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O plenário da Assembleia é o fórum adequado para debater o Projeto de Lei que veda o sacrifício dos animais nos cultos religiosos

Por Maurício Fernandes da Silva
Consultor Jurídico Ambiental
Mestre em Direito

mfsA Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul (AL/RS) deliberou ser inconstitucional o Projeto de Lei (PL) 21/2015 de autoria da deputada Regina Becker (PDT). O projeto buscava a retomada da redação original do Código Estadual de Proteção aos Animais (Lei n. 11.915/03), retirando parágrafo que autoriza o sacrifício de animais em rituais religiosos. O Relator da CCJ, Deputado Gabriel Souza foi o único dos doze deputados que reconheceu a constitucionalidade do PL.

Inafastável reconhecer a polêmica que se reveste o Projeto, pois afeta diretamente interesses, costumes, crenças e dogmas das mais variáveis origens. Contudo, a abordagem ora eleita restringir-se-á à constitucionalidade da proposta, sem adentrar no mérito.

A CCJ mostrou-se política, não jurídica. Ocorre que nos termos regimentais, deveria ser um fórum técnico, restrito à análise da Constitucionalidade das matérias. Entretanto, no dia 28 de abril de 2015 a AL/RS velou a CCJ e criou uma “Comissão Política”, avocando debate que deveria ser levado ao Plenário.

A norma vigente, que permite o sacrifício e a morte aleatória de animais o Estado do Rio Grande do Sul, descumpre a Constituição Federal. Estão em um mesmo nível de resguardo a proteção de todas as formas de vida, a livre manifestação cultural e religiosa, dentre tantos outros direitos fundamentais. Ocorre que um interesse não pode se sobrepor ao outro.

É possível o desenvolvimento de manifestação cultural e religiosa sem ferir outro direito fundamental assegurado constitucionalmente. Ou seja, não resta dúvida de que as manifestações religiosas são protegidas, assim como as manifestações culturais e, no mesmo nível, a proteção de todas as formas de vida. Foi uma decisão republicana do legislador constituinte, queira-se ou não.

O tema não é novo, e o Supremo Tribunal Federal já o abordou em diversas ocasiões. Por exemplo, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1856 o Procurador-Geral da República levou à análise do STF lei fluminense que autorizara rinha de galo. No Recurso Extraordinário n. 153531 o julgamento foi contra norma do Estado de Santa Catarina que regulamentava a Farra do Boi (prática açoriana que submete bovino à crueldade nos festejos da páscoa). Em ambas a interpretação conforme a constituição foi a de que as manifestações culturais podem e devem ser reconhecidas e preservadas, desde que não ofenda outro direito fundamental constitucionalmente assegurado, como a vedação de condutas que submetam os animais à crueldade.

Ora, não há falar em conflitos de direitos fundamentais. É preciso ponderá-los e conciliá-los. Na ADPF n. 54 (que tratou de feto anencéfalo, afastando o crime de aborto) a pressão religiosa era tamanha que o STF sentenciou: "o Brasil é uma república laica, surgindo absolutamente neutro quanto às religiões.” Essa neutralidade não significa respaldar conduta que ofenda outro bem juridicamente protegido, pelo contrário. Consiste em respeitar, mas jamais corromper a constituição em nome da religião.

Em suma, o que as interpretações do órgão guardião da constituição nos ensina é que deve ser garantida a liberdade de qualquer manifestação religiosa, desde que não submeta nenhum animal à crueldade.

Logo, a atual autorização genérica, contida na Lei Estadual que permite indistintamente o sacrifício de animais em rituais religiosos, é ofensiva à Carta Magna. Nesse sentido, aliás, espera-se que o Ministério Público ajuíze Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.

E aos Deputados, parafraseando João de Almeida Neto, peço que “não falte coragem a esses homens” e pautem o tema em plenário, sem esconder-se em falsos argumentos pseudo-inconstitucionais.

 

 

 

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