sexta-feira , 13 setembro 2024
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A IMPORTÂNCIA DE DISCUTIR A AMAZÔNIA LEGAL SOB O OLHAR DE SEUS HABITANTES QUANTO AO USO E ACESSO AOS RECURSOS NATURAIS

Por Paulo Sérgio Sampaio Figueira

A Amazônia Legal é uma área que corresponde a 59% do território brasileiro e engloba a totalidade de 8 (oito) Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins) e parte do Estado do Maranhão (a oeste do meridiano de 44ºW), perfazendo 5,1 milhões de km², foi delimitada nos anos de 1950 para incentivar o desenvolvimento econômico da região amazônica brasileira, por meio de incentivos fiscais e desenvolver políticas públicas específicas para a região.

Vale destacar que a Amazônia Legal Possui 808 municípios que representa 14,5% dos municípios do país; 5,1 milhões de km² que representa 60% do território brasileiro; e 27,8 milhões de habitantes, que corresponde a 13,7% do Brasil.
Embora a Amazônia Legal seja conhecida principalmente pelas vastas florestas naturais, mais de três quartos da população vivem em vilas e cidades. Trinta e seis por cento da população vive na pobreza.

Diante deste cenário há uma necessidade urgente de um caminho alternativo de desenvolvimento que promova a inclusão e o uso econômico dos recursos naturais, buscando fornecer um caminho que proporcione maior renda para a população, ao mesmo tempo em que conserve as florestas naturais e os modos de vida tradicionais.

Entretanto, o que se verifica hoje é que há excessivamente uma preocupação com a Amazônia Legal, principalmente por países europeus, organizações não governamentais, mídia internacional e a própria mídia nacional, atinentes aos seus biomas, sendo que esses mesmos países através de duas empresas são as grandes detentores das concessões que exploram os recursos naturais (minerarias, florestal e hidrelétricas).

Contudo, o que se observa é que existe uma exclusão das populações locais que habitam esses biomas e fazem uso sustentável desses recursos naturais pelo Estado-União, que vivem uma invisibilidade fundiária rural proposital, com desrespeito ao instituto da ancianidade, fato que dá incidência ao calote fundiário rural público e privado, para destinação dessas terras devolutas e remanescentes.

Para completar essa rede de conexão, na maioria das vezes os estudos e as publicações que tratam da Amazônia Legal são oriundas de capital internacional, que não retratam a realidade da população que residem nesses ecossistemas, sem olvidar da ausência de pesquisa cientifica pública e privada, em que os próprios institutos federais, faculdades e universidades conferem maior destaque para fauna e flora sem atentar para a inclusão das comunidades locais e das próprias cadeias produtivas, que busquem a inclusão e a verticalização da produção.

Desta forma, o escopo das políticas públicas do Estado-União para essa região, deveriam buscar realizar uma abordagem sistêmica e inclusiva, que identificasse a verdadeira realidade e a vocação da Amazônia Legal, no aspecto do Direito Agrário, Fundiário e Ambiental, deixando claro que há experiências exitosas na Amazônia Legal, que contradiz com as posições dos países europeus, das organizações não governamentais, da mídia local e internacional, quanto aos aspectos de uso e acesso aos recursos naturais, desmitificando a excessiva mídia local, internacional, e instituições de pesquisa cientifica e tecnológica, que focam sempre nas atividades antrópicas das populações residentes, sem atentar para experiências exitosas locais dessa população residente, sem olvidar do tratamento diferenciado realizado pela máquina pública do Estado-União quanto aos impactos ambientais dessas empresas internacionais.

Outro fator preponderante, é ausência de política pública para realizar a regularização fundiária rural em terras públicas e devolutas e dos próprios projetos de implantação de modelos de uso sustentável (assentamentos rurais, terras quilombolas, unidades de conservação de uso sustentável) com prova legitima de posse e ocupação centenárias, fator impeditivo de prova fundiária para obtenção do licenciamento ambiental e acesso ao financiamento de bancos públicos e privados.

Leis claras e objetivas existem para esse fim, principalmente quando for dar destinação para essas terras e comprovar a existência de comunidades tradicionais. Se existir comunidades residentes apregoa a Lei nº. 11.952, de 2009: […] Art. 8 – Em caso de conflito nas regularizações de que trata este Capítulo, a União priorizará: I – a regularização em benefício das comunidades locais, definidas no inciso X, do art. 3º da Lei n.º 11.284, de 2 de março de 2006, se o conflito for entre essas comunidades e particular, pessoa natural ou jurídica.

Além dessas pontos, ainda tem questões de exigências na própria lei acima elencada. veja-se: Art. 36. Os Estados da Amazônia Legal que não aprovarem, mediante lei estadual, o respectivo Zoneamento Ecológico-Econômico – ZEE no prazo máximo de 3 (três) anos, a contar da entrada em vigor desta Lei, ficarão proibidos de celebrar novos convênios com a União, até que tal obrigação seja adimplida. Aqui reside um grande problema, visto que a maioria dos 9 (nove) Estados da Amazônia Legal não tem ZEE ou lei específica. Situação que não é diferente em outros Estados brasileiros.

Vale ressaltar que a efetivação desses zoneamentos depende tanto de capacidade técnica e política de cada Estado, bem como vontade política para priorizar este instrumento de forma a equilibrar o desenvolvimento econômico com a conservação da natureza, algo desafiador.

Para superar esses desafios, primeiro deve-se consultar os relatório oficial nas bases governamentais e levantar quais os Estados que não implementaram os seus respectivos ZEEs. Em conjunto com a colaboração do governo federal, estaduais e municipais, incluindo a sociedade civil e o setor privado, somente assim será possível superar os desafios e os conflitos fundiário garantindo desta maneira que as decisões tomadas sejam informadas, justas e benéficas para todos os envolvidos. Para completar ocorre ausência de vontade política e na maioria acaba envolvendo debates partidários em que prevalece a vontade de quem está no poder, e que sempre não reflete os anseios da maioria da sociedade e das cadeias produtivas locais e nacionais.

Diante dessa analogia, há necessidade de ser questionado alguns pontos importantes, tais como: Qual o real motivo de tantas burocracias para realizar a regularização Fundiária rural em terras públicas devolutas e remanescentes?; Quais os critérios extrínsecos que são levados para delimitar as terras indígenas, as terras quilombolas, os assentamentos rurais, as unidades de conservação?; Qual o real motivo de não levar em consideração nesses espaços territoriais a ancianidade e a propriedade consolidada legitimas? Qual o real objetivo de se assentar tanta dificuldade para conceder licenciamento ambiental para quem tem posse, ocupações e propriedade consolidada legitimas nessas terras que a União/Estados não promoveram a regularização Fundiária?

Por fim, para as grandes empresas internacionais e as nacionais não há exigência de prova fundiária, visto que tem toda máquina do Estado-União, desde o Congresso Nacional para obter as grandes concessões florestais, minerais, e para implantação de hidrelétricas, dentre outras, que não perpassam por crivo do MPE, MPF, PF, AGU, Ibama, Incra, Procuradorias dos Estados e a Sema, dentre outras.

Talvez aí encontre o cerne dos problemas e os alicerces necessários para entender melhor a teratologia e o imbróglio jurídico estabelecido para reforma agrária, para a regularização fundiária rural, e consequentemente para o licenciamento ambiental com as suas consequências negativas para não provocar o desenvolvimento econômico e social dessa região.

Para completar a lógica maquiavel os institutos de pesquisa científica e tecnológica existentes nos 9 (nove) Estados da Amazônia Legal, como por exemplo IMAZON, dentre outros, e o próprio Estado-União, através do Fundo para a Amazônia Legal, que recebem volumosos recursos financeiros advindos desses países europeus e de organizações não governamentais, para estabelecer o que determina esses países, como aparelho repressivos e de contenção do desenvolvimento econômico e social local, em que esses recursos naturais tem destinação carimbadas.

Com todo esse processo de terras sem destinação e é bom colocar que tem ocupações legitimas centenárias, mas sem nenhuma política pública para fazer a regularização Fundiária, são destinadas a essas empresas internacionais desses países europeus que pregam a manutenção da floresta em pé.

Um exemplo é o que vem ocorrendo com as concessões florestais onerosas com contratos de 40 anos, fruto da Lei Nacional nº. 11284, de 2006.

A dificuldade é tão grande para as cadeias produtivas locais como madeireira, garimpeiros, moveleiros, e agricultura familiar, como por exemplo pode-se relacionar a cadeia garimpeira, que apesar da garantia constitucional (art. 21, XXV, e art. 174, §3º, CRFB/88) tem grande dificuldade de obter concessões de lavra associativa e até mesmo para aproveitar os rejeitos minerais das grandes empresas mineradoras internacionais e da própria mina que foi fechada e que poderia continuar sendo explorados por garimpeiros, simplesmente a União coloca dificuldade e usa suas máquinas públicas de controle social, de poder de polícia e agência da mineração para impedir e servir de modelo repressivos, expondo negativamente desta forma essa cadeia produtiva.

Outro exemplo são as madeiras de leis que são retiradas das explorações das minas na floresta amazônica e são cobertas pelo solo ou ficam acima do solo e entra em processo de decomposição sem nenhum destino aos municípios, as cadeias madeireiras e moveleiras, ou à própria comunidade tradicional. Isso aconteceu nos municípios de Pedra Branca do Amapari e Serra do Navio no Estado do Amapá, em que grandes volumes de toras de madeira não foram aproveitadas na época da MMX.

Outro experiência foi do PAE do Maracá, no Município de Mazagão, em que os assentados tentaram por longos 30 (trinta) anos promoverem o plano de manejo florestal comunitário, inclusive existiu nesse assentamento um Acordo Internacional entre o Brasil e o Japão, com a JICA com esse escopo, e mesmo assim não se concretizou o plano de manejo florestal comunitário, devido ausência documental de gestão ambiental e fundiária, e com a saída da JICA O Estado-União abandonou o projeto.

E uma empresa que atua na Floresta Pública do Estado do Amapá (FLOTA) consegue anuências do INCRA e da SEMA, com todo amparo estatal para realizar plano de manejo florestal privado no assentamento do PAE do Maracá, situação de difícil compreensão, visto que reflete que o empenho não é o mesmo do Estado-União quando se trata das cadeias produtivas locais. É importante esclarecer que não estar aqui discriminando o setor privado, mas é necessário entender que sempre há amarras para as cadeias produtivas locais e uma certa facilidade para grupo empresarial internacional ou que opera com recursos internacionais.

Portanto, são essas nuances que precisa de um olhar holístico e sistêmico da máquina operacional Estado-União e da própria sociedade, visto que o Estado-União realiza uma discriminação e ataque ao princípio da isonomia entre nacionais e internacionais, agindo como órgão repressivo do desenvolvimento econômico e social.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n.º 11.952, de 25 de junho de 2009. Dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia Legal; altera as Leis nos 8.666, de 21 de junho de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/cciviL_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11952.htm. Acesso em: 14 agost. 2024.

BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 20 set. 2023.

BRASIL. Lei nº. 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõe sobre as terras devolutas do Império. Secretaria de Estado dos Negócios do Império. Rio de Janeiro, 20 dez 1850. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L0601-1850.htm. Acesso em: 23 abri. 2022.

BRASIL. Lei n.º 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8629.htm. Acesso em: 19 set. 2023.

BRASIL. Lei complementar n.º 76, de 6 de julho de 1993. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp76.htm. Acesso em: 22 set. 2023.

BRASIL. Lei n.º 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. In: Codex Ambiental. Brasília: Âmbito Comercial, 2009. Base de Dados. Atualização em fev. 2009.

BRASIL. Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4504.htm. Acesso em: 23 abr. 2022.

BRASIL. MAPA. Regularização Fundiária: Cenário e Legislação. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/cartilha-explica-processo-de-regularizacao-fundiaria-na-amazonia/regularizacaofundiariacenariolegislacao.pdf. Acesso em: 23 set. 2023.

FIGUEIRA, Paulo Sérgio Sampaio; DEVISATE, Rogerio Reis; KOHL, Paulo Roberto. Regularização Fundiária: Experiência Regional. Brasília: Gráfica do Senado Federal, 2022.

INCRA. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Institucional. 28 set. 2023. Disponível em: <https://bit.ly/35niJNB>. Acesso em 21 set. 2023.

Paulo Sérgio Sampaio Figueira – Advogado, Administrador de Empresa, Ciências Agrícolas, Professor Universitário com pós-graduação em metodologia do ensino superior, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Direito Eleitoral, Arquivologia e Documentação, com mestrado em Direito Ambiental e Políticas, Presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/AP, Conselheiro do COEMA, Vice-Presidente da Região Norte da Comissão Nacional de Assuntos Fundiário da UBAU, Presidente Nacional de Meio Ambiente e Agrário da UBAM

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