Ina Porras, do IIED
A comunidade ambiental tem sido adequadamente cautelosa com os mercados. Mas pagamentos por serviços ambientais podem ter um papel na proteção da natureza, desde que os governos guiem e regulem tais mercados.
Água, ar limpo e colheitas alimentares polinizadas por insetos são exemplos de legados da natureza à humanidade, e fornecem material para nosso bem-estar.
Em uma economia globalizada, todas as ações e decisões têm implicações tanto para as pessoas quanto para a natureza, perto ou longe. Compre flores no super mercado, e o agricultor no Quênia que as cultivou receberá uma fração do que você pagou. Compre arroz, e há chances de que um pântano no Arkansas tenha sido lavrado para fornecer os grãos baratos que o mercado demanda. A nova cama de madeira do seu filho pode ter vindo de uma floresta ilegalmente derrubada, através da China. A água em sua torneira não se materializa das nuvens. Enquanto algumas pessoas protestam ruidosamente contra a mercantilização da natureza, nem todos veem o quanto nossas necessidades de consumo estão guiando esses mercados que nos afligem.
Aqui parece haver um argumento de dois lados em nossa relação com a natureza. Colocar um preço na natureza é visto como um exercício grotesco para justificar o setor privado em sua pilhagem. Ainda que façamos isso quase todos os dias. A maioria de nós ainda pega o litro de leite mais barato no supermercado, não pensando além da garrafa, na fazenda onde a vaca foi ordenhada, nas plantações de soja no Brasil sobre florestas destruídas e nos pastos para alimentar a vaca, ou no mercado de ações em Nova York que está conduzindo agroinvestimentos.
Procurar alternativas que visam valorizar a natureza sobre os lucros tem muitos benefícios. Usar menos técnicas de agricultura intensiva, por exemplo, ajudará a manter os solos e reduzir a necessidade de fertilizantes caros. Mas os benefícios vão além do agricultor e da terra que ele cultiva. Uma terra bem administrada frequentemente é mais biodiversa, e cria um lindo cenário que todos nós gostamos. Evitar o desmatamento pode ajudar significativamente na luta contra o aquecimento global enquanto buscamos tecnologias mais limpas.
O mundo está respondendo
No mundo todo, encontramos exemplos de iniciativas que recompensam proprietários pelo bom manejo de sua terra. Pagamentos diretos a proprietários na Costa Rica – incluindo comunidades indígenas, agricultores e pequenas empresas – recompensam-nos financeiramente por manterem serviços ambientais que beneficiam outras pessoas, que então pagam por esse ganho. Por muitos anos, a Plan Vivo ajudou comunidades a desenvolver planos para proteger e gerir recursos naturais – como florestas – que são biodiversos, ajudam nas condições de vida das pessoas e capturam carbono. A organização mostrou como o dinheiro de vendas de carbono pode tanto mitigar os efeitos das mudanças climáticas quanto criar melhores condições de vida para pessoas que vivem no México, por exemplo. Enquanto isso, a Bolsa Floresta no Brasil mostrou como o dinheiro de mercados internacionais pode ser usado efetivamente para recompensar comunidades florestais que evitam o desmatamento.
Muitas espécies enfrentam a extinção porque seus habitats estão sendo destruídos a uma taxa sem precedentes. No oeste de Uganda uma abordagem similar a estas iniciativas está sendo testada para promover a conservação de habitats de chimpanzés e outros animais selvagens, compensando agricultores que vivem em terras privadas e comunitárias por manterem as florestas em pé.
E elas também podem promover uma agricultura ‘mais verde’. Na Europa, a regulamentação em terras agrícolas privadas é frequentemente complementada com subsídios para boas práticas, como por exemplo, o esquema Environmental Stewardship, que recompensa agricultores que mantêm cercas verdes e faixas de proteção, ou praticam agricultura orgânica. No Quênia, negociações estão em curso para um esquema de recompensa a agricultores que gerenciam a água de forma a limitar enchentes e proporcionar um fluxo estável.
Quem paga por tudo isso?
Municipalidades locais, serviços públicos de água e projetos hidrelétricos estão cada vez mais dispostos a pagar por serviços ecossistêmicos, já que isso reduz os custos totais que eles têm que pagar por tratamentos de água. Eles perceberam que os tratamentos seriam muito mais caros se, por exemplo, as florestas fossem cortadas e a quantidade de lodo na água fosse maior. Exemplos disso podem ser encontrados na América Latina em Los Negros, Bolívia, em Quito, Equador e em Jesús de Otoro, Honduras.
Organizações e pessoas que procuram reduzir sua pegada de carbono através de transações voluntárias e éticas e de órgãos internacionais de conservação, como o WWF, que estão interessados em proteger os habitats para manter a biodiversidade, também estão dispostas a pagar.
Os governos devem liderar o caminho
Há pedidos para que o setor privado se inclua nessas iniciativas e aumente o valor dos ‘investimentos verdes’. Embora isso de certa forma esteja acontecendo, em nossa atual economia mesquinha e pós-crise de crédito as chances de haver uma abordagem apenas eticamente guiada são pequenas se ela não for regulamentada, já que é difícil distinguir fontes respeitáveis de investimentos perigosos e fraudes.
A comunidade ambiental tem sido adequadamente cautelosa com os mercados. Para que esquemas de ‘Pagamentos por Serviços Ambientais’ tenham sucesso, precisamos de regulamentações mais rígidas, desencorajando práticas insustentáveis e garantindo que nada fique de fora. Os mercados podem ter um papel, recompensando esforços com preços melhores. Mas em última análise, os governos podem, e devem, ter um papel chave em guiar esses processos.
Isso pode ser feito. Na Costa Rica, o governo destina uma porcentagem das taxas de combustível e água para pagar por serviços ambientais, e promove a participação do setor privado através de iniciativas neutras em carbono. Por exemplo, a Thrifty Rent a Car compensa as emissões do aluguel de seus carros pagando 40 famílias para proteger suas florestas no mercado nacional voluntário de carbono.
Em vez de fugir e transferir a culpa, os governos devem estabelecer as bases para governarem, e não se renderem, a essas forças de mercado.
* Traduzido por Jéssica Lipinski
Leia o original no IIED (inglês)
(Instituto CarbonoBrasil)