por Paulo Sérgio Sampaio Figueira.
O Estado do Amapá por ser ainda um Estado “virtual”, sem terra e sem soberania territorial, sonha com o seu desenvolvimento econômico e social, mas parece algo impossível de acontecer em um Estado com constante intervenção federal nos órgãos de meio ambiente, de floresta, de terra, e do setor produtivo, por ações do Ministério Público Federal (MPF), pelo IBAMA, com ações civil pública, cautelar, criminal, e aplicação constante de Auto de Infração e Termo de Embargo.
Desta maneira, a manutenção de um meio ambiente não pode significar o estanque de progresso econômico, da qualidade de vida, do acesso a novas tecnologias, sob o risco de, justamente, a preservação excessiva da natureza desequilibrar o acesso a um ambiente, com vistas a extrair da terra de forma sustentável os bens que possam satisfazer as necessidades das gerações presentes sem prejuízo das futuras, no contexto da ordem econômica constitucional.
Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA/USP) em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) o agronegócio tem sido reconhecido como um vetor crucial do crescimento econômico brasileiro. Em 2019, a soma de bens e serviços gerados no agronegócio chegou a R$ 1,55 trilhão ou 21,4% do PIB brasileiro. Dentre os segmentos, a maior parcela é do ramo agrícola, que corresponde a 68% desse valor (R$ 1,06 trilhão), a pecuária corresponde a 32%, ou R$ 494,8 bilhões.
Por sua vez, a CNA relata que o valor bruto da produção (VBP) agropecuária alcançou R$ 651,5 bilhões em 2019, dos quais R$ 400,7 bilhões na produção agrícola e R$ 250,8 no segmento pecuário. As estimativas e projeções mais recentes da CNA, apontam que o VBP em 2020 deve alcançar R$728,68 bilhões – R$ 457,08 bilhões do ramo agrícola e R$ 271,6 do ramo pecuário -, um incremento de 11,8% frente a 2019, mesmo diante da pandemia corona vírus.
Vale ressaltar, segundo dados da CNA que a soja (grãos) é o carro-chefe da produção agropecuária brasileira, responsável por aproximadamente R$ 1,00 de cada R$ 4,00 da produção do setor no Brasil. O segundo lugar no ranking do VBP da agropecuária brasileira é ocupado pela pecuária de corte, com R$ 139,7 bilhões, em 2020. O terceiro maior VBP é o do milho, com R$ 90,7 bilhões, seguido da pecuária de leite (R$ 50,9 bilhões), e da cana (R$47,4 bilhões). O frango (R$ 43,9 bilhões) aparece em sexto lugar, seguido do café R$ 28,5 bilhões e algodão com R$ 20,5 bilhões, sendo que o setor absorve praticamente 1 (um) de cada 3 (três) trabalhadores brasileiros.
Além desses dados para a balança comercial brasileira, é importante enfocar que o Brasil é hoje o maior exportador de açúcar, café, suco de laranja, soja em grãos e carnes bovina e de frango; o terceiro maior de milho, e o quarto de carne suína. É também o maior produtor mundial de café e suco de laranja; o segundo na produção de açúcar, soja em grãos e de carnes bovina e de frango; o terceiro na produção mundial de milho; e é o quarto maior exportador mundial de produtos agropecuários, aproximadamente USD 96,9 bilhões, atrás apenas da União Europeia, EUA e China (CNA, 2020).
O Brasil e o Amapá tem uma grande missão, quando o tema é segurança alimentar. O Estado, no âmbito de suas funções de incentivo e planejamento, precisa buscar e de dar aos agentes privados, além da segurança jurídica, a eficiência e a consecução das atividades econômicas que, atualmente, compõem o agronegócio, em especial à produção agrícola em sentido latu. Para tanto, é necessário olhar o setor e sua missão como uma política de Estado e não de governo, sem olvidar do pavor que tem os políticos atuais do Amapá de enxergar o avanço no agronegócio com a participação dos nacionais como possíveis políticos do futuro do Amapá.
Desta maneira, é necessário se buscar uma forma de flexibilizar as normas para várias atividades do meio rural já em atividades, como o plantio de grãos no cerrado, não estamos falando de um novo empreendimento ou nova área. Mesma situação deve ser observada quanto ao licenciamento anual em que o empreendedor é obrigado a renovar a licença concedida todo ano para a mesma atividade sem que seja alterado o projeto, não tendo que arcar com a falta de pessoal por parte do órgão fiscalizador.
O Amapá abriga em seu território 19 unidades de conservação, sendo doze federais, cinco estaduais e duas municipais, distribuindo-se em territórios de quinze dos dezesseis municípios amapaenses. A área total delas é de aproximadamente 90 mil Km2 equivalendo a mais de 60% do território estadual. Se forem adicionadas as cinco Terras Indígenas, com cerca de 1,2 mil Km2, a proporção de áreas com algum tipo de proteção ultrapassa 70% do total da extensão territorial do Amapá.
O Amapá possui 16 municípios. Quando da criação do Território Federal havia apenas três: Macapá, Mazagão e Amapá. Oiapoque foi elevado à condição de município em 1945 e Calçoene em 1956. Em 1987 a Lei Federal n.º 7.639 criou mais quatro: Ferreira Gomes, Laranjal do Jari, Santana e Tartarugalzinho. Logo após transformação em Estado, foram criados os municípios de Pedra Branca do Amapari, Cutias do Araguari, Itaubal, Porto Grande, Pracuúba, e Serra do Navio. Finalmente, em 1994 é criado o 16o município: Vitória do Jari.
Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa) no Amapá, o Estado possui cerca de 400 mil hectares de sua área de Cerrado aptos para a agricultura. Nos últimos 5 (cinco) anos, a área de soja plantada no Amapá quadruplicou, passando de 4.550 hectares em 2013 para 18.900 em 2017 (CHELALA, 2018). Vale ressaltar que a partir de 2019 os empreendedores do agronegócio não estão conseguindo renovar as licenças ambientais e as novas concessões por Recomendação do MPF e pela inércia da Procuradoria Geral do Estado (PGE), os órgãos licenciador do Estado e de Terras em apresentar defesa técnica quanto ao Termo de Cooperação Técnica com a União, através do IBAMA e do INCRA para realizar licenciamento ambiental e expedir títulos de terra. No Gráfico 1 a demonstração da evolução da área plantada de 2012 -2017:
Gráfico 1 – Evolução da área plantada de cultura temporária de grãos no Estado do Amapá, em hectares.
Em 2012, não foi identificado nenhum hectare da cultura plantado, passando para 4,5 mil ha em 2013. No ano seguinte, o crescimento da área foi de 249%, ultrapassando a marca de 15 (quinze) mil ha. Nos dois anos finais da série prossegue a evolução positiva até a expectativa de uma área plantada superior a 18 (dezoito) mil ha para este ano de 2016 (CHELALA, 2018).
Desta forma, é importante ressaltar nesse aspecto que o desenvolvimento do agronegócio no Amapá vem desde o início do século 20, quando foi instituída a Cooperativa de Produtores agrícolas do Cerrado Amapaense (COOPAC), que teve como objetivo aproveitar as condições de logística e incentivo governamental para produzir grãos no Estado.
Entretanto, o agronegócio somente teve um aumento significativo no ano de 2014 no Estado. Vale ressaltar que nos anos que antecederam 2012, quando o modelo de licenciamento regulamentado para qualquer atividade era utilizado unicamente os ritos das três etapas (LP, LI e LO), não houve progresso, o que impedia a expansão do agronegócio, sem olvidar do entrave da regularização fundiária requisito necessário para aquisição da concessão do licenciamento ambiental.
O Estado do Amapá apresenta boa disponibilidade de terras a preço mais competitivo do que nas demais regiões produtoras do país. Estudo da EMBRAPA sobre o cerrado amapaense concluiu que aproximadamente 176 (cento e setenta e seis) mil hectares deste domínio pode ser destinado à agricultura. Abaixo Gráfico 2 que descreve a Evolução das receitas da produção de soja e milho no Amapá:
Gráfico 2 – Evolução das receitas da produção de soja e milho no Amapá (valores em R$ de 2016)
Atualmente, a agropecuária responde por 2,1% do Produto interno Bruto do Amapá (CHELALA, 2018). Estudos publicados pela EMBRAPA avalia que é possível chegar a mais de R$ 1,7 bilhões, o que poderá vir a representar em torno de 10% do PIB estadual.
Atualmente é praticamente impossível conseguir um titulo fundiário definitivo no Amapá. Estudo da EMBRAPA identificou que apenas 6% dos produtores de grãos no Estado detém este documento (CASTRO, ALVES, 2014, p. 32, apud CHELALA, 2018). Saliente-se que este percentual pode ainda estar superestimado, pois a fonte da informação pesquisada foi a auto declaração dos entrevistados e não a pesquisa documental em si, tendo sido possível ter ocorrido viés de alta, pois é de se esperar que alguns dos entrevistados tenham dificuldade em distinguir títulos de posse precária com documento de propriedade definitiva (CHELALA, 2018).
Todos os empreendimentos localizados em áreas rurais devem possuir registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR), informando a situação das Áreas de Preservação Permanente (APP) e das Áreas de Reserva Legal. O empreendedor que não tiver o CAR deve acessar o site do Governo federal (http://www.car.gov.br/#/) para realizar seu cadastro.
Para os processos de licenciamento e de autorizações para intervenção ambiental de atividades do grupo agrosilvopastoril (agricultura, pecuária, avicultura, suinocultura, aquicultura, entre outras), o empreendedor deveria solicitar ao extinto IMAP (hoje a SEMA) a Licença Ambiental Única (LAU). Essas atividades poderiam ser realizadas em separado ou conjuntamente, sendo expedida uma única licença: a LAU. Empreendimentos que ocupassem área maior que 1000 hectares ou área ambientalmente frágil deveriam, obrigatoriamente, apresentar o Estudo prévio de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EPIA/RIMA).
Para requisição da LAU, o interessado deveria executar os mesmos procedimentos citados para a solicitação da Autorização Ambiental (AA). Ao fim do prazo de vigência, o empreendedor deveria solicitar a renovação dessa modalidade de licença ambiental.
Sob o enfoque do agronegócio, este entrave afeta profundamente a viabilidade do agronegócio no Amapá, especialmente porque a ausência do documento de propriedade impede os agricultores de acessar programas oficiais de financiamentos, que apresentam as melhores condições do mercado, como os oriundos do Fundo Constitucional do Norte (FNO).
Esta verdadeira maratona percorrida pela estruturação da operacionalização da legalização fundiária no Estado revela que o principal dos entraves que impedem o desenvolvimento mais célere e sustentável do agronegócio no Amapá ainda está longe de ser superado, em parte pelo excesso de burocracia, em parte pela condução excessivamente lenta que o governo do Estado optou por tratar a questão fundiária no Estado, e pela desconfiança da União através dos seus órgãos em repassar as terras em definitivo.
Analisando as legislações nacionais, é notório que para que uma atividade possa ser licenciada torna-se necessário que sejam apresentados documentos comprobatórios de posse da área no qual o empreendimento irá ser executado. Nesse aspecto, o extinto IMAP considerava aptas ao licenciamento para o agronegócio somente propriedades que tivessem título definitivo ou a concessão de uso expedido por órgãos competentes, antes da criação da Lei complementar n.º 091, de 6 de outubro de 2015, fato que travava todo processo de licenciamento, visto que no Amapá ainda perdura possuidores e proprietários ainda em fase de regularização de títulos.
Essa situação de regulamentação fundiária no Estado do Amapá é uma questão chave no desenvolvimento de inúmeras atividades, pois grandes partes das áreas ainda são de domínio da União, em que não houve a transferência de terras ao Amapá.
No cenário atual o Instituto de Terras do Amapá administra somente 11,38% do seu território, ficando com o INCRA 39,77%; IBAMA 40,68% e FUNAI 8,17%.
Outra novidade concernente à atividade do agronegócio advém da alteração no Código Ambiental do Amapá, com a criação da Lei Complementar n.º 091, de 2015. Nela, especificamente no seu artigo 10,parágrafo terceiro, inciso I, estabeleceu que para o licenciamento de atividades agrosilvopastoris, poderiam ser aceitos pelo órgão ambiental, como documentos comprobatórios de posse, o contrato de compra e venda de imóvel, acompanhada pela devida certificação emitida pelo extinto IMAP.
A grande questão a respeito desse processo, diz respeito ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), por se tratar de política pública agrária nacional, visto que não apresenta definição estadual quanto a efetivação e devida comprovação de suas informações, processo esse paralisado no Amapá, na SEMA, desde 2018.
Essas documentações exigidas são somente dados declaratórios, que necessitam de averiguação; sem olvidar que as condicionantes de averbação da Reserva Legal (ARL) não foi objeto de obrigatória pela lei do Amapá. Fato que foi comprovado nas ações de vistoria e de fiscalização realizada pelo IBAMA, ocasionado em parte pelos problemas fundiários ainda presentes e devido em que havia a exigência do órgão federal para a Autorização para Supressão de Vegetação (ASV) em que nenhum empreendedor apresentou autorização do órgão ambiental para a supressão de vegetação, exigência prevista no artigo 26 da Lei n.º 12.651 de 2012 (novo Código Florestal), para as áreas autorizadas a executar o agronegócio.
O licenciamento da atividade do agronegócio libera a execução do empreendimento, mas a retirada da vegetação para seu funcionamento deve ser licenciada à parte, o que não ocorreu nos licenciamentos realizados pelo extinto IMAP. Nesse ponto, o IBAMA, de acordo com as definições da legislação ambiental, cobrou desses empreendimentos a devida comprovação, que culminou com as autuações e os respectivos embargos pelo órgão federal.
Mesmo após essa cobrança inicial, a permissão para Autorização da Supressão de Vegetação (ASV) continuava a não ser contemplada no processo de licenciamento ambiental para o agronegócio pelo órgão licenciador. Assim, o IBAMA, em meados de 2016, multou vários empreendimentos ligados ao agronegócio, obrigando-os, dessa forma, a regularizar essa situação junto ao extinto IMAP.
O processo no extinto IMAP somente respeitava o rito do licenciamento ambiental, sem contemplar a licença ambiental para emissão do Sistema DOF para analisar e liberar autorizações que permitem a supressão de vegetação, ou seja, o processo tramitava somente no setor do licenciamento ambiental havendo falha no processo.
É importante salientar que ARL e a APP são contempladas com mais detalhamento na licença ambiental para a supressão de vegetação, e se elas não forem bem abrangidas, restava a dúvida de que realmente esses percentuais legalmente assegurados na lei eram respeitados.
É oportuno acrescentar que a Lei Complementar n.º 091, de 2015, estabeleceu que empreendimentos de até 2.500 hectares, são considerados de baixo potencial degradador e poluidor, e os acima desse tamanho, serão considerados de médio e alto impacto. Além disso, ficou estabelecido que empreendimentos agrosilvopastoris de até 4 módulos fiscais ficam isentos de apresentar estudos de impacto ambiental e Anotação de Responsabilidade Técnica (ART).
A partir dessa norma, mudanças nos cenários para o agronegócio extremante significantes foram notadas. A primeira delas foi à alteração do artigo 12 do Código de Proteção ao Meio Ambiente do Amapá, no qual foi acrescentado a LAU, que trata de uma licença que engloba as três etapas convencionais para o licenciamento (LP, LI e LO) em uma única licença. Essa adoção dessa norma em 2015 foi um dos principais fatores para o aumento da demanda por atividades ligadas ao agronegócio no Amapá.
Vale ressaltar, entretanto, que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot a época, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5475/AP) no Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido de suspensão cautelar, contra a lei do Estado do Amapá que dispõe sobre Licença Ambiental Única para atividades e empreendimentos de agronegócio.
A ação questionava o artigo 12, inciso IV, parágrafo 7º, da Lei Complementar 005, de 1994, alterada pela Lei Complementar n.º 70, de 2012, para criar a “Licença Ambiental Única (LAU)” para atividades e empreendimentos relacionados a agricultura, pecuária, avicultura e outras, além de extrativismo e atividades agroindustriais. Essa licença, segundo a ação da PGR, substitui outras licenças ambientais e etapas do processo de liberação de obras e empreendimentos.
O Procurador-Geral da República sustentava que essas leis estaduais violam a competência privativa da União para editar normas gerais para proteção do ambiente, na forma do artigo 24, inciso VI, da CRFB, de 1988. Argumentava ainda que elas ofendiam o artigo 225 (caput e parágrafo 1º, inciso IV), que impõe ao poder público o dever de defender e preservar o ambiente e exige estudo prévio de impacto ambiental (EPIA) para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental.
Nesse objeto solicitava que o STF acolhesse o argumento de inconstitucionalidade formal por usurpação de competência da União para legislar sobre o tema, que considerava violação do princípio da precaução do ambiente equilibrado, segundo o qual “havendo conflito legislativo entre União e os Estados, deve prevalecer a norma mais restritiva, ou seja, aquela que melhor defenda o ambiente”.
Por considerar que as normas federais que tratam de preservação ambiental são bem mais rigorosas e asseguram maior controle de atividades potencialmente poluidoras, o Procurador-Geral da República solicitou a concessão de liminar para suspender os dispositivos questionados e, no mérito, a declaração de inconstitucionalidade das mesmas.
A ação foi distribuída à ministra Cármen Lúcia. Em razão da relevância da matéria, a ministra aplicou ao caso o rito abreviado previsto no artigo 12 da Lei n.º 9.868, de 1999 (Lei das ADIs). A medida faz com que a ação fosse julgada pelo Plenário do STF diretamente no mérito, sem prévia análise do pedido de liminar.
No dia 21 de abril de 2020, o STF em sessão virtual julgou e emitiu a seguinte decisão quanto a ADI 5475/AP:
[…] O Tribunal, por maioria, julgou procedente o pedido formulado na ação direta para declarar formal e materialmente inconstitucionais o inc. IV e o § 7º do art. 12 da Lei Complementar nº 5/1994 do Amapá, alterada pela Lei Complementar estadual nº 70/2012, nos termos do voto da Relatora, vencido o Ministro Gilmar Mendes. A Ministra Rosa Weber acompanhou a Relatora com ressalvas. Não participou deste julgamento, por motivo de licença médica no início da sessão, o Ministro Celso de Mello (art. 2º, § 5º, da Res. 642/2019). Plenário, Sessão Virtual de 10.4.2020 a 17.4.2020.
Portanto, o STF considerou procedente o pedido formulado na ação direta da Procuradoria Geral da República para declarar formal e materialmente inconstitucionais o inciso IV e o § 7º do artigo 12 da Lei Complementar n.º 005 de 1994 do Amapá (Código Ambiental), alterada pela Lei Complementar Estadual n.º 70, de 2012, que inovou com a LAU.
Vale ressaltar, entretanto, que a decisão proferida na ADI 5.475/AP não acompanha a lógica das ultimas decisões da corte na ADI 4.615/CE e até mesmo com a decisão proferida na ADI 5.312/TO proposta em face da Lei n.º 2.713, de 2013 do Estado do Tocantins que dispensava de licenciamento ambiental as atividades agrosilvopastoris. Para corroborar nesse entendimento elenca-se o entendimento do Dr. Antunes[1] quanto a decisão do STF:
[…] Entretanto, aos 20/04/2020, o STF julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade [ADI] 5.475/AP[10] para declarar formal e materialmente inconstitucional o inc. IV e o § 7º do art. 12 da Lei Complementar nº 5/1994 do Amapá, alterada pela Lei Complementar estadual n.º 70/2012 que instituía a Licença Ambiental Única[11], na verdade uma forma simplificada de licenciamento ambiental, tal como existente em outros estados da federação. […] A Lei do estado do Amapá não suspendeu a exigência de licenciamento ambiental, limitando-se a estabelecer um conjunto de licenças, dentro do qual se encontrava a Licença Ambiental Única. […] Entendemos que, certamente, o STF teria andado melhor se tivesse examinado a questão pela ótica do artigo 23 e não do artigo 225, § 1º, IV , pois a mensagem transmitida é que os estudos prévios de impacto ambiental se constituem em regra no que se refere à avaliação ambiental de empreendimentos. É importante que o STF reveja a decisão proferida na ADI 5475/AP, pois ela está em contradição com a jurisprudência mais recente da Corte e pode implicar na invalidação dos sistemas de licenciamento ambiental que estão em plena aplicação em muitos estados e municípios brasileiros […].
Verifica-se, que mais uma vez, o Estado do Amapá, foi penalizado com severo ataque ao princípio da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade, quando para a mesma matéria dos Estados do Ceará e do Tocantins as normas foram consideradas constitucionais no aspecto da simplificação de licenciamento ambiental que não é exigido EIA/RIMA.
Desta maneira, além do desentendimento de aplicação de normas com o IBAMA, agora o STF revogou os dispositivos da LC nº. 005, de 1994, trazendo desta forma mais complicação para as atividades do agronegócio que deverá proceder a um licenciamento corretivo junto ao órgão licenciador do Estado.
Quanto a Área da Reserva Legal (ARL) para o cerrado é de 35% e que deve ser mantido as APPs, entretanto o Código Florestal apresenta ponderações e vantagens competitivas para os Estados organizados nas ferramentas de gestão, como a diminuição do percentual de ARL caso a área em que se localiza a propriedade esteja contemplada pelo ZEE, assim como a incorporação das áreas de APP dentro da ARL de uma propriedade pequena.
Sem olvidar que o Amapá tem 65% de suas áreas protegidas, o que garante essa estabilidade competitiva, inclusive contida no Decreto que criou o Parque Nacional Montanhas de Tumucumaque, em 22 de agosto de 2002. Entretanto, essa vantagem competitiva o Amapá não apresenta, pois não elaborou o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) e não submeteu a aprovação da União, sendo que recursos federais e de Cooperação Internacional teve a disposição desde o PPG-7, no ano de 1997, tentativa realizada pelo IEPA e em meados de 2015 pela EMBRAPA, cujo produto foi um Relatório, visto que não foi aprovado pela avaliação da União para ser recepcionado como ZEE.
Esse entrave persiste entre a União através do IBAMA e órgão licenciador do Estado e dos Municípios descentralizados que insistem em análise de licenças ambientais com base no ZEE do IEPA e da EMBRAPA, reprovados pela União que somente recepciona as informações do Projeto Radam.
Desta maneira, o grande prejudicado é o setor produtivo que cada vez mais se ver numa encruzilhada de insegurança jurídica pela ausência de entendimento dos órgãos ambientais do SISNAMA e dos órgãos intervenientes.
Vale ressaltar, que o número de solicitações de licenciamento ambiental aumentou consideravelmente a partir de 2015 devido a fatores como a adoção da Licença Ambiental Única (LAU) pelo Estado através da LC n°. 091, de 2015. Entretanto, a partir de 2018 as atuações de vistoria e de monitoramento do IBAMA detectaram ausência de licenciamento ambiental para Autorização para Supressão da Vegetação (ASV), o que desencadeou Recomendações do Ministério Público Federal, quanto à adoção pelo órgão licenciador do Estado para exigência do CAR, da titulação da área, e pela obrigatoriedade do licenciamento ambiental para Autorização da Supressão da Vegetação.
Posto isso, verifica-se que a LAU aplicava-se corretamente ao Amapá para as atividades do agronegócio, bastando a simples observância quanto ao quesito Autorização para Supressão da Vegetação (ASV), o que pode ser suprida pela elaboração do Termo de Referencia Compartilhado, pois até 2019 não havia sido definido a ADI 5.475/AP da LAU pelo STF.
Para iniciar uma lavoura hoje, o empreendedor necessita ter título da terra, Cadastro Ambiental Rural (CAR) regularizado, área de supressão e reserva legal delimitada. Desta maneira, não deveria ser adotado para o agronegócio as mesmas exigências de um procedimento administrativo de licenciamento complexo, como se fosse uma hidrelétrica, mineradora de grandes portes, sem olvidar das anuências de outros órgãos ligados ao processo de licenciamento, como FUNAI, Fundação Palmares, ICMBIO, e IPHAN, que demoram em se posicionar, o que acaba prejudicando a concessão das licenças, sem olvidar da ausência de normas quanto à exigência de prazo para deliberar sobre a anuência em Termos de Referencia no Estado do Amapá.
O ideal é que o produtor rural tenha acesso a um sistema eletrônico pelo qual possa emitir sua própria licença ambiental sem a necessidade de se deslocar do seu trabalho ao órgão licenciador como vem ocorrendo no Amapá que ainda não tem um sistema on line de licenciamento ambiental.
A título de ilustração, alguns Estados já adotam modelos céleres de licenciamento, como por exemplo, em que o empreendedor preenche um cadastro prévio, insere seus dados naquelas condições preestabelecidas e tira uma licença eletrônica do sistema. É claro que, se você fizer uma declaração falsa e estiver fora da linha, é crime, vai ser punido pela lei de crime ambiental. O Estado de Santa Catarina lançou o Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC), previsto nas modalidades de licenciamento ambiental através da Resolução CONSEMA n.º 98 de 2017. O LAC será efetuado em meio eletrônico, em uma única etapa, através de declaração de adesão e compromisso do empreendedor, mediante critérios e condições estabelecidas pelo órgão ambiental licenciador, no caso o Instituto do Meio Ambiente (IMA).
Desta maneira, diante de tanta insegurança jurídica estabelecida no Amapá e a total recepção das Recomendações do MPF aceita como verdade real e com valor de poder vinculante, sem defesa técnica da PGE, da SEMA e do Amapá Terra quanto a competência material do Amapá advinda de Termo de Cooperação Técnica com a União para realizar titulação conjunta com o INCRA e substituir o IBAMA nas licenças ambientais em terras da União, acabou sendo um fator negativo e hoje os empreendedores nacionais do agronegócio estão abandonando o Amapá e a única possibilidade de arrecadação e de geração de emprego acabou no Amapá.
Posto isso, o Amapá retorna seu estado a quo de 34 anos de atraso tendo como a principal característica da economia amapaense é a expressiva participação da Administração Pública nas atividades econômicas. É comum a expressão “economia do contracheque” (público), em alusão ao fato de que a movimentação econômica é bem mais ativa nas datas de pagamento dos servidores públicos do que em outros períodos do mês.
Triste é observar a quantidade de faculdades no Amapá e Institutos Federais, formando mão-de-obra qualificada, mas sem nenhuma perspectiva de emprego e renda, com total abandono nos municípios do Estado vindo para a Capital para impactar cada vez mais os ambientes úmidos (ressacas) e aumentar o índice de criminalidade na capital.
Em síntese, um Estado “VIRTUAL”, sem terra, sem politica pública, sem possibilidade mínima de desenvolvimento econômico e social, que afasta de vez os empreendedores nacionais pela insegurança jurídica do acesso a TERRA e do LICENCIAMENTO AMBIENTAL.
REFEÊNCIAS
CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL. Comunicado Técnico do VBP, Maio/2020 – CNA. Dados até abril e preços corrigidos pelos IGP-DI. Valor Bruto da Produção Agropecuária em 2019, a preços de abril de 2020. CNA, 2020.
CHELALA, Charles. Perfil Socioeconômico do Amapá: Diagnóstico e Análise Estratégica. Macapá: Práxis Consultoria, 2018. 44p.
FIGUEIRA, Paulo Sérgio Sampaio. Análise e Sugestão para Desenvolvimento das Cadeias Produtivo do Amapá. Macapá: Cavalcante & Figueira, 2020. 610p.
______. Programa de Gestão Ambiental Municipal do Estado do Amapá. Macapá: SEMA, 2009. 108p.
______. Direito Ambiental Brasileiro: Estudo de caso de Descentralização Ambiental no Estado do Amapá. Macapá, 2015. 270p.
______. Direito Ambiental Brasileiro e Política Pública: Uso Sustentável da Floresta de Várzea no PAE do Maracá do Projeto Jica. Macapá, 2015. 262 p.
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Nota:
[1] ANTUNES, Paulo de Bessa. Como uma onda no mar: a recente jurisprudência sobre licenciamento ambiental do STF. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2020/06/09/jurisprudencia-licenciamento-ambiental/. Acessado em: 19 jun. 2020.