Tema deveras debatido e controverso em Direito Ambiental é a responsabilização civil daquele que causar dano ao meio ambiente. Sob auspícios do suposto princípio do poluidor-pagador, associado ao fato do meio ambiente ecologicamente equilibrado ser um direito difuso, coletivo e para as futuras gerações, foram forjadas diversas teses que implicam inovação à ordem jurídica posta, sem que houvesse o devido processo previsto pela Constituição brasileira.
Exemplo destas é o entendimento dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo o qual a ação de reparação de dano ambiental é imprescritível (Confira-se o Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.421.163-SP). Segundo precedentes do STJ, pela natureza do bem jurídico envolvido, a reparação civil ambiental assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do poluidor. Assim sendo, além de objetiva, na forma do art. 14 da Lei nº 6.938/1981, estaria sob o manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, de caráter fundamental e essencial à afirmação dos povos. Esta imprescritibilidade, ainda segundo o STJ e boa doutrina, independe de tal restrição não estar prevista em lei, ao menos não expressamente. Ocorre que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a repercussão geral de matéria relativa à prescrição de pedido de reparação de dano ambiental.
O tema é objeto do Recurso Extraordinário (RE) nº 654.833, que trata de dano causado por madeireiros na exploração de terras indígenas no Acre nos anos 1980, e no qual se busca afastar a tese da imprescritibilidade. E agora STF: a responsabilidade civil ambiental prescreve?
A resposta a este questionamento passa por desvelar se a nação de bem ambiental se insere na de patrimônio público, o que, de logo, se rechaça. É que, apesar da norma do artigo 225 da Constituição se referir ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como “bem de uso comum do povo” e a Lei nº 6.938/1981, no seu artigo 2º, II, como sendo este bem jurídico de ordem pública e não de titularidade pública, tem-se que estas normas querem atribuir ao bem jurídico a natureza de interesse público, mesmo porque se sabe que não tem vocação meramente patrimonial e econômica, além de haver bem ambiental incorporado ao patrimônio particular, a exemplo das Reservas Particulares do Meio Ambiente e as demais formas de constituição de Unidades de Conservação de Uso Sustentável, regidas pela Lei nº 9.985/2000.
Por essas e algumas outras sólidas razões constitucionais, defende-se aqui que a prescrição também atinge a reparação do dano ambiental, estando suscetível à prazo de prescrição o direito e verdadeiro dever-poder de propor a ação civil pública a ser manejada pelos legitimados. Com efeito, sabe-se que o sistema jurídico brasileiro não admite nenhuma imprescritibilidade, salvo as que clara e expressamente já estão disciplinadas na Constituição, como já sustentado em artigo anterior que integra o livro “Direito Público – Estudos e Pareceres, Ed. Fórum, 2011”, em coautoria com o prof. Márcio Cammarosano, pelos seguintes fundamentos a seguir sintetizados:
(i) a Constituição, quando declara a imprescritibilidade de ações, sempre o faz de forma expressa, o que não é o caso das ações de ressarcimento ao erário;
(ii) outras lesões, danos e prejuízos ao erário são expressamente sujeitas ao prazo de prescrição ? como as que podem se dar no caso de não pagamento dolo e de má-fé do tributo devido e as de ilícitos civis, como agora já reconhecido pelo STF, ao ensejo da multicitada Repercussão Geral nº 666;
(iii) nenhum direito de ação pode ser imprescritível, por via de interpretação extensiva de princípios jurídicos, como o do poluidor-pagador, ao menos sem grave e clara ofensa ao direito fundamental à segurança jurídica;
(iv) conforme técnica reconhecida de hermenêutica constitucional, considera-se inconstitucional a interpretação ampliativa de uma restrição, com o fim de garantias individuais como prescrição, decadência, coisa julgada, ato jurídico perfeito. Portanto, não cabe ao legislador infraconstitucional ou ao aplicador da norma criar a possibilidade de se eternizar a hipótese de uma lide civil ambiental ser levada à apreciação do Poder Judiciário a qualquer tempo, ainda mais quando essa inércia deriva de omissão do Poder Público, que, por princípio, tem o dever de atuar com eficiência e promover a razoável duração dos processos.
(v) por fim, diante da inexistência de lei específica regendo a matéria da prescrição da ação de reparação de danos ao meio ambiente, aplicar-se-ia o quanto disposto pelo microssistema de tutela do interesse público e dos direitos difusos e coletivos, composto pela Lei de Ação Popular, da Ação Civil Público e da Lei de Improbidade Administrativa e Código de Defesa do Consumidor, em detrimento de um criacionismo de novas regras via ativismo judicial ou qualquer outra forma que não seja o devido processo legislativo. Consequentemente, entende-se como de cinco anos o prazo prescricional aplicável às ações civis ambientais públicas de reparação ou ressarcimento.
Vale registrar que, por estes ou outros argumentos, tende a ser revista a posição errônea do STJ pela ilegal e inconstitucional imprescritibilidade, tirada como uma cartada mágica de supostos princípios. Isto se o STF mantiver seu histórico de respeito a segurança jurídica na matéria, ao ensejo da repercussão geral 666, onde o STF reconheceu e afirmou, como regra geral, a prescrição do direito de ação da fazenda pública ou de quem atue em defesa desta, ao ensejo da reparação de danos resultantes de ilícito civil, em uma interpretação desfavorável à Fazenda Pública e ao erário. Contudo, deixe-se claro que o STF ainda não se posicionou firmemente e de forma expressa, quanto a incidência ou não da prescrição às ações reparatórias, quando o dano foi causado por atos ilícitos de improbidade administrativa ou o específico ambiental, ambos elevados a condição de interesse público relevante.
Desta forma, com o devido respeito ao pensamento contrário, é forçoso concluir que a prescrição reconhecida na Repercussão Geral nº 666 do STF também incide para as hipóteses de responsabilidade civil ambiental, em contraponto à jurisprudência dominante do STJ e ao que, até então, vem sustentando a boa doutrina.
Georges Louis Hage Humbert – Advogado e Professor de Direito Ambiental, Diretor e sócio-fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental – UBAA. É Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, Doutor e Mestre em Direito pela PUC/SP.
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STF só entende de proteger bandidos. Um gambá cheira a outro.
É atualmente instituição falida. Q nos dá nojo só de ver o nome.