sexta-feira , 19 abril 2024
Home / Notícias / Licenciamento Ambiental de Postos de Combustíveis

Licenciamento Ambiental de Postos de Combustíveis

 

Cumprir a extensa legislação ambiental brasileira e ter jogo de cintura para driblar os inúmeros atrasos nos pedidos de licenciamento têm exigido habilidade (e paciência) redobrada dos empresários brasileiros, em especial daqueles que operam em atividades consideradas potencialmente perigosas, como os postos de combustíveis.

A boa notícia é que tal situação está incomodando também os gestores dos órgãos ambientais em todo o país, que, de certa forma, são reféns do que está escrito na lei e, muitas vezes, ficam sem margem de manobra para implementar mudanças que poderiam trazer maior agilidade ao processo, como é o caso do “autolicenciamento”. “Não tem cabimento um escritório montado no centro urbano ter que pedir licenciamento ambiental, mas às vezes aparece alguém lá querendo ver a licença ambiental”, explica Luiz Firmino Martins Pereira, secretário-executivo da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), que tem a difícil missão de coordenar as diferentes propostas e visões dos órgãos estaduais e apresentar uma só voz no âmbito federal. Segundo ele, a Abema já vem discutindo a modificação da Lei 6.938, que criou a figura do licenciamento ambiental. O secretário-executivo também falou sobre a dificuldade dos postos com passivo ambiental para conseguir a Licença de Operação e elogiou o setor por responder rapidamente às demandas que lhe são apresentadas.

Arquiteto urbanista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Ciência Ambiental pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e doutor em Geografia também pela UFF, Firmino Martins é funcionário de carreira da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema) do Rio de Janeiro e assumiu em janeiro de 2009 a presidência do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) – que absorveu as funções das extintas Feema, Serla e IEF –, onde atualmente ocupa o cargo de sub-secretário executivo de Estado do Ambiente. Confira os principais trechos da entrevista, concedida com exclusividade à Combustíveis & Conveniência, na sede do Inea, no Rio de Janeiro (RJ).

 

Combustíveis & Conveniência: Qual o papel da Abema junto às secretarias de meio ambiente?

Luiz Firmino Martins Pereira: É basicamente tratar dos assuntos de interesse comum de todos os estados. Temos uma legislação ambiental fortemente calcada no órgão ambiental estadual. Somente agora, com a regulamentação da Lei Complementar (LC) 140, de 8/12/2011, que se está começando a dar as atribuições aos municípios nesse processo. O estado do Rio de Janeiro foi o primeiro a aprovar a regulamentação da Lei 140. E a expectativa é de que, muito em breve, os municípios vão estar com uma autonomia bem maior para tratar, inclusive, das questões referentes a postos de combustíveis.

Nacionalmente, uma série de problemas são comuns a todos. Há procedimentos que dependem de normas federais, por exemplo, e nesses casos a Abema tem um papel preponderante, porque a gente precisa fechar um consenso entre os estados e levar para discutir com o Ministério de Meio Ambiente e com o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama, que edita normas e resoluções). Dentro do Conselho, a Abema tem um espaço enorme de representação e peso nas discussões. Várias das questões normativas da área ambiental do país passam pelo Conama e quem faz essa estruturação é a Abema, até porque quem sente na pele a dificuldade em superar os obstáculos é o órgão ambiental estadual.

Esse papel da Abema, de articuladora e de porta-voz dos estados, é fundamental. Hoje temos uma ação muito difícil na função dos gestores públicos, porque o Ministério Público está sempre com uma lupa em cima de cada passo, de cada questão e precisamos ter a legalidade de todos os aspectos o tempo inteiro. Legalidade que eu digo é na vírgula da legislação, ou acabamos sendo enquadrados como réus em ação movida na justiça.

 

C&C: Entrando mais especificamente no setor de revenda, qual a principal dificuldade para se licenciar um posto?

LFMP: Quando se trata de um posto novo, é relativamente fácil, porque ele se instala num terreno “virgem”, que ainda não foi utilizado para aquele tipo de atividade. Fazemos todas as exigências de estanqueidade, de cuidados, de sistemas separadores e rapidamente se chega ao processo da Licença Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO).

Só que a grande maioria dos postos já está instalada há muitos anos. São atividades que vêm de longas décadas e, no passado, pela própria dinâmica de cuidado com a questão ambiental, que era muito menor, os tanques não tinham camada dupla, deterioravam-se, vazavam. Então, é quase impossível você pegar um posto antigo, que vem de duas ou três décadas, e não encontrar problema de contaminação. E como precisamos seguir à risca a legislação, mesmo com ele trocando o tanque e seguindo todos os procedimentos, será necessário descontaminar o terreno, porque passa a ser um passivo. E isso gera um imbróglio no licenciamento. Por que, o que vem primeiro? Primeiro descontamina o terreno todo e depois dou a Licença? Mas se ele não tiver a Licença, como vai conseguir ajeitar tudo?

O estado do Rio superou isso há dois anos, quando modificou seu decreto que versa sobre sistema de licenciamento. Foi criada uma figura chamada LOR: icença de Operação e Recuperação. Apesar de se aplicar a diversas situações, ela foi gestada para resolver o problema dos postos de combustíveis antigos. Porque se não tenho Licença, não consigo financiamento e, sem operar o posto, também não consigo dinheiro para descontaminar o terreno. A LOR permite que ele esteja licenciado e recupere ao mesmo tempo. Ele faz um laudo do terreno, avalia o processo, faz o projeto e aprova a Licença junto com isso, que sai como restrição. Por que isso não pode ser feito simplesmente dentro de uma Licença de Operação? Porque, no entendimento da legislação, a LO é para quem está com tudo resolvido, sem problema algum.

Outra figura bastante utilizada é o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC): o empreendimento não tem a Licença, vem até o órgão, reconhece que tem um problema ambiental, compromete-se a ajustar a conduta, via TAC, e ao final sai a Licença. Ele pode operar nesse período, mas estará sempre suscetível a restrições. Por exemplo, o posto precisa de um licenciamento, vai até uma agência de fomento e esta não libera, porque a regra adotada por ela exige a Licença. Por isso a LOR ajudou muito. No Rio de Janeiro, havia um passivo que beirava os três mil postos sem Licença em todo o estado. Do final de 2009 (quando foi editada essa nova legislação) para cá, reduziu-se em quase 80% esse passivo. E, o mais importante: está funcionando. Os postos estão operando adequadamente e promovendo as mudanças. Até porque se não cumprirem a cláusula de descontaminação, incorrem em descumprimento da Licença e serão multados e autuados.

 

entrevista_3_opt_small.jpg

 

C&C: De forma geral, como o senhor avalia a situação dos postos em todo o país?

LFMP: Há um divisor de águas quando, há mais ou menos uma década, saiu-se dos tanques de ferros para os de fibra, de parede dupla, que não estão sujeitos à corrosão. O setor reagiu e houve uma melhora muito rápida, foi um processo muito dinâmico, que acabou esbarrando depois nesse ponto do licenciamento, porque eram áreas contaminadas. Acho que caminhamos para não mais termos esse problema, com medidas como as adotadas no Rio de Janeiro. Os três mil postos que estavam sem Licença não conseguiam nem executar o projeto de remediação. Na medida em que eles entram na legalidade, conseguem as linhas de fomento. Tenho a impressão de que, em mais cinco anos, essas atividades estarão todas regularizadas e sem qualquer passivo de contaminação, o que é extremamente positivo.

A questão de lavagem de veículos, por sua vez, já está superada há bastante tempo, porque os postos têm um cuidado muito grande com essa atividade. Temos problemas sim com os lava a jato particulares.

Além disso, em relação à logística reversa, o setor de óleo é hoje um exemplo em todo o país. A organização é boa e o Estado quase não precisa fazer nada, além de receber as solicitações e dar as autorizações. Há o recolhimento das embalagens de óleo nos postos, algo que no passado não existia. E é o posto quem consegue dar cumprimento.

 

C&C: Muitos postos reclamam que cumprem toda a legislação, ajustam-se às regras, mas sofrem concorrência na venda de óleo lubrificante de estabelecimentos que não se preocupam com a questão do descarte adequado etc. Essa questão tem sido alvo de análise?

LFMP: Com certeza. É claro que toda fiscalização não é onipresente. Depende também muito de denúncias, especialmente nesse caso de atividade que muitas vezes é feita em fundo de quintal, sem qualquer tipo de controle. Os órgãos ambientais conseguem ter uma atuação rápida e eficaz, mas isso depende muito de denúncias. O processo de municipalização vai contribuir, cada vez mais, com isso, porque os municípios estão se estruturando não só para o licenciamento, como também para a fiscalização. E eles estão muito mais perto do problema.

 

C&C: Uma reclamação comum entre os revendedores é quanto ao conflito entre órgãos ambientais dentro de um mesmo estado, com exigências e prazos diferentes. Agora, com a maior autonomia dos municípios, como isso está sendo trabalhado para não se agravarem essas divergências?

LFMP: Do ponto de vista ambiental, não deveria ter esse tipo de problema. Porque, independentemente de quem faz o licenciamento, ou o acompanhamento ou o controle, ele precisa se pautar nas normas do Conama, nas NBRs sobre o assunto.

 

C&C: Mas esse é o básico, o órgão pode exigir além do Conama.

LFMP: Pode. Mas mesmo nesse ponto a LC 140 vai ser muito boa. Porque ela é bastante clara ao dizer que o empreendimento só pode ser licenciado por um ente federativo e, em sendo fiscalizado, prevalece a fiscalização do ente que licenciou. Então, isso talvez, aos poucos, traga um pouco menos de incertezas e confusões nessa parte. Se o licenciamento foi do município, o controle também será feito pelo Município. É claro que, se o Estado passar por lá e vir uma situação de vazamento ou de óleo sendo despejado de forma irregular, vai poder atuar, mas é o Município que vai ver o que está acontecendo e prevalecerá a posição dele no processo. E vice-versa: se o Estado licenciar, o Município só vai poder agir de forma cautelar.

Eu presenciei várias vezes processos que estavam aqui sendo regularizados no Estado, com a empresa cumprindo, atendendo às exigências e aí vinha o Ibama e lacrava o posto. Hoje isso já não existe mais no Rio de Janeiro por causa da LOR. A nova LC 140 também deixa claro que você só pode estar vinculado a um ente, do início ao fim.

 

C&C: Outra grande reclamação – e aí não apenas dos postos, mas de todo setor produtivo – é quanto à demora do licenciamento ambiental. Com a nova LC 140, isso vai mudar?

LFMP: Sim. Olhando o exemplo do Rio de Janeiro: no ano passado, foram seis mil licenças ambientais, três mil dadas pelo estado e três mil pelo conjunto de Municípios que já atuam no licenciamento. Evidentemente, você multiplica a força de trabalho e tende a dar respostas bem mais rápidas. E cada Município está se aparelhando, estruturando, dinamizando a sua burocracia para ser o mais rápido possível. Obviamente existem problemas que independem da vontade do órgão ambiental, como quando, por força da legislação, tem que consultar outro órgão e aí você fica de mãos atadas, esperando chegar a resposta. Às vezes, a demora do licenciamento está associada a problemas de outras licenças obrigatórias, que não podem deixar de ser observadas na hora de dar a licença ambiental.

 

entrevista_6_opt_small.jpg

 

C&C: Fala-se bastante que os órgãos ambientais em diversos estados sofrem com a falta de recursos e de pessoal. Isso é uma verdade?

LFMP: Essa é uma luta constante. Há um aumento de demanda exponencial para os órgãos, porque, quando se fala em alteração ambiental, tudo se encaixa nesse conceito. Então é preciso ter capacidade de dar dinâmica à legislação para ver aquilo que é insignificante e não deve tomar tempo do órgão e no que o órgão realmente precisa se concentrar. E, obviamente, tem que contratar, fazer concurso, tem que se estruturar, ou realmente fica para trás.

 

C&C: Há planos de se implementar, de forma padrão, uma espécie de autolicenciamento, em que as empresas se comprometem a realizar determinados procedimentos e depois a Secretaria de Meio Ambiente apenas confere se está tudo de acordo com o previsto?

LFMP: Está em pauta na Abema, mais especificamente na discussão para revisar a Lei 6.938, que é a legislação federal que estabelece a Política Nacional de Meio Ambiente e cria a figura do licenciamento. Há estados (não para postos de combustíveis) que já implementaram esse tipo de ato declaratório: o empresário vem aqui e declara, a grosso modo, que vai cumprir a lei. Mas existem questionamentos judiciais, porque a legislação não dá margem clara para esse tipo de licenciamento hoje. No Rio de Janeiro, implementamos isso para empreendimentos com desprezível potencial poluidor: o empresário imprime do site o documento que mostra que ele está enquadrado nessa classe e dispensado de licença. Não tem cabimento um escritório montado no centro urbano ter que pedir licenciamento ambiental, mas às vezes aparece alguém lá querendo ver a licença ambiental.

O Estado do Rio criou, junto com o decreto de 2009, a figura do responsável técnico no licenciamento. Qual é o intuito? Justamente ter um gestor daquela Licença. Se ele é o responsável, está lá o tempo inteiro, conferindo se todas as condicionantes estão sendo cumpridas e apresenta relatórios ao órgão ambiental. É alguém (um engenheiro ou um biólogo, por exemplo) contratado pelo empreendimento, que funciona quase como um fiscal: assina, põe seu registro embaixo e traz para o órgão. Na nossa legislação, para fins de renovação de Licença, já aceitamos essa declaração, atestando que não mudou nada e o processo continua o mesmo. E podemos emitir imediatamente a Licença. Obviamente se quem assinou estava mentindo, vai responder por isso.

Essa é uma forma de caminhar para o processo de autolicenciamento. Ou seja, ao invés de somente o empresário ir ao órgão, declarar que vai cumprir a lei e ir embora, cria-se essa condição: você vai contratar um profissional devidamente habilitado, que vai ao órgão, vai assinar como responsável e nos enviar relatórios constantemente. Se o proprietário não cumprir as determinações, provavelmente esse responsável técnico virá aqui e pedirá baixa. Na hora em que isso acontecer, vamos imediatamente fazer uma fiscalização para saber o porquê de o profissional ter pedido baixa.

A Abema tem discutido muito esses caminhos. Vamos ter um congresso no ano que vem e um dos grandes temas de pauta deve ser a reforma da Lei 6.938. Mas essa questão da certificação é o futuro da área ambiental, porque hoje são três mil empreendimentos, amanhã vão ser seis mil, depois 12 mil… Vamos ter um exército de 15 mil funcionários para dar conta?

 

C&C: Recentemente, a ANP passou a exigir a Licença de Operação para emitir o protocolo de novos postos revendedores. Entretanto, algumas secretarias requerem o protocolo da ANP para dar início ao processo de licenciamento. Está havendo algum diálogo com a ANP quanto a isso?

LFMP: Isso acontece em outras áreas também. No setor de mineração, por exemplo, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) só aceita o registro se tiver a licença do Inea, mas o Inea só dá a licença se tiver a lavra do DNPM. O que se faz? A gente fecha um acordo. O Inea vê a viabilidade ambiental e dá a Licença Prévia. Com a LP, ele pede o registro no DNPM e, com isso em mãos, o Inea dá a Licença de Instalação.

Normalmente, (o diálogo) é caso a caso, porque não é igual em todos os estados o nível de complicação.

 

C&C: Quais são os principais problemas encontrados em fiscalizações nos postos já ambientalmente adequados?

LFMP: Passado o processo de licenciamento, com LO em mãos, não encontramos grandes problemas. O que pega um pouco é, por exemplo, a caixa separadora de água e óleo, que não tem manutenção adequada. Não adianta ter o conjunto separador, porque se há muito material de resíduo sólido ali dentro, ele permite passar um percentual que não deveria.

Outra questão é a do óleo utilizado, que será posteriormente recolhido por outras empresas para rerrefino, e o posto precisa apresentar o Manifesto de Resíduo. Toda atividade que gera resíduos que não têm uma destinação final própria dada por eles precisa apresentar o Manifesto. Esse documento comprova a quantidade de óleo e que o posto deu uma destinação adequada, para uma empresa de rerrefino, por exemplo, que reprocessou esse produto.

  

C&C: Desde janeiro deste ano, o Arla-32 tem sido vendido em postos e concessionárias de todo o país, nesse primeiro momento, em vasilhames, mas a expectativa é de que haja em breve venda a granel. Qual tratamento será dispensado a esse produto, em termos de meio ambiente? Será necessário um novo licenciamento ambiental para quem for instalar um tanque de Arla-32?

LFMP: Ainda não temos essa discussão na Abema.

 

C&C: Mas se hoje chegasse um posto ao Inea com essa demanda? Qual seria o procedimento?

LFMP: Se não há normatização a respeito, o órgão ambiental pode agir por semelhança. No nosso caso, a tradição seria usar como caso piloto para propor uma normatização estadual.

Por semelhança, o máximo que poderia acontecer seria exigir uma canaleta ao redor do tanque e uma estocagem para caso de vazamento. Talvez estabelecesse algum procedimento desses e se averbaria na licença, não sendo necessário um novo processo de licenciamento. Mas não há nada definido.

 

C&C: Muitos postos de combustíveis sofrem a concorrência desleal de Pontos de Abastecimento, que funcionam algumas vezes como postos, têm o mesmo potencial poluidor dos postos, mas não estão submetidos à mesma fiscalização. Eles estão na mira da fiscalização ambiental?

LFMP: Claro. Esse é o tipo de fiscalização que se pega de rotina. O fiscal passa no lugar, vê um tanque aéreo, já vai ver se tem dique, se está tudo conforme a legislação. Agora, não é a gente que diz se pode ou não ter um Ponto de Abastecimento em determinado local. A gente observa a legislação do município e a ambiental, para ver o que elas determinam.

Fonte: Combustíveis & Conveniência

Além disso, verifique

Javalis atacam lavouras

Javalis atacam lavouras de arroz e soja no Rio Grande do Sul

Os ataques acontecem em lavouras de arroz, que foram semeadas no tarde, em novembro e …

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *