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Crime ambiental: TRF1 decide que porte de utensílios de pesca não configura crime

A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou provimento ao recurso, interposto pelo Ministério Público Federal (MPF), contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª vara Federal da Subseção Judiciária de Cáceres/MT, que absolveu, com base no princípio da insignificância, um pescador acusado de praticar crime ambiental.
Consta da denúncia que o acusado foi abordado por Fiscais Ambientais da estação ecológica de Taimã, no Rio Paraguai, ocasião em que constataram a existência a bordo da embarcação de uma tarrafa com pesos de chumbo e utensílios de pesca não permitidos pela legislação ambiental.
Insatisfeito com a absolvição do pescador em primeira instância, o MPF recorreu ao Tribunal alegando que a aplicação do princípio da insignificância a crimes ambientais vai de encontro aos princípios que regem o Direito Ambiental, tais como os princípios da Prevenção e da Precaução.
Em seu, voto o relator do processo juiz federal Iran Esmeraldo Leite, destacou que o crime praticado pelo réu, posse de petrecho de pesca em estação ecológica, não provocou lesão relevante ao meio ambiente e, dessa forma, a sanção administrativa aplicada ao acusado, sobretudo a apreensão do equipamento, é adequada e suficiente aos fins de reprovação e prevenção da conduta praticada.
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso nos termos do voto do relator.
Processo nº: 0002286-90.2013.4.01.3601/MT
Data de julgamento: 16/08/2016
Data de publicação: 24/08/2016

Fonte: TRF1, 15/09/2016

 

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Confira a íntegra da decisão:

 

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO
RELATOR CONVOCADO : JUIZ FEDERAL IRAN ESMERALDO LEITE
APELANTE : JUSTICA PUBLICA
PROCURADOR : LETICIA CARAPETO BENRDT
APELADO : FABIO DAS NEVES SILVA
DEFENSOR : ZZ00000001 – DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO – DPU

 

EMENTA

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. PESCA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. ESTAÇÃO ECOLÓGICA. ART. 34, II, DA LEI Nº 9.605/98. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

1. O princípio da insignificância é aplicado aos crimes ambientais, de modo excepcional e de maneira cautelosa, quando se verificar mínima ofensividade e ausência de reprovabilidade social da conduta.

2. O crime praticado pelo réu, posse de petrecho de pesca em estação ecológica, não provocou lesão relevante ao meio ambiente.

3. A sanção administrativa aplicada ao acusado, sobretudo a apreensão do equipamento, é adequada e suficiente aos fins de reprovação e prevenção da conduta praticada. A intervenção do direito penal, neste caso, torna-se desnecessária.

4. Apelação não provida.

ACÓRDÃO

Decide a Turma, à unanimidade, negar provimento ao recurso.

Terceira Turma do TRF da 1ª Região – Brasília, 16 de agosto de 2016.

Juiz Federal IRAN ESMERALDO LEITE

Relator Convocado

RELATÓRIO

O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL IRAN ESMERALDO LEITE (Relator Convocado):

Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença proferida pelo Juízo Federal da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Cáceres/MT, que absolveu, com base no princípio da insignificância, Fábio das Neves Silva da prática dos crimes capitulados no art. 34, parágrafo único, II, 2ª parte, c/c art. 36, ambos da Lei nº 9.605/98 (fls. 74/75).

Narra a denúncia que, no dia 07 de maio de 2013, o acusado foi abordado por Fiscais Ambientais da estação ecológica de Taimã/ICMBio, no Rio Paraguai, ocasião em que constataram a existência a bordo da embarcação de 01 (uma) tarrafa com pesos de chumbo de aproximadamente 1,60m (um metro e sessenta), petrecho de pesca não permitido pela legislação ambiental (fls. 02A/2B).

Em razões de apelação, o Ministério Público Federal aduz que a aplicação do princípio da insignificância a crimes ambientais vai de encontro aos princípios que regem o Direito Ambiental, tais como os princípios da Prevenção e da Precaução. Alega tratar-se de delito de perigo abstrato, em que basta a prática de atos potencialmente lesivos ao meio ambiente para que sejam considerados lesivos ao bem jurídico tutelado. Sustenta ser desnecessária a comprovação de dano para incidência de condenação por crimes de perigo abstrato (fls. 78/82).

Contrarrazões do o réu (fls. 84/93).

Nesta instância, o Ministério Público Federal pugna pelo provimento do recurso (fls. 97/100).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL IRAN ESMERALDO LEITE (Relator Convocado):

Compreendo que a conduta, embora formalmente típica, apresenta potencialidade ofensiva insignificante, sendo injustificável a incidência da norma penal incriminadora, sobretudo porque não foi apreendido nenhum pescado, apenas uma tarrafa, que se encontrava muito bem embalada, situação que, a meu ver, autoriza a aplicabilidade do princípio da insignificância.

Com efeito, é impensável que, ante a dinâmica social e a necessidade de ajuste das leis ao tempo de sua aplicação, tenha o legislador previsto todas as formas de exaurimento de situações elencadas no Código Penal.

A dogmática penal encerrou-se dentro de si mesma, dedicando-se, tão-somente, a elaborações abstratas, abandonando as particularidades do caso concreto e fechando as portas a qualquer consideração da realidade social.

Carlos Vico Mañas, ao falar do isolacionismo e do abstracionismo da dogmática penal atual, cita Jescheck, para quem “…o perigo de uma dogmática jurídico-penal baseada em fórmulas abstratas, pode levar o juiz a esquecer as particularidades do caso concreto, entregando-se ao automatismo dos conceitos teóricos”.

O direito penal e sua dogmática estão alicerçados em princípios, dentre os quais o da subsidiariedade, que diz respeito à interferência da ciência penal somente naqueles campos em que os demais ramos do direito não possam solucionar as questões postas, e o da fragmentariedade, a confirmar a proteção a bens jurídicos que tenham absoluta relevância para o corpo social, não devendo se ocupar de bagatelas. Tais princípios alicerçam o princípio maior, da intervenção mínima, que tem em Ferrajoli um de seus principais teóricos.

A tipicidade não se encerra na letra da lei, no sentido formal. Um fato será considerado crime se, além de se ajustar ao preceito contido na lei penal, ofender de maneira grave, intolerável e transcendental o bem jurídico tutelado, colocando em perigo ou lesionando interesses sociais ou vitais do indivíduo, sentido material.

É bem verdade que a tese da insignificância em crimes ambientais deve ser aplicada com cautela. No entanto, a situação dos autos comporta tal excepcionalidade, pois, ao que se infere dos autos, o réu foi flagrado portando  petrecho de pesca amadora e não estava na posse de pescado algum, situação que sequer representa risco potencial ao equilíbrio ecológico, demonstrando pouca ofensividade e nenhuma periculosidade social da ação.

Este Tribunal já teve oportunidade de se manifestar sobre a matéria, ocasião em que consignou o entendimento no sentido de ser possível o reconhecimento da atipicidade da conduta em situação como a discutida nos autos. Nesse sentido, os precedentes resumidos nas ementas a seguir transcritas:

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART.34 DA LEI N. 9605/98. ATOS DE PESCA EM PERÍODO PROIBIDO OU LOCAL INTERDITADO. APREENSÃO DE PETRECHOS SEM A RETIRADA DE QUALQUER ESPÉCIME DA ÁGUA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO IMPROVIDO.  1. A aplicabilidade do princípio da insignificância restringe-se às peculiaridades do caso concreto, de forma a aferir o potencial grau de reprovação da conduta, valendo ressaltar que delitos contra o meio ambiente, a depender da extensão das agressões, têm potencial capacidade de afetar ecossistemas inteiros, capazes de gerar dano ambiental irrecuperável, bem como a destruição e até a extinção de espécies da flora e da fauna. Precedentes.  2. No caso, a conduta dos acusados, consubstanciada na prática de atos de pesca em local interditado pelo órgão competente, não causou dano ao meio ambiente, já que foram apreendidos apenas petrechos (caniço e molinete) sem, contudo, ter sido retirado qualquer espécime da água, não ocasionando lesão ao bem jurídico tutelado.  3. Recurso improvido. (RSE 0000068-50.2013.4.01.3808 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 p.154 de 03/10/2014)

PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME AMBIENTAL. LEI 9.605/98, ART. 34. PESCA ILEGAL. PERÍODO DE DEFESO. PIRACEMA. PESCA DE ESPÉCIME DOURADO. ATIPICIDADE MATERIAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO.  1. O réu foi flagrado pela Polícia Militar Ambiental armazenando em freezer 05 (cinco) exemplares de pescado (dourado), dos quais o acusado assumiu a propriedade de 04 (quatro), o que resultou na apreensão de 04 kg (quatro quilos) de pescado, tendo tal fato ocorrido durante período de defeso da piracema.  2. A despeito da subsunção da conduta relacionada à pesca, em período proibido, ao tipo penal ambiental no aspecto subjetivo, ante a presença do dolo, não se pode atribuir relevância material quando a ação apresenta mínima ofensividade, nenhuma periculosidade social, reduzido grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica. (Precedentes desta Corte).  3. Recurso em sentido estrito não provido.

(RSE 0001118-50.2014.4.01.3817 / MG, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MONICA SIFUENTES, TERCEIRA TURMA, e-DJF1 p.6007 de 27/03/2015)

Demais, sequer é possível aferir o dano ambiental decorrente da conduta do acusado, pois houve a devida aplicação de multa e apreensão dos instrumentos de pesca.

Por estas razões, entendo que a sanção administrativa aplicada ao acusado, sobretudo a apreensão do equipamento de pesca, se apresenta como meio adequado e suficiente para os fins de reprovação e prevenção do delito praticado por ele, o que torna desnecessária a intervenção do direito penal nesta hipótese.

Em face do exposto, nego provimento à apelação.

É o voto.

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