conclusos para a sentença.
RELATADO.
FUNDAMENTO.
DECIDO.
Processo em ordem. Antes de adentrar ao mérito da demanda, afasto de plano a preliminar arguida de coisa julgada, uma vez que os fatos aqui apurados, pela primeira vez estão sendo analisados pelo Juízo, sendo descabida a alegação da Empresa Ré, haja vista que não fora lhe oferecido a suspensão condicional do processo sobre os fatos em tela, inclusive cabendo consignar que incabível o instituto de suspensão condicional do processo nos crimes a serem apurados, bem como ainda que os fatos descritos na denúncia de páginas 451/452 não versam sobre os mesmos fatos narrados na denúncia de páginas 01/08.
Passo à análise do mérito.
DO CRIME CAPITULADO NO ARTIGO 38 DA LEI N. 9.605/98.
DA MATERIALIDADE.
A materialidade delitiva vem comprovada nos autos por meio do Auto de investigação preliminar de páginas 09/227 dos autos, sendo que o documento de páginas 158 atesta que 3,12 ha de Área de Preservação Permanente (APP) foi alterada entre 2001 e 2007.
DA AUTORIA.
Da mesma forma, a autoria do crime restou comprovada contra o acusado, como a seguir demonstrado.
A testemunha Carlos Francisco Augusto Gadelha, quando ouvido em Juízo narra que “que reside no município de Brasiléia; que é analista ambiental, trabalhando no IBAMA; recorda que a equipe do IBAMA foi convocada para acompanhar equipe do Ministério do Trabalho e Polícia Federal para fiscalizar crimes ambientais nas dependências da Fazenda Bella Aliança; que a mensuração da área se deu por levantamento feito por GPS (…)”.
A testemunha Diogo Selhorst, em seu depoimento em juízo, asseverou “que é analista ambiental e trabalha no IBAMA; que participou da ação de campo, recordando que técnicos do IBAMA foram convidados a acompanharem equipe do Ministério do Trabalho para fiscalizar a Fazenda Bella Aliança; que foram identificados alguns ilícitos ambientais, como a madeira serrada, desmatamento a corte raso e infrações contra a fauna, não sabendo informar a exatidão; foram lavrados autos de infração distintos; que teve auto de infração para o desmatamento; que ajudou no levantamento de campo e levantamento remoto com imagens de satélite; que foi percorrida toda a área com uso de GSP e foi feito o mapeamento; que o desmate foi realizado sem a devida licença.”
A testemunha MARCELO JOSÉ SILVEIRA LIMA, em seu depoimento, declarou que na época dos fatos trabalhava no setor de geoprocessamento do IBAMA; que não participou da vistoria, que pessoas do setor de geoprocessamento não participam de vistoria, que faziam a interpretação visual das imagens, gerando as informações; que trabalhou com imagens da fazenda Bella Aliança; que fez o parecer constante nos autos.
DO CRIME CAPITULADO NO ARTIGO 45 DA LEI N. 9.605/98.
Aqui sem maiores delongas, em consonância com as alegações do Ministério Público, vislumbro não restar caracterizado o delito em apreço, isso porque durante a instrução processual não se logrou demonstrar que a madeira oriunda de castanheira foi, de fato, abatida dentro da propriedade, de modo a se poder apontar como agente da ação a Agropecuária Bela Aliança, assim como não se conseguiu demonstrar o uso como sendo “para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não…”, como expressa o tipo penal, razão pela qual fica absolvida da imputação quanto ao crime em comento.
Devo mencionar que vigora no sistema processual penal brasileiro o princípio do convencimento motivado, em que o magistrado pode formar o seu convencimento ponderando as provas produzidas nos autos, valorando-as conforme o seu entendimento, desde que o faça fundamentadamente (HC 302.162/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 04/12/2014, DJe 15/12/2014).
No que tange ao crime capitulado no artigo 38 da Lei 9.605/98 as provas colhidas dão conta da ocorrência do crime na forma como descrito na denúncia. As provas são robustas, seguras e incriminatórias. Impossível, assim, a absolvição. De outro lado, diante da fundamentação supra, as teses defensivas caem por terra.
Por fim, não vislumbro causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade, razão pela qual a sua responsabilidade penal se impõem.
A Ré será condenado, como incurso no artigo 38 da Lei 9.605/98.Assim sendo, dispõe os artigos 6º e 21º da Lei 9.605/98 que:
Art. 6º. Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:
I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;
II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;
III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.
Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:
I – multa;
II – restritivas de direitos;
III – prestação de serviços à comunidade.
Tendo em vista se tratar de um pequeno desmate (3,12 ha) quando considerado o tamanho total da propriedade que é superior a 20.000,00 ha, considero como necessário para a reprovação do crime em comento a aplicação tão somente da pena de multa.
Descreve o artigo 18º da Lei 9.605/98 que:
Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.
Portanto, em que pese se tratar de um “pequeno desmate”, levando-se em consideração o impacto causado ao meio ambiente, por se tratar de Área de Preservação Permanente-APP, o poderio econômico da Acusada, uma vez que considerável sua área de extensão e, de sabença de muitos nesse Município ser uma propriedade produtiva principalmente da criação de bovinos, por fim, visando o caráter pedagógico da pena em evitar que novos desmatamentos venha a ocorrer na propriedade sem autorização do órgão competente, entendo como necessária a condenação da acusada em 50 dias-multa à razão de um salário mínimo mensal vigente ao tempo da condenação.
Posto isso, com fundamento nos artigos, 6º, 18º, 21º 50º, todos da Lei 9.605/98, condeno a Fazenda Bela Aliança Agropecuária LTDA, pessoa jurídica de direito privado, inscrito no CNPJ/MF sob o n. 06.954.773/0001-93, sediada na BR-364, Km 64, no Município de Bujari-AC, como incursa na pena do art. 38 da Lei de Crimes Ambientais, a uma pena de multa no valor de 50 dias-multa a razão de um salário mínimo mensal vigente ao tempo da condenação, devendo ser observado quanto a sua execução, o disposto no artigo 51 do Código Penal, ficando o valor retro mencionado destinado ao Fundo Penitenciário Nacional.
Após, o trânsito em julgado, intime-se a condenada para efetuar o pagamento no prazo de dez dias, nos termos do art. 50 do Código Penal.
Não ocorrendo o pagamento, expeça-se a certidão da condenação e demais documentos necessários e envie à Procuradoria do Estado do Acre para ser feita a execução nos termos da Lei.
Transitado em julgado a presente, arquivem-se os autos com as cautelas necessárias.
Publique-se.
Intimem-se.
Bujari-(AC), 09 de março de 2016.
Manoel Simões Pedroga
Juiz de Direito