quinta-feira , 25 abril 2024
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TRF4 determina demolição de imóvel construído na Praia de Laguna e a recuperação da área ambiental

“O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou a demolição de um imóvel localizado na Área de Proteção Ambiental (APA) Baleia Franca, próximo à Praia da Galheta, em Laguna (SC). O proprietário da residência também terá que promover a recuperação ambiental do local. A decisão foi proferida há duas semanas.

A casa de alvenaria foi construída a menos de dez quilômetros do Farol de Santa Marta, ponto turístico da região. O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação solicitando a demolição do imóvel e a aplicação de multa de R$ 150 mil. De acordo com o órgão, a edificação é utilizada apenas para veraneio e não se enquadra nas hipóteses permitidas de intervenção em área de proteção ambiental.

O réu afirmou ser pescador e que a propriedade é a sua única moradia. No entanto, no decorrer do processo não conseguiu comprovar as alegações e a ação foi julgada procedente pela Justiça Federal de Laguna. Ele recorreu contra a sentença, mas a decisão foi mantida pelo TRF4.

O relator do processo, desembargador federal Luiz Alberto d’Azevedo Aurvalle, destacou que ‘existe, na legislação e jurisprudência, certa tolerância para ocupação de APA em situações excepcionais, quando se tratar de comunidades tradicionais radicadas no local, envolver o direito à moradia ou área urbana consolidada. Porém, não é o caso dos autos, que versa sobre casa de veraneio, construída em região de promontório e sobre dunas, não urbanizada’.

A multa de R$ 150 mil foi substituída pela obrigação de recuperação ambiental da área”.

Fonte: TRF4, 29/11/2016.

Direito Ambiental

Confira a íntegra da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002116-05.2012.4.04.7216/SC
RELATOR
:
LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
APELANTE
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APELANTE
:
RODRIGO DOS SANTOS SILVEIRA
ADVOGADO
:
VICTOR BAIAO PEREIRA
:
GUSTAVO HENRIQUE
:
PAULO CESAR RODRIGUES
APELANTE
:
UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
APELADO
:
OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de RODRIGO DOS SANTOS SILVEIRA objetivando a recuperação do dano ambiental ocorrido em área de preservação permanente, na Praia da Galheta, em Laguna/SC, causado por construção erigida em área praia marítima, terreno de marinha, sambaqui, dunas móveis, promontório, no interior da área de proteção ambiental – APA da Baleia Franca. Requereu a demolição da construção e a recuperação da área, bem como a condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados e, ante a eventual impossibilidade de completa reparação dos danos ambientais, pleiteou a condenação do réu na obrigação de pagar R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais).
Processado o feito, sobreveio sentença (evento87 – SENT1) que julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o réu a proceder ou custear a demolição total da edificação, recuperando o dano ambiental ocorrido na área, removendo os entulhos provenientes da demolição e implementando projeto de recuperação da área degradada (PRAD), sob pena de multa a ser definida em sede de cumprimento de sentença. A sentença de origem determinou, ainda, a notificação da CELESC, para que procedesse à interrupção do fornecimento de energia elétrica na edificação em questão.
Apela o réu (evento93-APELAÇÃO1), refere que a residência foi edificada em 1990, época em que não havia qualquer intervenção do Poder Público Municipal, quanto à exigência de licença municipal para a construção, ou mesmo licença ambiental, não havendo prova de clandestinidade da construção. Sustenta que não construiu o imóvel, tratando-se, portanto, de fato consumado, não havendo motivos para que o auto de infração contra ele lavrado seja considerado na presente demanda. Aduz que reside no imóvel com sua família e que não possui outro imóvel que lhe sirva de moradia, eis que possui baixa renda, por ser pescador. Requer a exclusão da condenação à obrigação de demolição da construção objeto da presente demanda e a determinação de compensação ambiental no local do imóvel, por meio de projeto a ser apresentado ao órgão ambiental competente.
Recorre o MPF (evento94 – RAZAPELA1), sustenta a possibilidade de cumulação das obrigações de fazer e não fazer com a de indenizar. Alega a necessidade de fixação de indenização pelos danos causados ao meio ambiente, sob pena de estímulo à degradação, por entender que a demolição da obra e a implementação de PRAD são medidas insuficientes para compensar o dano causado pelo réu pelo tempo em que o réu manteve a ocupação ilegal e o dano ambiental. Requer seja o réu condenado ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados, cumulativamente à obrigação de fazer, consistente na remoção da edificação e a recuperação da área degradada.
Com contrarrazões (Evento 100 – CONTRAZ1), vieram os autos a esta Corte para Julgamento.
O Ministério Público Federal opina pelos desprovimentos dos recursos.
É o relatório.

VOTO

A r. sentença, no que interessa, assim decidiu:
Mérito
 
Aos 26/06/2016 foi lavrado contra o demandado auto de infração pelo IBAMA e ICMBio, em razão de ocupação e edificação irregular (evento 1, PROCADM2, pp. 2-5).
 
O Ministério Público, conforme restou apurado, fundamenta seu pedido na circunstância de o imóvel do réu estar localizado no interior da APA da Baleia Franca, sobre APP, consubstanciada em promontório e dunas, em praias marítimas, sobre sambaquis, próximo a aqüífero e em terreno de marinha.
 
1 APA da Baleia Franca
 
Conforme Relatório de Fiscalização, (evento 1, PROCADM2, p. 6), fotos e mapas (p. 9), informação técnica (PROCADM12, pp. 1-17) e parecer técnico da FATMA (PROCADM4, pp. 2-3), restou evidenciado que o imóvel encontra-se no interior da APA da Baleia Franca, unidade de conservação federal.
 
O art. 225 da Constituição Federal impõe ao Poder Público o dever de preservar e defender o meio ambiente, ao qual incumbe, dentre outras medidas, ‘definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção’ (inc. III).
 
Este dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei n. 9.985/00, que, no art. 2º, inc. I, definiu como unidade de conservação o ‘espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção’.
 
A conservação da natureza, por sua vez, entende-se, conforme inc. II daquele artigo, pelo ‘manejo do uso humano da natureza, compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural, para que possa produzir o maior benefício, em bases sustentáveis, às atuais gerações, mantendo seu potencial de satisfazer as necessidades e aspirações das gerações futuras, e garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral’.
 
A área de proteção ambiental foi estabelecida pela legislação como unidade de uso sustentável (art. 14, inc. I), considerada como ‘área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais’.
 
A APA da Baleia Franca foi criada pelo Decreto Federal sem nº, de 14/09/2000, com a finalidade de proteger, em águas brasileiras, a baleia franca austral, ordenar e garantir o uso racional dos recursos naturais da região, ordenar a ocupação e utilização do solo e das águas, ordenar o uso turístico e recreativo, as atividades de pesquisa e o tráfego local de embarcações e aeronaves (art. 1º).
 
Consoante art. 3º desse ato normativo, na área de proteção ambiental, ficam sujeitas à regulamentação específica dos órgãos competentes, dentre outras, as atividades de: implantação ou alteração de estruturas físicas e atividades econômicas na faixa de marinha e no espaço marinho (inc. V); implantação de projetos de urbanização, novos loteamentos e a expansão daqueles já existentes (inc. VI); implantação ou execução de qualquer atividade potencialmente degradadora do ambiente (inc. XI).
 
Por fim, o art. 4º dispõe que na APA ‘deverão ser adotadas medidas para recuperação de áreas degradadas, proteção da vegetação fixadora de dunas e melhoria das condições de disposições e tratamento de efluentes e lixo’.
 
Retira-se, pois, da Lei Fundamental e da legislação que a regulamenta, que o Poder Público tem o dever de instituir unidades de conservação, às quais será dispensado um regime especial de proteção, e de zelar pela preservação ambiental dessas áreas protegidas. Se as atividades ou edificações provocam degradação ecológica e comprometem a integridade dos atributos que justificaram sua proteção, é dever das autoridades competentes atuar para impedir, mitigar e recuperar os danos ambientais ocasionados.
 
Na lição de José Afonso da Silva:
 
Espaços territoriais e seus componentes, sem sentido ecológico, referem-se, na verdade, a ecossistemas. Se são dignos de proteção especial é porque são áreas representativas de ecossistemas. Sua definição, como tais, pelo Poder Público lhes confere um regime jurídico especial quanto à modificabilidade e quanto à fruição (…). Quer constituam bens de propriedade privada, quer bens de domínio público, ficam eles sujeitos a um regime jurídico de interesse público, pela relevância dos atributos naturais de que se revestem, postulando proteção especial (in Direito Ambiental Constitucional. 9 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 237) (grifei).
 
No caso concreto, conforme documentos técnicos retrocitados, a construção trouxe conseqüências negativas para a saúde publica e meio ambiente, com comprometimento da biota, dos recursos naturais, da qualidade ambiental ou estabilidade dos ecossistemas e danos à unidade de conservação (evento 1, PROCADM2, pp. 6-8).
 
A informação técnica do IBAMA e ICMBio (evento 1, PROCADM13, p.p. 1-17) e parecer técnico da FATMA (PROCADM4, pp. 2-3) também constatam os danos ambientais causados pela ocupação desordenada na Praia da Galheta.
 
Além disso, é fato notório na região (CPC, arts. 334, inc. I e 335) que o acesso à praia da Galheta só pode ser realizado através de veículos tracionados, que possuam características ‘fora de estrada’ ou ‘off road’, com suspensão mais elevada, já que a localidade é efetivamente tomada por extensa região arenosa e dunas móveis. Logo, a manutenção das edificações naquele local proporciona severos prejuízos decorrentes da passagem de veículos de porte maior pelas dunas e vegetações para ingressar na praia.
 
Ao depois, conforme documentos acostados pelo demandado (evento 37, CONTR16 e CONTR20), dessume-se que o imóvel foi adquirido por Ronaldo Kock Nunes em 21/07/2000, constando área total de 70m². Na data de 25/06/2007, este vendeu o imóvel a Adeladio Silveira, genitor do réu, e no contrato consta uma casa de alvenaria medindo 10m e frente e 18m de fundos. No entanto, o relatório de fiscalização do IBAMA e ICMBio, lavrado em 23/07/2012 (evento 1, PROCADM2, p. 6) indicam que a área total atingida perfazia 196,64m², a revelar que o réu e seu genitor mais que duplicaram a construção anterior. Portanto, foram responsáveis pela ampliação dos danos ambientais.
 
Desse modo, o uso e a manutenção de edificação em desconformidade com os objetivos da área de proteção ambiental pode ensejar a ação do Poder Público e a demolição do imóvel, até porque inexiste direito adquirido a poluir.
 
De outra parte, não merece prosperar a afirmação de que o réu reside no local com sua família. Ao invés, a conta de luz datada de 21/10/2012 indica que o consumo é drasticamente superior nos meses de verão. Nos demais, é bastante inferior ou quase nenhum, a demonstrar que, fora da alta temporada, a casa não é ocupada. Afigura-se, pois, como casa de veraneio.
 
Outrossim, como restou mencionado, a praia da Galheta é de difícil acesso e desprovida de transporte coletivo, o que dificulta sua utilização com moradia.
 
Assim, o lazer do demandado, conquanto não se negue sua relevância, não deve preponderar sobre o direito ao meio ambiente equilibrado, mormente na situação dos autos, em que afetadas negativamente as características ambientais da região.
 
2 Área de Preservação Permanente (APP)
 
Retira-se dos autos que o imóvel em questão interfere em dunas e promontório, ambas consideradas áreas de preservação permanente, como será a seguir exposto.
 
Às áreas de preservação permanente também é tributada especial proteção, para que ‘não ocorram erosão e assoreamento dos rios, deslizamentos e inundações que possam afetar a população’ (SILVA, Solange Teles, BORGES, Fernanda Salgueiro. Aplicação do Código Florestal: Áreas de Preservação Permanente e Riscos. In: LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental na Sociedade de Risco. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 217).
 
As APPs foram disciplinadas na revogada Lei n. 4771/65, Resoluções do CONAMA n. 303/02 e 369/06, bem assim no atual Código Florestal – Lei n. 12.651/12. Essa legislação definiu os locais considerados como de preservação permanente, sem prejuízo de outros estabelecidos por leis estaduais e municipais.
 
2.1 Dunas
 
As dunas, tanto no Código Florestal Revogado (art. 2º, al. ‘f’) como no vigente (art. 4º, inc. VI) conferiram proteção apenas às restingas, como fixadoras de dunas.
 
Contudo, a Resolução n. 303/02 do CONAMA, no art. 3º, inc. XI, considerou como APP a área situada em duna, sem exigir a existência de vegetação fixadora.
 
Como decidiu o e. STJ, não é apenas a vegetação fixadora de dunas que merece proteção ambiental:
 
‘A vegetação deve ser resguardada também, pois esta, evidentemente, tem a função de proteger as dunas. No entanto, o bem maior tratado aqui é a proteção ambiental que deve ser dada às dunas, como escopo final, as quais, portanto, estão englobadas no objetivo de proteção da norma’ (REsp 1069155/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/12/2010, DJe 03/02/2011)
 
A respeito da extensão do poder regulamentar do CONAMA e da validade das disposições do aludido ato normativo, decidiu o e. TRF da 4ª R.:
 
ADMINISTRATIVO. DIREITO AMBIENTAL. ÁREA ENQUADRADA COMO DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. (…). É legal a previsão do art. 3º, IX, ‘a’ da Resolução CONAMA 303/2002, porquanto inserido no poder regulamentar do órgão e adequada ao sistema de proteção ao meio ambiente, devendo ser interpretada em sintonia com a legislação que lhe dá amparo. Remessa oficial provida, apelo do IBAMA prejudicado. (TRF4, APELREEX 5001131-94.2011.404.7208, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Loraci Flores de Lima, D.E. 21/06/2012) (grifei).
 
É elucidativo o seguinte trecho do voto condutor desse julgado, que tratou da Resolução n. 303/2002 do CONAMA:
 
(…) Frise-se, desde já, que a norma não padece de qualquer ilegalidade, ao contrário do que pugnado na sentença, vez que inserida no poder regulamentar do órgão competente. Não se há de falar em excesso da resolução quando comparada com o diploma legal que lhe deu origem, porquanto o ato normativo não desborda dos limites da regra legal, mas apenas lhe explicita os contornos e regula a previsão contida no art. 2º, ‘f’ do Código Florestal. E, nesse ponto, legitimado para tanto está o CONAMA.
(…)
Assim, dentro dos limites legais a resolução CONAMA, vez que editada dentro das atribuições regulamentadoras que detém o órgão.
 
A questão ambiental ganhou com a Constituição de 1988 tutela especial, cuja eficiência depende da atuação dos órgãos que compõem o Sistema Nacional do Meio Ambiente, como organizado pela Lei nº 6.938/81.
 
A manutenção da tarefa regulatória exclusivamente no Poder Legislativo suprimiria a celeridade, a avaliação técnica qualificada e a ênfase para as peculiaridades de cada região de um país de proporções continentais, condicionantes estes de influência vital na atividade regulamentar. Incompatíveis, diga-se de passagem, com o processo legislativo (…). (grifei)
 
Na mesma linha:
 
PROCESSUAL CIVIL E DIREITO AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. OBRA EMBARGADA PELO IBAMA, COM FUNDAMENTO NA RESOLUÇÃO DO CONAMA N. 303/2002. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. EXCESSO REGULAMENTAR. NÃO-OCORRÊNCIA. ART. 2º, ALÍNEA ‘F’, DO CÓDIGO FLORESTAL NÃO-VIOLADO. LOCAL DA ÁREA EMBARGADA. PRETENSÃO DE ANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO-CONHECIDO. 1. O fundamento jurídico da impetração repousa na ilegalidade da Resolução do Conama n. 303/2002, a qual não teria legitimidade jurídica para prever restrição ao direito de propriedade, como aquele que delimita como área de preservação permanente a faixa de 300 metros medidos a partir da linha de preamar máxima. 2. Pelo exame da legislação que regula a matéria (Leis 6.938/81 e 4.771/65), verifica-se que possui o Conama autorização legal para editar resoluções que visem à proteção do meio ambiente e dos recursos naturais, inclusive mediante a fixação de parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente, não havendo o que se falar em excesso regulamentar. 3. Assim, dentro do contexto fático delineado no acórdão recorrido, e, ainda, com fundamento no que dispõe a Lei n. 6.938/81 e o artigo 2º, ‘f’, da Lei n. 4.771/65, devidamente regulamentada pela Resolução Conama n. 303/2002, é inafastável a conclusão a que chegou o Tribunal de origem, no sentido de que os limites traçados pela norma regulamentadora para a construção em áreas de preservação ambiental devem ser obedecidos. 4. É incontroverso nos autos que as construções sub judice foram implementadas em área de restinga, bem como que a distância das edificações está em desacordo com a regulamentação da Resolução Conama n. 303/2002. Para se aferir se o embargo à área em comento se deu apenas em razão de sua vegetação restinga ou se, além disso, visou à proteção da fixação de dunas e mangues, revela-se indispensável a reapreciação do conjunto probatório existente no processo, o que é vedado em sede de recurso especial em virtude do preceituado na Súmula n. 7, desta Corte. 5. Recurso especial não-conhecido. (STJ, REsp 994.881/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2008, DJe 09/09/2009)
 
Por fim, o art. 129, § 2º, inc. XIII da Lei Orgânica de Laguna reputa como APP não edificável as praias e as dunas que as margeiam, e determina que não podem ser transferidas a particulares a qualquer título (§ 3º).
 
Os documentos suso referenciados comprovam que o imóvel do réu está estruturado sobre dunas, de modo a interferir, pois, em APP, onde a construção é vedada.
 
2.2 Promontório
 
Conforme elementos dos autos, já aludidos anteriormente, a edificação encontra-se em área de promontório, normalmente conceituada como estruturas que atuam como barreiras físicas que interrompem o transporte de areia através da costa, de maneira a provocarem erosão e acumulação de sedimentos nas praias adjacentes a esta estrutura natural.
 
O revogado e o atual Código Florestal, bem assim as Resoluções n. 303/2002 e 369/2006 do CONAMA, não previram o promontório como área de preservação permanente.
 
A Lei n. 7661/88, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, conferiu à zona costeira elevada proteção ambiental, definiu o promontório como recurso natural dessa macrorregião (art. 3º, inc. I) e consignou que ‘a degradação dos ecossistemas, do patrimônio e dos recursos naturais da Zona Costeira implicará ao agente a obrigação de reparar o dano causado e a sujeição às penalidades previstas no art. 14 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981’ (art. 7º).
 
Os promontórios foram reputados áreas de preservação permanente pela legislação estadual e municipal.
 
Com efeito, a Lei Estadual de Santa Catarina n. 5793/80, no art. 6º, estabeleceu que o ‘Poder Executivo poderá, mediante decreto, criar áreas de proteção especial e zonas de reserva ambiental, visando preservá-las e adequá-las aos objetivos desta Lei’. No § 1º, al. ‘b’, dispôs que essas áreas poderão compreender promontórios.
 
Já o Decreto Estadual n. 14.250/81 expressamente conferiu aos promontórios proteção especial:
 
Art.42 – São consideradas áreas de proteção especial:
(…)
II- os promontórios, as ilhas fluviais e as ilhas costeiras e oceânicas, estas quando cedidas pelo Governo Federal;
 
Art. 43 – Para efeito deste Regulamento, considera-se:
(…)
III- promontório – a elevação costeira florestada ou não que compõem a paisagem litorânea do continente ou de ilhas (grifei).
 
No art. 47 do mencionado ato normativo, restou caracterizada a área dos promontórios como non edificandi:
 
Art. 47. Nos promontórios, numa faixa de até 2.000(dois mil) metros de extensão, a partir da ponta mais avançada é proibido:
I – o corte raso da vegetação nativa;
II – a exploração de pedreiras e outras atividades que degradem os recursos naturais e a paisagem;
III- a edificação de prédios ou construções de qualquer natureza.
Parágrafo único – Mediante prévia autorização, desde que admitida pelos órgãos municipais ou, quando for o caso, pelos órgãos federais competentes, poderá ser deferido pedido de construção de que trata o item III, deste artigo (grifei).
 
Do mesmo modo, a Lei Orgânica do Município de Laguna, no art. 129, § 2º, inc. VII, atribuiu ao Morro do Cabo de Santa Marta Pequena a condição de área de preservação permanente, non aedificante, vedada a transferência a particulares (§ 3º).
 
Sendo assim, o imóvel do réu, porquanto localizado em área de preservação permanente, cuja edificação e transferência a particulares é vedada, deve dali ser retirado, efetuada a devida recuperação do meio ambiente degradado.
 
De observar que, embora a legislação estadual confira à municipalidade a possibilidade de autorizar construções em promontórios, o próprio Município de Laguna declarou que o Morro do Cabo de Santa Marta Pequena como área não-edificável e não transferível. Ademais, o demandado não dispõe de autorização do Município para construir, que não se confunde com mero cadastramento (evento 37, COMP4).
 
Importante mencionar que a existência de diversas outras residências na região não elide a obrigação de o réu preservar o meio ambiente, nem impede a ação protetiva dos órgãos competentes e a aplicação das medidas necessárias à reparação dos danos ambientais causados. Essas outras edificações também poderão estar em situação irregular, e cabe aos órgãos competentes averiguar o fato.
 
Embora a região tenha sido ocupada inicialmente por pescadores, recentemente a população e as construções no local aumentaram em grandes proporções e de forma não planejada, devido ao interesse turístico no local.
 
Percebe-se, desse modo, que os poderes públicos consentiram, nas últimas décadas, com a ocupação irregular, desordenada e ecologicamente lesiva da Praia da Galheta. Lamentavelmente, emprestaram prioridade aos interesses imediatistas, em prejuízo de políticas sociais e ambientais de longo prazo e, assim agindo, renderam-se ao que se convencionou chamar viés do presente, muito bem explorado por Juarez Freitas: (…) existe tendência de buscar recompensas imediatas, sem perguntar sobre os efeitos a longo prazo, causando prejuízos de toda ordem (inclusive à saúde pública), por falhas nas escolhas intertemporais (in Hermenêutica Jurídica e a Ciência do Cérebro: como lidar com os automatismos mentais. Revista da Ajuris, ano XL, n. 130, jun de 2013, p. 236).
 
Sucede que esta tolerância, seguida de ações ilegais do Poder Público, não gera direito adquirido em permanecer em situação irregular, nem imuniza o réu da obrigação de recompor o meio ambiente degradado. Está, é natural, preocupado com seu interesse de curto prazo, consubstanciados no desfrute da casa na praia. Contudo, esse interesse não prevalece sobre a obrigação constitucional de tutela do meio ambiente, a acarretar benefícios de longo prazo para a população.
 
Existe, na legislação e jurisprudência, certa tolerância para ocupação de áreas de preservação permanente em situações excepcionais, quando se tratar de comunidades tradicionais radicadas no local, envolver o direito à moradia ou área urbana consolidada, por exemplo. Não é o caso, porém, dos autos, que versa sobre casa de veraneio, construída em região de promontório e sobre dunas, não urbanizada.
 
No ponto, importante mencionar emblemática decisão do STJ, que impôs a demolição de obra de hotel, construído em 1993, em promontório situado em Porto Belo/SC, e decretou a nulidade de licenciamento concedido pelo Município. Rejeitou-se, igualmente, a alegação de fato consumado e direito adquirido a poluir, ainda que a região já estivesse deteriorada e ocupada:
 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSABILIDADE POR DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTE. ZONA COSTEIRA. LEI 7.661/1988. CONSTRUÇÃO DE HOTEL EM ÁREA DE PROMONTÓRIO. NULIDADE DE AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA URBANÍSTICO-AMBIENTAL. OBRA POTENCIALMENTE CAUSADORA DE SIGNIFICATIVA DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL – EPIA E RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL – RIMA. COMPETÊNCIA PARA O LICENCIAMENTO URBANÍSTICO-AMBIENTAL. PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR (ART. 4°, VII, PRIMEIRA PARTE, DA LEI 6.938/1981). RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14, § 1°, DA LEI 6.938/1981). PRINCÍPIO DA MELHORIA DA QUALIDADE AMBIENTAL (ART. 2°, CAPUT, DA LEI 6.938/1981).
1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta pela União com a finalidade de responsabilizar o Município de Porto Belo-SC e o particular ocupante de terreno de marinha e promontório, por construção irregular de hotel de três pavimentos com aproximadamente 32 apartamentos.
2. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, deu provimento às Apelações da União e do Ministério Público Federal para julgar procedente a demanda, acolhendo os Embargos Infringentes, tão-só para eximir o proprietário dos custos com a demolição do estabelecimento.
3. Incontroverso que o hotel, na Praia da Encantada, foi levantado em terreno de marinha e promontório, este último um acidente geográfico definido como ‘cabo formado por rochas ou penhascos altos’ (Houaiss). Afirma a união que a edificação se encontra, após aterro ilegal da área, ‘rigorosamente dentro do mar’, o que, à época da construção, inclusive interrompia a livre circulação e passagem de pessoas ao longo da praia.
4. Nos exatos termos do acórdão da apelação (grifo no original): ‘O empreendimento em questão está localizado, segundo consta do próprio laudo pericial às fls. 381-386, em área chamada promontório. Esta área é considerada de preservação permanente, pela legislação do Estado de Santa Catarina por meio da Lei n° 5.793/80 e do Decreto n° 14.250/81, bem como pela legislação municipal (Lei Municipal n° 426/84)’.
5. Se o Tribunal de origem baseou-se em informações de fato e na prova técnica dos autos (fotografias e laudo pericial) para decidir a) pela caracterização da obra ou atividade em questão como potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente – de modo a exigir o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (Epia) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) – e b) pela natureza non aedificandi da área em que se encontra o hotel (fazendo-o também com fulcro em norma municipal, art. 9°, item 7, da Lei 426/1984, que a classifica como ‘Zona de Preservação Permanente’, e em legislação estadual, Lei 5.793/1980 e Decreto 14.250/1981), interditado está ao Superior Tribunal de Justiça rever tais conclusões, por óbice das Súmulas 7/STJ e 280/STF.
6. É inválida, ex tunc, por nulidade absoluta decorrente de vício congênito, a autorização ou licença urbanístico-ambiental que ignore ou descumpra as exigências estabelecidas por lei e atos normativos federais, estaduais e municipais, não produzindo os efeitos que lhe são ordinariamente próprios (quod nullum est, nullum producit effectum), nem admitindo confirmação ou convalidação.
7. A Lei 7.661/1988, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, previu, entre as medidas de conservação e proteção dos bens de que cuida, a elaboração de Estudo Prévio de Impacto Ambiental – Epia acompanhado de seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental – Rima.
8. Mister não confundir prescrições técnicas e condicionantes que integram a licença urbanístico-ambiental (= o posterius) com o próprio Epia/Rima (= o prius), porquanto este deve, necessariamente, anteceder aquela, sendo proibido, diante da imprescindibilidade de motivação jurídico-científica de sua dispensa, afastá-lo de forma implícita, tácita ou simplista, vedação que se justifica tanto para assegurar a plena informação dos interessados, inclusive da comunidade, como para facilitar o controle administrativo e judicial da decisão em si mesma.
9. Indubitável que seria, no plano administrativo, um despropósito prescrever que a União licencie todo e qualquer empreendimento ou atividade na Zona Costeira nacional. Incontestável também que ao órgão ambiental estadual e municipal falta competência para, de maneira solitária e egoísta, exercer uma prerrogativa – universal e absoluta – de licenciamento ambiental no litoral, negando relevância, na fixação do seu poder de polícia licenciador, à dominialidade e peculiaridades do sítio (como áreas representativas e ameaçadas dos ecossistemas da Zona Costeira, existência de espécies migratórias em risco de extinção, terrenos de marinha, manguezais), da obra e da extensão dos impactos em questão, transformando em um nada fático-jurídico eventual interesse concreto manifestado pelo Ibama e outros órgãos federais envolvidos (Secretaria do Patrimônio da União, p. ex.).
10. O Decreto Federal 5.300/2004, que regulamenta a Lei 7.661/1988, adota como ‘princípios fundamentais da gestão da Zona Costeira’ a ‘cooperação entre as esferas de governo’ (por meio de convênios e consórcios entre União, Estados e Municípios, cada vez mais comuns e indispensáveis no campo do licenciamento ambiental), bem como a ‘precaução’ (art. 5°, incisos XI e X, respectivamente). Essa postura precautória, todavia, acaba esvaziada, sem dúvida, quando, na apreciação judicial posterior, nada mais que o fato consumado da degradação ambiental é tudo o que sobra para examinar, justamente por carência de diálogo e colaboração entre os órgãos ambientais e pela visão monopolista-exclusivista, territorialista mesmo, da competência de licenciamento.
11. Pacífica a jurisprudência do STJ de que, nos termos do art. 14, § 1°, da Lei 6.938/1981, o degradador, em decorrência do princípio do poluidor-pagador, previsto no art. 4°, VII (primeira parte), do mesmo estatuto, é obrigado, independentemente da existência de culpa, a reparar – por óbvio que às suas expensas – todos os danos que cause ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, sendo prescindível perquirir acerca do elemento subjetivo, o que, consequentemente, torna irrelevante eventual boa ou má-fé para fins de acertamento da natureza, conteúdo e extensão dos deveres de restauração do status quo ante ecológico e de indenização.
12. Ante o princípio da melhoria da qualidade ambiental, adotado no Direito brasileiro (art. 2°, caput, da Lei 6.938/81), inconcebível a proposição de que, se um imóvel, rural ou urbano, encontra-se em região já ecologicamente deteriorada ou comprometida por ação ou omissão de terceiros, dispensável ficaria sua preservação e conservação futuras (e, com maior ênfase, eventual restauração ou recuperação). Tal tese equivaleria, indiretamente, a criar um absurdo cânone de isonomia aplicável a pretenso direito de poluir e degradar: se outros, impunemente, contaminaram, destruíram, ou desmataram o meio ambiente protegido, que a prerrogativa valha para todos e a todos beneficie.
13. Não se pode deixar de registrar, em obiter dictum, que causa no mínimo perplexidade o fato de que, segundo consta do aresto recorrido, o Secretário de Planejamento Municipal e Urbanismo, Carlos Alberto Brito Loureiro, a quem coube assinar o Alvará de construção, é o próprio engenheiro responsável pela obra do hotel.
14. Recurso Especial de Mauro Antônio Molossi não provido. Recursos Especiais da União e do Ministério Público Federal providos. (REsp 769753/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 10/06/2011) (grifei)
 
No caso concreto, o réu alega que a residência foi edificada por terceiros, em 1990, antes de o mesmo adquiri-la. No entanto, consoante ficou acima aventado, o pai do réu adquiriu o imóvel em 2007 e, segundo se retira do relatório de fiscalização, as dimensões da construção eram maiores do que na época da aquisição.
 
 O cadastramento perante o Município, como foi mencionado, não implica autorização para construir e suprimir vegetação. O próprio demandado admite que não foi exigida licença pela Prefeitura.
 
A alegação de que a ocupação do local fora autorizada pela SPU não encontra respaldo nos autos, pois ausente prova da inscrição na SPU, sendo anexado apenas o requerimento para a regularização (evento 37, COMP30). Ainda assim, isso não isenta o demandado da responsabilidade ambiental, posto que a manifestação desse órgão federal limita-se à anuência de ocupação em terreno de marinha, que não guarda qualquer relação com questões ecológicas. De qualquer sorte, a Lei n. 9636/98, art. 9º, inc. II, veda a inscrição de ocupações que estejam concorrendo ou tenham concorrido para comprometer a integridade das áreas de uso comum do povo, de preservação ambiental ou necessárias à preservação dos ecossistemas naturais.
 
A inscrição do demandado e de seu genitor como pescador profissional (evento 37, COMP5 a COMP13, e COMP25), e o recebimento de seguro-defeso (COMP 27 e COMP28) não demonstram que o réu residia na casa objeto desta ACP. Aliás, os indícios revelam que ele não morava no local.
 
Também infundada a alegação de que a construção representa atividade de baixo impacto ambiental, pois, conforme amplamente demonstram os documentos acostados pelo parquet, a manutenção de residências de modo desordenado e irregular na Praia da Galheta acarreta danos ambientais de diversas ordens, segundo ficou relatado acima.
 
A benfeitoria em questão atende a interesse meramente individual, que não retrata utilidade pública ou interesse social.
 
Segundo informação técnica (evento 01), a área caracteriza-se como APP, em suma: 1- uma vez que incluída em Zona Costeira, ambiente dinâmico e sensível a alterações, tanto naturais como antrópicas, responsáveis pelo balanço dos sedimentos costeiros, formação de restingas, dunas e praias; 2- a área é de dunas móveis conforme definido no artigo 2º, X, da Resolução 303/2002 do CONAMA; 3- a mesma Resolução Conama 303 estabelece em seu artigo 3º, XI que constitui área de preservação permanente aquela situada em duna.
 
3 Ocupação de bem da União Federal
 
A Constituição Federal enumera como bem da União as praias marítimas (CF, art. 20, inc. IV) e os terrenos de marinha (inc. VII).
 
Inicialmente, de notar que, como já afirmado, o réu não demonstrou autorização de ocupação pela SPU, mas apenas requerimento nesse sentido.
 
Pela foto acostada ao evento 1, PROCADM2, p. 9, e demais informações técnicas trazidas pelo autor, constata-se que o imóvel do demandado está situado na faixa de areia da praia marítima.
 
Demais disso, com base nas informações da SPU, juntadas pela União no evento 16, a edificação foi levantada em terreno de marinha.
 
Situado o imóvel, pois, em bem da União, é impositiva sua remoção. Nessa linha:
 
AÇÃO ORDINÁRIA. DIREITO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO EM TERRENO DE MARINHA SOBRE FAIXA DE PRAIA E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO DA OBRA. NECESSIDADE. GARANTIA DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. Constatada a abusividade na exploração irregular do terreno de marinha, mediante a construção de casa de veraneio e benfeitorias à beira do mar, em área de preservação permanente, ao arrepio da lei, e da Constituição Federal, em prejuízo ao meio ambiente e, por consequência, ao direito da coletividade, deve ser promovida a demolição da obra, sendo que o custo, inclusive da retirada e disposição dos entulhos deverão correr às expensas dos demandados. (TRF4, AC 5000217-51.2011.404.7201, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, juntado aos autos em 30/03/2012)
 
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PRODUÇÃO DE PROVAS. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. EXPLORAÇÃO DE QUIOSQUES EM PRAIA E TERRENO DE MARINHA. DANO AMBIENTAL. Não há falar em cerceamento de defesa pelo indeferimento de prova pericial quando a parte interessada deixa de recorrer oportunamente da decisão que lhe foi desfavorável. O fato de ter o Município autorizado o uso das áreas de marinha e de praia não confere qualquer direito aos autorizatários. Não pode legislar sobre a forma de utilização de bem que pertence à União, salvo se para isso autorizado expressamente. Demonstrado o dano ambiental às áreas protegidas, a possibilidade de compatibilizar o interesse social na exploração sustentável dos quiosques exige a redução e adequação destes ao tipo de terreno em que se localizam, reduzindo os efeitos danosos ao meio ambiente costeiro. (TRF4, AC 1999.72.08.006654-0, Quarta Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, D.E. 21/09/2009)
 
3 Responsabilidade Civil por Danos Ambientais
 
A responsabilidade civil por danos ao meio ambiente encontra respaldo no art. 225, § 3º da Constituição Federal, que recepcionou o regime da responsabilidade objetiva, independentemente de culpa, prevista pela Lei n. 6.938/81, art. 14, § 1º.
 
A responsabilidade objetiva restou albergada também pelo art. 7º da Lei n. 7661/88, que dispôs sobre a zona costeira, e art. 2º, § 1º da Lei n. 12.651/12, e decorre dos princípios do poluidor-pagador, da prevenção e precaução.
 
Além disso, a obrigação de recompor o meio degradado é propter rem, inerente à função socioambiental da propriedade, de modo que acompanha o imóvel e pode ser exigida dos adquirentes posteriores, ainda que não tenham sido autores da lesão ecológica.
 
A propósito:
 
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. TERRENOS DE MARINHA. LEGITIMIDADE ATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA AGRAVANTE ADQUIRENTE DO TERRENO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. DESCABIMENTO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. Improvimento do agravo de instrumento. (TRF4, AG 5002696-81.2014.404.0000, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 27/03/2014)
 
(…)A responsabilidade pela reparação do dano ambiental constitui obrigação propter rem, sendo possível cobrar também do atual proprietário a reparação por danos causados pelos proprietários antigos. Precedentes do STJ. 4. Impõe-se, na hipótese, a aplicação dos princípios do ‘poluidor-pagador’ e do ‘usuário-pagador’, previstos no art. 4º, VII, da Lei nº 6.938/1981, segundo o qual cabe ao poluidor e ao predador a obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, a contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos. 5. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. (TRF4, AC 0004811-27.2006.404.7216, Quarta Turma, Relator Luís Alberto D’azevedo Aurvalle, D.E. 02/04/2014)
 
(…) 2. A jurisprudência desta Corte está firmada no sentido de que os deveres associados às APPs e à Reserva Legal têm natureza de obrigação propter rem, isto é, aderem ao título de domínio ou posse, independente do fato de ter sido ou não o proprietário o autor da degradação ambiental. Casos em que não há falar em culpa ou nexo causal como determinantes do dever de recuperar a área de preservação permanente.
(…) (STJ, AgRg no REsp 1367968/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 12/03/2014)
 
Consequentemente, devem ser atribuídas ao demandado as obrigações de reparar a degradação ambiental, independentemente de sua participação na construção. Todavia, como foi referido, não apenas os danos ambientais ainda estão presentes, mas após a aquisição o réu e seu genitor procederam à ampliação da obra.
 
A determinação aos réus de demolição do imóvel e recuperação da área, enfim, é adequada à vocação do Direito Ambiental, que prioriza medidas preventivas, reparatórias e compensatórias, em lugar da mera indenização pelos danos ocasionados.
 
Apesar da existência de diversos imóveis da região, essa circunstância não obsta a adoção de providências reparatórias e mitigadoras sobre a edificação específica do demandado. Antes, a fim de minimizar os impactos ambientais gerados pela ocupação desorganizada do local, sobretudo pelo efeito de adensamento, revela-se necessária a demolição e recuperação, cabendo aos órgãos competentes agir em relação aos demais imóveis do entorno.
 
Assim já decidiu o e. TRF da 4ª R.:
 
DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE MARINHA. ZONA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO. RECUPERAÇÃO DA ÁREA. 1. Além de configurar terreno de marinha, a área em que está situada a construção localiza-se em Zona de Preservação Permanente (ZPP) prevista na Lei Orgânica do Município de Laguna/SC, consoante informado pela Administração Municipal. 2. Embora prática temerária da Administração, a ausência de resposta aos pedidos efetuados pelo requerido junto do Serviço de Patrimônio da União, em face das normas citadas, cujos preceitos, sem sombra de dúvida são cogentes, não tem o condão de possibilitar ao particular que se apodere do bem, utilizando segundo seus próprios interesses. 3. As praias são bens públicos de uso comum, isto é, de utilização comum pela coletividade, devendo seu acesso ser garantido a todos e não podem ser objeto de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares. 4. A apropriação e transformação da praia para interesses meramente individuais, vai em sentido diametralmente oposto à destinação comum dada pelo legislador, devendo essa atitude ser coibida pelas vias competentes, impedindo que um bem dessa natureza seja modificado a bel prazer de alguns, que acreditam que possuem direito exclusivo sobre ele. 5. Sob este prisma exsurge inarredável a necessária ingerência do Judiciário sobre o mundo fático. Ocorre que, num mundo como o atual, onde cada vez mais, os problemas ambientais vêm degradando a qualidade de vida, todos têm responsabilidades a assumir e o Poder Judiciário, uma vez provocado, deve fazer prevalecer os postulados constitucionais e a lei, voltando-se para uma interpretação comprometida com essa realidade, para a melhoria do ecossistema. 6. Impõe-se a demolição da construção irregular (imóvel de alvenaria) e condenação do réu em proceder à completa reparação da área, através da remoção dos detritos, bem como pela plantação da vegetação característica do local. (TRF4, AC 2002.72.07.008762-6, Quarta Turma, Relator Marga Inge Barth Tessler, D.E. 27/08/2007, grifei) Grifei.
 
Convém registrar que, segundo entendimento sufragado pelo e. TRF da 4ª Região, as casas da Praia da Galheta devem ser demolidas e procedida à recuperação do meio ambiente lesado:
 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AMBIENTAIS. CONSTRUÇÃO. CITAÇÃO DO CÔNJUGE. DESNECESSIDADE. COMPETÊNCIA. CERCEAMENTE DO DEFESA. INEXISTÊNCIA. ÁREA DE RESTINGA. TERRENO DE MARINHA. 1. Desnecessária a citação do cônjuge em ação civil pública que versa sobre responsabilidade por danos ambientais, decorrentes da construção de uma casa réu em área non edificandi, e não sobre direito real imobiliário. 2. Tendo a União protocolado petição requerendo a intervenção no feito na qualidade de litisconsorte ativo e a sentença admitido a intervenção respectiva na qualidade de assistente, ressaltando que, nos termos do artigo 50 do Código de Processo Civil, receberia o processo no estado em que se encontrava, justifica-se o processo e julgamento da demanda na Justiça Federal. 3. Contestada a ação apenas após a prolação da sentença, apesar de devidamente citado o réu, mostra-se indevido o argumento de que não teria sido oportunizada a produção de prova, eis que o próprio réu deixou de promover a reclamada perícia durante a instrução do processo. 4. Conjunto probatório que demonstra estar a construção localizada na Praia da Galheta, no Município de Laguna/SC, em área de restinga, de praia marítima, de uso comum do povo e que constitui terreno de marinha. (TRF4, AC 2002.72.07.008761-4, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 21/09/2009)
 
 
Por outro lado, ainda que possível a cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar pelas agressões ao meio ambiente, no caso em voga é suficiente ordenar a recuperação do local degradado.
 
Isso porque, embora o imóvel venha a ser gerador de impactos ao meio ambiente, ele é apenas mais um contribuinte para a degradação, visto que há outros imóveis em seu entorno que também produzem interferências ambientais. Demais disso, a cessão dos danos apontados requerem a demolição da edificação e recomposição do local.
 
Ao depois, diante da duradoura tolerância do Poder Público na ocupação irregular, e pela atitude do Município que, inclusive, permitiu cadastramento do imóvel em seus registros, verifica-se que o réu não tinha conhecimento que mantinha uma edificação aos arrepio da lei.
 
Sendo assim, é desproporcional condenar o suplicado a pagar indenização, além dos custos que terá com a demolição e recuperação do meio, se foi induzidos em erro pelo Estado e contou com a conivência do Poder Público Municipal.
 
Não é outro o entendimento do e. TRF da 4ª Região:
 
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA DO MEIO AMBIENTE. CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. DESNECESSIDADE DE CONDENAÇÃO DE INDENIZAÇÃO NO CASO EM APREÇO. 1. A demolição de edificação em Área de Preservação Permanente é medida adequada a cessar a agressão ao meio ambiente. 2. Presentes os elementos caracterizadores da responsabilidade civil por dano ambiental, impõe-se a condenação da parte ré à reparação do dano por meio de apresentação de PRAD ao IBAMA em prazo de 90 dias, a contar da presente decisão, pois – considerado o transcurso de tempo – resta inviabilizada a determinação de contagem de prazo desde a sentença. 3. Ainda que possível a cumulação da obrigação de fazer, consistente na recuperação do dano ambiental in natura, com a condenação ao pagamento de indenização, nos termos do art. 3º da Lei 7.347/85, diante da ausência de demonstração de ocorrência de outros prejuízos e, tendo sido determinada a recuperação da área, a partir de projeto de recuperação de área degradada (PRAD), descabida a condenação ao pagamento de indenização. (TRF4, AC 5000237-21.2011.404.7208, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 29/08/2013) (grifei)
 
Por fim, deixo de determinar a publicação da sentença neste processo, uma vez que os indícios trazidos pelo réu apontam que o mesmo carece de recursos financeiros para custear a divulgação.
 
4 Descumprimento da ordem de afixação de placa
 
No evento 3 foi deferida liminar para determinar ao réu a afixação de placa indicativa da existência desta demanda em frente ao imóvel, assim como para ordenar a interrupção do fornecimento de energia elétrica. Esta última providência restou revogada posteriormente (evento 28).
 
Entretanto, o demandado jamais cumpriu o mandamento judicial, que o obrigou a colocar a referida placa. A imposição de multa diária revelou-se ineficaz para esse fim, de modo que o demandado não demonstrou preocupação com o aumento progressivo da astreinte.
 
A interrupção da energia elétrica, porém, produziu mais efeito na conduta do demandado, que prontamente pediu a reconsideração da primeira decisão.
 
Importante mencionar que a medida pode ser ordenada com fundamento no art. 461, § 5º do CPC, e art. 84, § 5º do CDC, os quais proporcionam ao juiz o poder de impor providências apropriadas para a tutela do direito material, ainda que não tipificadas em lei. Na lição de Luiz Guilherme Marinoni, esses dispositivos, ao dispensarem a ação de execução para obrigações de fazer e não-fazer, tiveram a ‘nítida intenção de conferir ao juiz que proferiu a sentença a possibilidade de determinar a medida executiva adequada ao caso concreto, mesmo que não expressamente tipificada na lei’ (in Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 123).
 
Por conseguinte, a fim de tornar efetiva a ordem judicial que vige desde 22/10/2012 e não foi atendida, cumpre determinar novamente a interrupção do fornecimento de energia elétrica ao imóvel do réu, até que seja comprovada nos autos a afixação da placa aludida, salvo se, antes disso, proceder-se à demolição do imóvel.
 
O valor total das multas cominadas, na forma do art. 461, § 6º do CPC, será reavaliado por ocasião da execução da sentença.
Considerando o local da edificação, correta, portanto, a sentença que condenou o réu à demolição da edificação situada em área praia marítima, terreno de marninha, sambaqui, dunas móveis, promontório, no interior da área de proteção ambiental – APA da Baleia Franca.
Em casos análogos envolvendo residências edificadas na Praia da Galheta, esta Corte reconheceu a necessidade de demolição da obra, com a posterior recuperação do meio ambiente lesado:
PROCESSO CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EDIFICAÇÃO IRREGULAR. DANO AMBIENTAL. RECUPERAÇÃO IN NATURA. CUMULAÇÃO COM INDENIZAÇÃO. 1. Constatado por equipe técnica especializada que a área em que se encontra a edificação é qualificada como de preservação permanente, não há como deixar de aplicar as disposições normativas pertinentes: Lei n. 4.771/65 (antigo Código Florestal), Resolução n. 303/2002, do CONAMA, e Lei n. 12.651/2012 (novo Código Florestal). 2. Verificada a ocorrência de dano ambiental e existindo a possibilidade de recuperação da área degradada, é pertinente a ordem de demolição de edificação erigida irregularmente, sem a licença do órgão competente. 3. Se a recuperação in natura é suficiente para a recomposição do meio ambiente afetado, não há razão para impor, cumulativamente, o dever de indenizar em pecúnia o dano perpetrado pelo infrator. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001527-13.2012.404.7216, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/12/2015)
 
 AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO DE RESIDÊNCIA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRÓXIMO À UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL – APA BALEIA FRANCA. A prova técnica produzida pela Polícia Federal, que é prova produzida segundo as regras do processo penal, é válida e capaz para embasar uma condenação cível. Ainda que a ocupação seja antiga, isso não justifica sua manutenção, especialmente considerando que não houve regularização da área ocupada e que as construções não foram autorizadas. Em sendo suficiente a análise feita pela perícia para dar conta de que se trata de ocupação irregular, com comprometimento ao ecossistema local, e não sendo produzida prova em contrário, ônus que incumbia à parte ré, impõe-se a procedência da ação e o desprovimento da apelação. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL nº 5001280-32.2012.404.7216, Rel. Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 19/03/2015)
  
DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTRUÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DEMOLIÇÃO. RECUPERAÇÃO DA ÁREA. 1. Além de configurar terreno de marinha, a área em que está situada a construção localiza-se em Zona de Preservação Permanente (ZPP) prevista na Lei Orgânica do Município de Laguna/SC, consoante informado pela Administração Municipal. 2. As praias são bens públicos de uso comum, isto é, de utilização comum pela coletividade, devendo seu acesso ser garantido a todos e não podem ser objeto de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares. 3. A apropriação e transformação da praia para interesses meramente individuais, vai em sentido diametralmente oposto à destinação comum dada pelo legislador, devendo essa atitude ser coibida pelas vias competentes, impedindo que um bem dessa natureza seja modificado a bel prazer de alguns, que acreditam que possuem direito exclusivo sobre ele. 4. Sob este prisma exsurge inarredável a necessária ingerência do Judiciário sobre o mundo fático. Ocorre que, num mundo como o atual, onde cada vez mais, os problemas ambientais vêm degradando a qualidade de vida, todos têm responsabilidades a assumir e o Poder Judiciário, uma vez provocado, deve fazer prevalecer os postulados constitucionais e a lei, voltando-se para uma interpretação comprometida com essa realidade, para a melhoria do ecossistema. 5. Impõe-se a demolição da construção irregular e condenação do réu em proceder à completa reparação da área. (TRF4, AC 5002077-08.2012.404.7216, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 07/11/2014)
Acerca do pedido endereçado pelo MPF – cumulação da condenação em obrigação de fazer (demolição da edificação e implantação de PRAD) com a condenação do demandado em indenização pelos danos causados aos interesses difusos, tendo em vista o tempo que a natureza levará para se regenerar, tenho que improcede o pleito.
Em matéria ambiental, o cerne da tutela jurídica é a prevenção ou a mais completa mitigação dos danos ocasionados, visto que estes afetam toda coletividade e comprometem a própria existência das futuras gerações. Trata-se de respeito ao princípio da precaução, norteador do Direito ambiental, segundo o qual se devem evitar riscos potenciais e sempre tentar prevenir a degradação ambiental, objetivando-se manter o equilíbrio do ecossistema.
Ainda que a Constituição Federal imponha a toda a coletividade o dever de preservar e proteger o meio ambiente, devem ser considerados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade para a aplicação da responsabilidade civil ambiental.
Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade norteiam a responsabilidade civil e determinam que a reparação da conduta lesiva causada ao meio ambiente deve ser proporcional ao dano gerado, atentando para um critério razoável que, de um lado, não deixe o degradador/poluidor com a sensação de impunidade, mas que também não seja causa de ruína do mesmo.
Assim, não procede a apelação do MPF quanto ao pedido de cumulação da condenação de indenização à condenação de obrigação de fazer já fixada ao réu. Isso porque, embora o imóvel gere impactos ao meio ambiente, a demolição da edificação, cumulada com a implantação de PRAD, mostra-se medida suficiente para promover a completa reparação do local degradado e condenar o réu ao pagamento de indenização pecuniária mostra-se irrazoável.
É firme na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, comprovada a ocorrência de dano ambiental, a adoção de procedimentos, visando à integral recuperação da área degradada, não exime de responsabilidade o degradador do meio ambiente, sendo admissível a cumulação de obrigação de fazer e eventual indenização pelo dano ainda remanescente (Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, REsp nº 904.324/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJe 27/05/2009).
A cumulação de sanções, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, somente justifica-se quando insuficiente a reparação in natura do meio ambiente, o que inocorre na espécie. Nesse sentido:
DIREITO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. ELEMENTOS. CUMULAÇÃO ENTRE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAR. POSSIBILIDADE. DESCABIMENTO NO CASO.
1. A responsabilidade civil por dano ambiental dispensa a existência de dolo ou culpa, exigindo a presença dos seguintes elementos: conduta (ação ou omissão), dano ao meio ambiente e nexo causal entre ambos.
2. Comprovada a edificação de rancho em área de preservação permanente, com lançamento de resíduos diretamente nas águas do Rio Iguaçu, sem anuência da autoridade competente e com violação às normas de regência da matéria.
3. Embora não haja óbice para a cumulação da obrigação de fazer, consistente na reparação do dano, e a de indenizar (STJ, REsp 625.249/PR, Primeira Turma, Relator Luiz Fux, DJ 31/08/2006, p. 203), no caso dos autos a condenação dos réus na retirada do rancho, remoção do entulho e respectiva recuperação da área, somada ao custeio da divulgação da sentença, atende plenamente aos objetivos perseguidos na ação, mostrando-se proporcional ao ilícito flagrado. (TRF4, Apelação/Reexame Necessário nº 0001015-63.2008.404.7214/SC, Relatora Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, julgamento em 16/02/2011, publicação em 23/02/2011)
Há que se priorizar a aplicação do princípio da reparação in natura, sendo, assim, excepcional a conversão da obrigação de fazer – recuperar a área degradada, nesse caso, por meio da demolição da obra de reforma – em obrigação de pagar indenização ao patrimônio ecológico.
Nesse sentido e em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo que seria desproporcional condenar o réu a pagar indenização por danos ao patrimônio ecológico, tendo em vista que já terá que arcar com os custos provenientes da demolição e da retirada dos entulhos dela originados, de modo a possibilitar a mais completa recuperação do meio ambiente degradado.
De aí, tenho que a sentença andou bem ao determinar a demolição e a recuperação da área degradada pelo réu. Considerando a atuação do mesmo junto à área de preservação permanente, não vejo razões para lhe retirar a obrigação de demolição, ainda que demonstre ser pescador e alegue ser membro de família de baixa renda.
Ademais, consoante lançado em sentença De outra parte, não merece prosperar a afirmação de que o réu reside no local com sua família. Ao invés, a conta de luz datada de 21/10/2012 indica que o consumo é drasticamente superior nos meses de verão. Nos demais, é bastante inferior ou quase nenhum, a demonstrar que, fora da alta temporada, a casa não é ocupada. Afigura-se, pois, como casa de veraneio.
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações.
Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle
Relator

EMENTA

ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. PROCESSUAL CIVIL. EDIFICAÇÃO. APA DA BALEIA FRANCA. DEMOLIÇÃO. PRAD. RECUPERAÇÃO AMBIENTAL. CUMULAÇÃO COM INDENIZAÇÃO. DESNECESSIDADE.
1. Em que pese a Constituição Federal imponha a toda a coletividade o dever de preservar e proteger o meio ambiente, devem ser considerados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade para a aplicação da responsabilidade civil ambiental.
2. O objetivo da reparação ambiental não implica tão somente a indenização pecuniária, mas, na medida do possível, recuperação das condições ambientais anteriores, ou seja, o status quoante. A reparação do dano deverá ser a mais completa possível, buscando recompor a área degradada ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do dano ambiental.
3. Há que se priorizar o princípio da reparação in natura, sendo, assim, excepcional a conversão da obrigação de fazer – recuperar a área degradada, nesse caso, por meio da demolição da obra de reforma – em obrigação de pagar indenização ao patrimônio ecológico. A cumulação de sanções, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, somente justifica-se quando insuficiente a reparação in natura do meio ambiente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, por negar provimento às apelações, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de novembro de 2016.
Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle
Relator

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