Por Marina Meyer Falcão
Vivenciamos um momento ímpar para pavimentar o futuro do setor de distribuição do país, tendo como grande divisa o processo de renovação dos contratos de concessão das distribuidoras de energia. E como fazer isso? Apenas vamos conseguir por meio do diálogo com toda sociedade civil e com respeito absoluto às competências do legislador e do Poder Concedente: o MME.
Não podemos mais lamentar ou dizer que nosso sistema elétrico é diferente e mudou. O aumento da participação de geração solar nas instalações do consumidor nos aproxima das experiências mundiais. Basta olhar para quem está na frente dessa transformação – caso da Califórnia e da Austrália – não somente com o aumento da participação dos recursos energéticos distribuídos, mas também da oportunidade de todas as formas de geração de energia poderem conviver em harmonia por lá – sem predileção de uma ou outra fonte em detrimento de outras.
O cenário do setor de energia elétrica hoje passa por profundas transformações, no entanto está completamente atrasado – em termos de modernização da infraestrutura básica de condições de acesso à rede (linhas de transmissão, distribuição e obras de subestação). Impulsionado pela transição para sistemas inteligentes, pelo crescente uso de fontes de energia renovável e pela descentralização da matriz energética brasileira o sistema interligado nacional já não é mais o mesmo de 30 anos atrás.
Precisamos urgentemente de trazer um equilíbrio nos contratos, através de uma adaptação nas tarifas de eletricidade, em conjunto com instrumentos e mecanismos de segurança de mercado. Maior segurança no ambiente livre diminui os custos de transação e de default – que seriam arcados pelo ambiente regulado em momentos de mudanças abruptas e tende a proteger o consumidor regulado.
É fundamental entendermos que o grande protagonista desse processo não tem que ser o Legislativo e nem o Executivo, e sim o consumidor de energia brasileiro, que busca a redução de gastos e ganhos de eficiência, pois já não aguenta pagar uma conta tão alta. A propósito, se vamos debater o novo papel das distribuidoras nos próximos anos, o consumidor necessariamente precisa estar no centro das discussões.
Por isto esse debate merece maior aprofundamento, sobretudo nas questões jurídicas e regulatórias envolvidas. Ora, o MME, ao estabelecer as diretrizes para os novos contratos das Concessões que estão por vencer, indica a necessidade de “haver adequação com o novo papel das distribuidoras”, que requererá “maior flexibilidade para exploração de novos modelos de negócios”. Menciona, inclusive, a necessidade de inserir nos novos termos contratuais “autorização para o concessionário oferecer novos serviços aos consumidores, por sua conta e risco”, desde que tais serviços “favoreçam a modicidade tarifária”; assim como a intenção de “permitir a oferta, por parte das distribuidoras, de serviços acessórios, podendo a ANEEL autorizar maiores ou menores repasses – a depender do grau de competição”
Talvez aqui resida uma grande saída para permitir a desoneração tarifária, pois parte da receita proveniente desses novos serviços poderá ser capturada em benefício à modicidade tarifária. E, dessa maneira, teremos condições de promover equidade e justiça na transição energética.
Portanto, falar do processo de renovação de contrato de concessão das Distribuidoras de Energia e não falar dos parâmetros objetivos no processo regulatórios dos contratos, dos compromissos com as metas de atendimento ao mercado (investimentos na expansão, modernização e manutenção da infraestrutura, com modicidade tarifária); e dos requisitos mínimos de qualidade para a continuidade da prestação do serviço público adequado (universalização e segurança energética) é mais uma vez fechar os olhos para o atraso nas obras de infraestrutura do setor elétrico brasileiro, e sim temos que nos preparar para uma modernização mais estruturada, com melhor gerenciamento de riscos e um adequado equilíbrio na distribuição dos benefícios.
Adicionalmente, deve ser assegurada a estabilidade regulatória pelo MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA – tão necessária para a preservação do equilíbrio econômico-financeiro das concessões, uma vez que se trata de condição indispensável para a continuidade da prestação do serviço público de energia elétrica no Brasil.
Logo, entendemos que a renovação dos contratos de concessão das distribuidoras de energia será importante para manter a segurança e a estabilidade do sistema elétrico, irá garantir o fornecimento de energia de forma contínua e adequada para a sociedade. Além disso, a depender do seu direcionamento, permitirá a modernização do setor, maior segurança e a expansão da infraestrutura elétrica, contribuindo para o desenvolvimento econômico e social do país – e para que o novo consumidor de energia elétrica seja o verdadeiro protagonista nessa mudança do novo SEB – Setor Elétrico Brasileiro.
Marina Meyer Falcão – Professora Pós Graduação na PUC/MG. Presidente da Comissão de Energia da OAB de Minas Gerais Diretora Jurídica do INEL e Secretária de Assuntos Regulatórios do INEL, Diretora Regulatória e Jurídica da ENERGY GLOBAL SOLUTION – EGS. Advogada especialista em Direito de Energia. Membro representante do Estado de Minas Gerais na missão Energias Renováveis na Alemanha em 2018 e nos Estados Unidos em 2016 (The U.S. Department of State’s sponsoring an International Visitor Leadership Program project entitled “Modernizing the Energy Matrix to Combat Climate Change,” for Brazil in 2016), Autora de 3 Livros em Direito de Energia, MBA em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Pós-graduada em Gestão Ambiental pelo Instituto de Educação Tecnológica – IETEC. Graduada pela Universidade FUMEC. Membro da Comissão de Energia da OAB- MG; Membro da Câmara de Energia, Petróleo e Gás da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais – FIEMG; Ex-Superintendente de Política Energética do Estado de Minas Gerais (2009 a 2014); Ex-Conselheira do Conselho de Política Ambiental – COPAM do Estado de Minas Gerais (2009 a 2014); Ex-Secretária Executiva do Comitê Mineiro de Petróleo e Gás.
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