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Sentença contra Salles cita doutrina marxista e desdenha de seu objetivo de desburocratizar processos

Por Maurício Fernandes – Mestre em Direito Ambiental, Professor e atual Secretário Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Porto Alegre.

Causou surpresa e perplexidade a sentença que condenou o novo Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por improbidade administrativa por ato de gestão praticado durante o exercício do cargo de Secretário Estadual de Meio Ambiente de São Paulo.

O primeiro ponto a ser destacado é o fato de a sentença ter sido prolatada justamente no dia 19 de dezembro, véspera do recesso forense e da posse do novo Ministro do Meio Ambiente, fato que pode aventar dúvidas quanto a eventuais intenções de cunho ideológico-partidário do magistrado prolator da decisão. Tal suspeita decorre, justamente, do fato de que o magistrado, Juiz de Direito Fausto José Martins Seabra, titular da 3ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, ao condenar Salles cita ideologia marxista e destaca que ele pretendia desburocratizar e dar celeridade aos processos administrativos ambientais. Eis o referido trecho da sentença do Juiz Fausto:

“Ao depor, o requerido Ricardo de Aquino Salles várias vezes sustentou que o tratamento adequado dos temas ambientais pressupõe o desapego ideológico. Curiosamente, no Dicionário Houaiss há pelo menos duas definições marxistas do vocábulo ideologia e, numa delas, afirma-se que é a totalidade das formas de consciência social, o que abrange o sistema de ideias que legitima o poder econômico da classe dominante (ideologia burguesa) e o conjunto de ideias que expressa os interesses revolucionários da classe dominada (ideologia proletária ou socialista). A defesa do meio ambiente equilibrado é obrigação de todos e, em especial, dos agentes públicos que juram cumprir a Constituição Federal e as leis, independentemente de sua orientação política à direita, esquerda ou centro. É assunto jurídico, embora alguns economistas, por exemplo, vejam o tema ambiental como uma falha de mercado ou externalidade negativa.”

O segundo ponto que causa perplexidade diz respeito ao ato que deu causa à denúncia. Nesse sentido, deve ser recordado que APA é a unidade de conservação de menor proteção entre todas as modalidades previstas pela Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC (Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000). Vale lembrar que até mesmo indústrias podem ser instaladas dentro do perímetro de uma APA, observando, por óbvio, os atributos ambientais que são protegidos, até porque se o espaço e os bens ambientais existentes no referido perímetro territorial necessitasse de uma maior proteção, não seria a constituição de uma APA a modalidade adequada, mas uma das modalidades de unidade de conservação de proteção integral previstas pela Lei do SNUC. Por conta disso, é lamentável a interpretação contrária à proposta desburocratização na análise da viabilidade de empreendimentos localizados no espaço territorial de uma APA. Trata-se de um erro de natureza ontológica, revelando desconhecimento quanto á natureza e finalidade de tal instituto jurídico.

Por fim, cumpre lembrar que a proteção do meio ambiente deve ser sempre embasada por critérios técnicos, não devendo ser utilizada com instrumento de militância ideológica ou perseguição político-partidária contra os gestores ambientais, empreendedores e produtores rurais. Conforme preceitua a nossa Constituição, o direito ao meio ambiente rege-se pelo equilíbrio.

 

Direito Ambiental

 

Clique aqui e leia a íntegra da sentença.

Direito Ambiental

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4 Comentários

  1. O Salles acha que engana quem defendendo intetesses de mineradoras e empresários em detrimento do meio ambiente? Ele se vale da função pra beneficiar esses grupos. Ele ñ me engana com esse discursinho hipócrita.

  2. Quer dizer que o juiz que sentenciou Salles justificou-se como “isento”, “técnico”, mas tudo que fez, foi se apoiar em uma nefanda ideologia, pretensamente “científica” e desideologizada para proferir uma sentença hiper-ideológica?

  3. Da mera leitura da sentença e sem mesmo conhecer o futuro Ministro, fica evidente a dificuldade aprentada pelo Ministério Público e pelo Magistrado com a ideologia com a qual estão impregnados, e talvez até sem consciência. Sem disfarçar a simpatia pelo marxismo, o juiz usou logo o conceito mais pobre de ideologia do marxismo, desprestigiado o clássico conceito de Karl Marx de ideologia como falseamento da realidade.
    Mas me surpreendeu como a sentença reveste-se de ressentimento ao buscar punir a altivez do então secretário de meio ambiente que deixou claro que agiu para corrigir deficiências provenientes das estruturas consultivas, entre as quais, por óbvio, as demandas do setor econômico.
    Quando se fala de unidade de conservação como APA, nenhum interesse é mais legítimo que o outro. Todos são legítimos. Desprezar as demandas do setor econômico é ignorância das condições básicas de produção de um bem da vida ou pura hipocrisia.
    Um plano de manejo de uma APA jamais poderá impedir uma atividade econômica, pois viola o princípio constitucional da legalidade, posto que somente uma norma do tipo lei poderá fazê-lo. Se um determinado atividade não consegue se viabilizar diante da qualidade ambiental que um específico território exige, é aspecto a ser tratado num estudo de impacto ambiental. E mais, mineração assim como potencial energético é matéria de competência da União. Não compete ao Estado membro tratar deste assunto a pretexto de PM de APA.
    Por fim, claro ficou na sentença que não houve afronta ao devido processo legal de tramitação do PM, tanto que se o Secretário tivesse sido mais restritivo quanto a utilização dos recursos naturais, mal não teria havido. O problema foi ter considerado também as demandas do setor econômico. Ora, o Judiciário não pode invadir o juízo discricionário do Executivo, que arca junto ao eleitor com os ônus das suas escolhas políticas!
    Espero que o TJSP corrija a distorção posta, até porque, ” o pau que bate em Chico bate também em Francisco.

    Texto com correção na digitação

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