Os recursos financeiros que os países ricos prometeram aos mais pobres para que enfrentem problemas climáticos terminam em 2012. O dinheiro prometido era pouco – US$ 30 bilhões, em três anos – e, mesmo assim, não chegou totalmente ao destino. Pior: depois disso não há mais nenhum compromisso firme para financiar a adaptação aos impactos da mudança do clima.
Este é mais um ponto delicado que a conferência das Nações Unidas que começa hoje (26) em Doha, no Qatar, terá que resolver.
Na conferência do clima de Copenhague, em 2009, os países ricos prometeram enviar US$ 10 bilhões ao ano, entre 2010 e 2012, para um fundo que financiasse a adaptação das regiões mais vulneráveis aos impactos da mudança do clima. Os recursos do chamado "fast track" tinham que ser novos e adicionais, ou seja, não comprometidos com outra ação anterior. Iriam para projetos de adaptação e redução das emissões de gases-estufa. Era uma demanda urgente de lugares vulneráveis e que vêm sofrendo com inundações constantes, como Bangladesh, ou secas fortes, como vários países africanos.
Estudo divulgado hoje pelo instituto inglês IIED, espécie de think tank britânico para desenvolvimento sustentável, mostra que, até agora, apenas US$ 23,6 bilhões dos US$ 30 bilhões prometidos originalmente foram entregues. E apenas 20% dessa soma teria sido colocada em projetos de adaptação nos países mais pobres. O relatório, também elaborado por pesquisadores da Brown University, dos Estados Unidos, mostra ainda que menos da metade dessa verba são recursos doados; a maior parte são empréstimos.
O estudo deu notas aos países doadores analisando oito pontos-chave na arquitetura financeira do clima. Os tópicos examinaram se houve transparência no processo, se o dinheiro foi direcionado de forma equilibrada a projetos de adaptação e redução de emissões, se o dinheiro para adaptação era doado. Empréstimos, neste caso, ferem o que diz a Convenção do Clima porque "países pobres têm que devolver, com juros, o custo da adaptação a um problema que eles não causaram", diz o estudo.
Um quarto item analisou se os recursos dos dez países doadores são "novos e adicionais", como prometido. O estudo conclui que se este dinheiro fosse realmente "novo e adicional", os volumes destinados à ajuda financeira internacional deveriam ter aumentado no período. "Mas segundo a OCDE, entre 2008 e 2011, todos os recursos da ajuda internacional de todos os países – não apenas dos doadores do Fast Track – aumentaram apenas US$ 11,7 bilhões".
Apenas a Suíça foi aprovada no quesito transparência. Só a Noruega e o Japão prometeram recursos que, segundo um cálculo proposto pelo estudo, estão adequados à responsabilidade histórica do país com o aquecimento global e à renda nacional. Nesse item, Islândia e os Estados Unidos tiveram a pior performance. Apenas 2% das finanças climáticas estão fluindo através de fundos da ONU. "Estes fundos continuam sendo apenas cascas vazias", critica o estudo.
"Grande parte deste recurso é reciclado, já havia sido prometido em outra ação", diz Mark Lutes, especialista do WWF em finança climática. "Também não há muito dinheiro público", prossegue. Lutes lembra outro problema: a viabilidade dos recursos de longo prazo para enfrentar a mudança do clima. Em Copenhague os países ricos prometeram US$ 100 bilhões ao ano a partir de 2020. Esta promessa, hoje, parece ter pouca chance de ser cumprida.
A Coreia do Sul irá sediar o Fundo Verde do Clima (Green Climate Fund), que deveria hospedar os US$ 100 bilhões. A questão é descobrir de onde virá este dinheiro. "Doha tem que mostrar progressos em mecanismos que possam gerar recursos", diz Lutes. Ele cita a taxação das emissões marítimas e aéreas, por exemplo. A União Europeia defende a ideia, mas recuou há poucos dias da sua implementação imediata. China, EUA, Rússia e Índia se opunham à intenção da UE de taxar as emissões das companhias aéreas que entrarem no espaço aéreo do bloco.
Fonte: Valor Econômico